“VOCÊ NÃO SOUBE ME AMAR”: A REPRESENTAÇÃO DA DÉCADA PERDIDA NAS FESTAS PLOC (SÉC XX - XXI) Renata Rodrigues de Freitas - UERJ 1 Nas últimas décadas presenciamos uma busca incessante pelo passado e as lembranças são cada vez mais sentidas pela sociedade. Tal interesse vem acompanhado pelo aumento nos trabalhos relativos à memória. A partir disso, pretendemos analisar as representações do rock nacional da década de 80 presentes nas Festas Ploc do Rio de Janeiro. Consideramos esses espaços como lugares de memória (NORA, 1993) do rock, dada sua importância no cenário cultural do Rio de Janeiro no final do século XX e início do século XXI. Tais representações se manifestam devido a um fenômeno contemporâneo que é a nostalgia musical das produções de bandas oitentistas, como Legião Urbana, Blitz, Kid Abelha, Cazuza, Ultraje a Rigor e Paralamas do Sucesso. Ao tocarem nas Festas Ploc, terem seus sucessos regravados por bandas covers e serem relembrados nos palcos provocam nos diferentes grupos sociais um sentimento de pertencimento a um tempo passado que é reconhecido pelos participantes da festa como um período de grandes transformações culturais, sociais e políticas. Para a elaboração desse artigo, analisamos os testemunhos de muitos participantes dos eventos, muitos dos quais, ao serem questionados sobre qual é a sensação de ouvir uma música da “década perdida” afirmaram que atualmente as produções musicais são “descartáveis” e que o rock nacional dos anos 80 possuía um caráter diferente. Rafael Veloso, 45 anos e frequentador dos revivals dos anos 80, ao ouvir Que pais é Esse, da Legião urbana respondeu ao ser entrevistado que Essa música é boa porque é das antigas. O rock nacional dos anos 80 tinha um compromisso artístico e político (...) a participação política daquela época estava fervendo (...) Isso se refletia nas músicas pois estávamos saindo de um regime repressor e a liberdade do rock e a irreverência do pop marcaram época e são sentidas aqui nesse espaço.3 2 Percebemos no trecho que o Brock (DAPIEVE, 2009) ganha um tom de valoração por fazer parte de um período histórico específico, que é lembrado por muitos como “o melhor momento do rock nacional”. Ressaltamos nesse artigo que o objetivo é discutir o saudosismo trazido por esses lugares de memória e não apenas reproduzir um juízo de valor sobre determinado período. Assim, na análise das entrevistas, percebemos que a juventude que viveu a década de 80 possui uma consciência crítica em relação ao período em questão por se acharem mais engajados politicamente por terem vivido um momento de grande explosão do rock nacional e de transição política para democracia aos primeiros anos da Nova República. Dessa forma, analisamos os testemunhos dos participantes da faixa etária de 40 a 65 anos de idade, frequentadores dos revivals, refletimos acerca das suas visões de mundo relacionadas às experiências vividas na década de 80 e consideramos seus relatos associados ao conceito de juventude (BOURDIEU, 1983, p.112) por ser uma expressão que remete a experiência de determinados grupos, suas mudanças e inquietudes (ROCHEDO, 2011, p.12). A ideia que o termo juventude suscita de forma geral está ligada a uma fase da vida onde os jovens estão em processo de formação biológica, psicológica e social. Porém o conceito de juventude, amplamente discutido por Bourdieu, vai para além dessa noção generalizada já que para ele a juventude é algo que deve ser pensado de modo a não fazermos comparações de melhor ou pior, mas sim analisarmos as diferenças entre elas (BOURDIEU, 1983). Em nossa análise notamos a existência de uma fronteira - entre a juventude e a velhice - que é um objeto de disputas pelo público que frequenta as festas à procura do Brock, já que muitos dos relatos da juventude da década de 80 afirmavam sem exitar que “viveram a melhor fase do rock nacional”. Torna-se fundamental refletirmos sobre as interpretações dos testemunhos dos que compunham a juventude do período em questão e que hoje em dia constroem, através de práticas culturais e da linguagem, a memória dos anos 80. Dessa forma consideramos as concepções de Mannheim sobre juventude quando o autor afirma que Não é muito difícil conjeturar quais as sociedades em que o prestígio cabe aos velhos e em que as forças revitalizantes da juventude não se integram em 3 um movimento, permanecendo apenas como uma reserva latente. Acredito que as sociedades estáticas, que só se desenvolvem gradativamente e em que a taxa de mudança é relativamente baixa, confiarão, sobretudo, na experiência dos mais velhos. Mostrar-se-ão relutantes em encorajar as novas potencialidades latentes nos jovens. A educação destes será centrada na transferência da tradição; seus métodos de ensino serão de mera cópia e reprodução. As reservas vitais e espirituais da juventude serão deliberadamente negligenciadas, visto não haver uma vontade de romper com as tradições existentes na sociedade (MANNHEIM, 1980, p.49-50) Todas essas afirmativas, indagações e experiências nos fizeram refletir sobre um fenômeno social da nossa contemporaneidade que é esse resgate nostálgico do rock nacional visto e sentido de forma cada vez mais recorrente em lugares de memória e as Festas Ploc atualmente acontecem em vários lugares do país. Faz-se necessária uma breve análise sobre uma tendência da historiografia contemporânea que se debruçou nas últimas décadas sobre o estudo da memória que vem sendo o centro do debate nas atividades de pesquisa acerca de práticas culturais, ritos e festas comemorativas. Notamos ainda a importância dos testemunhos como fontes que auxiliam o historiador na atividade de pesquisa, uma vez que os relatos orais possibilitam analisar as experiências dos atores sociais envolvidos, e a experiência e a memória enquanto capacidade de recordar e de evocar constituem um enriquecimento de saberes (HALBWHACS, 1990,p.9-17). Vemos que a partir da década de 1980 ocorre um interesse pelos estudos referentes a temáticas cotidianas. Tal fenômeno é analisado por Beatriz Sarlo na obra Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva, na qual a autora chama atenção para os perigos dos anacronismos e imparcialidades nos relatos orais, bem como reflete sobre o conceito de guinada subjetiva. Diz ela: As “histórias da vida cotidiana”, produzidas, em geral, de modo coletivo e monográfico no espaço acadêmico, às vezes têm um público que está além desse âmbito, justamente pelo interesse “romanesco” de seus objetos. O passado volta como quadro de costumes em que se valorizam os detalhes, asoriginalidades, a exceção à regra, as curiosidades que já não se encontram no presente. (SARLO, 2007, p. 16-17) 4 Outro conceito fundamental para o nosso trabalho é o de Retromania, elaborado pelo jornalista Simon Reynolds, que analisa o fenômeno retrô em vários espaços como moda, roupas, cinema e música. A moda retrô, segundo ele, é um fenômeno constantemente revisitado, e a primeira década do século XXI começou a parecer distante, como se fosse uma continuação do presente (REYNOLDS, 2011, p.372), ou seja, a “sensação de se mover para frente diminuiu conforme a década se desenrolou. O próprio tempo parece lento, como um rio que começa a se perder em seus meandros e formar poças” (REYNOLDS, 2011). Considerando que a última década foi marcada por revivals dos anos 80, as reflexões de Reynolds nos auxiliam a pensar sobre o fenômeno da nostalgia do rock nacional presente em nosso tempo. Segundo autor, esses revivals - que começaram no fim da década de 1990 e desde então não param de crescer- seriam réplicas que marcariam a primeira década do século XXI. A mídia teria um grande papel nesse processo, pois Do arquivo de shows do youtube aos incontáveis blogs de música, moda, fotografia e design, a internet é um gigantesco banco de imagens que encoraja e possibilita a réplica de estilos de época. (…) Na música especialmente, a combinação de tecnologia musical barata e o vasto acúmulo de conhecimento sobre como gravações específicas foram feitas significam que as bandas de hoje podem conseguir exatamente o som que elas procuram (REYNOLDS, 2011, p.372) Dessa forma, percebemos que uma das explicações para esse culto ao passado está ligada a tecnologia, posto que as mudanças sociais e a memória histórica são cada vez mais mediadas pela experiência midiática.. O ponto principal da retromania contemporânea, segundo Reynolds, é o caráter da recordação total e instantânea que a internet possibilita ao aproximar duas juventudes: os contemporâneos dos anos 80 e a juventude atual, colocando o passado remoto e o presente lado a lado. Notamos que muitos dos entrevistados se referiam justamente à questão da qualidade das produções musicais oitentistas como ímpares e que a atualidade não produz significativamente como os anos 80 pois Não existe década mais simbólica no século inteiro como os anos 80. Os anos 80 hoje em dia são um estilo de vida. A Festa Ploc virou conceito com música de qualidade e chega num patamar que não tem reclamação. A Festa Ploc virou conceito (…) só há saudosismo. Vemos pessoas que viveram a época falando: “nossa, essa música marcou a minha vida” e jovens de 20 5 anos dizendo “estou aqui por influência dos meus pais”, isso tudo porque hoje em dia a musica hoje é descartável. As bandas hoje não marcam. Havia nos anos 80 um núcleo do rock nacional que era transgressor, Camisa de Venus, Ultraje a rigor falavam. O rock dos anos é muito emblemático e com a internet isso aumenta. “Legião Urbana, hoje em dia, é conceitual.” 4. Grandes partes dos produtores e dos participantes da Festa apontaram para a questão da criatividade das produções em diversos espaços e dos remakes produzidos na atualidade nas novelas, sambas - enredo, cinema - que repaginou filmes que foram sucessos nos anos 80, como por exemplo, Carrie: a estranha, que teve quatro remakes- e principalmente na música. Reynolds ressalta que sua obra não visa lamentar a perda da “boa música”, mas justamente chamar atenção para o desaparecimento de certa qualidade musical. Para ele, isso está relacionado à transformação da produção criativa, com o artista não sendo mais um criador, mas sim um curador ou compilador (REYNOLDS, 2011, p.130). Tal fato estaria ligado ao panorama da arte contemporânea das décadas de 60 e 70, que se refletiu na produção cultural das últimas décadas, marcadas pela colagem de referenciais. A partir das entrevistas com os participantes dos eventos saudosistas notamos como a permanência do sucesso de algumas bandas tais como Titãs, Paralamas e Ultraje a Rigor, bem como o de bandas e artistas covers dos ícones do rock nacional da década de 80 (como Cazuza, Renato Russo e Raul Seixas), nos auxiliam na compreensão da retromania contemporânea discutida por Reymonds, quando este afirma que as produções musicais tendem “não à descoberta, e sim a recuperação”. Dessa forma a Festa Ploc surge como lugar de memória e de representação de um período marcante na música brasileira que era voltada para uma geração que acabara de presenciar a abertura política e que gozara da liberdade de ouvir bandas e músicos que foram censurados em décadas anteriores. Bandas como Ultraje a Rigor, com seu sucesso Inútil, que, nos anos 80, representou uma crítica ao modelo político e sempre é relembrado pelo público com muita animação A gente não sabemos escolher presidente A gente não sabemos tomar conta da gente A gente não sabemos nem escovar os dentes Tem gringo pensando que nóis é indigente Inútil A gente somos inútil5 6 A Festa Ploc surgiu no Rio de janeiro no dia 7 de Janeiro de 2004 como um fenômeno que atraia inúmeras pessoas de várias idades, mas principalmente a geração coca-cola agora correspondente à faixa etária de 35 a 45 anos. O nome Ploc faz referência ao chiclete que foi muito consumido no período. Assim como o chiclete a cultura da época gruda de um jeito muito especial e de uma forma que não pode desaparecer. Um dos criadores do evento, o DJ Luciano Vianna define muito bem o 6 objetivo da festa ao dizer que Hoje em dia, as músicas que todo mundo curte das grandes bandas nacionais, como Paralamas, Barão Vermelho e Legião Urbana, são todas da época. É só ver o que acontece na maioria das festas quando elas tocam. Com a música pop também ocorre o mesmo. Alguns brinquedos e o estilo dos programas infantis (...) nem existem mais. Não dá para fugir. Os anos 1980 estão aqui até hoje.7 A Ploc tenta ser um revival do rock nacional e do pop e várias práticas culturais são percebidas como o fato dos participantes do evento irem a caráter usando roupas e fazendo apologia não somente à década de 80 como também a produtos consumidos no período como patins, chiclete, jogos de atari bem como camisas de bandas de rock nacionais e internacionais da época que explodiram nas rádios. Consideramos a Festa Ploc como um esforço de representação cultural do passado por ser palco para grandes bandas de rock que fizeram sucesso nos anos 80, como Plebe Rude e Uns e Outro e até mesmo para bandas e artistas covers do rock nacional e internacional, como a banda Legião Cover, que traz Beto Sanches interpretando Renato Russo com roupagem e trejeitos idênticos, a banda Bandalata que imita os Paralamas do Sucesso. A Ploc é realizada há 12 anos em espaços como o Circo Voador, um dos lugares mais tradicionais da música, que foi palco de grandes sucessos do rock nacional dos anos 80, e o Espaço Marum no Catete. A Festa Ploc começou como uma festa entre amigos no Espaço Marum no evento chamado “Quintas feiras de verão”. No fim do verão a demanda pelas festas aumentou e foi se espalhando pela cidade do Rio de Janeiro, e no ano de 2006 o evento ganhou popularidade com a média de 12 festas semanais. Atualmente a Ploc acontece regularmente em 15 estados do país, com festas mensais e anuais, como a que acontece em Salvador no estádio de futebol Arena Fonte Nova. 7 Percebemos que o sucesso da Ploc foi para além da festa, transformando-se em um sinônimo de festa retrô que passou a ser comercializada também em formatos de mídia. A procura do público pela compra das mídias das Festas Ploc era grande e por conta disso alguns produtos foram lançados como Livros, CD´s e três DVD´s da festa que foram lançados pela gravadora Som Livre. Segundo o idealizador do evento a festa, dependendo do espaço em que é realizada, consegue atrair um público considerável como, por exemplo: 15.000 pessoas no estádio Arena Fonte Nova, 2000 pessoas no Circo Voador e 800 pessoas no Espaço Marum. Luciano Vianna e os idealizadores da 8 festa afirmam que o que “era apenas uma brincadeira entre amigos” ganhou uma proporção muito maior do que o esperado, fugindo ao controle dos próprios organizadores e se transformando em um selo, em uma marca popularmente conhecida, pois “quando se fala Ploc as pessoas de qualquer lugar do Brasil já associam a festas dos anos 80”. O termo Ploc é uma marca registrada, e percebemos a trajetória de crescimento da festa como um negócio de grande amplitude, um organismo empresarial que tem sua sede administrativa no Rio de Janeiro. Notamos que o território é ocupado por certas marcas que, no caso da Ploc 80´s, representam um passaporte para uma “viagem ao passado”. Marcas de objetos como os jogos de Atari -que formam a logomarca da Ploc 80´s- têm a propriedade dos anos 80 e estabelecem um diálogo com o público ávido pelo saudosismo. As festas trazem não somente artistas e músicas, mas toda uma linguagem visual e elementos estéticos que possuem um valor de ligação com o passado, despertando nos frequentadores da festa um sentimento de comunhão. Dessa forma, “a linguagem realiza a libertação do aspecto mudo da experiência, redimindo-a de seu caráter imediato e do esquecimento ao qual estaria destinada, transformando-a no comunicável” (SARLO, 2007) e a Ploc 80´ seria justamente uma forma de linguagem por serem nítidos os elementos como a atmosfera, as marcas, produtos e serviços como valores responsáveis pelo elo entre os participantes. Portanto, através da análise de símbolos e comportamentos compartilhados como um sistema de significados que procuram representar uma década, é possível também perceber o lugar ocupado por esses objetos e marcas que proporcionam lembranças e um sentimento de identificação entre os diferentes grupos. A Festa Ploc surge como uma tentativa de reconstrução. Segundo Halbwachs, 8 A lembrança é reconhecimento e reconstrução. É reconhecimento, na medida em que porta o “sentimento do já visto”. É reconstrução, principalmente em dois sentidos: por um lado, porque não é uma repetição linear de acontecimentos e vivências do passado, mas sim um resgate destes acontecimentos e vivências no contexto de um quadro de preocupações e interesses atuais; por outro, porque é diferenciada, destacada da massa de acontecimentos e vivências evocáveis e localizada num tempo, num espaço e num conjunto de relações sociais. (HALBWHACS, 1990, p.9-17). Dessa forma consideramos a Festa Ploc como espaços onde acontecem tentativas de reconstruir um momento histórico de grande relevância, não somente para o rock nacional, mas também para a cultura dos anos 80, “tendo em vista que as lembranças retomam relações sociais, e não simplesmente ideias ou sentimentos isolados, e que são construídas a partir de um fundamento comum de dados e noções compartilhadas”. As Festas Ploc seriam então uma tentativa, mais precisamente um esforço de representação do passado que é cada vez “usado” e lembrando na atualidade com nostalgia e valoração. Para Roger Chartier, as representações são importantes, visto que o social só tem sentido dentro das práticas culturais e a partir dos símbolos que dão sentido e explicação para uma dada realidade (CHARTIER, 1990). Nas festas e shows é possível perceber uma gama de práticas culturais para comemorar esse passado que vão desde as vestimentas até escolhas das bandas e músicas que fizeram grande sucesso no período em questão. As questões suscitadas por esse tema nos levaram a pesquisar diversas bibliografias sobre os anos 80, e nos deparamos com uma relativa escassez de trabalhos de cunho historiográfico referentes ao tema em questão. Muitas vezes encontramos dissertações referentes ao rock nacional (o movimento Brock) bem como a questões políticas presentes nas músicas de vários artistas do período. Analisamos alguns jornais da época, revistas como-BLITZ, Isto é, Som Três e várias dissertações e livros acerca da produção musical da década de 80, e percebemos a importância de alguns meios de comunicação que foram fundamentais para pensarmos o ímpeto musical do momento que é relembrado hoje. Criada em março de 1982, A Rádio Fluminense, popularmente conhecida como Maldita, foi um desses meios de comunicação que surgiu com interesse de não apenas tocar bandas de rock, mas também ter locução, linguagem, programação, filosofia e 9 mentalidade que nada tinham a ver com as chamadas "rádios jovens” (FIGUEIREDO, 2009). Assim, a rádio teve um papel crucial na cultura dos anos 80 por lançar grandes artistas no mercado da música e que são lembrados com nostalgia. Uma das suas coletâneas musicais era denominada Rock Voador, que consistia em uma parceria da Rádio Fluminense com o Circo Voador, hoje palco de grandes shows e das Festas Ploc, e que lançou nomes como Celso Blues Boy, Kid Abelha e Lobão. O Circo Voador e a Rádio Fluminense juntos no projeto Rock Voador serviram como espaços fundamentais para divulgação do rock nacional e hoje servem de espaços para shows que relembram os anos 80. Mais de 250 bandas foram lançadas na mídia brasileira (ROCHEDO, 2011) e dessa forma muitos ouvintes tiveram acesso a músicas até então desconhecidas pelo público conforme ilustra o jornalista Tom Leão No Rio o verão era do rock e tem agito em todos os cantos da cidade. Todo o sábado no circo voador, lá na Lapa, rola o rock Voador, onde se apresentam grupos de nomes que estão surgindo e que estão saindo da casca. Os shows são no mínimo triplos e antes tem vídeo e música para dançar. A entrada custa Cr$ 800 bem dados (ROCHEDO, 2011, p.48) Partindo-se do pressuposto de que as fontes orais “são discursos que não deveriam ficar confinados numa cristalização inabordável” (SARLO, 2007, p.47) é possível recuperar parte de nossa memória, com o auxílio dos relatos que nos servem como indicativos das representações de determinadas épocas. As discussões acerca do nosso objeto de pesquisa, que são os lugares de memória do Brock, não seriam possíveis sem considerarmos o papel dos testemunhos dos que compõem esses espaços, compartilham experiências e se transportam a uma determinada época ou lugar. Halbwachs afirma que “o indivíduo que lembra é sempre um indivíduo inserido e habitado por grupos de referência, pois a memória é sempre construída em grupo, mas é também um trabalho do sujeito” (HALBAWHACS, 1990, p.9-17), ou seja, a memória do indivíduo se desenvolveria a partir da interação entre as pessoas e as emoções têm um papel crucial nesse processo. Dessa forma, consideramos as experiências compartilhadas como fatores cruciais para a existência dos lugares de memória do Brock, conforme ilustra o idealizador da Ploc 80´s: Nós não vendemos a Ploc apenas como uma festa. Nós vendemos uma experiência e as pessoas embarcam nessa experiência. Uma coisa 10 impressionante é que as pessoas fazem camisas da Ploc e outros produtos e símbolos que remetem à festa. Outra coisa que acho interessante: 90% das pessoas que chegam na Ploc vão sozinhas e acabam se conhecendo. As pessoas têm diferentes sensações e o mais legal é que cada pessoa tem sua própria experiência, lembranças e sintonia com as músicas. 9 Ao longo de nossas vivências e experiências fazemos escolhas e selecionamos na memória o que queremos que persista em nossas lembranças e em nosso tempo e espaço. Diante disso, podemos afirmar que as Festas Ploc são uma gama de eventos que procuram reafirmar aderência ao modo de ser de alguma época ou lugar. Consideramos em nosso trabalho essas comemorações do passado não somente como um resgate de comportamento social e cultural, mas como um “lugar” da memória, pois segundo Nora: Os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que não há memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar atas, porque essas operações não são naturais. É por isso a defesa pelas minorias, de uma memória refugiada sobre focos privilegiados e enciumadamente guardados nada mais faz do que levar à incandescência a verdade de todos os lugares de memória. Sem vigilância comemorativa, a história depressa as varreria. São bastiões sobre os quais se escora. Mas se o que eles defendem não estivesse ameaçado, não se teria, tampouco, a necessidade de constituí-los. Se vivêssemos verdadeiramente as lembranças que elas envolvem, eles seriam inúteis (NORA, 1993, p.13) Dessa forma, faz-se necessária uma “vigilância comemorativa”, e uma das funções desses lugares sociais da memória seria de interromper o esquecimento de algo que queremos manter vivo em nosso tempo. Assim, consideramos as Festas Ploc não somente comemorações de um passado, mas sim como uma leitura de um tempo passado que se faz presente.
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