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Tudo o que devia aprender na vida aprendi no jardim de infancia PDF

151 Pages·2012·0.51 MB·Portuguese
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R F OBERT ULGHUM T UDO QUE EU DEVIA SABER NA VIDA APRENDI J - -I NO ARDIM DE NFÂNCIA I DÉIAS INCOMUNS SOBRE COISAS BANAIS Editora Best Seller Título original: All I Really Need to Know I Leamed in Kindergarten Copyright © Robert Fulghum, 1986, 1988 Publicado sob licença de Villard Books, a division of Randon House, Inc. Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução no todo ou em parte, por qualquer meio, sem autorização do Editor. Não é permitida a venda em Portugal. Direitos exclusivos da edição em língua portuguesa no Brasil adquiridos por EDITORA NOVA CULTURAL LTDA., que se reserva a propriedade desta tradução. EDITORA BEST SELLER Uma divisão da Editora Nova Cultural Ltda. Av. Brig. Faria Lima, 2000 – CEPO 1452 -Caixa Postal 9442 São Paulo, SP. Fotocomposto na Editora Nova Cultural Ltda. Impresso e acabado na Gráfica do Círculo do Livro S.A. 3 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância DO AUTOR PARA O LEITOR ________________________ Antes de você começar, quero dizer-lhe duas palavras. Oferecerlhe uma espécie de roteiro, para que não perca o fio da meada. O que você está começando a ler foi escrito ao longo de muitos anos, aos pouquinhos – e eu pensava em amigos, familiares, numa comunidade religiosa e em mim mesmo –, sem a idéia de que “meus escritos” viessem a se transformar em livro. Não sabia que nome dar ao que fazia e os chamava assim: “meus escritos” – espécie de registro do que se passava em minha cabeça e em minha vida. Parte desses escritos – a que se refere ao que aprendi no jardimde- infância – viajou bastante, de um canto a outro do país, antes de ganhar autonomia e vida própria. De repente, o texto chegou às mãos de uma agente literária, trazido da escola na mochila de seu filho. E ela me escreveu, querendo saber se eu tinha mais material. Ora, eu tinha. Daí em diante, numa espécie de maravilhosa corrente, uma coisa foi puxando a outra. Assim, temos aqui, em livro, os meus primeiros “escritos” e outros que produzi depois. Alterei alguns nomes e acontecimentos para resguardar a privacidade de meus “personagens”, uns tímidos, outros inocentes, outros as duas coisas. Mais um detalhe: é possível que você encontre contradições no texto. Pode acontecer de estar lendo e pensar: “Mas ele não disse exatamente o contrário poucas páginas atrás?” É. Parece que guardo, arquivadas na cabeça, noções completamente 4 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância contraditórias. Por exemplo, é verdade que não vale a pena viver sem questionar a própria vida, mas também é verdade que a ignorância é uma bênção. Coisas assim. Ainda não cheguei a conclusões definitivas sobre tudo. Que mais lhe poderia dizer? Vá lendo devagar, sem pressa, pois não faço suspense, nem guardei a grande surpresa para o último capítulo. Por fim, devo informar que tenho diploma de Contador de Histórias. Um amigo teve o cuidado de datilografá-lo e o colou com fita adesiva na parede, em frente a minha escrivaninha. Por esse diploma, fica-me assegurado o direito de usar a imaginação para “costurar” como quiser os fatos de minha experiência, desde que, com isso, consiga uma boa história, respeitada a Verdade na medida do possível. Em meu diploma pode-se ler, também, o Credo do Contador de Histórias: Creio que a imaginação pode mais que o conhecimento. Que o mito pode mais que a história. Que os sonhos podem mais que os fatos. Que a esperança sempre vence a experiência. Que só o riso cura a tristeza. E creio que o amor pode mais que a morte. Tenho feito de tudo para não escrever nada que dê motivo à cassação do meu diploma. ROBERT FULGHUM 5 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância JA FAZ MUITOS ANOS QUE, a cada primavera, imponho-me a tarefa de fazer uma declaração pessoal de fé – de compor um Credo. Quando era mais jovem, meu Credo ocupava páginas e páginas, de tanto que me preocupava em cobrir todas as áreas, sem deixar nada pendente. Era como se tivesse de produzir uma espécie de sentença da Suprema Corte; como se, com palavras, pudesse resolver todos os conflitos sobre o sentido da existência. Com o tempo, o Credo foi encolhendo. Às vezes acaba soando cínico, às vezes cômico, às vezes sereno, mas continuo trabalhando nele. Recentemente resolvi que tinha de fazê-lo caber inteiro em uma única página e que só podia usar palavras simples, mesmo sabendo que corria o risco de parecer idealista e ingênuo. A idéia de procurar ser breve, verdadeira inspiração, ocorreu-me num posto de gasolina. Estava abastecendo meu velhíssimo automóvel com a gasolina mais pura, de alta octanagem. Combustível de luxo. O carro protestou: começou a ratear nos cruzamentos, vazava combustível pelas esquinas. Eu logo entendi o que estava acontecendo. De vez em quando me sinto assim, como o tanque de meu carro. Excesso de informação, excesso de complexidade, e eu é que começo a ratear pelas esquinas – um ratear existencial pelos cruzamentos da vida, justamente nos locais e horas em que tenho de tomar as mais difíceis decisões, e inevitavelmente descubro que ou sei demais, ou sei de menos. Quanto mais penso sobre a vida, mais me convenço de que ela não é um piquenique. Foi quando descobri que já sei praticamente tudo o que é necessário saber para viver com dignidade – o quê, afinal, não é assim tão complicado. Já sei quais são as coisas que realmente contam. E de fato sei há muito tempo, porque tenho vivido essas 6 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância coisas. Sim, claro que viver já são “outros quinhentos”. Eis o meu Credo: Tudo que eu preciso mesmo saber sobre como viver, o que fazer, e como ser, aprendi no jardim-de-infância. A sabedoria não estava no topo da montanha mais alta, no último ano de um curso superior, mas no tanque de areia do pátio da escolinha maternal. Vejam o que aprendi: Dividir tudo com os companheiros. Jogar conforme as regras do jogo. Não bater em ninguém. Guardar os brinquedos onde os encontrava. Arrumar a “bagunça” que eu mesmo fazia. Não tocar no que não era meu. Pedir desculpas, se machucava alguém. Lavar as mãos antes de comer. Apertar a descarga da privada. Biscoito quente e leite frio fazem bem à saúde. Fazer de tudo um pouco – estudar, pensar e desenhar, pintar, cantar e dançar, brincar e trabalhar, de tudo um pouco, todos os dias. Tirar uma soneca todas as tardes. Ao sair pelo mundo, cuidado com o trânsito, ficar sempre de mãos dadas com o companheiro e sempre “de olho” na professora. Pense na sementinha de feijão, plantada no copo de plástico: as raízes vão para baixo e para dentro, e a planta cresce para cima – 7 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância ninguém sabe como ou por quê, mas a verdade é que nós também somos assim. Peixes dourados, porquinhos-da-índia, esquilos, hamsters e até a semente no copinho plástico – tudo isso morre. Nós também. E lembre-se ainda dos livros de histórias infantis e da primeira palavra que você aprendeu, a mais importante de todas: Olhe! Tudo que você precisa mesmo saber está por aí, em algum lugar. A regra de ouro, o amor e os princípios de higiene. Ecologia e política, igualdade e vida saudável. Escolha um desses itens e o elabore em termos sofisticados, em linguagem de adulto; depois aplique-o à vida de sua família, ao seu trabalho, à forma de governo de seu país, ao seu mundo, e verá que a verdade que ele contém mantém-se clara e firme. Pense o quanto o mundo seria melhor se todos nós – o mundo inteiro – fizéssemos um lanche de biscoitos com leite às três da tarde e depois nos deitássemos, sem a menor preocupação, cada um no seu colchãozinho, para uma soneca. Ou se todos os governos adotassem, como política básica, a idéia de recolocar as coisas nos lugares onde estavam quando foram retiradas; arrumar a “bagunça” que tivessem feito. E é verdade, não importa quantos anos você tenha: ao sair pelo mundo, vá de mãos dadas, e fique sempre “de olho” no companheiro. 8 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância ESTOU ENCARREGADO DA LAVANDERIA, em minha casa. Gosto do serviço. Fico com a sensação do dever cumprido. Sinto- me, de algum modo, envolvido com o resto da família. E o tempo que passo lá nos fundos da casa, sozinho, também é bom, às vezes. Gosto de ir separando as peças – leves, escuras, “médias”. Gosto de mexer nos botões – quente, frio, enxaguar, tempo, água fria, água quente. São escolhas que posso entender, opções que faço com a mais autêntica sabedoria, com o mais genuíno know-how. Ainda não conheço bem os novos equipamentos de som estéreo ou a laser, mas sou mestre em máquinas de lavar e em secadoras. A máquina dá sinal, você vai e retira as roupas fofinhas, ainda quentes, põe em cima da mesa da copa, separa a roupa de cada um dos familiares, vai dobrando e fazendo pilhas ou montinhos bem- arrumados. Mas gosto ainda mais quando a roupa sai da secadora carregada de eletricidade estática: você pega as meias, aproxima-as de qualquer pedaço de pele do corpo e elas ficam lá, grudadas. (Minha mulher me surpreendeu, certa vez, todo embandeirado com pés de meia pelos braços e ombros, e me deu um olhar daqueles. Nem sempre se pode explicar um gesto, um movimento. Você sabe como é...) Quando o trabalho termina, sinto-me realizado, competente. Sou mesmo bom de lavanderia. Pelo menos nisso. E lavar roupa, você sabe, é uma experiência religiosa. Água, terra, fogo – os opostos, o seco e o molhado, o quente e o frio, o sujo e o limpo. Os grandes ciclos, o eterno retorno, gira e gira, começo e fim, Alfa e Ômega, amém. E eu lá, em contato com a fantástica e monumental uma- coisa-ou-outra. Por um momento, pelo menos, a vida é uma seqüência de fatos ordenados e plenos de sentido. Mas então, outra vez, tudo volta a ser como antes... 9 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância Na semana passada a máquina de lavar “pifou”. Acho que a sobrecarreguei de toalhas de banho e, sei lá por quê, as toalhas juntaram-se todas do mesmo lado da máquina, quando o tambor começou a girar. Então foi um tal de ranger de ferragens, de motor gemendo, e a máquina “saiu andando” pela lavanderia e explodiu, levantando a tampa. Pensei que estivesse à minha procura, ou tentando me caçar pela área de serviço. Num instante era um organismo calmo, bem ajustado, e no minuto seguinte lá estava, autêntica besta-fera, com o ventre cheio de toalhas semidigeridas, soltando espuma pela boca porque, provavelmente, exagerei também no sabão em pó. Cinco minutos depois, também a secadora estava parada, morta. Pensei num daqueles casais de velhinhos de casa de repouso que morrem, o marido logo depois da mulher, ou vice-versa, de tão ligadas que foram suas vidas. Era sábado à tarde e todas as toalhas da casa estavam molhadas, além de todos os meus shorts e meias. E quer saber do pior? Se resolvesse chamar um desses técnicos, precisaria ficar de plantão em casa por trinta e seis horas e ainda convocar o gerente do banco para fazer plantão comigo e avalizar meu cheque de pagamento, porque, sem aval, o tal do técnico nem cruzaria a soleira da porta. Não dava. Eu não tinha tempo. A única solução possível era levar tudo para a lavanderia self-service de um shopping. Desde os tempos de faculdade, eu não passava uma noite de sábado numa dessas lavanderias automáticas. Quanta experiência se perde quando deixamos de freqüentá-las! A rara oportunidade de ver a roupa suja dos outros e de ouvir conversas que não se pode escutar em nenhum outro lugar. Vi uma respeitável velhinha com uma sacola cheia de peças de lingerie preta, sensualíssimas, e fiquei pensando se seriam dela ou não. E aprendi com um jovem 10 _______________________________________________________________ Robert Fulghum - Tudo que eu devia saber na vida aprendi no Jardim-de-Infância

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