1 JULIANA RIPKE DA COSTA Tópicas afro-brasileiras como tradição inventada na música brasileira do século XX Tese apresentada ao programa de pós- graduação em música (PPGMUS) da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Mestre em Música. Área de concentração: Musicologia Linha de pesquisa: Teoria e Análise musical Orientador: Prof. Dr. Paulo de Tarso Salles São Paulo 2017 Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. 3 COSTA, Juliana Ripke da. Tópicas afro-brasileiras como tradição inventada na música brasileira do século XX. 2017. 187 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017. Aprovado em: _________________________________ Banca Examinadora Prof. Dr. ___________________________________________________________________ Instituição: _________________________________________________________________ Julgamento: ________________________________________________________________ Prof. Dr. ___________________________________________________________________ Instituição: _________________________________________________________________ Julgamento: ________________________________________________________________ Prof. Dr. ___________________________________________________________________ Instituição: _________________________________________________________________ Julgamento: ________________________________________________________________ 4 Este trabalho é dedicado à minha mãe, Rosangela Ripke, que está sempre aqui, que faz tudo ser amor. 5 AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, Prof. Dr. Paulo de Tarso Salles, pela sempre presença, pelas cuidadosas orientações e reflexões, pela confiança depositada em mim e neste trabalho, pela paciência, convívio e amizade. Pude aprender, a cada orientação, como é valioso saber transmitir o conhecimento de forma tão generosa. Ao Prof. Dr. Rodolfo Coelho de Souza, por ter acompanhado o processo de desenvolvimento deste trabalho com valiosas sugestões e contribuições. Ao Prof. Dr. Clóvis de André, por acreditar em mim desde os primeiros passos da vida acadêmica. A Deus, pelo dom da vida, pelo cuidado, pela força diária nesta jornada, e por colocar pessoas tão especiais em meu caminho. Ao meu pai, por me introduzir no caminho da música. À minha irmã Luana Ripke, por ser minha melhor amiga e meu exemplo de determinação, gentileza e amor. Obrigada por me entender com um simples olhar. Ao meu marido, José Luiz Martins, meu companheiro e amigo de todas as horas, meu incentivador, meu exemplo e minha inspiração. Por toda ajuda, conversas, críticas e contribuições. Nada disso seria possível sem você. Aos queridos companheiros de trabalho do Instituto Baccarelli, ao Coral Avançado, e em especial à Silmara Drezza pelo convívio e incentivo diário, pelo exemplo de força, pelas contribuições, pela confiança e pela amizade. À minha querida amiga Maíra Ferreira, pela conexão e pela sintonia que nos dão forças pra seguir, cair e levantar a cada dia. Pela amizade e pela oportunidade de fazer música juntas. Às queridas amigas Marcella, Bim, Esther, Hívina e Samanta. Obrigada por me mostrarem, a cada dia, o que realmente vale à pena. 6 “Nós tivemos que inventar o Brasil, o Brasil não existia. Quer dizer, eu, quando fui inventar o Brasil, o Brasil já estava inventado. Mas, pessoas antes de mim tiveram que inventar o Brasil. O Villa- Lobos teve que inventar o Brasil, o Portinari...Tiveram que inventar a língua inclusive. Estava conversando ali com nosso amigo, professor de português: essas palavras indígenas que nós temos não existem no português de Portugal. Então, a gente tinha que fazer uma música brasileira. E isso aí, para eu dizer porque é que eu fiz isso, é muito simples: porque eu nasci aqui”. (JOBIM, 1993) 7 COSTA, Juliana Ripke da. Tópicas afro-brasileiras como tradição inventada na música brasileira do século XX. 2017. 187 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017. RESUMO Este trabalho pretende analisar e demonstrar como as tópicas musicais afro-brasileiras são um exemplo de tradição inventada na música brasileira do século XX (especialmente a partir do modernismo e do nacionalismo musical no Brasil). O conceito de tradição inventada foi amplamento discutido e desenvolvido pelo historiador Eric Hobsbawm, e diz respeito a um conjunto de práticas reguladas por regras comumente aceitas, estabelecendo normas derivadas do costume ou da convenção. Assim, este trabalho correlacionará o conceito de tópicas musicais e o conceito de tradição inventada, a fim mostrar como a aparente configuração de uma tópica não está de acordo com sua forma original e nem tampouco é uma representação literal do que se refere, mas sim estilizações e recriações estabelecidas através de um senso comum. Tudo isso será feito a partir de uma abordagem que reúne a análise musical e abordagens semióticas baseadas na teoria das tópicas, a fim de compreender alguns caminhos de significação nos processos composicionais da música brasileira. Para isso exemplificarei e analisarei a tópica canto de xangô e a tópica berimbau em obras de compositores a partir do modernismo e nacionalismo musical brasileiro, percorrendo então outros compositores brasileiros ao longo do século XX, tanto na música erudita quanto na música popular, até abordagens mais recentes como obras dos compositores Rodolfo Coelho de Souza e Fernando Iazzetta. Palavras-chave: Tópicas afro-brasileiras. Tradição inventada. Berimbau. Canto de xangô. Música brasileira. Século XX. 8 COSTA, Juliana Ripke da. African-Brazilian topics as invented tradition in Brazilian music of the 20th century. 2017. 187 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017. ABSTRACT This work aims to analyze and demonstrate how African-Brazilian musical topics are an example of invented tradition in Brazilian music of the 20th century (especially from modernism and musical nationalism in Brazil). The concept of invented tradition was widely discussed and developed by the historian Eric Hobsbawm, and it concerns a set of practices regulated by commonly accepted rules, establishing norms derived from custom or convention. Thus, this work will correlate the concept of musical topics and the concept of invented tradition to show how the apparent configuration of a topic is not in accordance with its original form, neither is it a literal representation of what it refers to. Rather than that, they are stylizations and recreations established through a common sense. All of this will be done by bringing together the musical analysis and semiotic approaches based on topic theory in order to understand some paths of signification in the compositional processes of Brazilian music. Therefore, I will exemplify and analyze the canto de xangô topic and the berimbau topic in works of composers from modernism and Brazilian musical nationalism, by going from other Brazilian composers throughout the twentieth century, both in classical and popular music, until the most recent approaches, as found in works by the composers Rodolfo Coelho de Souza and Fernando Iazzetta. Keywords: African-Brazilian topics. Invented Tradition. Berimbau. Canto de xangô. Brazilian Music. 20th Century. 9 LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Tresillo....................................................................................................................61 Figura 2 – Síncope característica.............................................................................................61 Figura 3 – Cinquillo.................................................................................................................61 Figura 4 – Ritimo de habanera ou ritmo de tango...................................................................61 Figura 5 – Raízes do maxixe....................................................................................................64 Figura 6 – Raízes do samba.....................................................................................................64 Figura 7 – Modelo de Oposições proposto por Hatten e traduzido por Salles (2016)..............89 Figura 8 – Modelo de oposições proposto por Salles (2016) para música de Villa-Lobos.....90 Figura 9 – Tópica nordestina e tópica época-de-ouro, segundo Acácio Piedade...................96 Figura 10 – Tópica sabiá no Quarteto de Cordas n.6 de Villa-Lobos (I movimento, c. 153- 156), segundo Salles (2012)................................................................................97 Figura 11 – Canto de Xangô recolhido por Mário de Andrade..............................................115 Figura 12 – Canto de Xangô – Villa-Lobos versão para canto e piano (c. 1-5).....................116 Figura 13 – Tópica canto de xangô no Quarteto de Cordas n.4 (II mov., c. 1-8) – Villa- Lobos.................................................................................................................117 Figura 14 – Tópica canto de xangô no Quarteto de Cordas n.6 (I mov., c. 117-122) – Villa- Lobos.................................................................................................................118 Figura 15 – Tópica canto de xangô no Quarteto de Cordas n.6 (II mov., c. 6-11) – Villa- Lobos.................................................................................................................119 Figura 16 – Tópica canto de xangô em Kankukus, das Danças Características Africanas (c. 95 a 108) – Villa-Lobos.....................................................................................120 Figura 17 – Fig. 52 – Maracatu de Chico Rei- F. Mignone – ostinato - c. 639....................121 Figura 18 – Maracatu de Chico Rei – F. Mignone – tema do Canto de Xangô nos baixos e clarinetes baixos (c. 643-649) ...........................................................................122 Figura 19 – Maracatu de Chico Rei – F. Mignone – tema do Canto de Xangô nos barítonos, corne-inglês e fagotes (c. 649-653) ..................................................................123 Figura 20 – Tópica canto de xangô em Maracatu de Chico Rei (c. 677-678) – F. Mignone.............................................................................................................124 Figura 21 – Dança Negra – C. Guarnieri – escala pentatônica maior no ostinato da mão esquerda (c. 1-3) ...............................................................................................128 10 Figura 22 – Dança Negra – C. Guarnieri – contrametricidade entre mão direita e esquerda.............................................................................................................129 Figura 23 – XIV Variações sobre o tema de Xangô – Almeida Prado – apresentação do tema....................................................................................................................131 Figura 24 – Tópica canto de xangô em XIV Variações sobre o tema de Xangô – Almeida Prado – variação XIII.........................................................................................132 Figura 25 – Introdução de Samba do avião – Tom Jobim......................................................134 Figura 26 – Canto de Xangô e Samba do Avião – Comparação.............................................136 Figura 27 – Modelo de transcrição para TUBS, por Graeff (2014) .......................................137 Figura 28 – Linha rítmica do Samba de Angola em notação TUBS, por Graeff (2014)........138 Figura 29 – Linha rítmica do samba em notação ocidental, transcrita por Graeff (2014)......138 Figura 30 – Canto de Xangô e Samba do Avião – notação TUBS.........................................139 Figura 31 – Canto de Xangô e Samba do Avião – comparação rítmica em notação TUBS – 1.........................................................................................................................139 Figura 32 – Canto de Xangô e Samba do Avião – comparação rítmica em notação TUBS – 2.........................................................................................................................140 Figura 33 – Tópica canto de xangô em Nanã – Moacir Santos (c. 1-6).................................141 Figura 34 – Tópica canto de xangô em Nanã – Moacir Santos (c. 22-29).............................142 Figura 35 – Canto de Xangô – Baden Powell (c. 19-30) .......................................................144 Figura 36 – Polirritimias entre melodia e acompanhamento contínuo do violão – Canto de Xangô – Baden Powell (c. 36-38)......................................................................145 Figura 37 – Berimbau de barriga............................................................................................150 Figura 38 – Tópica berimbau no Quarteto de Cordas n.11 – Allegro – Villa-Lobos............153 Figura 39 – Tópica berimbau no Quarteto de Cordas n.9 (I mov. – 3) – Villa-Lobos..........154 Figura 40 – Tropos: tópica berimbau e tópica canto de xangô no Quarteto de Cordas n.9 (I mov. – 12) – Villa-Lobos...................................................................................155 Figura 41 – Tópica berimbau no Quarteto de Cordas n.9 (IV mov. – c. 1-9) – Villa- Lobos.................................................................................................................156 Figura 42 – Tópica berimbau no Quarteto de Cordas n. 13 (I mov, n. de ensaio 6) – Villa- Lobos.................................................................................................................157 Figura 43 – Tópica berimbau no Quarteto de Cordas n. 13 (IV mov.- c. 16-20) – Villa- Lobos.................................................................................................................157 Figura 44 – Toque Angola por Mestre Vavá e transcrição de Oliveira Pinto no sistema TUBS...............................................................................................................158
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