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Santo Agostinho - A paciência PDF

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Santo Agostinho A P ACIÊNCIA Tradução de: Souza Campos, E. L. de teodoro editor Niterói – Rio de Janeiro – Brasil 2018 A Paciência Introdução Diferença entre a verdadeira paciência e a falsa. Exortação à prática da verdadeira paciência, pela qual suportamos os males com vistas à vida eterna e por amor a Deus. Esta virtude não é obra das forças de nosso livre arbítrio, mas da graça de Deus. Capítulo I – A paciência de Deus. 1. A força da alma, a virtude que leva o nome de paciência é um dom muito grande da prodigalidade divina, pois se exalta no próprio Deus essa paciência com a qual ele espera os maus até que eles se corrijam. Deus não pode sofrer, não pode padecer (a pala- vra paciência vem de padecer, sofrer) e, no entanto, Deus é paci- ente. Esta é uma daquelas verdades que acreditamos com um co- ração fiel e confessamos com a boca para nossa salvação. Mas, qual é a natureza, qual é a grandeza dessa paciência de um Deus que não padece, que não é impaciente e que, pelo contrá- rio, é a própria paciência? Isto é algo impossível de explicar atra- vés da linguagem humana. Sua paciência é, portanto, inefável; Santo Agostinho – A paciência como seu zelo, como sua cólera e seus outros sentimentos do mesmo gênero. Eles não são nele, de forma alguma, como eles são em nós e não é assim que devemos imaginá-los. Assim como seu zelo é ciumento sem qualquer mistura de inveja, sua cólera é sem transtorno, sua piedade sem nenhuma dor, seu arrependimento é sem reparação de qualquer falta que ele possa ter cometido; assim, ele é paciente sem sofrer. Mas, vejamos a paciência humana; essa virtude que devemos compreender e praticar. Exponhamos no que ela consiste, na me- dida em que Deus nos permita fazê-lo e permita a brevidade deste texto. Capítulo II – No que consiste a verdadeira paciência. Sua utilidade. 2. A paciência humana __ eu digo a paciência verdadeira, louvável, aquela que merece o nome de virtude __ consiste em suportar os males com constância de alma, com medo de que a inconstância de alma que gera a iniquidade nos faça abandonar os bens espirituais que são para nós os meios de chegar aos bens su- periores. Segue-se daí que os impacientes, ao se recusarem a so- frer os males, não conseguem se livrar deles e acabam sofrendo 3 Santo Agostinho – A paciência males maiores. Os pacientes, pelo contrário, que preferem supor- tar o mal sem cometê-lo, do que cometê-los a não suportá-los, conseguem um duplo ganho: eles tornam os males que eles sofrem mais leves através da paciência e escapam dos males mais graves que sofreriam por causa da impaciência. Além disso, eles evitam a perda dos grandes bens da eternidade, ao não sucumbirem sob o peso dos males passageiros do tempo. Pois, os sofrimentos da pre- sente vida não têm proporção alguma com a glória futura que nos deve ser manifestada1, como diz o Apóstolo. E também: A nossa presente tribulação, momentânea e ligeira, nos proporciona um peso eterno de glória incomensurável2. Capítulo III – A dimensão da paciência dos iníquos. 3. Consideremos, meus caríssimos irmãos, tudo o que as pes- soas suportam de trabalhos e dores por causa dos objetos de suas paixões viciosas, por coisas em que se é tão infeliz em desejar quanto se imagina ser feliz em possuir. A que perigos elas se ex- põem por causa de falsas riquezas! Que amarguras elas suportam por honras vãs! Que incrível paciência por satisfações pueris! Á- 1 Romanos 8: 18. 2 2 Coríntios 4: 17. 4 Santo Agostinho – A paciência vidas de dinheiro, glória, depravações, nada lhes é custoso demais para lhes propiciar o que desejam e conservar o que adquiriram. O sol, a chuva, a graça, as ondas rugindo, o mar em fúria, a guerra, por mais dura e cheia de incertezas, golpes, lesões terríveis, feri- mentos horríveis, elas suportam tudo sem serem impedidas pela lei da necessidade; elas enfrentam tudo com prazer e para seguir seus desejos culposos. E acreditam que todas essas loucuras são permitidas! Capítulo IV – Os fúteis louvam essa paciência. Com efeito, a avareza, a ambição, a luxúria e todo o cortejo dos divertimentos fúteis são reputados como coisas inocentes, desde que não sejam proporcionadas por algum crime ou fraude proibidos pelas leis humanas. E mais: desde que não prejudique ninguém, este pode adquirir uma fortuna ou aumentar a sua, aque- le ambicionar as honras e se manter no topo, aquele outro ainda buscar os aplausos no palco e todos, para atingirem seus objetivos, suportarão dores e cansaços de todos os tipos. Os populares, ami- gos das vaidades, evitam lhes dirigir a menor crítica e, longe dis- so, eles até os erguem até às nuvens. Assim, segundo as palavras 5 Santo Agostinho – A paciência das Escrituras O pecador se gloria até de sua cupidez3. A violên- cia desses desejos faz suportar os trabalhos e as dores e, com efei- to, ninguém sofre voluntariamente tormentos, a não ser para obter prazer. Mas, como eu dizia, essas paixões que devoram aqueles que querem satisfazê-las ao preço de tanto esforço e amarguras suportadas com tanta paciência são vistas como permitidas e tole- radas pelas leis. Capítulo V – Exemplos de paciência espantosa: Catilina e os ladrões. 4. O que diremos ainda? Não vemos pessoas se submeterem aos mais rudes trabalhos por ocasião dos crimes mais evidentes, não para puni-los, mas para cometê-los? Lemos nos autores profa- nos a vida de um parricida carrasco de sua pátria, da primeira no- breza. Dizem que ele sabia suportar a fome, a sede, o frio e que, com uma paciência insuperável, ele submetia seu corpo às priva- ções, ao sofrimento, à insônia, em uma medida que ultrapassa qualquer imaginação4. 3 Salmo 9: 24. 4 Cf. CÍCERO. Catilinárias. 3,16. 6 Santo Agostinho – A paciência O que dizer dos ladrões das estradas? Para realizar suas em- boscadas aos viajantes, todos passam noites sem dormir e, para surpreender o inocente na passagem, eles mantêm focados seus espíritos criminais e seus corpos imóveis, sob os climas mais in- clementes! Vários deles, pelo que contam, chegam até a se torturar uns aos outros, para se prepararem para o suplício, com um exer- cício que não difere dele. Talvez o juiz os atormente menos cru- elmente para lhes arrancar a verdade através das dores do interro- gatório, do que seus próprios companheiros, quando querem se assegurar que o suplício não os tornará traidores. No entanto, a paciência de todas essas pessoas pode provocar a admiração, mas não o louvor. Ai! O que foi que eu disse?! Não, nem uma coisa e nem outra; a paciência não existe aqui. Admire a obstinação, negue a paciência, pois, não há nada aqui que mereça ser louvado e nada de útil a ser imitado. Você julgará com razão que uma alma merece um castigo muito maior, quando ela faz uso para o vício dos instrumentos das virtudes. A paciência é a com- panheira da sabedoria e não a serva da concupiscência. A paciên- cia é amiga da boa consciência e não inimiga da inocência. 7 Santo Agostinho – A paciência Capítulo VI – A causa pela qual se sofre constitui a diferença entre a verdadeira e a falsa paciência. 5. Quando você ver alguém sofrer pacientemente, não se a- presse em louvar sua paciência, enquanto não se revelar a causa pela qual ele sofre. Se a causa é boa, a paciência é verdadeira. Se essa causa não está manchada por alguma paixão, você pode dizer que a paciência não é falsa. Mas, quando o vício caracteriza a primeira, você errará ao caracterizar a segunda por seu nome. As- sim como nem todos aqueles que sabem são adeptos da ciência, também nem todos aqueles que sofrem são, por causa disso, adep- tos da paciência. As pessoas que sabem usar o sofrimento pela virtude, eis os que merecem realmente o nome de pacientes e a coroa remuneradora da paciência. Capítulo VII – Os iníquos sabem sofrer tudo pela vida temporal. Nem só a alma se beneficia com a morte e as dores pacientemente suportadas; o corpo tem nisso sua parte. 6. No entanto, essa espantosa perseverança das pessoas em sofrer tantos males horríveis por suas paixões e até mesmo por crimes nos esclarece bastante sobre o que devemos suportar para 8 Santo Agostinho – A paciência levar uma vida virtuosa, para que ela possa se tornar uma vida eterna, estável, de verdadeira felicidade, contra os limites do tem- po e contra qualquer redução dos elementos de sua felicidade. O Senhor disse: É em vossa paciência que possuireis vossas almas5. Ele não disse vossa fazenda, vossas honras, vossos praze- res culpáveis, mas ele disse vossas almas. Se então a alma conse- gue sofrer tanto para possuir o que a faz perecer, quanto ela não deve suportar para evitar perecer? E, para citar um exemplo que não inclui nada de criminoso, se a alma sabe sofrer para salvar sua carne nas mãos de médicos equipados com ferro e fogo, quanto ela não deve sofrer para sua própria salvação, no meio dos ataques furiosos de todos os seus inimigos? Pois, os médicos salvam o corpo da morte fazendo-o sofrer e os inimigos da salvação amea- çam o corpo com o sofrimento da morte, para precipitar na morte eterna a alma e o corpo. 7. Há mais; vela-se mais eficazmente pelos interesses do próprio corpo, quando se despreza, pela justiça, sua saúde tempo- ral; quando, pela justiça, dedica-se aos tormentos e até mesmo à morte. Pois, é da redenção final do próprio corpo que o Apóstolo fala, quando diz que Nós, que temos as primícias do Espírito, ge- 5 Lucas 21: 19. In patientia vestra possidebitis animas vestras. 9

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