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Santo Agostinho - A natureza do bem PDF

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A natureza do bem Santo Agostinho Capítulo I Deus, bem supremo e incorruptível. Deus, este é o bem supremo e infinito. Isto é dizer claramente que este bem é soberanamente imutável e, assim, essencialmente imortal, essencialmente eterno. Todos os outros bens particulares não possuem outro princípio que não seja este bem supremo, mas eles não são da mesma natureza. O que é da mesma natureza que ele não é outra coisa além dele mesmo. Mas, o que foi feito por ele não é o que é ele mesmo. Já que só ele é imutável, todos os outros bens tirados do nada são submetidos à mu- dança. Se eles existem, foi dele que receberam a existência, pois ele é onipotente e do nada ou do que não existe ele pode criar bens, dos mai- ores aos menores, celestes ou terrestres, espirituais ou físicos. Ele é também soberanamente justo. Eis por que o que ele tirou do nada, não pode se igualar ao que ele gerou de sua própria natureza. Assim então, todos os bens particulares, qualquer que seja seu grau na escala dos seres, tanto os maiores como os menores, só possu- em Deus como princípio. Por um lado, toda natureza, enquanto natureza, é sempre um bem. Desta forma, ela é, necessariamente, obra do Deus supremo e verdadei- ro, pois todos os bens, cuja excelência os aproxima do soberano bem ou Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem cuja simplicidade os afasta dele e os coloca no último lugar, todos têm infalivelmente como princípio o bem supremo. Daí concluo que todo espírito está submetido à mudança e todo corpo vem de Deus. Espírito e matéria; está aí toda a natureza criada. Portanto, toda natureza é necessariamente espírito ou corpo. Deus também é espírito, mas um espírito imutável. Todo espírito submetido à mudança não passa de uma natureza criada, embora supe- rior ao corpo. Por seu lado, o corpo não é um espírito, embora em sentido figu- rado chamemos o vento de espírito, por que ele nos é invisível propria- mente, embora seus efeitos nos sejam perfeitamente sensíveis. Capítulo II Como estes dois princípios bastam para refutar os maniqueístas. Conhecemos pessoas que, não podendo compreender que toda na- tureza, espírito ou corpo, é bom propriamente, por que elas veem o espí- rito vítima da iniquidade e o corpo, da mortalidade, não encontram ou- tra opinião a sustentar do que afirmar que Deus não é o autor do espírito mau e nem do corpo mortal. É a eles que nos dirigimos neste momento. Elas admitem que tudo o que é bom não tem outro princípio que não seja o Deus supremo e verdadeiro. Esta é uma verdade fora de qualquer discussão e eu declaro que se elas querem pesar suas conse- quências, só ela já basta para arrancá-las do erro. 2 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem Capítulo III Os bens gerais que encontramos nas coisas criadas. Nós cristãos católicos adoramos o Deus que é o princípio de todos os bens, grandes ou pequenos; princípio de toda medida, grande ou pe- quena; princípio de toda forma, grande ou pequena; princípio de toda ordem, grande ou pequena. Quanto mais as coisas criadas refletem a medida, a forma e a or- dem, mais elas são boas. Quanto menos elas brilham pela medida, a forma e a ordem, menos elas são boas. Sem falar de um grande número de outras características que de- correm mais ou menos diretamente destas, eu digo que a medida, a for- ma e a ordem são três bens gerais que encontramos em todas as coisas criadas, sejam espirituais ou físicas. Deus ultrapassa, portanto, infinitamente, toda criatura, quanto à medida, quanto à forma e quanto à ordem. Não se trata aqui de uma superioridade resultante da elevação espacial, mas de um poder inefável e divino, donde decorre necessariamente tudo o que é medida, forma e ordem. Onde estas três características estão em um alto grau, o bem aí es- tá na mesma proporção. Da mesma forma, o bem é medíocre onde elas estão em um grau fraco. Elas são nulas? O bem aí é igualmente nulo. 3 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem Da mesma forma, onde estas três características são grandes, as naturezas são grandes. Se elas são fracas, as naturezas são pequenas. Se elas inexistem absolutamente, a natureza é nula. Portanto, toda natureza é boa. Capítulo IV O mal é apenas a corrupção da medida, da beleza e da ordem. Antes de perguntar de onde vem o mal, é preciso primeiro pesqui- sar qual é sua natureza. Ora, o mal não é outra coisa além da corrupção ou da medida ou da forma ou da ordem natural. A natureza má é, portanto, aquela que é corrompida, pois toda na- tureza que não é corrompida é boa. Mesmo a natureza corrompida não deixa de ser boa, na medida em que é natureza. Mas ela é má na medida em que está corrompida. Capítulo V Uma coisa de ordem superior, embora corrompida, é melhor do que uma coisa de ordem inferior, embora não corrompida. Pode acontecer de uma natureza, colocada em uma ordem mais elevada quanto à medida e quanto à forma, se corrompa e permaneça, no entanto, superior a outra não corrompida, mas colocada em uma or- dem inferior quanto à medida e quanto à forma. 4 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem Assim, na avaliação humana, o ouro, mesmo corrompido, é me- lhor do que a prata não corrompida e a prata, mesmo corrompida, é me- lhor, por sua vez, do que o chumbo não corrompido. Da mesma forma, um poder racional, mesmo corrompido, conti- nua superior a toda substância privada de razão, mesmo não corrompi- da. Um espírito, mesmo corrompido, é superior a um corpo, mesmo não corrompido. De fato, toda natureza que, em virtude de sua superioridade sobre o corpo, é para ele um princípio de vida, é sempre superior a uma natu- reza que não tem vida por ela mesma. Suponhamos um espírito de vida por mais corrompido que ele seja, ele sempre pode dar a vida ao corpo e, nesta qualidade, estando corrompido, ele é superior ao corpo, mesmo estando em toda sua integridade. Capítulo VI A natureza incorruptível constitui o soberano bem. Se a corrupção destrói, nas coisas corruptíveis, tudo o que o que nelas constitui a medida, a forma e a ordem, ela destrói também, por isso mesmo, a própria natureza. Segue-se daí que toda natureza essencialmente incorruptível é, por isso mesmo, o soberano bem, ou seja, Deus. 5 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem Portanto, toda natureza submetida à corrupção não passa de um bem imperfeito e particular, pois a corrupção só pode atingi-la destruin- do ou diminuindo nela o que constitui sua bondade. Capítulo VII Para as almas racionais há uma corrupção voluntária e uma corrupção penal. O dom propiciado pelo Criador às criaturas mais superiores, ou seja, aos espíritos racionais, é de uma maneira tal que se elas quiserem elas podem se livrar da corrupção. De fato, se elas se conservam em uma perfeita dependência com relação ao Senhor, elas permanecem em comunicação com sua beleza incorruptível. Pelo contrário, se elas se revoltam contra Deus, é volunta- riamente que elas se dedicam à corrupção do pecado e em seguida so- frerão involuntariamente a corrupção como castigo. Deus é para nós um bem tão grande e tão generoso que, nos pren- dendo a ele, nenhum mal pode nos atingir. Da mesma forma, dentre as coisas criadas, a natureza racional é uma coisa tão excelente que ne- nhum bem pode torná-la feliz, a não ser Deus. Ao pecar, o ser humano sai da ordem e o castigo o faz voltar a ela. Mas, por que essa ordem não está conforme com sua natureza, nós a chamamos de punição. Pelo contrário, visto pelo lado de sua falta, esse 6 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem castigo lhe é perfeitamente apropriado. E é por isso que o chamamos de justiça. Capítulo VIII Do que resulta a beleza do universo. Fora do espírito racional, nenhuma das outras criaturas inferiores pode ser nem feliz e nem infeliz. No entanto, como a ordem e a forma tornam essas naturezas boas propriamente e como, nessa qualidade, foi de Deus somente que elas receberam a existência e a bondade, nós a- firmamos sem medo que essas naturezas de um grau inferior foram or- denadas de tal sorte que as mais fracas devem ceder às mais fortes, as mais frágeis às mais duráveis, as mais impotentes às mais potentes, as terrestres às celestes. A harmonia do conjunto resulta dessa dependência geral. Na ordem natural, as coisas aparecem e desaparecem para dar lu- gar à outras. Essa variedade é uma das principais características da be- leza. Dessa maneira, o que perece ou deixa de ser não prejudica em na- da a medida, a forma e a ordem do conjunto. Examine um discurso; cada sílaba, cada som nasce e desaparece e dessa sucessão bem harmoniosa resulta a beleza do discurso. 7 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem Capítulo IX Cada falta tem seu castigo determinado. Quanto a fixar a natureza e a gravidade do castigo devido ao erro, o ser humano não pode nada; só Deus é seu juiz. Quando Deus livra do castigo os pecadores arrependidos, isto é um efeito de sua bondade infi- nita, mas não há nenhuma injustiça de sua parte, quando ele golpeia o culpado com o castigo que ele merece, pois a natureza da ordem exige que o pecador sofra mais em seu suplício do que goze impunemente em seu pecado. Pois bem! Mesmo oprimida em seu castigo, essa natureza ainda apresenta medida, forma e ordem. Ela ainda é, portanto, um bem, pro- priamente. Ela só deixaria de ser um bem deixando de ser uma natureza, ou seja, perdendo inteiramente a medida, a forma e a ordem. Capítulo X O nada, princípio e causa da corrupção. Todas as naturezas corruptíveis só são naturezas por que recebe- ram a existência de Deus. Por outro lado, elas não seriam corruptíveis se tivessem sido ge- radas da substância divina, pois então, elas seriam o que Deus propria- mente é. Por conseguinte, seja qual for a medida, a forma ou a ordem que elas desfrutem, elas só desfrutam por que foram criadas por Deus e, se elas são corruptíveis, é unicamente por que foram tiradas do nada. 8 Santo Agostinho – 399 – A natureza do bem Não é então um sacrilégio audaz igualar o nada a Deus, compa- rando o que nasceu de Deus com o que saiu do nada? Capítulo XI Como uma coisa pode prejudicar e a quem. Nada pode prejudicar a Deus, seja de que maneira for. Quanto às criaturas, nada deve lhes prejudicar injustamente. De fato, se houver quem prejudique injustamente, a vontade injus- ta que o dirige lhe será imputada como um crime. Por outro lado, o poder que permite prejudicar é obtido de Deus mesmo e Deus sabe quais os castigos que merece aquele a quem ele permite que o mal aconteça, mesmo que este não o saiba. Capítulo XII Todos os bens procedem de Deus. Se aqueles que supõem a existência de uma natureza que Deus não criou, quisessem refletir sobre essas considerações tão simples e tão evidentes, eles não seriam mais tentados a recorrer a essas numerosas blasfêmias por meio das quais eles pretendem conciliar o soberano mal com bens de todos os tipos e encontrar em Deus males numerosos. Como eu disse, bastaria, para conduzi-los à verdade que a evidên- cia os atinge apesar deles, que eles desejassem não perder de vista que tudo o que é bom só pode vir de Deus. Sustentar que os grandes bens 9

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