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Revista Maracanan Dossiê O “caso Abel Parente” PDF

19 Pages·2015·1.19 MB·Portuguese
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Preview Revista Maracanan Dossiê O “caso Abel Parente”

Revista Maracanan Edição: n.13, Dezembro 2015, p. 127-145 ISSN-e: 2359-0092 DOI: http://dx.doi.org/10.12957/revmar.2015.20127 Dossiê O “caso Abel Parente”, os homens de letras e a disseminação do saber científico nos primórdios da República1 The “Abel Parente affair”, the literary community and the disseminantion of scientific knowledge in the early Republic Leonardo Mendes Universidade do Estado do Rio de Janeiro [email protected] Renata Ferreira Vieira Universidade do Estado do Rio de Janeiro [email protected] Resumo: Este estudo revisita e expande a história de uma polêmica científica que agitou a sociedade brasileira nas décadas de 1890 e 1900: o “caso Abel Parente”. A polêmica resultou em investigações policiais e dois processos contra o médico italiano Abel Parente (1851-1923) que, a partir de 1893, anunciou seu método de contracepção nos jornais do Rio de Janeiro. O apoio dos homens de letras foi crucial para a vitória do médico nos dois processos. Compreendido pelos setores conservadores da classe médica e da sociedade como uma forma de aborto, o tratamento desenvolvido por Abel Parente gerou intenso debate acerca da contracepção e da interrupção da gravidez nos primórdios da República, constituindo-se um capítulo da história da ciência no Brasil. Palavras-chave: História da ciência; Aborto; República; História da Medicina no Brasil. Abstract: This study revisits and expands the history of a scientific controversy that caused an upheaval in Brazil in the decades of 1890 and 1900: the "Abel Parente affair”. The controversy resulted in police investigations and two lawsuits against the Italian doctor Abel Parente (1851-1923), who starting in 1893 announced his contraception method in Rio de Janeiro newspapers. The literary community’s support was crucial for the physician’s victory in both indictments. Understood by the conservative sectors of the medical profession and society as a form of abortion, the treatment developed by Abel Parente gave rise to an intense debate about contraception and the termination of pregnancy in the early days of the Republic, forming a chapter in the history of science in Brazil. Keywords: History of Science; Abortion; Republic; History of Medicine-Brazil. Artigo recebido para publicação em: Julho de 2015 Artigo aprovado para publicação em: Dezembro de 2015 1 Esta pesquisa contou com o apoio financeiro da FAPERJ. Leonardo Mendes Renata Ferreira Vieira Introdução Em janeiro de 1893, atendendo ao pedido do médico e parteiro italiano Abel Parente (1851-1923), os jornais do Rio de Janeiro publicaram anúncios sobre um novo método, por ele desenvolvido, capaz de prevenir para sempre a concepção. Prescrita em casos de gravidez problemática ou indesejada, a esterilização feminina definitiva consistia numa técnica de cauterização da mucosa uterina, associada a um tratamento de injeções esterilizadoras. O método não era detalhado para o público, havia dúvidas se o efeito podia ser definitivo ou apenas temporário e, além disso, não era um procedimento barato. Na virada do século, um tratamento de esterilização com Abel Parente durava vários meses e podia custar até dois contos de réis, numa época em que o salário médio mensal do funcionalismo público era quatro ou cinco vezes menor.2 Embora não fosse um procedimento para interromper a gravidez, a medida contraceptiva foi compreendida por setores conservadores do meio científico e da sociedade como uma forma de castração, um encobrimento da prática do aborto e até de curandeirismo. A novidade agitou a imprensa e a opinião pública. Os jornais e os homens de letras se posicionaram contra ou a favor de Abel Parente. O debate se estendeu de janeiro de 1893 até o final da primeira década do século XX. Era um assunto explosivo que estremecia um dos pilares da sociedade patriarcal: o controle sobre o corpo da mulher. Partimos dos estudos pioneiros de José Leopoldo Ferreira Antunes e Fabíola Rohden3 sobre o “caso Abel Parente” e expandimos com nova pesquisa de fontes, dados e pontos de vista extraídos dos periódicos da Hemeroteca Digital Brasileira (FBN), assim como da ficção do período. Nosso objetivo é contar a história da polêmica científica com base nos posicionamentos dos homens de letras e especular sobre o impacto que o debate causou – e as ansiedades que encobria – na sociedade brasileira das duas primeiras décadas republicanas. O médico Abel Parente Formado em medicina, em 1875, pela Universidade de Nápoles, na Itália, Abel Parente imigrou para o Brasil no ano seguinte, aos 25 anos. Aqui se submeteu aos exames da Academia Nacional de Medicina para clinicar obstetrícia e ginecologia. Aprovado com louvor, dedicou-se às “moléstias das senhoras”, denominação dada, na época, à clínica ginecológica.4 As fontes sugerem que ele tinha boa clientela e era reconhecido como um bom profissional. Nas estatísticas da Imperial Farmácia Diniz sobre os médicos cujas receitas haviam sido aviadas no estabelecimento nunca faltava o nome de Abel Parente.5 Em maio de 1882, a paciente Paulina Maria Farani publicou na imprensa uma carta de agradecimento ao ginecologista pela cura de uma endometrite cervical crônica, conhecida por “catarro uterino”.6 Como ela, ao longo dos anos, 2 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 1º/12/1900. Quando morreu, o escritor cearense Adolfo Caminha (1867-1897) recebia em torno de 300 mil réis mensais como funcionário do Tesouro Nacional, no Rio. Ver: BEZERRA, Carlos Eduardo. Adolfo Caminha: um polígrafo na literatura brasileira do século XIX (1885-1897). São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. p. 46. 3 ANTUNES, José Leopoldo Ferreira. Medicina, Leis e Moral: pensamento médico e comportamento no Brasil (1870- 1930). São Paulo: Editora da UNESP, 1998; ROHDEN, Fabíola. Uma ciência da diferença: sexo, contracepção e natalidade na medicina da mulher. Tese (Doutorado em Antropologia Social). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2000. 4 O Álbum, n. 25, Rio de Janeiro, jun. 1893. p. 193. 5 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 1º/08/1890. p. 2. 6 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 21/05/1882. p. 2. 128 Revista Maracanan, Rio de Janeiro O “caso Abel Parente”, os homens de letras e a disseminação do saber científico nos primórdios da República outras pacientes usaram as páginas dos jornais para reconhecer o talento do médico italiano no tratamento e na cura das “moléstias das senhoras”. Em 1893, quando foi investigado pela primeira vez, Abel Parente vinha clinicando com sucesso no Rio de Janeiro havia mais de quinze anos. Àquela altura já praticara mais de quinhentas operações ginecológicas e obstétricas bem-sucedidas.7 Aos sábados dava consulta gratuita aos necessitados e fazia sem cobrar “qualquer operação ginecológica em mulheres pobres”.8 Especializado no tratamento de “moléstias internas, uterinas e sifilíticas”, Abel Parente foi pioneiro no Brasil ao usar o speculum, instrumento utilizado para dilatar a vagina em exames ginecológicos.9 O médico enriqueceu no Rio de Janeiro e tornou- se proprietário de vários imóveis, incluindo, em 1898, o palacete – que Pedro I mandara construir para a marquesa de Santos – na rua Pedro Ivo, nº 147, em São Cristóvão, onde hoje funciona o Museu do Primeiro Reinado. Ali Abel Parente instalou uma bem-sucedida “clínica de senhoras”.10 Além do atendimento às pacientes, Abel Parente publicou vários artigos sobre a saúde da mulher, entre eles, “Diagnóstico clínico diferencial entre cancro uterino e a metrite crônica”, na Brasil Médico, revista semanal da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, e três dissertações nos Anais do 2º Congresso Brasileiro de Medicina (1889): “A ergotina no puerpério”, “Indicações e contraindicações da histerotomia nos casos de tumor fibroso do útero” e “As ulcerações do colo do útero, sua frequência no Brasil, causas que para isto concorrem, tratamento curativo e profilático”.11 Sua contribuição de maior relevância, entretanto, foi a pesquisa para prevenção da concepção. Dessa investigação resultou o procedimento que gerou a polêmica em torno do aborto e de métodos contraceptivos nos primórdios da República. Figura 1 O médico italiano Abel Parente aos 42 anos. Fonte: O Álbum, jun. 1893, ano 1, n. 25. 7 O País, Rio de Janeiro, 05/02/1893. p. 3. 8 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 25/01/1890. p. 2. 9 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 24/09/1882. p. 2. 10 O Jornal, Rio de Janeiro, 24/07/1920. p. 1. 11 O Álbum, n. 25, Rio de Janeiro, jun. 1893. p. 194. n.13, Dezembro 2015, p. 127-145 129 Leonardo Mendes Renata Ferreira Vieira A polêmica e o primeiro processo A fagulha da polêmica foi a decisão de Abel Parente de divulgar sua descoberta nos anúncios dos jornais em vez de publicá-la nos anais científicos. Tal medida ampliava o público atingido, incluindo as mulheres e os milhares de leitores de jornal, que tomavam conhecimento de um método contraceptivo sem o aval da comunidade científica. A iniciativa escandalizou a classe médica. Liderado pelo clínico Públio Constâncio de Mello (1855-1904), um grupo de médicos pediu abertura de sindicância contra Abel Parente, acusando-o de charlatanismo, de provocar lesões corporais e por atentado ao pudor. Públio de Mello era formado pela Faculdade de Medicina da Bahia (turma de 1882), membro da Academia Nacional de Medicina (na qual ocupava cargos de direção) e médico da Hospedaria de Imigrantes da Ilha das Flores.12 “Especialista em moléstias de crianças”, o principal acusador de Abel Parente era um médico reconhecido, com atuação destacada na Sociedade de Higiene do Brasil, ligado às autoridades do governo republicano e dotado de prestígio bastante para associar seu nome a medicamentos vendidos nas farmácias da cidade, como a “Água Inglesa de Granado”, indicada para tratamento da malária.13 Públio de Mello discursou contra o médico italiano na Sociedade de Higiene do Brasil, em janeiro de 1893, e publicou a memória O charlatanismo: protesto contra a esterilidade da mulher pelo processo secreto do Dr. Abel Parente,14 na qual alertava para o “perigo” dos métodos anticoncepcionais. Sem medo de engravidar, a mulher teria liberdade para ter vida sexual autônoma, desviando-se do caminho “natural” da família para a senda da “prostituição clandestina”.15 No imaginário da época, esta era a mais perigosa das prostituições, pois era exercida no seio das famílias por mulheres que se passavam por costureiras, floristas ou parteiras.16 De um ponto de vista mais abrangente, o tratamento de Abel Parente colocava em risco o próprio funcionamento da sociedade, influenciando “no decréscimo da taxa de natalidade”.17 O argumento da diminuição da população era persuasivo numa sociedade que precisava importar mão de obra para a lavoura e a indústria, como explicava um editorial do Cidade do Rio: “Enquanto gastamos dinheiro para atrair a gente estrangeira, o médico acaba com a gente indígena”.18 Em outro violento editorial de primeira página, o jornal resumiu: “o médico italiano prejudica os interesses do país, ofende a moral, facilita a prática de crimes, atenta contra a lei e desonra nossa civilização”.19 Além das questões morais e sociais, havia uma importante crítica científica. Para Públio de Mello, o tratamento de Abel Parente não era seguro. Ele questionava as bases científicas das prescrições e duvidava da eficácia do tratamento. Na avaliação do clínico, a curetagem uterina podia mutilar o órgão reprodutor da mulher e provocar o aborto. Mas não se podia certificar o que Abel Parente fazia na realidade, já que ele reivindicava a propriedade intelectual do invento e só tornaria públicos os detalhes se o governo da República o ressarcisse pelo trabalho de pesquisa.20 O mistério em torno do procedimento permitia a acusação de charlatanismo e curandeirismo, pois o médico “vendia remédios ocultos”, incorrendo em crime 12 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 27/09/1894. p. 3. 13 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 24/07/1892. p. 7. 14 ANTUNES, José Leopoldo Ferreira. Crimes, sexo, morte. Avatares da medicina no Brasil. Tese (Doutorado em Sociologia). Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. p. 215. 15 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 17/02/1893. 16 Ver: ENGEL, Magali. Meretrizes e doutores: saber médico e prostituição na cidade do Rio de Janeiro, 1849-1890. São Paulo: Brasiliense, 1989. A figura da prostituta servia como “contraideal necessário para dar limites à liberdade feminina”. Ver: ROHDEN, Fabíola. Op. cit., 2000. p. 191. 17 Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 05/02/1893. p. 1. 18 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 12/02/1893. p. 1. 19 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 08/02/1893. p. 1. 20 O país, Rio de Janeiro, 05/02/1893. p. 2. 130 Revista Maracanan, Rio de Janeiro O “caso Abel Parente”, os homens de letras e a disseminação do saber científico nos primórdios da República contra a saúde pública, com pena de prisão e multa.21 No Código Penal de 1890, o aborto, bem ou malsucedido, era crime passível de pena de dois a seis anos de prisão. Se fosse provocado por um médico, a pena podia chegar a 24 anos de prisão, com privação do direito de exercer a medicina.22 Do lado da acusação ficaram, na capital federal, o Jornal do Brasil, o conservador Jornal do Comércio e o importante jornal Cidade do Rio, do influente jornalista negro José do Patrocínio (1853-1905), que, em fevereiro de 1893, publicou na íntegra o protesto de Públio de Mello na Sociedade de Higiene do Brasil. Nos estados, a Gazeta Médica da Bahia, o Correio Paulistano e o Órgão Oficial dos Poderes do Estado de Minas Gerais também se posicionaram a favor da apuração das denúncias e da punição dos culpados. O Jornal do Brasil e o Cidade do Rio capitanearam uma campanha contra Abel Parente. Com títulos dramáticos de “O bloqueio da vida”, os editoriais denunciavam a ilegalidade dos “reclames do ilustre médico”, que abriam a porta para “abusos e escândalos, o crime e a imoralidade, previstos no código penal”.23 Empenhados em insuflar a ira popular, alardeavam que o tratamento do ginecologista “prometia dar cabo da humanidade por meio de uma esterilização definitiva sem comprovação científica”.24 O Jornal do Brasil, de inclinação monarquista, publicava notas sem assinaturas, denunciando Abel Parente. O articulista E. P. usou pelo menos cinco vezes sua coluna diária na primeira página, nos meses de fevereiro e março de 1893, para manifestar seu repúdio ao médico. No auge da campanha de difamação, chegou a pedir a deportação de Abel Parente por ser estrangeiro. A promotoria pública foi acionada. O primeiro promotor, o eminente jurista Francisco José Viveiros de Castro (1862-1906),25 recebeu a petição e abriu inquérito em 9 de fevereiro de 1893, denominando-o de “Caso Abel Parente”.26 O promotor requereu abertura de uma investigação policial e tratou de ouvir especialistas. As testemunhas de acusação foram recrutadas entre membros da Sociedade de Medicina e Cirurgia e incluía os médicos Érico Coelho e Augusto Brandão, lentes de medicina legal e ginecológica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.27 Um dos integrantes da comissão, o médico Caetano Werneck, manifestou seu repúdio a qualquer medida empregada “antes, durante ou depois” do ato sexual com o fim de impedir a gravidez. Para ele, ser mãe era a “principal prerrogativa” da mulher. As práticas médicas sob investigação permitiam à mulher abdicar desse privilégio “para transformar-se em simples máquina de prazer”.28 Ao desvincular o sexo da procriação, o tratamento de Abel Parente era atentatório ao pudor. Como prova de charlatanismo e de prática pseudocientífica, a acusação apresentou casos malsucedidos da clínica de Abel Parente. O médico Carolino de Almeida alegou conhecer uma paciente que 21 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 06/02/1893. p. 1. 22 “É considerado delito praticar o espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar de talismãs e cartomancias, para despertar sentimentos de ódio ou amor, inculcar curas de moléstias curáveis ou incuráveis, enfim, para fascinar e subjugar a credulidade pública”. Disponível em: http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=66049. Acesso em: 20/01/2015. 23 Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 05/02/1893. p. 1. 24 Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 05/02/1893. p. 1. 25 Viveiros de Castro foi o maior especialista em crimes sexuais do Brasil no século XIX. Valendo-se do conhecimento científico da época, ele foi o principal introdutor de um saber médico-jurídico sobre os delitos sexuais no alvorecer da República. Ver: MARTINS JUNIOR, Carlos. Sob o signo de Otelo: Francisco José Viveiros de Castro e as "contradições" na jurisprudência sobre crimes passionais. Revista de História, n. 135, jul./dez. 1996. p. 61-78. No ano seguinte à polêmica do “caso Abel Parente”, o jurista publicou sua obra mais importante: Atentados ao pudor: estudos sobre as aberrações do instinto sexual (1894), na qual descreveu, com farta pesquisa histórica, casos considerados então como “aberrações” sexuais, tais como o sadismo, a pederastia, o exibicionismo, o incesto, a necrofilia, o fetichismo, a zoofilia e até a “lubricidade senil”. Ver: CASTRO, Francisco José Viveiros de. Atentados ao pudor: estudos sobre as aberrações do instinto sexual. Rio de Janeiro: Livraria Editora Freitas Bastos, 1943. 26 O País, Rio de Janeiro, 10/02/1893. p. 1. 27 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 06/02/1893. p. 1. 28 Apud ROHDEN, Fabíola. Op. cit., 2000. p. 198. n.13, Dezembro 2015, p. 127-145 131 Leonardo Mendes Renata Ferreira Vieira sofreu hemorragia por seis horas, com síncopes e vertigens, após ter sido operada pelo ginecologista.29 O médico Augusto Brandão declarou conhecer uma senhora que, apesar de esterilizada por Abel Parente, concebeu de uma vez dois filhos.30 A principal prova material da acusação foi produzida pela Sociedade de Higiene do Brasil quando foram apresentados dois fetos de quatro meses com queimaduras pelo emprego de ácido fênico, que Abel Parente supostamente injetava nas pacientes.31 Viveiros de Castro pediu um exame médico-legal das provas, que foi realizado pelos médicos Eduardo Chapot Prévost (1864-1907), professor catedrático de Histologia da Faculdade Nacional de Medicina, e Augustinho José de Souza Lima (1842-1921), professor catedrático de Medicina Legal e Toxicologia da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. A autoridade policial indicou o médico Francisco Fajardo para participar do exame. Os apoiadores O principal apoiador de Abel Parente foi João Carlos de Medeiros Pardal Mallet (1864-1894), advogado e jornalista. Natural do Rio Grande do Sul e bacharel pela Faculdade de Direito do Recife, Pardal Mallet foi um dos escritores mais promissores de sua geração. Ele se destacou na imprensa a partir de meados da década de 1880, quando batalhou pela abolição e pela república em vários periódicos, desde os grandes jornais, como a Gazeta de Notícias e o Cidade do Rio, até folhas efêmeras, criadas e dirigidas por ele, como A Rua, O Meio e, já no período republicano, o radical O Combate.32 No ano seguinte ao “caso Abel Parente”, Pardal Mallet publicaria o panfleto Pelo divórcio,33 em que advogava pela legalização do divórcio como medida de libertação feminina. A morte prematura por tuberculose, em 1894, colaborou para o esquecimento de seu nome, mas, no início da década de 1890, Pardal Mallet era um escritor popular e influente, defensor de causas libertárias, conhecido por sua inteligência e disposição para a briga, com acesso aos escritores dominantes e às redações dos principais jornais da cidade. Pardal Mallet colocou seu prestígio e sua influência a serviço de Abel Parente. Não só aceitou defendê-lo nos tribunais, como escreveu e publicou, em fevereiro e março de 1893, uma série de sete artigos em O País e no Cidade do Rio com o título de “A questão Abel Parente”, enumerando os principais argumentos da defesa. O primeiro e mais importante argumento era negar que o médico fosse um abortador. Deixando claro que sua posição era a mais avançada, Pardal Mallet garimpou definições de aborto na literatura científica contemporânea e amparando-se no prestígio de Alexandre Lacassagne (1843– 1924) e Auguste Ambroise Tardieu (1818-1879), demonstrou que enquanto o aborto era a “expulsão prematura, violentamente provocada, do produto da concepção”, o método de Abel Parente, ao contrário, impedia a concepção: O aborto provocado é um ataque contra feto e o que Dr. Abel Parente anuncia e pratica é um processo que impede a formação do feto. Enorme é, por conseguinte, a diferença que vai entre um caso e outro. Ela não permite confusões. E estas não se farão apesar de todo o esforço que em tal sentido procurem envidar.34 29 O País, Rio de Janeiro, 05/02/1893. p. 1. 30 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 24/01/1893. p. 1. 31 Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 16/01/1893. p. 1. 32 Ver SILVA, Ana Carolina Feracin da. Entre a pena e a espada: literatos e jacobinos nos primeiros anos da República (1889-1895). Dissertação de Mestrado em História. Unicamp, Campinas, 2001. 33 MALLET, João Carlos de Medeiros Pardal. Pelo divórcio. Rio de Janeiro: Fauchon & Cia. Livreiros-Editores, 1894. 34 O País, Rio de Janeiro, 28/02/1893. p. 1. 132 Revista Maracanan, Rio de Janeiro O “caso Abel Parente”, os homens de letras e a disseminação do saber científico nos primórdios da República Além disso, Pardal Mallet observou que, segundo o psiquiatra forense Henri Legrand du Saulle (1830–1886), a configuração do crime de aborto dependia da definição do início da vida. Embora o pensamento científico dominante reconhecesse o feto como indivíduo somente após a 12ª semana de vida intrauterina, para o Código Penal de 1890 as fases primitivas do embrião não impediam a aplicação da penalidade. Mesmo assim, argumentava Pardal Mallet, se houve algum aborto na clínica de Abel Parente, tratou-se do chamado “aborto obstétrico” ou “aborto legal”, um procedimento que não era incomum, previsto no artigo 302 do Código Penal, que garantia a legalidade da interrupção da gravidez para evitar a morte da gestante.35 Para o advogado, Abel Parente estava sendo perseguido por colegas invejosos de seu talento e sucesso. Aos que acusavam-no de curandeirismo, pedia que mostrassem onde estavam os “preparados secretos” do médico, lembrando que cabia à acusação o ônus da prova.36 Desse ponto de vista, o caso carecia de base factual e científica. Por isso os detratores do médico colocavam o debate quase que exclusivamente no terreno movediço da moral. Mas a moral, prescrevia Pardal Mallet, não podia interromper o avanço da ciência. A defesa invertia o argumento da “prostituição clandestina” e mostrava como tal julgamento, a pretexto de moralidade, na verdade aviltava a mulher brasileira, “supondo-a capaz de prostituir-se a torto e a direito, sem mais nem menos, somente porque um facultativo descobriu um processo de esterilização”.37 Entre os grandes jornais, O País foi o que mais abertamente defendeu Abel Parente, reservando os melhores espaços da folha para dar destaque às vitórias e aos argumentos da defesa. E o médico também contava com a simpatia da Gazeta de Notícias, o mais influente jornal brasileiro do final do século XIX. 38 Desde a década de 1880, a Gazeta vinha publicando notas de agradecimento a Abel Parente pelos sucessos nos tratamentos de “moléstias das senhoras”. Por ocasião da abertura do inquérito, o jornal publicou uma nota de gratidão da baronesa de Guararema referente aos serviços clínicos prestados pelo médico. Como gesto de reconhecimento, a senhora presenteou-o com um luxuosíssimo tapete por ela bordado, num trabalho de cinco anos.39 Nesse contexto acolhedor, dias antes da instalação do inquérito, a Gazeta publicou uma declaração de Abel Parente em que ele respondia às acusações e reforçava os argumentos de seus apoiadores: Declaro ainda uma vez que não deve ser confundida a minha descoberta com os meios empregados para provocar o aborto, as fraudes conjugais, a castração, o uso de drogas e as teorias de Malthus, como podem testemunhar aqueles meus ilustres colegas que, não movidos por nenhum mesquinho motivo de inveja, compreendendo as brilhantes aplicações à clínica da minha descoberta me honram com sua confiança, dirigindo-me enfermos de sua clínica. Estes casos são: 1º Quando a mulher corre perigo de vida no parto, como nos casos de vício da bacia, que reclamam o aborto ou graves operações obstétricas. 2º Nos casos de moléstias genitais, que se opõem à gestação e ao parto, provocando repetidos abortos podendo causar a morte da doente, como nos casos de peri e parametrite e salpingite; 3º Em certos casos de vômitos incoercíveis que reclamam o aborto e quando a mulher é acometida de cólicas hepáticas com ictero; 4º Doenças do coração, do pulmão, que são agravadas ou podem ter êxito fatal pela gestação ou parto, como a tísica pulmonar, as lesões orgânicas do coração; 5º Nos casos de loucura provocada ou agravada pela gestação, parto, aborto ou aleitamento; 35 Ver: ROHDEN, Fabíola. A arte de enganar a natureza: contracepção, aborto e infanticídio no início do século XX. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003. 36 O País, Rio de Janeiro, 02/03/1893. p. 1. 37 O País, Rio de Janeiro, 02/03/1893. p. 1. 38 SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. São Paulo: Martins Fontes, 1983. 39 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 12/01/1893. p. 2. n.13, Dezembro 2015, p. 127-145 133 Leonardo Mendes Renata Ferreira Vieira 6º Tumores abdominais que impedem a gestação e o parto e reclamam graves operações obstétricas; 7º Sempre que se trata de evitar gerar uma prole à qual seria inevitável a transmissão hereditária de moléstias graves, tais como a sífilis, a demência, a epilepsia, o câncer, a tísica; 8º Sempre que pais idosos, nevropatas, alcoólicos, sifilíticos, caquéticos não queiram obter uma prole degenerada, raquítica e escrofulosa; 9º Enfim nos casos de anemia profunda e miséria. Dr. Abel Parente.40 Artur Azevedo (1855-1908) também cerrou fileiras com Abel Parente. No primeiro semestre de 1893, sua revista literária semanal O Álbum ia de vento em popa, com uma equipe de colaboradores do quilate de seu irmão Aluísio Azevedo (1857-1913), de Machado de Assis (1839-1908), do poeta Luiz Murat (1861-1929), do destacado crítico Valentim Magalhães (1859-1903) e de outros renomados homens de letras. Na seção “Crônica Fluminense”, de fevereiro de 1893, assinada por Artur, o “caso Abel Parente” era um dos assuntos comentados pelos personagens da história, um homem e sua colcha de inverno: Crônica Fluminense [...] – Homem não durmas ainda! Conta-me as novidades. Tu sabes que sou uma colcha alegre; dize-me... Tem havido muitas coisas engraçadas? – Há muito tempo não tínhamos quem nos fizesse rir. A vida fluminense arrastava-se monótona, com a lentidão e a melancolia do boi... Nem um fato cômico, nem uma chalaça inédita, nem uma nova invenção do Dr. Castro Lopes!41 – Deveras? – Já estávamos todos resignados a morrer de aborrecimento, como tu no fundo da tua gaveta, quando apareceu o Dr. Abel Parente com a sua famosa descoberta para impedir que as mulheres concebam... – [a colcha] Eu é que não concebo como a justiça consente... – Já lá vamos: o Dr. Viveiros de Castro, promotor público, acusa o homem, mas o Dr. Francisco de Castro, chefe da repartição sanitária, defende-o; entre os dois Castros, o Dr. Parente pode castrar à vontade!42 (Grifo nosso) Embora Artur Azevedo soubesse que o tratamento de Abel Parente não era uma forma de castração, o trocadilho da crônica ilustrava a confusão da população sobre o que o médico fazia com o corpo das mulheres. Esse trocadilho também destacava outro apoiador de Abel Parente: Francisco de Castro (1857- 1901), professor de Clínica Propedêutica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Na época, ele ocupava o cargo de diretor da Diretoria Sanitária da capital federal, instituição responsável pela vigilância dos exercícios da medicina e da farmácia. O médico era ligado aos homens de letras e já havia publicado um livro de versos, Harmonias errantes, com prefácio de Machado de Assis.43 No primeiro despacho sobre Abel Parente, solicitado por Viveiros de Castro, o diretor declarou que a publicação nos jornais dos anúncios do método preventivo do ginecologista não transgredia as normas legais do exercício da profissão. No decorrer do processo judicial, Francisco de Castro foi intimado a depor em favor de Abel Parente. Ele confirmou a diferença entre aborto e esterilização, garantindo que o tratamento do médico italiano não causava constrangimento ou prejuízo à saúde. Repetindo o argumento da defesa, tratava-se de impedir a gravidez “contraproducente”.44 40 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 20/01/1893. p. 2. 41 Antônio de Castro Lopes (1827-1901) foi um gramático de renome que apoiava o movimento “Abaixo o galicismo!” na língua portuguesa. Em 1886, ele foi caricaturado por Artur Azevedo na peça O carioca. Ver: BORTOLONZA, João. O poeta novilatino carioca Antônio de Castro Lopes. Hvmanitas, v. LI, 1999. p. 301-316. 42 O Álbum, n. 7, Rio de Janeiro, fev. 1893. p. 51. 43 CASTRO, Francisco de. Harmonias errantes. Rio de Janeiro: Rio de Janeiro: Typ. de Moreira, Maximino, 1878. 44 ROHDEN, Fabíola. Op. cit., 2000. p. 205. 134 Revista Maracanan, Rio de Janeiro O “caso Abel Parente”, os homens de letras e a disseminação do saber científico nos primórdios da República Machado de Assis Machado de Assis era amigo de Francisco de Castro que apoiava Abel Parente, mas o escritor assumiu um posicionamento neutro (ou ambíguo), deixando claro seu desgosto de que tal assunto fosse debatido em público. Em sua crônica dominical na Gazeta de Notícias, em fevereiro de 1893, o escritor imagina ter morrido e que, ao deparar-se com São Pedro, este lhe pede que explique por que “um grande número de almas” que partiram em direção ao Brasil, naqueles dias, haviam retornado “sem se poderem incorporar”. O cronista explica: – Há de ser obra de um médico italiano, um doutor... espera aí... creio que Abel, um doutor Abel, sim Abel... É um facultativo ilustre. Descobriu um processo para esterilizar as mulheres; afirma-se que nenhuma pode já conceber; estão prontas. – As pobres almas voltavam tristes e desconsoladas; não sabiam a que atribuir essa repulsa. Qual é o fim do processo esterilizador? – Político. Diminuir a população brasileira, à proporção que a italiana vai entrando; ideia de Crispi, aceita por Giolitti, confiada a Abel... – Crispi sempre foi tenebroso. – Não digo que não; mas, em suma há um fim político, e os fins políticos são sempre elevados... Panamá, que não tinha fim político... – Adeus, tu és muito falador. O céu é dos grandes silêncios contemplativos.45 Machado via o “caso Abel Parente” como uma questão de ordem pública. Ecoava uma preocupação mais abrangente com o futuro do país, semelhante ao editorial do Cidade do Rio, que apontava o contrassenso de se permitir a esterilização de mulheres brasileiras e ao mesmo tempo se admitir a necessidade de mão de obra importada. Como o cronista estava sonhando (ou delirando), ele podia imaginar uma conspiração entre Giovanni Giolitti (1842-1928), então primeiro-ministro italiano, e seu compatriota Abel Parente, inspirados ambos por Francesco Crispi (1818-1901), que fora proeminente no processo de unificação do estado italiano no século XIX. Quando foi primeiro-ministro, entre 1887 e 1891, Crispi supervisionou a emigração de trabalhadores italianos (para países como Brasil e Estados Unidos) como política de estado que visava criar uma identidade italiana e um nicho de negócios – como a “cozinha italiana” – no comércio transatlântico.46 Isso não parecia bom negócio para o Brasil, pensava Machado. Mas é importante notar a desqualificação desse posicionamento dentro da própria crônica, quando São Pedro se despede abruptamente e lhe pede que se cale. Mestre na arte de dizer sem dizer, Machado acreditava que a esterilização era uma questão de foro íntimo; devia ser reservada aos consultórios médicos e ficar longe dos tribunais. Mesmo assim, ele deixava claro que não confiava em Abel Parente, a quem chamou numa crônica, no mês seguinte, de “patrício de Maquiavel”, sugerindo abertamente ardil e dissimulação na prática do ginecologista.47 Machado chama o debate de “guerra civil”, dando a dimensão do impacto que causou. Ele aponta que o escândalo era bom negócio para Abel Parente, pois a resistência e o estardalhaço que se seguiram ao anúncio dos jornais só tornavam o invento cada vez mais conhecido e procurado. Três anos depois, numa crônica de janeiro de 1896, o cronista rememorou o caso e reafirmou seu posicionamento ambíguo. Machado escreve que tanto os defensores quanto os acusadores tinham razão – “era difícil adotar uma opinião sem ficar olhando para outra com saudade, como aquele irresoluto da comédia, que acaba escolhendo uma das duas moças a 45 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 12/02/1893. p. 1. 46 Ver: CHOATE, Mark. Emigrant Nation: the making of Italy abroad. Cambridge: Harvard University Press, 2008. 47 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 26/03/1893. p. 1. n.13, Dezembro 2015, p. 127-145 135 Leonardo Mendes Renata Ferreira Vieira quem namora, mas suspira consigo: ‘Creio que teria feito melhor escolhendo a outra’”.48 De qualquer maneira, incomodava-o que se desse a um médico (ou a qualquer pessoa) o poder de decidir quem devia e não devia nascer. O “caso Abel Parente” e o romance naturalista O aborto Naquele início de 1893, outro acontecimento escandalizou a sociedade e ampliou o debate sobre a interrupção da gravidez: a publicação do romance naturalista O aborto, do escritor macaense Alberto Figueiredo Pimentel.49 Com linguagem naturalista e científica, o romance narra a vida da jovem Maria Rodrigues, moça de 17 anos, natural de Rio Bonito e de posição social razoável, que, com os pais, muda-se para Niterói nos últimos anos da monarquia, em busca de uma vida melhor, longe do tédio e da mediocridade do interior. O romance descreve de forma direta e franca as consequências de uma gravidez indesejada e interrompida por um aborto. Com venda de 6 mil exemplares em alguns meses – número impressionante para a época –, a obra obteve sucesso imediato.50 Histórias e polêmicas sobre o sexo e a “clínica de senhoras” estavam na ordem do dia. Como a ação do romance se passa na década de 1880, a legislação em vigor é o Código Criminal do Império. O trecho que trata do crime do aborto aparece na Parte Terceira – “Dos crimes particulares”, Título II – “Dos crimes contra a segurança individual”, Capítulo I – “Dos crimes contra a segurança da Pessoa e Vida”, na seção II sobre o “Infanticídio”. Na redação do texto jurídico, o crime de aborto incluía o ato de fornecer, com conhecimento de causa, drogas, ou quaisquer meios para produzir o abortamento. “Se este crime for cometido por médico, boticário, cirurgião ou praticante de tais artes, penas dobradas”, explicava a lei imperial, para consternação de Mário, estudante de Farmácia, que, no romance, era o pai da criança indesejada. Ao se ver grávida, Maricota pede ajuda ao estudante e lhe pergunta sobre algum remédio que interrompesse a gravidez. Ciente de que estava cometendo um crime, Mário diz que havia alternativas, mas lhe pede segredo: – Tenho muitos [remédios], embora não haja realmente abortivos. A única coisa infalível é o puncionamento do óvulo, mas a isso não me atrevo: é uma operação arriscadíssima... – Mas um xarope qualquer, um remédio caseiro? – É o que vou ver... Olhe que é uma coisa grave o que vamos fazer. A lei pune os abortos provocados, no Artigo 200 do código criminal. Sabemos bem disso, porque, na Escola, muitas vezes caçoávamos uns com os outros. Escuso de te recomendar todo segredo. – E não há perigo? – Não, absolutamente nenhum. Deixa estar que arranjarei tudo da melhor forma possível. Em todo caso, acalma-te.51 Para provocar o aborto, o estudante recorre a uma beberagem chamada “cozimento de sabina”. O nome científico da planta da qual se extraía o xarope era Juniperus Sabina Linnaeus, da família das cupressáceas, espécie de arbusto semelhante aos ciprestes. Por sua propriedade emenagoga – a de 48 Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 26/01/1896. p. 1. 49 PIMENTEL. Alberto Figueiredo. O aborto. Rio de Janeiro: Livraria do Povo, 1893. 50 Ver: CATHARINA, Pedro Paulo Garcia Ferreira. De “O artigo 200” a “O aborto”: trajetória de um romance naturalista. Letras, v. 23, n. 47, jul./dez. 2013. p. 37-58; EL FAR, Alessandra. Páginas de sensação. Literatura popular e pornográfica no Rio de Janeiro (1870-1924). São Paulo: Cia. das Letras, 2004. 51 PIMENTEL, Alberto Figueiredo. O aborto. Rio de Janeiro: 7Letras, 2015. p. 129. 136 Revista Maracanan, Rio de Janeiro

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brasileira nas décadas de 1890 e 1900: o “caso Abel Parente”. do século, um tratamento de esterilização com Abel Parente durava vários meses e
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