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Racismo e cultura PDF

34 Pages·2021·1.675 MB·Portuguese
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Coleção textos essenCiais FRANTZ FANON RACISMO E CULTURA Editora Terra sem Amos Brasil, 2021 Coleção textos essenCiais Fonte: Racismo e cultura. In: Em Defesa da Revolução Africana. Arquivo Marxista da Internet. https://www.marxists.org/portugues © Editora Terra sem Amos © Frantz Fanon Autor Frantz Omar Fanon Edição Alexandre Wellington dos Santos Silva Revisão Francisco Raphael Cruz Maurício Licença Atribuição-CompartilhaIgual 3.0 Não Adaptada CC BY-SA 3.0 DaDos InternacIonaIs De catalogação na PublIcação (cIP) F214 Frantz Omar Fanon (1925-1961). Fanon, Frantz Omar. Racismo e cultura. Editora Terra sem Amos: Brasil, 2021. 32p. ISBN: 978-65-89500-02-5 1. Racismo 2. Cultura 3. Sociedade. I. Frantz Fanon. II. Título. CDD: 320.56 306 Índice para catálogo sistemático: 1. Racismo (320.56) 2. Cultura e instituições (306) RACISMO E CULTURA Texto da intervenção de Frantz Fanon no I.° Congresso dos Escritores e Artistas Negros em Paris, em Setembro de 1956. Publicado no número especial de Présence Africaine, de Junho-Novembro de 1956. A reflexão sobre o valor normativo de certas culturas, decretado unilateralmente, merece que lhe prestemos atenção. Um dos paradoxos que mais rapidamente encontramos é o efeito de rico- chete de definições egocentristas, sociocentristas. Em primeiro lugar, afirma-se a existência de grupos humanos sem cultura; depois, a existência de culturas hierarquizadas; por fim, a noção de relatividade cultural. Da negação global passa-se ao reconhecimen- to singular e específico. É precisamente esta histó- ria esquartejada e sangrenta que nos falta esboçar ao nível da antropologia cultural. Frantz Fanon | 5 Podemos dizer que existem certas constelações de instituições, vividas por homens determina- dos, no quadro de áreas geográficas precisas que num dado momento sofreram o assalto direto e brutal de esquemas culturais diferentes. O de- senvolvimento técnico, geralmente elevado, do grupo social assim aparecido autoriza-o a instalar uma dominação organizada. O empreendimento da desculturação apresenta-se como o negativo de um trabalho, mais gigantesco, de escravização econômica e mesmo biológica. A doutrina da hierarquia cultural não é, pois, mais do que uma modalidade da hierarquização sistematizada, prosseguida de maneira implacável. A moderna teoria da ausência de integração cortical dos povos coloniais é a sua vertente aná- tomo-fisiológica. O surgimento do racismo não é fundamentalmente determinante. O racismo não é um todo, mas o elemento mais visível, mais quotidiano, para dizermos tudo, em certos mo- mentos, mais grosseiro de uma estrutura dada. 6 | raCismo e Cultura Estudar as relações entre o racismo e a cultura é levantar a questão da sua ação recíproca. Se a cultura é o conjunto dos comportamentos mo- tores e mentais nascido do encontro do homem com a natureza e com o seu semelhante, devemos dizer que o racismo é sem sombra de dúvida um elemento cultural. Assim, há culturas com racis- mo e culturas sem racismo. Contudo, este elemento cultural preciso não se enquistou. O racismo não pôde esclerosar-se. Teve de se renovar, de se matizar, de mudar de fisionomia. Teve de sofrer a sorte do conjunto cultural que o informava. Como as Escrituras se revelaram insuficientes, o racismo vulgar, primitivo, simplista, pretendia encontrar no biológico a base material da doutri- na. Seria fastidioso lembrar os esforços empreen- didos nessa altura: forma comparada do crânio, quantidade e configuração dos sulcos do encéfa- lo, características das camadas celulares do córtex, dimensões das vértebras, aspecto microscópico da epiderme etc. Frantz Fanon | 7 O primitivismo intelectual e emocional apare- cia como uma consequência banal, um reconhe- cimento de existência. Tais afirmações, brutais e maciças, dão lugar a uma argumentação mais fina. Contudo, aqui e ali vêm ao de cima algumas ressurgências. É assim que a “labilidade emocional do Negro”, “a integração subcortical do Árabe”, “a culpabi- lidade quase genérica do Judeu”, são dados que se encontram em alguns escritores contemporâ- neos. Por exemplo, a monografia de J. Carothers, patrocinada pela OMS, exibe, a partir de “argu- mentos científicos”, uma lobotomia fisiológica do Negro de África. Estas posições sequelares tendem, no entan- to, a desparecer. Este racismo que se pretende racional, individual, determinado, genotípico e fenotípico, transforma-se em racismo cultural. O objeto do racismo já não é o homem particular, mas uma certa forma de existir. Os “valores oci- dentais” reúnem-se singularmente ao já célebre apelo à luta da “cruz contra o crescente”. 8 | raCismo e Cultura Sem dúvida, a equação morfológica não desa- pareceu completamente, mas os acontecimentos dos últimos trinta anos abalaram as convicções mais firmes, subverteram o tabuleiro de xadrez, reestruturaram um grande número de relações. A lembrança do nazismo, a miséria comum de homens diferentes, a escravização comum de grupos sociais importantes, o surgimento de “co- lônias europeias”, quer dizer, a instituição de um regime colonial em plena Europa, a tomada de consciência dos trabalhadores dos países coloniza- dores e racistas, a evolução das técnicas, tudo isto alterou profundamente o aspecto do problema. Temos de procurar, ao nível da cultura, as con- sequências deste racismo. O racismo, vimo-lo, não é mais do que um elemento de um conjunto mais vastso: a opressão sistematizada de um povo. Como se comporta um povo que oprime? Aqui, encontram-se constantes. Assiste-se à destruição dos valores culturais, das modalidades de existência. A linguagem, o vestuá- rio, as técnicas são desvalarizodos. Como dar conta Frantz Fanon | 9

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