PRISCILA MARIA LARANJO DE SOUSA PSICOLOGIA DO TESTEMUNHO: A CREDIBILIDADE DOS IDOSOS EM TRIBUNAL - UMA PERSPETIVA TEÓRICO-EPISTEMOLÓGICA Orientador: Professor Doutor Carlos Alberto Poiares Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Escola de Psicologia e Ciências da Vida Lisboa 2014 PRISCILA MARIA LARANJO DE SOUSA PSICOLOGIA DO TESTEMUNHO: A CREDIBILIDADE DOS IDOSOS EM TRIBUNAL - UMA PERSPETIVA TEÓRICO-EPISTEMOLÓGICA Dissertação apresentada para obtenção do Grau de Mestre em Psicologia Forense e da Exclusão Social conferido pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Orientador: Professor Doutor Carlos Alberto Poiares Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Escola de Psicologia e Ciências da Vida Lisboa 2014 Priscila Maria Laranjo de Sousa Resumo A presente dissertação teórico-epistemológica, elaborada através da análise da literatura sobre a problemática, tem como objetivo analisar a credibilidade do testemunho dos idosos em tribunal. Atualmente, o cenário da população mundial encontra-se em constante mutação, estando em crescente fase de envelhecimento, o que fomenta a probabilidade de, cada vez mais, aparecerem testemunhas idosas para prestar depoimentos na justiça. Como tal, são necessárias investigações que apurem a credibilidade dos mesmos, visto que o envelhecimento é uma fase em que ocorre uma panóplia de declínios a todos os níveis, especialmente, ao nível psicológico e cognitivo, onde se inserem os principais processos que atuam quando presenciamos um cenário de crime. Após a revisão da literatura, propomo-nos a analisar se o testemunho dos idosos em tribunal pode ser considerado credível, devido ao decréscimo no seu desempenho inerente à idade, bem como em razão de todas as fragilidades que a mesma acarreta. Palavras-chave: Psicologia do Testemunho; Credibilidade; Idosos; Envelhecimento; Défices. i Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa Abstract This theoretical-epistemological thesis elaborated by analyzing the literature on the problem, aims to analyze the credibility of the elderly witness in court. Currently, the scenario of the world population is constantly changing and being in ascending aging stage, which fosters the likelihood of increasingly appearing elderly witnesses to testify in court. As such, investigations are needed to find out the credibility of the same, since aging is a stage where a panoply of declines occur at all levels, especially the psychological and cognitive level, where are located the main processes when we witness a scene of crime. After reviewing the literature, we propose to examine if the testimony of the elderly in court may be considered credible, due to the decrease in performance inherent in age and because of all the weaknesses that it brings. Key Words: Testimony Psychology; Credibility; Elderly; Aging; Deficits. ii Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa Siglas ADN - Ácido desoxirribonucléico DSM-5 – Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, 5ª Edição EUA – Estados Unidos da América INE – Instituto Nacional de Estatística iii Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa Índice Resumo ............................................................................................................................ i Abstract ........................................................................................................................... ii Siglas .............................................................................................................................. iii Introdução ........................................................................................................................ 1 Parte A - Fundamentação Teórica Capítulo I - Psicologia do Testemunho: a matriz da Psicologia Forense 1. Interação comunicacional e descomunicacional entre a Psicologia e o Direito....8 2. Introdução à prova testemunhal e à testemunha .................................................13 3. Processos psicológicos básicos .......................................................................... 17 4. Credibilidade e fiabilidade ..................................................................................24 5. Sugestionabilidade ..............................................................................................26 6. Falso testemunho consciente e inconsciente ..................................................... 28 6.1 Mentira .......................................................................................... 30 6.2 Falsas memórias ............................................................................ 32 7. Influência dos fatores biopsicossociais no testemunho: uma perspetiva ........... 36 7.1 Variáveis a estimar ........................................................................ 37 7.1.1 Características da testemunha ............................. 38 7.1.2 Características do agressor .................................. 48 7.1.3 Características do acontecimento presenciado .....57 7.1.4 Características do depoimento ............................ 60 7.1.5 Características do intervalo de retenção ...............65 7.2 Variáveis do sistema .......................................................................71 Capítulo II - O envelhecimento: aspetos psicológicos 1. Introdução à temática do envelhecimento ........................................................ 84 2. Declínio intelectual ............................................................................................87 3. Perturbações mentais frequentes no envelhecimento ..................................... 101 3.1 Demências ................................................................................................ 101 3.2 Abuso de substâncias ................................................................................ 106 4. Interpretação do envelhecimento .................................................................... 108 4.1 Representações sociais .......................................................... 109 iv Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa 4.2 A perceção da credibilidade das testemunhas idosas pelos atores do sistema judicial: motivações ajurídicas do sentenciar ...... 111 Capítulo III –Legitimação e pertinência do estudo.......................................................119 Parte B - Análise da problemática ............................................................................... 134 Conclusão .................................................................................................................... 146 Referências Bibliográficas ...........................................................................................149 v Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa Índice de figuras Figura 1........................................................................................................................... 15 Figura 2 .......................................................................................................................... 29 Índice de quadros Quadro 1 ........................................................................................................................ 76 Quadro 2 ........................................................................................................................ 90 Quadro 3 ........................................................................................................................ 98 vi Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa Introdução Tal como advogaram Wells & Olson (2003), a Psicologia desempenha um papel de destaque na investigação e na profilaxia de condenações injustas, propondo métodos para o sistema de justiça minimizar os erros inerentes a qualquer memória e, consequentemente, a qualquer depoimento. Como tal, têm sido realizadas inúmeras investigações no sentido de atingir este fim. A crescente admissão da prova testemunhal no âmbito do tribunal tornou imprescindível a validação dos depoimentos de testemunhas, bem como uma inerente apreensão no modo de aquisição da prova. Os cenários em que as testemunhas ou as vítimas prestam depoimentos são acontecimentos especialmente complexos, tais como roubos, assaltos, homicídios, acidentes rodoviários, entre outros. Geralmente, estes acontecimentos ocorrem muito rapidamente, tornando difícil para os atores que presenciam a cena avaliarem o quadro completo. Se estiverem associados a violência, esta pode representar um impacto muito poderoso na memória da testemunha. Para a maioria dos sujeitos estas experiências são novidade, inesperadas, deveras assustadoras e emocionalmente negativas. As capacidades humanas são imensas, sendo que o sistema cognitivo permite à testemunha transformar as características do que é refletido em informação visual, assim como características de sons do culpado em informação auditiva. A testemunha sincroniza estas fontes de informações recebidas e incorpora-as no seu conhecimento de experiências passadas. Mais tarde, a testemunha está apta a utilizar esta base de conhecimento contínuo para trazer a informação já distante para o momento presente. Contudo, por muito impressionantes que estas habilidades sejam, não são perfeitas, pois a informação é esquecida e distorcida (Davies & Beech, 2012), tornando os acontecimentos testemunhados meras reconstruções idiossincráticas, elaboradas à medida das interpretações e perceções de cada um. No seguimento, os estudos no âmbito da memória do testemunho ocular têm colocado um foco negro sobre as testemunhas, cada vez mais percecionadas como limitadas na capacidade para codificar a informação que percecionam, pela interpretação dos acontecimentos baseada em conhecimentos prévios e por terem memórias maleáveis, em que informações enganosas após o acontecimento poderão ser incorporadas na ação original, distorcendo-a, devido à suscetibilidade a questões sugestivas ou enganosas. Ora, este quadro negativo ainda é mais acentuado quando se trata de uma testemunha com uma idade avançada. Embora sejamos todos suscetíveis a realizar erros mnésicos, a alterar as nossas recordações e à 1 Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida Priscila Maria Laranjo de Sousa criação de falsas memórias, é importante perceber quando é que os idosos são mais propensos a cometer erros acerca da origem das suas memórias, a incorporar-lhe informação errónea de outras fontes, ou a incluir informação lógica congruente com a situação presenciada (Aizpurua, Migueles & Garcia-Bajos, 2014), pois devido às consequências biopsicossociais do quadro de declínio, resultante do inevitável envelhecimento, fazem-no de modo inconsciente. Controlar e compreender os aspetos críticos supracitados é importante para a determinação da veracidade da informação, bem como para a credibilidade do testemunho dos gerontes, que irá ser descortinada ao longo da presente dissertação. Considerando os dados demográficos, em pleno século XXI, o cenário do envelhecimento da população mundial é notório, não só nas sociedades europeias, mas concomitantemente nos restantes países do mundo ocidental. Segundo as projeções demográficas do Instituto Nacional de Estatística –INE (2003), este fenómeno apresenta tendência a acentuar-se cada vez mais. Prevê-se que em 2020, cerca de 20 por cento da população da Europa tenha 65 anos de idade e mais. Em Portugal, a população portuguesa está a envelhecer diariamente e encontra-se mais ativa, com maior mobilidade e independência do que as gerações anteriores, usufruindo de uma maior esperança de vida. No ano 2000, assistia-se a um duplo envelhecimento da população em que existiu um aumento do número de idosos e uma diminuição do número de jovens, sendo que se prevê que, em 2050, o Índice de Envelhecimento poderá atingir os 395 anciãos por cada 100 jovens (INE, 2003). A diminuição da taxa de natalidade, abaixo do limiar para a continuação de rotatividade que providencia a substituição das gerações, o aumento da esperança média de vida, devido aos avanços da Medicina, bem como os saldos migratórios baixos, são fatores que estão na base desta problemática. Esta redefinição da pirâmide etária do país, e de todo o mundo, exige uma mudança premente no modo de olhar a terceira idade, bem como ao nível de medidas políticas e sociais que possibilitem o enfrentar desta presente e futura realidade, capacitando as sociedades ao nível económico e social, e no sentido da profilaxia, nomeadamente no âmbito da exclusão social, bem como em sede de justiça, de modo a que esta acompanhe o aumento da participação dos idosos na sociedade. De acordo com os “Censos Sénior”, realizados em 2012, pela Guarda Nacional Republicana - GNR, existem muitos idosos a viver em situações de solidão e isolamento, o que proporciona o aumento da criminalidade sobre esta população. A grande percentagem de população idosa nos países desenvolvidos e a sua crescente 2 Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Psicologia e Ciências da Vida
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