Volume 3, Número 1, jan/jun 2015. ISSN 2318-0129 PADRES NA MAÇONARIA DO PORTUGAL SETECENTISTA: Prisões e Delações no Santo Ofício—O caso de D. André de Moraes Sarmento Virgínia Maria Trindade Valadares O APRENDIZ COMO ELEMENTO DE ANÁLISE HISTÓRICA SOBRE A MAÇONARIA: Mudanças e Permanências Paulo Ferraz de Camargo Oliveira A TRADIÇÃO ROSACRUCIANA E SUAS ORDENS: Um Levantamento Histórico Kennyo Ismail LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE: Um Substrato Filosófico Rodrigo Peñaloza A MAÇONARIA PARA OS LEIGOS: Mistérios, Origens e Estrutura Marco Antônio L. G.Campillo MAÇONARIA E SIMBOLOGIA: Uma :o Análise do Preconceito Através da ã ç História e da Psicologia (review) a z ila Rodolfo A. Germano e R 2 “A primeira revista acadêmico-científica brasileira com foco no estudo da Maçonaria” Missão: Democratizar a produção acadêmico-científica sobre Maçonaria e seu acesso. Dados Catalográficos: ISSN 2318-0129 Janeiro a Junho de 2015 Volume 03. Número 01. Periodicidade: Semestral Conselho Editorial: Imagem da Capa: Gabriel Castelo Branco A 3a. Tortura de John Coustos. Kennyo Ismail Max Stabile Mendes Fonte: The Sufferings of John Coustos for Freemasonry and for Nihad Faissal Bassis his refusing to turn Roman Catholic, in the Inquisition at Lisbon; Where he was sentenc'd, during Four Years, to the Galley; and Conselho Científico: afterwards releas'd from thence by the gracious Interposition of his present Majesty King George II. London : Printed by W. Vide in website. Strahan, for the Author, 1746, p.66. Contatos: Trata-se de um dos tantos homens torturados por anos pela Editor-Chefe: Kennyo Ismail inquisição portuguesa pelo simples fato de ser maçom. Muitos desses, esquecidos pela história e, algumas vezes, pela própria [email protected] Maçonaria, terão uma faísca da memória e consideração que merecem por meio de artigo inédito publicado nesta edição de Suporte Técnico: Nihad Bassis Ciência & Maçonaria. [email protected] Portal - www.cienciaemaconaria.com.br Realização: NP3-CEAM-UnB - Núcleo de Estudos e Pesquisa em Políticas Públicas, Governo e Gestão do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares da Universidade de Brasília. Aviso: Os artigos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Revista Ciência & Maçonaria. Não é necessário solicitar prévia autorização para reproduzir parte do conteúdo publicado nesta revista, desde que sejam devidamente citados o autor e a fonte. 2 “A primeira revista acadêmico-científica brasileira com foco no estudo da Maçonaria” Sumário Palavra do Editor 5-6 PADRES NA MAÇONARIA DO PORTUGAL SETECENTISTA: Prisões e Delações no Santo Ofício— 7-19 O caso de D. André de Moraes Sarmento Virgínia Maria Trindade Valadares O APRENDIZ COMO ELEMENTO DE ANÁLISE HISTÓRICA SOBRE A MAÇONARIA: Mudanças e 21-27 Permanências Paulo Ferraz de Camargo Oliveira A TRADIÇÃO ROSACRUCIANA E SUAS ORDENS: Um Levantamento Histórico 29-37 Kennyo Ismail LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE: Um Substrato Filosófico 39-57 Rodrigo Peñaloza A MAÇONARIA PARA OS LEIGOS: Mistérios, Origens e Estrutura 59-68 Marco Antônio L. G.Campillo MAÇONARIA E SIMBOLOGIA: Uma Análise do Preconceito Através da História e da Psicologia 69-70 (resenha) Rodolfo A. Germano Sobre a Revista “Ciência & Maçonaria” 71-72 3 4 Volume 3 Número 1 jan/jun. 2015 Palavra do Editor Poderemos, enfim, ampliar os debates realiza- Prezados leitores, dos durante o I Congresso Brasileiro de Ciência e Ma- Como de costume, a revista Ciência & Maço- çonaria, ocorrido no segundo semestre de 2014, e naria – C&M, mais uma vez tem o prazer de informa- que contou com pesquisadores de importantes uni- los de sua mais nova conquista: sua indexação no im- versidades brasileiras, como USP, UECE, UFRJ, UERJ, portante InfoBase Index, no qual nossa revista alcan- UNIESP, UCB e FCS. çou o IBI Factor inicial de 2.4 (numa escala até 5), fa- Ainda, seguindo outro costume da C&M, faço tor esse superior a muitas revistas nacionais e que, aqui uma breve apresentação sobre o que vocês en- temos certeza, só tenderá a crescer com esta e as contrarão nas próximas páginas desta edição: próximas edições. A pesquisadora Virgínia Valadares nos presen- Isso é reflexo do nosso compromisso contínuo teia com um excelente artigo sobre maçons persegui- de qualidade, fazendo constar cada vez mais a C&M dos na inquisição portuguesa durante o Século XVIII. nos mais importantes diretórios e indexadores inter- Esse artigo serviu-nos de inspiração para a ilustração nacionais e nacionais, como: DOAJ, ROAD, Academic da capa desta edição. Journals Database, Latindex, Sumarios.org e Diado- rim. Na sequência, há o artigo de Paulo Ferraz de Camargo Oliveira, apresentando uma análise históri- Outro fato que não podemos nos furtar de ca da Maçonaria pela perspectiva do Aprendiz Ma- registrar e comemorar é o índice de acessos da C&M, çom, primeiro grau da Maçonaria. que totaliza, até o fechamento desta edição, mais de 70 mil leituras diretas! Agradecemos a cada um dos Você também terá a oportunidade de ler um leitores pelo interesse na produção acadêmico- artigo sobre outra tradição fraterna, a Rosacruciana, científica publicada na C&M e disponibilizada gratui- e suas diversas Ordens, as quais em muitos momen- tamente e sem restrições pelo formato eletrônico. tos cruzaram o caminho da Maçonaria ou, até mes- mo, foram confundidas com a mesma. Kennyo Ismail E mantendo nosso compromisso com a reali- apresenta um levantamento histórico, permitindo a zação de eventos acadêmicos relacionados à Maço- compreensão do surgimento dessas Ordens. naria, é com alegria que também informamos nossa intenção de realizar, via NP3-CEAM-UnB, ao qual nos- Contamos nesse número também com uma sa revista está vinculada, nos dias 07 a 09 de Setem- análise filosófica do Dr. Rodrigo Peñaloza sobre o le- bro de 2017, o I Congresso Internacional de Ciência e ma maçônico latino de Liberdade, Igualdade e Frater- Maçonaria. Essa antecipação de dois anos se faz ne- nidade. cessária pela magnitude que pretendemos garantir Há ainda um artigo de Marco Antônio L. ao evento, contando com acadêmicos de diversos G.Campillo, apresentando um resumo básico e bem países que apresentarão seus trabalhos nesse que referenciado quanto o famoso “mistério” da Maçona- será o primeiro evento acadêmico-científico voltado ria, as teorias acerca de sua origem e sua estrutura à Maçonaria de nível internacional a ser realizado no de funcionamento. Brasil. C&M | Brasília, Vol. 3, n.1, p. 5-6, jan/jun, 2015. 5 C&M - PALAVRA DO EDITOR Por fim, Rodolfo Germano novamente nos presenteia com uma excelente resenha, dessa vez do livro “Maçonaria e Simbologia: Uma Análise do Pre- conceito Através da História e da Psicologia”, do au- tor Marcel Henrique Rodrigues, que ressalta a impor- tância da simbologia para a sociedade em geral. E, seguindo um terceiro e último costume da C&M, registramos que os artigos publicados nesta edição não estão restritos a uma ciência apenas, apresentando abordagens relacionadas a História, Filosofia e Psicologia, por exemplo, e tendo em co- mum a Maçonaria e o Fraternalismo como campos de estudo. O que está em perfeita sintonia com o compromisso institucional da revista “Ciência & Ma- çonaria”, de publicar produção acadêmico-científica multidisciplinar de forma ampla e gratuita. Abusando dos trocadilhos, esse editorial posi- ciona claramente a C&M como uma revista “livre e de bons costumes”. Boa leitura a todos! Sincera e Fraternalmente, Kennyo Ismail Editor-Chefe C&M | Brasília, Vol. 3, n.1, p. 5-6, jan/jun, 2015. 6 Recebido em: 09/04/2015 Aprovado em: 21/05/2015 PADRES NA MAÇONARIA DO PORTUGAL SETECENTISTA: Prisões e Delações no Santo Ofício: O caso de D. André de Moraes Sarmento (PRIESTS IN MASONRY OF EIGHTEENTH CENTURY’S PORTUGAL: Prisons and denunciations in the Holy Office: The case of D. André de Moraes Sarmento) Virgínia Maria Trindade Valadares ¹ Resumo O meu objetivo neste artigo é analisar a participação e envolvimento dos padres na Maçonaria portuguesa dos finais do século XVIII. O fato de eclesiásticos participarem da Sociedade dos Pedreiros Livres, que era proibida pelo Estado e pela Igreja, provoca reação por parte do Santo Oficio, resultando em prisões e suplí- cios. Neste texto, tomando como base o processo inquisitorial de D. André, Cônego de Santo Agostinho, ana- liso a reação do clérigo diante o interrogatório do Santo Oficio. Palavras-chaves: Maçonaria; Santo Ofício; Padres; Perseguição. Abstract My goal in this article is to analyze the participation and involvement of priests in the Portuguese Free- masonry of the late eighteenth century. The fact ecclesiastical participate in the Free Masons Society, which was prohibited by the State and the Church, provokes reaction from the Holy Office, resulting in arrests and tortures. In this paper, based on the inquisitorial process of D. Andrew, St. Augustine Canon, I analyze the cleric's reaction to the interrogation of the Holy Office. Keywords Freemasonry; Inquisition; Priests; Pursuit. ¹ Virgínia Valadares tem Pós-Doutorado em História Moderna pela Universidade Nova de Lisboa; Doutorado em História da Expan- são e dos Descobrimentos Portugueses pela Universidade de Lisboa; Mestrado em História da Expansão e dos Descobrimentos Portugueses pela Universidade de Lisboa; Graduação em História pelo UNIBH - Centro Universitário de Belo Horizonte. É pesquisa- dora do Centro de História dAquém e dAlém-mar (CHAM), Universidade Nova de Lisboa, professora aposentada da UFMG-COLTEC e atualmente Professora Adjunta IV da PUC-MG. E-mail: [email protected] C&M | Brasília, Vol. 3, n.1, p. 7-19, jan/jun, 2015. 7 VALADARES, V. M. T. PADRES NA MAÇONARIA DO PORTUGAL SETECENTISTA As origens desta instituição podem ser encontra- 1. Introdução das na Idade Média, embora nesse período da História Este artigo que ora apresento é resultante de pes- assumisse contornos bem distintos dos da época moder- quisa realizada no Arquivo Nacional da Torre do Tombo2, na. A repressão aos movimentos heréticos foi, desde sem- localizado em Lisboa, Portugal. Tal investigação foi tema pre, uma preocupação que afligia os senhores laicos e do Pós-doutoramento feito na Universidade Nova de Lis- também os eclesiásticos, tanto é que os maçons ao serem boa, com acolhimento do Centro de História d’Aquém e d’ presos nunca sabiam a razão da sua prisão. Não obstante, Além Mar – CHAM, pertencente à mesma Universidade. O antes de serem trancafiados nas celas do Santo Oficio, Pós-doutoramento foi realizado no período entre 2008 a vasculhavam lhes a casa e recolhiam todo material que 2012 sendo este, financiado pela Fundação para Ciência e encontrassem. Nunca, porém lhes confessavam que a ra- Tecnologia (FCT), órgão de fomento da União Europeia em zão de estarem sendo detidos era por praticarem o crime Lisboa, Portugal. de adoção da doutrina dos Pedreiros Livres. Inicialmente, parece contraditório falar em padres Quando, no entanto, examinei os processos inqui- maçons, quando essa associação era proibida pela Igreja, sitoriais, alguns até com 150 páginas, percebi que em pri- em função dos seus membros serem acusados de praticar meiro lugar são condenados pela acusação do crime de heresia. Tal proibição ocorreu a partir de 27 de Abril de heresia e somente no final do depoimento é que os inqui- 1738, quando o papa Clemente XII proibiu aos católicos de sidores lhes diziam que praticavam a doutrina maçônica. participarem das lojas maçônicas, e em Portugal D. João V, Nesse artigo, analisarei o processo inquisitorial do Padre na mesma época, ameaçou punir gravemente quem fosse André, tendo como base o seu depoimento, durante o iniciado na Sociedade dos Pedreiros Livres. Apesar de tal período em que esteve nas garras dos inquisidores. proibição, e, de acordo com o nosso banco de dados, os eclesiásticos formavam o segundo maior grupo de segui- dores da maçonaria, no Portugal de finais dos setecentos. 2. André de Moraes Sarmento—Padre Arrebanhador Tal grupo era antecedido em número, apenas pelos milita- Natural de Vinhaes, freguesia da Junta Marinha de res. Quintela, e habitante da cidade de Lisboa, com aproxima- No entanto, é importante ressaltar que o Santo damente 30 anos de idade. Seu pai, Caetano de Morais Tribunal foi instalado em Portugal a pedido do rei D. João Sarmento, já falecido, vivia das suas fazendas, e era tam- III, via solicitação ao Vaticano, em 1533. O Papa, porém bém nascido na mesma freguesia da Marinha de Quintela. não deliberou de pronto a instalação do Santo Oficio em Sua mãe Isabel Teixeira, já defunta, era natural de Cesnan- terras lusitanas, demorando 14 anos para que o pedido do de, pertencente à Sintra. No que diz respeito aos seus Rei fosse atendido. Assim, após muita insistência da diplo- avós, os paternos se chamavam Ignácio de Morais Sar- macia real, a Inquisição se tornou realidade em terras por- mento e Marianna Rego Maria da Nóbrega, e os maternos tuguesas, com a emissão da bula papal em 16 de Julho de Antônio Fernandes e Domingas Teixeira. O avô, tal qual 1547. sua mãe, era nascido em Cesnande e a avó natural do Idral. O Tribunal do Santo Ofício era uma instituição eclesiástica de carácter "judicial", ávida por perseguir ju- Cristão batizado tinha como padrinho um tio, cha- deus e mouros, mas também os que adotavam a doutrina mado Antônio Teixeira e, como madrinha sua irmã Maria dos Pedreiros Livres, por considerá-los heréticos e liberti- Antónia. Foi crismado pelo Bispo de Miranda, D. Francisco nos. Prendiam-nos aos Estãos do Santo Oficio, de forma Aleixo. Ignora o nome do padrinho de crisma. Desde que secreta, objetivando inquiri-los para que se autodenunci- atingiu a adolescência nunca deixou de frequentar a Igre- assem heréticos da doutrina católica. Tal inquirição era ja, assistir a santa missa e cumprir todas as obrigações de detalhada e constante, diria mesmo que, representava um verdadeiro católico, e até fez-se sacerdote. Em Santa uma forma de tortura para que o reo falasse o que eles, Cruz de Coimbra, tornou-se Cônego Regular de Santo inquisidores desejavam ouvir, - daí o Santo Ofício ser tam- Agostinho.3 Depois que saiu de Coimbra foi para Mafra, bém conhecido como Inquisição. onde permaneceu por um período entre 8 a 9 anos. Estu- 2 Denominada a partir de agora como ANTT. 3 Apesar de parecer ambíguo, o documento relata que D. André era também Presbítero Secular do Hábito de São Pedro nos se- guintes termos: “Entrou Cônego Regular em Santa Cruz de Coimbra”; noutro momento nos autos de diligência e achados refere-se a ele como “D. Andre de Morais Sarmento Presbítero Secular do Hábito de São Pedro” (ANTT, 1791). C&M | Brasília, Vol. 3, n.1, p. 7-19, jan/jun, 2015. 8
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