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Os cursos seqüenciais: em boa hora PDF

2 Pages·2002·0.04 MB·Portuguese
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Os cursos seqüenciais: em boa hora (2002) Simon Schwartzman A Lei de Diretrizes e Bases foi sábia ao prever a possibilidade dos chamados “cursos seqüenciais”, de curta duração, abrindo espaço para milhares de pessoas que gostariam de continuar seus estudos, mas não querem ou não têm condições de seguir as carreiras superiores existentes, de quatro anos ou mais. Sem uma ampla rede de instituições de educação pós-secundária de curta duração, o Brasil é uma anomalia, não só em relação aos países mais desenvolvidos, mas inclusive em relação a nossos vizinhos, como a Argentina, o Chile ou o Peru, que abrem grandes espaços para a educação tecnológica ou “vocacional” de terceiro grau. Em um sistema de educação superior de massas, os cursos longos são a opção para um segmento dos estudantes, normalmente mais jovens, vindos de escolas secundárias de boa qualidade, e ainda fora do mercado de trabalho. No entanto, existem muitas outras pessoas querendo continuar ou retomar seus estudos – gente que trabalha, mais velha, com uma formação prévia mais limitada. Para estas, os cursos regulares representam uma maratona de longo prazo, custosa, e de resultados incertos. A consequência deste desencontro entre o que tantas pessoas querem ou podem e o que o ensino superior oferece é o desperdício e a frustração: no país como um todo, menos da metade dos que entram em alguma faculdade terminam seus cursos; no setor privado, a deserção se aproxima, em média, dos 70%. É tempo, dinheiro e esperanças perdidas de centenas de milhares de pessoas, que poderiam estar adquirindo conhecimentos relevantes, adequados a suas necessidades, e de resultados profissionais mais palpáveis. Não é fácil criar cursos curtos de boa qualidade. Na área tecnológica, eles exigem equipamentos, professores bem treinados, e vínculos fortes entre as instituições de ensino e o mercado de trabalho nos quais os estudantes já estão, ou pretendem ir depois. Nas áreas de formação geral, eles precisam atrair professores que muitas vezes ainda olham com preconceito estas formas “inferiores” de educação. Para os estudantes, é essencial que estes cursos não sejam vistos como uma alternativa mais pobre, um prêmio de consolação e um beco sem saída para quem não consegue entrar nas carreiras de mais prestígio e duração. Para que isto ocorra, os créditos obtidos nestes cursos devem poder valer para quem pretenda continuar estudando, se for seu interesse. Quando funcionam bem, a outra vantagem destes cursos é liberdade que existe de oferecer programas inovadores, e adaptados às condições e interesses de cada um. As divisões entre departamentos, carreiras e cursos que existem hoje nas universidades tradicionais se tornaram, em muitos casos, obsoletas, e é bom poder experimentar com novos formatos e conteúdos, sem a camisa de força das tradições profissionais e disciplinares de décadas atrás. Mas quem garante que estes cursos são ou serão de qualidade? Ninguém garante, da mesma forma que o Ministério da Educação, apesar dos esforços, não consegue garantir que os cursos regulares sejam realmente bons. No pior dos casos, é melhor fazer um curso ruim de dois anos do que um de quatro. Mas existe hoje um mercado educacional fortemente competitivo, que está levando à oferta de cursos de qualidade bastante aceitável no setor privado, e o segmento dos cursos sequenciais é evidentemente um novo nicho que começa a ser explorado. O setor público, livre da competição, se move mais lentamente, mas precisa decidir sua vocação específica, que poderia ser se concentrar nas carreiras mais caras e de maior duração, ou então se voltar para outros públicos, para os quais o ensino superior convencional nem sempre serve, nem convém. Por mais difícil que seja, precisamos reverter esta tradição elitista que nos dá uma pós-graduação razoável ao lado de uma educação fundamental de péssima qualidade; e que acena para milhares de pessoas com as maravilhas da universidade da pesquisa e das profissões de alto prestígio, legando à grande maioria, na prática, o fracasso e a frustração. Os cursos de curta duração, tecnológicos ou “seqüenciais” não devem ser vistos como uma deformação em relação a um modelo ideal, mas anacrônico, de universidade, e sim como um componente fundamental e indispensável da educação superior de massas, típica do mundo moderno. Ainda que tarde, é bom que estejamos começando a trilhar este caminho. Simon Schwartzman é sociólogo, e membro da Academia Brasileira de Ciências

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