BIBLIOGRAFIA LIMA, Alceu Amoroso. Introdução à Literatura Brasileira, Rio, Livraria Agir Editora, 1957. CASTELO, José Aderaldo - A Literatura Brasileira - 1.0 vol. Manifesta çc.es Literárias da Era Colonial - Editora Cultrix. TELES, Gilberto Mendonça - Camões P a Poesia Brasileira, Edições Quenion, MEC - 2.8 Edição - São Paulo - 1976. RAMOS, Feliciano - História da Literatura Portuguesa - 7.8 Edição. OS CORUMBAS: UMA VERTENTE DO ROMANCE Braga, Livraria Cruz Editora - 1963. SOCIAL DOS ANOS TRINTA CIDADE, Hernani - Luís de Camões - O Lírico - 3.8 Edição. Lisboa Ocidente, 1943. DE OLIVEIRA, Cândido - Súmulas de Literatura P·ortuguesa - Décima, Quarta Edição - Gráfica Biblos Ltda. Editora - São Paulo. Claudemildes Monteiro da Rocha FERREIRA, Joaquim - História c!<L Literatura Portuguesa - 3..8 Edição Porto, Domingos Barreira, 1964. SARAIVA, Antonio José - Lopes Oscar - História da Literatura Portu Com o progresso das ciências o mundo alcançou trans guesa - 3.8 Edição. formações nunca antes observadas. O homem toma consci - D'ALGE, Carlos - Camões: O Real e o imaginári·o. Jornal O Povo - ênc1a da sua capacidade, passa a investir mais na concreti 25/03/ 80. Fortaleza - Ceará. zação das suas idéias e na realização de seus desejos. MASSAUD, Moisés - A Literaturm Portuguesa - 16.8 Edição - Editora Ao mesmo tempo que o desenvolvimento, possibilitou no Cultrix Ltda. - São Paulo. vos estilos de vida, estabeleceu mudanças na maneira de ABREU, Casimira de. Grandes poetas românticos do Brasil. In: Obra.s de pensar, de agir e de se manifestar. Favoreceu o estudo do Casimira de Abreu. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1940. comportamento humano, das suas relações com a sociedade, ANDRADE, Mário de. Poesias completas, São Paulo - Martins, 1966. com o meio e com os objetos que produz e consome. Permi É Obra imatura. São Paulo, Martins, 1966. f= Obra imatura. São Paulo, tiu que o homem se aventurasse em suas conquistas e se tor Martins, 1960. nasse mais audacioso em suas atitudes. Delineou novos ca BANDEIRA, Manuel - Poesia e Prosa - Rio de Janeiro, Aguilar- 1958. minhos para o crescimento econômico e social e fez evoluir a mentalidade da época ao moldar-lhe o espírito. A propagação das ciências, assim como. a evolução tec nológica e a expansão do capitalismo produziram forte influ ência na maneira de conceber e interpretar os diversos tipos de arte, no início deste século. Acrescente-se a isso o impac to causado pelo pensamento marxista, a revolução russa de 1917 com a arte e a literatura proletárias e os reflexos sócio econômicos e morais da primeira guerra mundial. Todos estes fatores, sem dúvida, inspirariam escritores o artistas da segunda e terceira décadas do século XX, em cujas obras se verificariam, a partir de então, princípios po lltico-ideológicos e reformas sociais misturados à crítica, à denúncia do social, à preocupação com o bem-estar da po pulação menos favorecida, configurados como focus, como toma ou como· elemento construtor da narrativa e da conduta dos personagens. 102 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 ltcv. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 103 Simultâneo a essa nova tendência da literatura e da arte, na afirmação de sua identidade ( ... ), na riquís percebe-se no plano da criação modificações significativas no sima tradição cultural, ( ... ) no passado e nos que concerne à estrutura, à linguagem, à elaboração dos pro valores por ele legados ( .. ), os traços mais mar tagonistas, aos valores estético·s e até mesmo quanto aos cri cantes de sua personalidade, (1) e os motivos para térios de verdade e efeito que toda obra expressa, seja lite criar a nova ficção do Nordeste. tária ou não. No Brasil, o aspecto pouco animador do momento histó Se a ocasião não era propícia para a sociedade que se rico e político, as inquietações nascidas das experiências es defrontava com toda ordem de problemas, para a arte o mo téticas do Movimento Modernista de vinte e dois, o sentimen mento era por demais favorável, uma vez que é próprio desta to de brasilidade, a conscientização da realidade e o socio evoluir nas épocas de crise social intensa. Pois, sendo "pro logismo fundem-se para dar origem a uma nova ficção. duto da sociedade", a arte tende a acompanhar as metamo·r foses sofridas tanto pelo homem como pela sociedade. E a A renovação literária observada na década de trinta, em literatura não poderia fugir à regra. que pese não ser exclusiva do romance nordestino, se cons Eis a razão por que o romance nordestino de trinta ab titui, no entanto, fato indiscutível de que foi o romance do sorveu as mudanças sociais, captou o espírito apreensivo e No-rdeste o que conquistou mais espaço e importância no ce conturbado do homem, e assumiu a posição crítica do seu nário literário brasileiro, e quem definiu o tipo de narrativa, tempo e do grupo social a que pertence, embora o tenha de linguagem e até mesmo o "perfil estético da época". feito com a técnica e a temática do regionalismo realista, tão Entretanto, o aspecto inovador que ele trouxe não está usadas no século passado pelos ficcionistas locais. circunscrito às experiências estéticas dos anos vinte, nem Diante dessas considerações, é o caso de se perguntar às influências político-ideológicas da arte e da literatura pro o que de moderno então apresenta a ficção nordestina com letárias, mas às alterações sócio-culturais, políticas e econô preendida entre 1930 e 1940. A pergunta exige uma resposta micas, à autoconsciência da realidade local e à preponde objetiva e coerente, porém, com respaldo na análise e na rância do pensamento histórico-sociológico divulgado na re critica dessas produções. Pelo menos três aspectos oodem ser aoontados como gião, pelo sociólogo e historiador Gilberto Freyre. inovadores: a sobriedade da narrativa que flui com naturali Não se quer dizer com isso que a ficção nordestina de dade; a linguagem fluente, espontânea, clara, e pouco adje trinta seja uma produção à parte, dissociada dos padrões es tlvada e a presença do social, perfeitamente integrado à reali téticos da época e livre de influências. Mas que esses fatos dade espaço-temporal do texto. não se constituíram em fatores determinantes do romance Os personagens também passaram a ser construídos de nordestino, muito embora hajam contribuído. maneira distinta. Ganharam vida, dinamicidade, humanidade. E até o ambiente, onde estes se moviam, se modificou, Para melhor esclarecer esta questão, recorramos a si ganhou outras características, outra função. Já que se deixou tuação em que se encontrava o Nordeste nesse período. do estruturá-lo "com galhos retorcidos, com ossadas huma O momento era de cris.s e de transição. A decadência nas, com carcaças de animais, com poentes excessivamente econômica e social havia ultrapassado todas as expectativas vormelhos e levas de retirantes a se arrastar, a vagar à toa e transfigurado a feição da sociedade, do homem e do meio. polos caminhos ínqremes do sertão" - expressões próprias Na política se tentava novos caminhos, visando encontrar so dn imaginação fértil e exagerada de uma época. luções capazes de eliminar ou atenuar as dificuldades. Vi Nas páginas que se seguem apresentaremos a análise via-se entre a angústia, a ansiedade e a insegurança. tf'Os Corumbas, livro de Amando Fontes, cuja publicação em A incerteza do futuro que se divisava sombrio e sem perspectivas !evou os intelectuais a buscar: I) Cf. In: A Tradição Regicna.lista no Romance Brasileiro, à pág. 174. 104 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 lt•w. ele Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan.fdez. 1984 105 Simultâneo a essa nova tendência da literatura e da arte, na afirmação de sua identidade ( ... ), na riquís percebe-se no plano da criação modificações significativas no sima tradição cultural, ( ... ) no passado e nos que concerne à estrutura, à linguagem, à elaboração dos pro valores por ele legados ( .. ), os traços mais mar tagonistas, aos valores estético·s e até mesmo quanto aos cri cantes de sua personalidade, (1) e os motivos para térios de verdade e efeito que toda obra expressa, seja lite criar a nova ficção do Nordeste. tária ou não. No Brasil, o aspecto pouco animador do momento histó Se a ocasião não era propícia para a sociedade que se rico e político, as inquietações nascidas das experiências es defrontava com toda ordem de problemas, para a arte o mo téticas do Movimento Modernista de vinte e dois, o sentimen mento era por demais favorável, uma vez que é próprio desta to de brasilidade, a conscientização da realidade e o socio evoluir nas épocas de crise social intensa. Pois, sendo "pro logismo fundem-se para dar origem a uma nova ficção. duto da sociedade", a arte tende a acompanhar as metamor A renovação literária observada na década de trinta, em foses sofridas tanto pelo homem como pela sociedade. E a literatura não poderia fugir à regra. que pese não ser exclusiva do romance nordestino, se cons titui, no entanto, fato indiscutível de que foi o romance do Eis a razão por que o romance nordestino de trinta ab Nordeste o que conquistou mais espaço e importância no ce sorveu as mudanças sociais, captou o espírito apreensivo e nário literário brasileiro, e quem definiu o tipo de narrativa, conturbado do homem, e assumiu a posição crítica do seu tempo e do grupo social a que pertence, embora o tenha de linguagem e até mesmo o "perfil estético da época". feito com a técnica e a temática do regionalismo realista, tão Entretanto, o aspecto inovador que ele trouxe não está usadas no século passado pelos ficcionistas locais. circunscrito às experiências estéticas dos anos vinte, nem Diante dessas considerações, é o caso de se perguntar às influências político-ideológicas da arte e da literatura pro o que de moderno então apresenta a ficção nordestina com letárias, mas às alterações sócio-culturais, políticas e econô preendida entre 1930 e 1940. A pergunta exige uma resposta micas, à autoconsciência da realidade local e à preponde objetiva e coerent.e, porém, com respaldo na análise e na rância do pensamento histórico-sociológico divulgado na re crítica dessas produções. gião, pelo sociólogo e historiador Gilberto Freyre. Pelo menos três aspectos oodem ser aoontados como inovadores: a sobriedade da narrativa que flui com naturali Não se quer dizer com isso que a ficção nordestina de dade; a linguagem fluente, espontânea, clara, e pouco adje trinta seja uma produção à parte, dissociada dos padrões es tivada e a presença do social, perfeitamente integrado à reali téticos da época e livre de influências. Mas que esses fatos dade espaço-temporal do texto. não se constituíram em fatores determinantes do romance Os personagens também passaram a ser construídos de nordestino, muito embora hajam contribuído. maneira distinta. Ganharam vida, dinamicidade, humanidade. E até o ambiente, onde estes se moviam, se modificou, Para melhor esclarecer esta questão, recorramos a si ganhou outras características, outra função. Já que se deixou tuação em que se encontrava o Nordeste nesse período. de estruturá-lo "com galhos retorcidos, com ossadas huma O momento era de cris.e e de transição. A decadência nas, com carcaças de animais, com poentes excessivamente econômica e social havia ultrapassado todas as expectativas vermelhos e levas de retirantes a se arrastar, a vagar à toa e transfigurado a feição da sociedade, do homem e do meio. pelos caminhos ínqremes do sertão" - expressões próprias Na política se tentava novos caminhos, visando encontrar so da imaginação fértil e exagerada de uma época. luções capazes de eliminar ou a~enuar as dificuldades. Vi Nas páginas que se seguem apresentaremos a análise via-se entre a angústia, a ansiedade e a insegurança. d'Os Corumbas, livro de Amando Fontes, cuja publicação em A incerteza do futuro que se divisava sombrio e sem perspectivas !evou os intelectuais a buscar: 1) Cf. In: A Tradição Regiona,lista no Romance Brasileiro, à pâg. 174. 104 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 Rcv. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 105 1933 foi recebida com aplausos da crítica, conquistando, in hábitos da cidadebinha do interior; se despoja do que restou clusive, o Prêmio Felipe de Oliveira. dos bens e parte em busca de sobrevivência na capital. Con Entre as obras de ficção dos anos trinta podemos afir sigo a família leva apenas "as saudades", a esperança, a mar que Os Corumbas ocupa posição privilegiada; primeiro, ilusão de que a "felicidade lá embaixo" a espera, nada mais. por se constituir numa das poucas obras a abordar o pro Vejamos, por exemplo, esta passagem que significa o blema da industrialização e suas conseqüências sobre o re ponto de partida da nova vida que esperam construir: tirante; segundo, por fugir à estrutura do chamado, romance proletário. Venderam as galinhas, os dois cavalos, a roça, Mas ao leitor inexperiente, pouco habituado a investiga há pouco replantada. Como ninguém quisesse lhes ções no texto, estas conclusões não são apreendidas. E não comprar a casinha, que com suas próprias mãos ha o são porque os caminhos sugeridos pela obra são múltiplos; viam erguido, deram-na para morar a uns compa o que pressupõe diferentes interpretações e controvérsias dres. quanto ao conteúdo temático, à qualidade estética e à clas E num dia de sol, alegre e lindo, demandaram sificação da mesma. à Estação da Murta, para aguardar a passagem do Assim é que ao iniciarmos contacto com Os Corumbas, comboio. tem-se a impressão de que se está diante de mais um roman Levavam saudades dos amigos, da vida pláci ce sobre a seca, o êxodo e a decadência rural, igual a tantos da do Engenho, da própria terra que deixavam; outros do período. mas iam risonhos e contentes. Aos seus corações A medida, no entanto, que vamos nos inteirando da estó alvoroçados parecia que a Felicidade, lá embaixo', ria, que nos familiarizamos com a narrativa, com o processo os esperava. (2) criativo do autor, a impressão do começo cede espaço a duas outras. Uma, a de que o romance reflete tendências político. Embora Os Corumbas focalize o fenômeno da seca, do ideológicas, estando, portanto, circunscrito à denominação de xodo rural e os problemas enfrentados pelos retirantes, não literatura "engajada". Outra, de que a obra traduz o modus o um romance sobre a seca e seus reflexo·s. vivendi, particular e único, do retirante nordestino ou mesmo Na verdaàe, o que menos existe neste romance, é seca. da gente sergipana. 116 a presenciamos na primeira parie da narrativa, quando os Esse problema do enquadramento da obra numa deter pro]ufzos causados por ela na natureza e na vida do homem minada categoria e o da descoberta do, tema requer uma aná •;f\o apresentados pelo narrador. lise cuidadosa dos fatos e dos elementos que participam do A melhor amostra de sua ação destruidora temos no suporte estrutural e narrativo do texto. oxomplo abaixo, cuja linguagem despida de qualquer orna Deixemos o campo das suposições, das considerações rnonto demonstra o desânimo e a tristeza dos que precisam lineares e passemos à investigação, da obra. dolo fugir: Do ponto de vista da estrutura, interessa examinar o tema, o comportamento dos personagens e o andamento da narra Tão violenta foi a seca de 905, que o capim tiva. cresceu e secou no leito estorricado do,s ribeiros. Os Corumbas, primeiro livro de Amando Fontes, se orga Assolou tudo, matou tudo! niza a partir da realidade exterio·r, da preocupação com o so João Piancó, doente, não pôde salvar as re cial e o documental. duzidas criações. E morreu de desgosto. Escrito na terceira pessoa e tecido com uma linguagem Geraldo, a esse tempo, tinha já três filhos. Lu fria e objetiva, o romance narra as dificuldades vividas por tou contra a miséria o quanto pôde. Josefa o aju uma família de retirantes, que se vê desalojada e expulsa de dava dia e noite. suas terras pelas circunstâncias climáticas. Sem condições de aí permanecer, abandona o sossego, a segurança e os hábitos da cidadezinha do interior; se despoja do que restou IA, In Os Corumbas à pág. 10. 106 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 H1:v do Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 107 1933 foi recebida com aplausos da crítica, conquistando, in hábitos da cidadebinha do interior; se despoja do que restou clusive, o Prêmio Felipe de Oliveira. dos bens e parte em busca de sobrevivência na capital. Con Entre as obras de ficção dos anos trinta podemos afir ~;lgo a família leva apenas "as saudades", a esperança, a mar que Os Corumbas ocupa posição privilegiada; primeiro, Ilusão de que a "felicidade lá embaixo" a espera, nada mais. por se constituir numa das poucas obras a abordar o pro Vejamos, por exemplo, esta passagem que significa o blema da industrialização e suas conseqüências sobre o re ponto de partida da nova vida que esperam construir: tirante; segundo, por fugir à estrutura do chamado· romance proletário. Venderam as galinhas, os dois cavalos, a roça, Mas ao leitor inexperiente, pouco habituado a investiga há pouco replantada. Como ninguém quisesse lhes ções no texto, estas conclusões não são apreendidas. E não comprar a casinha, que com suas próprias mãos ha o são porque os caminhos sugeridos pela obra são múltiplos; viam erguido, deram-na para morar a uns compa o que pressupõe diferentes interpretações e controvérsias dres. quanto ao conteúdo temático, à qualidade estética e à clas E num dia de sol, alegre e lindo, demandaram sificação da mesma. à Estação da Murta, para aguardar a passagem do Assim é que ao iniciarmos contacto com Os Corumbas, comboio. tem-se a impressão de que se está diante de mais um roman Levavam saudades dos amigos, da vida pláci ce sobre a seca, o êxodo e a decadência rural, igual a tantos da do Engenho, da própria terra que deixavam; outros do período. mas iam risonhos e contentes. Aos seus corações A medida, no entanto, que vamos nos inteirando da estó alvoroçados parecia que a Felicidade, lá embaixo, ria, que nos familiarizamos com a narrativa, com o processo os esperava. (2) criativo do autor, a impressão do começo cede espaço a duas outras. Uma, a de que o romance reflete tendências político Embora Os Corumbas focalize o fenômeno da seca, do ideológicas, estando, portanto, circunscrito à denominação de xodo rural e os problemas enfrentados pelos retirantes, não literatura "engajada". Outra, de que a obra traduz o modus um romance sobre a seca e seus reflexos. vivendi, particular e único, do retirante nordestino ou mesmo Na verdade, o que menos existe neste romance, é seca. da gente sergipana. Só a presenciamos na primeira parte da narrativa, quando os Esse problema do enquadramento da obra numa deter prejuízos causados por ela na natureza e na vida do homem minada categoria e o da descoberta do· tema requer uma aná são apresentados pelo narrador. lise cuidadosa dos fatos e dos elementos que participam do A melhor amostra de sua ação destruidora temos no suporte estrutural e narrativo do texto. xemplo abaixo, cuja linguagem despida de qualquer orna Deixemos o campo das suposições, das considerações mento demonstra o desânimo e a tristeza dos que precisam lineares e passemos à investigação· da obra. dela fugir: Do ponto de vista da estrutura, interessa examinar o tema, o comportamento dos personagens e o andamento da narra Tão violenta foi a seca de 905, que o capim tiva. cresceu e secou no leito estorricado dos ribeiros. Os Corumbas, primeiro livro de Amando Fontes, se orga Assolou tudo, matou tudo! niza a partir da realidade exterior, da preocupação com o so João Piancó, doente, não pôde salvar as re cial e o documental. duzidas criações. E morreu de desgosto. Escrito na terceira pessoa e tecido com uma linguagem Geraldo, a esse tempo, tinha já três filhos. Lu fria e objetiva, o romance narra as dificuldades vividas por tou contra a miséria o quanto pôde. Josefa o aju uma família de retirantes, que se vê desalojada e expulsa de dava dia e noite. suas terras pelas circunstâncias climáticas. Sem condições de aí permanecer, abandona o sossego, a segurança e os hábitos da cidadezinha do interior; se despoja do que restou Cf. In Os Corumbas à pág. 10. 106 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 107 Mas tiveram de desanimar, como outros tantos. Embora aqui a chuva não signifique fartura, redenção. Perceberam que só lhes restava o recurso de deser nem solução para os problemas dos retirantes sertanejos. tar, fugir para sempre daquele torrão maldito. A sua inclusão, à esta altura, serve para atenuar o tom Arrumaram alguns objetos indispensáveis, as da narrativa e amenizar o sofrimento dos personagens. poucas roupas que ainda tinham, e puseram-se na Quanto ao êxodo, a sua função no texto é a de primeiro estrada. (3) agente desestruturador dos Corumbas, cuja desint-egração total ocorrerá mais tarde, com a prisão de Pedro, a morte de Esta passagem, bem como a anterior, demonstram com Bela e a prostituição de Rosenda, Albertina e Caçulinha. clareza que a seca, ao se instalar na região, domina os es Já o retirante é dos três elementos que compõem o ro píritos, descaracteriza a natureza, transforma a vida dos se mance o mais significativo, porque é ele quem vai estar pre res que aí habitam, os submete à miséria e os conduz à fuga. sente no desenvolvimento da narrativa, embora sob circuns De resto, a seca, vista no contexto geral da obra, é ape tâncias diferentes. nas o elemento impulsionador das ações e da narrativa. Ele Considerando o que até aqui se analisou, fácil é prever, mento a partir do qual o autor norteou e teceu a estória. porque a ficção de Amando Fontes, a exemplo de muitas ou Logo no princípio da segunda parte do romance ele de tras, foi classificada como sendo mais uma obra de cunho saparece, cedendo lugar à chuva que transforma o semblante regionalista. O que não expressa a verdade. Pois, os dramas da natureza, o rumo da narrativa e o próprio comportamento vividos pela família e os demais personagens não se limitam dos personagens: Hó ao povo nordestino, nem são característicos da gente ser glpana. Era uma madrugada fria de julho, em pleno in verno. Aliás, José Maurício Gomes de Almeida, em sua recente Desde a véspera uma chuvinha miúda, rarefei obra, discorda dessa classificação, ao afirmar que: ta, caía tristemente sobre as ruas alagadas e de sertas. Muitos dos romances (e romancistas) tidos tra E toda a noite assim chovera, sem parar. dicionalmente como regionalistas não o são, ou ne Na Rua da Estrada Nova, meio em declive, for les o regionalismo manifesta-se apenas de forma mara-se um pequeno riacho, por onde as águas des epidérmica. Exemplo disso é a obra de Amando Fon ciam mansamente, levando a areia e as sujeiras que tes: que seus dois romances sejam sociais e sejam encontravam. nordestinos não cabe dúvida, mas não são propria Aquela hora, ainda reinava o mais completo si mente regionalistas, a não ser em aspectos secundá lêncio em casa de Geraldo. rios. (5) Sá Josefa (era assim aue a tratava todo o bair ro), posto já estivesse acordada, deixara-se ficar Por outro lado, também não é conveniente rotular Os Co- sobre as tábuas duras da cama, toda encolhida de 11/lllbo.s de romance proletário. Nem afirmar que o tema cen frio, debaixo da sua desbotada coberta de retalhos. trul soja a formação de centros operários, ou a luta destes O sudoeste soprou mais forte, açoitando a contra o tratamento recebido dos patrões, ou a pregação dos chuva por entre as frestas do telhado. Então, a lduuls socialistas. mulher abriu os olhos, distendeu os braços e as Não obstante a obra faça referências a agitações políti pernas, e murmurou, num bocejo: ' à revolta dos operários por melhores salários, à greve - Santo Deus! Ainda chove! Como não de trabalhadores e se perceba na fala do narrador e de cer vem estar essas ruas?. . . (4) porsonagens, de vez em quando, insinuações sufís de 3) Idem, ibidem, pág. 8. 4) Idem, ibidem, pág. 11. ) Gl. In: A Tradição Regionalista no Romance Brasileiro, à pág. 177. 108 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 ltnv tio Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 109 ~ Mas tiveram de desanimar, como outros tantos. Embora aqui a chuva não signifique fartura, redenção. Perceberam que só lhes restava o recurso de deser nem solução para os problemas dos retirantes sertanejos. tar, fugir para sempre daquele torrão maldito. A sua inclusão, à esta altura, serve para atenuar o tom Arrumaram alguns objetos indispensáveis, as da narrativa e amenizar o sofrimento dos personagens. poucas roupas que ainda tinham, e puseram-se na Quanto ao êxodo, a sua função no texto é a de primeiro estrada. (3) agente desestruturador dos Corumbas, cuja desintegração total ocorrerá mais tarde, com a prisão de Pedro, a morte de Esta passagem, bem como a anterior, demonstram com Bela e a prostituição de Rosenda, Albertina e Caçulinha. clareza que a seca, ao se instalar na região, domina os es Já o retirante é dos três elementos que compõem o ro píritos, descaracteriza a natureza, transforma a vida dos se mance o mais significativo, porque é ele quem vai estar pre res que aí habitam, os submete à miséria e os conduz à fuga. sente no desenvolvimento da narrativa, embora sob circuns De resto, a seca, vista no contexto geral da obra, é ape tâncias diferentes. nas o elemento impulsionador das ações e da narrativa. Ele Considerando o que até aqui se analisou, fácil é prever, mento a partir do qual o autor norteou e teceu a estória. porque a ficção de Amando Fontes, a exemplo de muitas ou Logo no princípio da segunda parte do romance ele de tras, foi classificada como sendo mais uma obra de cunho saparece, cedendo lugar à chuva que transforma o semblante regionalista. O que não expressa a verdade. Pois, os dramas da natureza, o rumo da narrativa e o próprio comportamento vividos pela família e os demais personagens não se limitam dos personagens: só ao povo nordestino, nem são característicos da gente ser gipana. Era uma madrugada fria de julho, em pleno in verno. Aliás, José Maurício Gomes de Almeida, em sua recente Desde a véspera uma chuvinha miúda, rarefei obra, discorda dessa classificação, ao afirmar que: ta, caía tristemente sobre as ruas alagadas e de sertas. Muitos dos romances (e romancistas) tidos tra E toda a noite assim chovera, sem parar. dicionalmente como regionalistas não o são, ou ne Na Rua da Estrada Nova, meio em declive, for les o regionalismo manifesta-se apenas de forma mara-se um pequeno riacho, por onde as águas des epidérmica. Exemplo disso é a obra de Amando Fon ciam mansamente, levando a areia e as sujeiras que tes: que seus dois romances sejam sociais e sejam encontravam. nordestinos não cabe dúvida, mas não são propria Àquela hora, ainda reinava o mais completo si mente regionalistas, a não ser em aspectos secundá lêncio em casa de Geraldo. rios. (5) Sá Josefa (era assim aue a tratava todo o bair ro), posto já estivesse acordada, deixara-se ficar Por outro lado, também não é conveniente rotular Os Co sobre as tábuas duras da cama, toda encolhida de rtJmbas de romance proletário. Nem afirmar que o tema cen frio, debaixo da sua desbotada coberta de retalhos. trnl seja a formação de centros operários, ou a luta destes O sudoeste soprou mais forte, açoitando a c entra o tratamento recebido dos patrões, ou a pregação dos chuva por entre as frestas do telhado. Então, a ldoaís socialistas. mulher abriu os olhos, distendeu os braços e as Não obstante a obra faça referências a agitações políti pernas, e murmurou, num bocejo: cno, à revolta dos operários por melhores salários, à greve - Santo Deus! Ainda chove! Como não de 1los trabalhadores e se perceba na fala do narrador e de cer vem estar essas ruas?. . . (4) lcm personagens, de vez em quando, insinuações suUs de 3) Idem, ibidem, pág. 8. 4) Idem, ibidem, pág. 11. I. In: A Tradição Regionalista no Romance Brasileiro, à pág. 177. 108 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 l(í·V, tio Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan.jdez. 1984 109 ordem político-ideológica, como se pode observar através dos Tal problema, em geral, tem origem na miséria, na vida exemplos relacionados a seguir: procórla e sem perspectivas, ocorrendo, portanto, nas cama Toda vez que se oferecia ocasião, falava aos c1ns pobres da sociedade, onde as necessidades básicas são companheiros. Produzia, então, longos discursos, em rnnls prementes. que sempre abordava "a melhoria dos ordenados, a Na obra, essas concepções são difundidas, embora a in diminuição das horas de serviço, tudo· que, enfim, dustrialização surja como um outro fator de influência. pudesse dar ao operário de Sergipe o conforto e o Tanto é assim, que todas as personaqens que se orosti bem-estar que o trabalhador do Rio e de São Paulo tuom no romance são ou foram emoreqadas das Fábricas já gozava". (6) do Tecidos. Há um flaqrante determinismo - é verdade - Ao grupo de José Afonso coube dar o rebate e nostn colocação. Esta parece dar a entender aue nenhuma sustentar a luta contra as Fábricas. Ou "o serviço nporflria é portadora de boa conduta e de bons princípios noturno seria pago com a bonificação de um terço morols. sobre os salários do dia, ou ninguém se sujeitaria à No entanto, preferimos creditar tal conceito à mentalida nova exploração", foi o ultimato lançado pela Socie do preconceituosa e tradicional da época, cuja sociedade ja dade Proletária de Aracaju, que passou a funcionar lllltls permitia fosse desculpada, perdoada ou nela reinteqra em sessão permanente, cheia de curiosos e prosé rln n mulher que houvesse dado um "mal passo" na vida. litos. (7) Dar a razão por que Rosenda e Albertina, filhas de Ge Ainda assim, não se pode dizer que seja uma obra "en tuldo o Josefa Corumba, ao serem abandonadas por seus gajada", defensora do pensamento político-ideológico. Muito companheiros, tiveram como única saída o "mercadejamento menos romance proletário. E não o podemos denominá-lo do nous corpos." desta forma, porque o tocus não recai sobre a luta de clas Como se pode observar por esta passagem: ses trabalhadoras. Além disso, estes assuntos estão concen trados em apenas quatro capítulos dos quarenta e oito que Ele disse que o descarado não demorou muito compõem o romance, colocados a nosso ver, sem nenhuma em Simão Dias. Foi logo mudado pra Itabaiana ou ênfase. pra São Paulo. Quando· saiu, deixou a bichinha à Parece-nos que o autor, ao mencioná-los, quis tão-somen toa por lá, jogada no oco do mundo. . . ( ... ) Quan te aproximar a realidade ficcional da realidade histórica, para do o diabo largou a pobrezinha, ela ficou mesmo tornar aquela mais real e humana. sem jeito nesta vida .. . Teve de ir morar com ou Depois, a forma discreta como são narrados todos estes tras mulheres. . . E passou a receber a todo mun problemas deve-se antes ao próprio esquema da obra, muito do ... (8) mais de consciência crítica da realidade do que mesmo à divulgação de doutrina ou ideologia defendida, talvez, pelo utt, por esta outra, ainda mais esclarecedora: autor. A propósito ainda do tema, há que considerar a ques Após cinco meses de ligação, Fontoura sentiu tão da prostituição - uma constante na ficção de Amando se cansado de Albertina. Uma outra conquista o Fontes - que na estrutura do romance é por demais expres chamava. Deu-lhe uma cama e um guarda-roupa de siva. pinho envernizado. Um pouco de dinheiro. E aban Em grande parte d'Os Corumbas ela se faz presente. ~ donou-a. ao mesmo tempo a responsável pelas ações, pelo comporta Ela não perdeu tempo em hesitações sobre o mento e pelo destino das personagens e da própria narrativa. que teria de fazer, convencida de que apenas um 6) Cf. In Os Corumbas, . . pág. 52. 7) Idem, ibidem, pág. 56. ldun1, Ibidem, pp. 73-74. 110 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 v tio Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 111 ordem político-ideológica, como se pode observar através dos Tal problema, em geral, tem origem na miséria, na vida exemplos relacionados a seguir: precária e sem perspectivas, ocorrendo, portanto, nas cama das pobres da sociedade, onde as necessidades básicas são Toda vez que se oferecia ocasião, falava aos mais prementes. companheiros. Produzia, então, longos discursos, em que sempre abordava "a melhoria dos ordenados, a Na obra, essas concepções são difundidas, embora a in diminuição das horas de serviço, tudo· que, enfim, dustrialização surja como um outro fator de influência. pudesse dar ao operário de Sergipe o conforto e o Tanto é assim, que todas as personaqens que se orosti bem-estar que o trabalhador do Rio e de São Paulo tuem no romance são ou foram emoreqadas das Fábricas já gozava". (6) de Tecidos. Há um flaqrante determinismo - é verdade - Ao grupo de José Afonso coube dar o rebate e nesta colocação. Esta parece dar a entender aue nenhuma sustentar a luta contra as Fábricas. Ou "o serviço operária é portadora de boa conduta e de bons princípios noturno seria pago com a bonificação de um terço morais. sobre os salários do dia, ou ninguém se sujeitaria à No entanto, preferimos creditar tal conceito à mentalida nova exploração", foi o ultimato lançado pela Socie de preconceituosa e tradicional da época, cuja sociedade ja dade Proletária de Aracaju, que passou a funcionar mais permitia fosse desculpada, perdoada ou nela reinteqra em sessão permanente, cheia de curiosos e prosé da a mulher que houvesse dado um "mal passo" na vida. litos. (7) Daí a razão por que Rosenda e Albertina, filhas de Ge mido e Josefa Corumba, ao serem abandonadas por seus Ainda assim, não se pode dizer que seja uma obra "en companheiros, tiveram como única saída o "mercadejamento gajada", defensora do pensamento político-ideológico. Muito do seus corpos." menos romance proletário. E não o podemos denominá-lo desta forma, porque o tocus não recai sobre a luta de clas Como se pode observar por esta passagem: ses trabalhadoras. Além disso, estes assuntos estão concen trados em apenas quatro capítulos dos quarenta e oito que Ele disse que o descarado não demorou muito compõem o romance, colocados a nosso ver, sem nenhuma em Simão Dias. Foi logo mudado pra Itabaiana ou ênfase. pra São Paulo. Quando saiu, deixou a bichinha à Parece-nos que o autor, ao mencioná-los, quis tão-somen toa por lá, jogada no oco do mundo ... ( ... ) Quan te aproximar a realidade ficcional da realidade histórica, para do o diabo largou a pobrezinha, ela ficou mesmo tornar aquela mais real e humana. sem jeito nesta vida .. . Teve de ir morar com ou Depois, a forma discreta como são narrados todos estes tras mulheres. . . E passou a receber a todo mun problemas deve-se antes ao próprio esquema da obra, muito do ... (8) mais de consciência crítica da realidade do que mesmo à divulgação de doutrina ou ideologia defendida, talvez, pelo ou, por esta outra, ainda mais esclarecedora: autor. A propósito ainda do tema, há que considerar a ques Após cinco meses de ligação, Fontoura sentiu tão da prostituição - uma constante na ficção de Amando se cansado de Albertina. Uma outra conquista o Fontes - que na estrutura do romance é por demais expres chamava. Deu-lhe uma cama e um guarda-roupa de siva. pinho envernizado. Um pouco de dinheiro. E aban Em grande parte d'Os Corumbas ela se faz presente. !: donou-a. ao mesmo tempo a responsável pelas ações, pelo comporta Ela não perdeu tempo em hesitações sobre o mento e pelo· destino das personagens e da própria narrativa. que teria de fazer, convencida de que apenas um 6) Cf. In Os Corumbas, . . pâg. 52. 111 lclum, Ibidem, pp. 73-74. 7) Idem, ibidem, pâg. 56. 110 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan.fdez. 1984 ltov de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan.fdez. 1984 111 caminho se abria ante seus olhos: ir morar, com os homens são lá escassos e têm pouca impor mais outras companheiras, em local apropriado, e tância. Já em Corumbas as melhores figuras do ganhar a vida com o mercadejamento de seu cor sr. Amando Fontes eram as femininas. Agora os ma po. (9) chos servem para transportar móveis e para justifi car a profissão das raparigas. (11) Com Caçulinha o processo foi diferente. Abandonada pelo noivo, que a havia deflorado recorre, por influência da Com o que concordamos. Pois, tanto em sua primeira mãe, à justiça. Mas o noivo era militar e filho de família obra como na segunda, as atribuições do homem são ínfi abastada, nada podia ser feito. mas. Quase nunca a sua voz, a sua vontade, as suas ações Despedida do emprego, Caçulinha não teve outra alter se fazem sentir ou prevalecer. Se, por acaso, chegam a se nativa, a não ser aceitar a proteção do Dr. Gustavo: manifestar, é para convencer as namoradas e as amantes a lhes acompanhar em aventuras, a aceitar-lhes os carinhos. Somente n'Os Corumbas a sua fala se faz ouvir, assim mesmo para ir viver por conta dele .. . de forma rápida. Sá Josefa estremeceu. E, volvendo uns olhos Desde o início da narrativa, a preocupação do narrador ansiosos para a filha: é pôr em foco a capacidade de decisão, as atitudes, o espí - Dr. Gustavo?! ... -Como?! ... Ele não é ca rito de determinação, a coragem e a ousadia das mulheres. sado. Construídas à medida que a narrativa vai-se desenvol - ~- Eu sei. . . Mas é o único que aparece em vendo e os acontecimentos se sucedendo, as personagens condições de me ajudar. . . (lO} vão aos poucos tomando seus lugares na estória e carrean do para si as atenções do autor e do narrador, uma vez que Pelo aue foi exposto, o tema central do romance é a são os elementos mais marcantes da estrutura do romance. prostituição. Pois, esta bem mais que a seca e a luta dos De todas, as que mais se destacam são Josefa Corumba trabalhadores, é auem empre~t::J. o tom dram8tico à narrativa e Maria Pirambu, cujos procedimentos, colocados em con e de certa forma define o caráter documental da obra. fronto, demonstram a posição antagônica que ocupam. A maneira como é tratado e conduzid,.., o assunto deixa Enquanto a primeira é apresentada como exemplo de em evidência, porém, o conceito de moralidade, não do ro dignidade, de mulher bem comportada, que só vive para a mancista, mas o da região, o da sociedade dos anos trinta, família e as tarefas domésticas, a segunda é mostrada como os quais, apoiados em prec-eitos reliaiosos, bastA.nte radicais, a imagem da desocupada, da mexeriqueira, que tem como julgava a mulher com austeridade, não lhe perdoando o me únicas ocupações: prestar atenção à vida alheia e falar mal nor deslize. Prosseguindo na análise, um outro fator a ser comentado de todo mundo. é o da construção das personagens, particularmente as teme Analisemos separadamente o comportamento de cada ninas, que nas obras do autor assumem papel decisivo. uma. Elas são de tal maneira elaboradas, que nenhuma dúvi Josefa é a mulher trabalhadora, a companheira decidida da deixam quanto à superioridade que possuem sobre as sempre disposta a enfrentar qualquer problema, a tomar qual masculinas. quer resolução, no sentido de vencer as dificuldades ou de Graciliano Ramos, aliás, já observara a importância e a amenizá-las. força das mulheres na ficção de Amando Fontes, ao comen Quando sobreveio a seca e esta tudo destruiu, ela não tar seu outro livro Rua do Siriri. esmoreceu. Pelo contrário, armou-se de argumentos para Na íntegra, eis o que diz a respeito: convencer toda a família a se transferir para a Capital, pois lá: 9) Idem, ibidem, pâg. 122. 10) Idem, ibidem, pâg. 154. 11) Cf. In Linhas Tortas à pâg. 115. 1.12 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan./dez. 1984 Rev. de Letras, Fortaleza, 7 (1/2) - jan.fdez. 1984 113
Description: