LUIS ALBERTO ZIMBARG O CIDADÃO ARMADO COMUNISMO E TENENTISMO (1927 – 1945) Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Campus de Franca, para a obtenção do título de Mestre em História (Área de concentração História e cultura social) Orientadora: Profa. Dra. Alzira Lobo de Arruda Campos Franca 2001 Agradecimentos: Na elaboração desta dissertação pude contar com a cooperação inestimável de algumas pessoas que foram fundamentais: Maria Lúcia Torres pelas revisões e auxílios à pesquisa e que muitas vezes mostrou um empenho maior do que o meu próprio. Dora Lúcia Soares dos Santos, pela revisão, correções gramaticais e sugestões. Prof. Dra. Helouise Costa pelas sugestões e pelo apoio moral. Prof. Paulo Cunha pelas diversas sugestões e pelas entrevistas que me indicou. Ao brasilianista John Foster Dulles por gentilmente ceder suas entrevistas realizadas com Ilvo e Rosa Meirelles e Carlos da Costa Leite. À direção e toda equipe do Cedem/Unesp pelos recursos postos à minha disposição e pela facilidade de acesso ao seu acervo, sem os quais esta dissertação não seria possível. Dulce Meirelles Costa Leite Reis pelo acesso ao arquivo pessoal de seus pais, Rosa Meirelles e Carlos da Costa Leite, por seus depoimentos e pela sua paciência para comigo, identificando vários personagens citados nos documentos e muitas vezes traduzindo trechos manuscritos que este autor não conseguiu ler. Lembranças especiais à minha mãe e manas. Resumo: Esta dissertação estuda os motivos que levaram o PCB e setores do tenentismo a se aliarem no final da década de 20 e como se desenvolveu esta aliança, até o seu rompimento, com a democratização de 1945. A análise concentra-se na militância política de Silo Meirelles e seu cunhado Carlos da Costa Leite, participantes destacados dos levantes tenentistas dos anos vinte. Estes dois militantes estavam junto com Luiz Carlos Prestes, quando este rompeu com a maior parte dos seus colegas de movimento, ingressando no PCB. Esta dissertação divide-se em três partes, cada uma delas abarcando um período considerado crucial na política de alianças do Partido Comunista: a primeira parte englobo o período de 1927 a 1934, que analisa as primeiras aproximações entre o comunismo e o movimento tenentista e a interrupção desta aproximação com a política de “proletarização” do Partido, que culminou no afastamento da maior parte de Direção Nacional original do Partido. A segunda parte analisa a unidade entre o PCB e o movimento tenentista, consubstanciada na linha política de Frentes Populares, adotada pelos partidos comunistas a partir do VII Congresso da IC e que tem seu ponto culminante com o levante de novembro de 1935. A última parte abarca o período de 1937 a 1945, marcado pelo Estado Novo e pelo gradual desaparecimento do movimento tenentista, que é superado pela conjuntura nacional. A deflagração da Segunda Guerra Mundial introduz as aspirações democráticas no ideário comunista e a discussão sobre a forma de inserção do Partido no novo período democrático nacional irá acarretar no rompimento de remanescente do tenentismo que militavam no PCB, Silo Meirelles e Carlos da Costa Leite, que defenderão uma aliança ampla do Partido com a maior parte das correntes oposicionistas ao Estado Novo, proposta que não será vencedora na disputa interna ocorrida entre 1942 e 1945, resultando no afastamento destes militares do Partido que irá alcunhá-los com a designação de “liquidacionistas”, afirmando que eles pretendiam liquidar o Partido Comunista. SUMÁRIO Introdução .......................................................................................................................... I I – Aproximação 1.1. – Movimentos de libertação nacional ......................................................................... 01 1.2. – A aliança de classes................................................................................................12 1.3 – O soldado cidadão ................................................................................................... 24 1.4 – O cidadão armado.................................................................................................... 35 1.5 - A proletarização ........................................................................................................ 46 1.6 – Prestes contra o prestismo ...................................................................................... 70 II – Unidade 2.1 – A frente única ......................................................................................................... 106 2.2 – A restauração da hierarquia militar ........................................................................ 123 2.3 – A Batalha da Praça da Sé ...................................................................................... 131 2.4 – A Aliança Nacional libertadora ............................................................................... 137 2.5 – A Revolução ........................................................................................................... 158 2.6 – De capitão Virgulino à capitão de indústria ............................................................ 167 III – Afastamento 3.1 – Estado Novo .......................................................................................................... 187 3.2 – União Nacional ....................................................................................................... 194 3.3 – Na Guerra Civil Espanhola .................................................................................... 217 3.4 - Reviravoltas na linha política e queda do Comitê Central ...................................... 229 3.5 - A Bahia, o coletivo e a “Sibéria Canicular Brasileira” ............................................. 247 3.6 – A volta à pátria ....................................................................................................... 259 3.7 – A Reorganização ................................................................................................... 264 3.8 - Os renegados da revolução ................................................................................... 300 Conclusão ....................................................................................................................... 345 Bibliografia ...................................................................................................................... 358 Fontes ............................................................................................................................. 362 INTRODUÇÃO Esta dissertação estuda os motivos que levaram o PCB e setores do tenentismo a se aliarem no final da década de 20 e como se desenvolveu esta aliança, até o seu rompimento, com a democratização de 1945. A análise concentra-se na militância política de Silo Meirelles e seu cunhado Carlos da Costa Leite, participantes destacados dos levantes tenentistas dos anos vinte. Estes dois militantes estavam junto com Luiz Carlos Prestes, quando este rompeu com a maior parte dos seus colegas de movimento, ingressando no PCB. A proximidade que esses dois tenentes tinham com Luiz Carlos Prestes e o prestígio que conseguiram em alguns meios políticos, assim como o rompimento de ambos, especialmente o de Silo Meirelles, que foi bastante violento, com o mesmo Prestes e com o Partido, faz com que seja interessante estudar detidamente a trajetória destes dois no PCB. A aproximação desses tenentes com o Partido Comunista manifestou-se em um período histórico demarcado: do final da década de 1920 até meados da década de 1940. Período de significativas mudanças em relação à situação social e política brasileira e marcado pela mudança do eixo do poder de partidos regionais - dominados por uma elite tradicional, baseada na grande propriedade monocultora, destacando-se a lavoura cafeeira - com um sistema eleitoral excludente, na qual uma pequena porcentagem da população de baixa renda obtinha o direito ao voto num sistema eleitoral viciado, dominado pelo voto de cabresto e pela fraude pura e simples. Ao término da Segunda Guerra Mundial, o país encontrava-se muito mais industrializado. A atividade econômica, se bem que ainda baseada na agricultura - o café continuava a ser o principal produto de exportação – mas com a pauta exportações bem mais diversificada, além da produção industrial, que aumentava significativamente, colaborando na urbanização da sociedade brasileira e com o aparecimento da pequena burguesia urbana e do proletariado como classes sociais autônomas, com peso significativo num processo eleitoral no qual já não havia mais espaço para partidos regionais, mas grandes partidos nacionais, com plataformas políticas distintas. Os motivos da aproximação entre a esquerda do movimento tenentista e o Partido Comunista ligam-se a dois fatores fundamentais: o primeiro deles é o prestígio pessoal que Luiz Carlos Prestes tinha, tanto entre os tenentes - grupo militar do qual ele foi um dos grandes expoentes - como no Partido Comunista, onde era considerado um líder incontestável. O segundo fator de unidade entre o tenentismo e o comunismo no Brasil, que ao nosso ver é mais importante do que o primeiro, é que ao menos por um período, entre meados da década de 1920 e o final da década seguinte, havia uma coincidência programática entre os projetos comunista e tenentista, especialmente no que se refere ao principal inimigo a ser combatido por ambos os grupos, o latifundiário, que era o representante das oligarquias regionais, o principal inimigo não apenas dos jovens tenentes, como de toda uma geração das forças armadas que se inspiraram no ex- presidente Floriano Peixoto, alcunhado de jacobino pelos seus inimigos, todos ligados à elite rural. O mesmo latifundiário era visto pela Internacional Comunista como representante do “feudalismo”, que deveria ser combatido em nome do desenvolvimento da economia capitalista nos países atrasados, o Brasil entre eles. A eliminação do “senhor feudal”, encarnado nos grandes proprietários agrícolas, era vista pelo movimento comunista internacional como um pré-requisito para a deflagração da revolução nacional- libertadora, início da revolução socialista nos países semi-coloniais. Neste caso, tanto comunismo quanto tenentismo, bateram-se pela mudança na estrutura agrária brasileira, seja pela reforma agrária ou pela repressão política às elites regionais; bateram-se também pela industrialização do país, especialmente na defesa da implantação da indústria siderúrgica, usando sempre, além da justificativa da implantação da indústria de base, o discurso bélico. Em vários documentos internos do PCB deste período a necessidade de implantação da siderurgia se sustenta na fabricação de armamentos. Ítalo Tronca1 discorda que houvesse, nesse período, uma ideologia industrializante no seio das forças armadas; segundo este autor, a principal preocupação do Estado Maior das Forças Armadas era a restauração da hierarquia militar, abalada após a Revolução de 1930 e durante a guerra civil de 1932. Este autor baseia sua afirmação na ausência de qualquer matéria se referindo a indústria siderúrgica veiculada na revista Defesa Nacional, porta voz das forças armadas, entre 1930 e 1936, além de despachos do Estado Maior. A preocupação com a instalação da siderurgia no país não era manifestada pelo exército enquanto instituição, mas por alguns militares de forma isolada, destacando-se Horta Barbosa e Juarez Távora. Concordamos que a instalação da indústria siderúrgica era objetivo de setores do exército e que a principal preocupação do Estado Maior era a restauração da hierarquia, 1 TRONCA, I., “O Exército e a industrialização: entre as armas e Volta Redonda (1930 – 1942)”, em porém, como pretendemos demonstrar neste trabalho, o discurso pró-siderurgia era baseado antes na necessidade de fabricação de armamentos e de autonomia na política de defesa nacional do que na teorização da indústria de base, que aparece em momento posterior. Edmundo Coelho2, em contrapartida, considera que após a guerra civil de 1932, o Estado Maior passou a relacionar a capacidade industrial com o poderio bélico; dessa maneira, Coelho analisa uma carta do Gal. Góis Monteiro à Getúlio Vargas em 1932, onde este considera que a superioridade industrial de São Paulo concedia-lhe poder bélico, o que forçou o exército nacional a aplicar contra os rebelados paulistas “uma estratégia de ‘esgotamento’ na impossibilidade material de aplicar a de ‘aniquilamento’”3. Segundo a revista Anais do Exército Brasileiro, de 1940, a iniciativa para estabelecer um padrão de capacidade combativa do exército somente “poderia ser coroada de êxito completo com a criação da siderurgia nacional”4. Procuraremos demonstrar neste trabalho que a adesão do PCB ao discurso de implantação da siderurgia no país sofrerá forte influência militar, fruto da grande participação de oficiais do exército nos seus quadros dirigentes, sendo que a necessidade de desenvolvimento de uma indústria bélica estará contemplada a todo momento nos documentos do Partido. A aproximação do PCB com a esquerda do tenentismo é analisada por Paulo Sérgio Pinheiro5 e por Marcos Del Roio6: o primeiro, considera que a aproximação entre o PCB e o tenentismo se inicia a partir de 1927, “muito antes do que em geral se supunha”7, aproximação que se devia a uma concepção semelhante do Estado como uma fortaleza a ser conquistada pelo levante armado. Pinheiro concentra sua análise no levante armado de novembro de 1935, que ficou popularmente conhecido como “Intentona Comunista”: o movimento teria sido a última ação tenentista. Pinheiro procura demonstrar como a Aliança Nacional Libertadora, a princípio, está mais na órbita do tenentismo do que do comunismo, sendo que seus fundadores eram advindo deste movimento militar e que nos seus primeiros meses de existência da ANL, esta mantém independência e até um afastamento em relação ao PCB.8 Embora a análise acima seja correta em sua generalidade, não podemos perder de vista que a maioria das palavras de ordem da ANL tinha sua origem no movimento FAUSTO, B. (org.), História geral da civilização brasileira, vol. 10, p.p. 337 – 360. 2 COELHO, E. C., Em busca de identidade: o Exército e a política na sociedade brasileira. 3 Ibid., p. 107. 4 Ibid., p. 108. 5 PINHEIRO, P. S., Estratégias da ilusão – a revolução mundial e o Brasil. 6 DEL ROIO, M., A classe operária na revolução burguesa - a política de alianças do PCB: 1928 – 1935. 7 PINHEIRO, P. S., Estratégias da ilusão, p. 17. 8 Ibid., p.p. 172, 173. comunista e a despeito da coincidência de táticas e objetivos - a conquista do poder por meio de um levante armado - a bandeira do anti-fascismo é uma criação do movimento comunista, uma vez que para os tenentes, até a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, seu projeto reformista está ligado ao estabelecimento de um governo forte, marcadamente anti-liberal. Marcos Del Roio também analisa a aproximação entre o comunismo e o movimento tenentista, utilizando-se basicamente de documentos internos do PCB e da Internacional Comunista. Del Roio salienta as diversas crises internas do Partido Comunista causadas pelas diversas mudanças de orientação na política de alianças do movimento comunista internacional. Deste modo, a unidade de ação entre comunismo e tenentismo teve que acompanhar as vicissitudes da política exterior soviética, que muitas vezes estava em contradição com a realidade nacional. Nesse caso, a Internacional Comunista, por meio do Bureau Sul-americano, serviu não apenas como um orientador da linha política, mas interferiu ativamente no PCB, impondo a sua orientação e utilizando-se, para tanto, do recurso de isolar e afastar a maior parte da sua primeira direção nacional, comprometida com uma política de aliança com os movimentos considerados pequeno- burgueses pelo comunismo internacional. Neste sentido, o PCB estará sempre se desdobrando entre sua linha política original, as diversas reformulações da linha da IC e a realidade nacional: seus dirigentes terão que conduzir o Partido dentro desta realidade conflitiva e contraditória. Quanto à última parte deste trabalho, que se refere ao rompimento entre setores deste tenentismo comunista com o PCB, a bibliografia consultada se mostrou bastante falha, estando representada por autores ligados diretamente à militância partidária comunista que, na maioria dos casos, subscrevem a versão oficial do Partido em relação aos seus dissidentes. A maioria desses autores estabelecem que a reorganização partidária foi fruto, principalmente, do trabalho de um grupo de militantes denominado Comitê Nacional de Organização Provisória – CNOP, grupo constituído por militantes do Rio de Janeiro, Bahia e São Paulo, majoritário no Partido desde 1942, segundo a historiografia, e que teria a oposição de dois grupos minoritários, um de São Paulo, o Comitê de Ação, que se opunha à linha política de União Nacional estabelecida pela Internacional Comunista antes de sua auto-dissolução, em 1943 e se opunha inclusive, a Luiz Carlos Prestes como dirigente máximo do Partido. O segundo grupo de oposição, ao qual são ligados o major Costa Leite e a família Meirelles, teria como objetivo, segundo a historiografia comunista, a liquidação do Partido Comunista, motivo pelo qual são conhecidos como “liquidacionistas”. São signatários desta postura historiográfica, entre outros, Moisés Vinhas9, Leôncio Basbaum10, João Falcão11 e Edgard Carone12, que consideram esses grupos somente do ponto de vista do apoio que cada um deles dava a Luiz Carlos Prestes e ao governo federal, em observação à linha política vigente de União Nacional. Num trabalho um pouco mais atualizado, Carone admite que estes grupos não eram estáticos, sendo que muitos dos militantes incluídos no grupo “liquidacionista” também subscreveram a ata de fundação do Comitê de Ação13. Para a realização desta dissertação, dei ênfase à pesquisa documental em detrimento da discussão historiográfica, por considerar importante o preenchimento de lacunas documentais na historiografia especializada. Lacunas que creio ter parcialmente preenchido utilizando-me de fontes até então praticamente inéditas, especialmente o arquivo particular de Rosa Meirelles e Carlos da Costa Leite, que fornecem documentos que contradizem muito do que se encontra na historiografia, como por exemplo um manifesto assinado por Agildo Barata e Carlos Marighella, em 1943, condenando a criação de organismos ilegais pelos militantes do PCB. Esta pesquisa baseou-se em documentos pertencentes a quatro acervos: o Arquivo da Delegacia Especial de Segurança Pública e Social - DESPS, que posteriormente mudou de nome para DOPS, preservado no Arquivo do Estado do Rio de Janeiro; nos fundos Getúlio Vargas e Filinto Müller, que se encontram no Centro de Pesquisa e Documentação - CPDOC - da Fundação Getúlio Vargas; no arquivo pessoal de Rosa Meirelles e Carlos da Costa Leite, na residência de sua filha, Dulce Meirelles da Costa Leite Reis; e no Centro de Documentação e Memória da Unesp - Cedem. No Fundo DESPS, foram consultados os prontuários de Silo Meirelles, Carlos da Costa Leite e de lideranças comunistas que tiveram alguma ligação com eles, especialmente após o levante de 1935 e no exílio de Carlos Costa Leite na Argentina, deste modo consultei os prontuários de Fernando Paiva de Lacerda, Roberto Morena e Pedro Pinto de Mota Lima. A partir da leitura destes prontuários, consegui identificar outros militantes que também mantiveram ligação com este grupo. São eles: Paulo Pinto de Mota Lima, Álvaro Francisco de Souza, Antônio Muniz de Farias, Roberto Henrique 9 VINHAS, M.; O Partidão. 10 BASBAUM, L.; História sincera da República, vol. 3 11 FALCÃO, J.; Giocondo Dias. 12 CARONE, E.; O PCB. 13 CARONE, E.; Brasil: anos de crise (1930 – 1945), p. 334. Faller Sisson e Ilvo Furtado Soares de Meireles. Esta pesquisa constatou a atividade de Silo Meirelles durante a fase de reorganização do Partido, verificando que este mantinha contatos freqüentes com Fernando Lacerda, velho dirigente comunista que durante a fase de reorganização do PCB, formou uma tendência de oposição ao grupo que veio a tornar- se o grupo dirigente do Partido, conhecida como Comissão Nacional de Organização Provisória - CNOP. Fernando Lacerda, entre 1943 e 1944, período mais intenso na disputa entre as tendências partidárias, visitava diariamente a casa de Ilvo Meirelles, onde mantinha contatos freqüentes com Álvaro de Souza, Antônio Muniz de Farias, Roberto Sisson, Raul Fernandes, Silo e Ilvo Meirelles, todos veteranos do movimento de 35, no qual exerceram funções de liderança, a maior parte deles oficiais das forças armadas14. A leitura da correspondência entre os prontuariados foi bastante útil na minha pesquisa: algumas cartas são interceptadas pelos agentes policiais e copiadas para que, posteriormente, a original chegasse ao seu destino sem despertar maiores suspeitas, é bastante revelador que, dentre os nomes citados acima, somente dois tinham cópias de suas correspondências nos prontuários. Não por coincidência, são eles os oficiais de patente mais alta (o major Costa Leite e o capitão da Marinha Roberto Sisson). O primeiro é também identificado como um dos líderes do movimento de 1935 pelo relatório da Polícia Civil do Distrito Federal15. O segundo foi signatário do manifesto que lançou a Aliança Nacional Libertadora em março de 1935. Além desses dois, o nome de Ilvo Meireles também se encontra citado neste relatório como “o elemento de ligação entre Prestes e o Secretariado Nacional do Partido Comunista e, bem assim, entre os civis e militares envolvidos na preparação do golpe”16. Os documentos encontrados neste acervo dão um ótimo panorama das vicissitudes da política de “União Nacional”, que começou a ser formulada a partir do VII Congresso da Internacional Comunista, em 1935 e foi reafirmada no ato de sua extinção, em 1943. Esta política foi o ponto central da atuação de todos os grupos ligados ao Partido Comunista, ficando o debate concentrado antes na interpretação dessa política do que na sua contestação. O esforço de guerra tem lugar de destaque nesta política e a declaração de guerra do Brasil aos países do Eixo, em 1942, pode ser vista como um divisor de águas na atuação de todos os militantes comunistas que se encontravam em liberdade, sendo que 14 Fundo DESPS – Prontuário nº 16.607, de Fernando Paiva de Lacerda, Relatório do Delegado Seraphim Braga de 21 de maio de 1943. 15 Polícia Civil do Distrito Federal, A Insurreição de 27 de Novembro – Relatório do Delegado Eurico Bellens Porto, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional – 1936, p.p. 64 – 66. (Este relatório faz parte do Fundo Lívio Xavier, que se encontra custodiado no Cedem/Unesp). 16 Idem, ibidem, p. 67
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