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(Memórias pouco ortodoxas de pessoa idem) 2017 PDF

327 Pages·2017·2.86 MB·Portuguese
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1 VAGA, LEMBRANÇA (Memórias pouco ortodoxas de pessoa idem) Flavio A. de Andrade Goulart 2017 2 PARA SOPHIA, FLAVINHO, FRANCISCO E MARTIM ATRAVÉS DE QUEM APRENDI QUE ESCREVER SOBRE A VIDA SÓ TEM SENTIDO QUANDO A VIDA, ELA MESMA, PASSA A TER SENTIDO. E TAMBÉM PARA CARMEN QUE DEU SENTIDO À MINHA VIDA AO DIVIDÍ-LA IRREMEDIAVELMENTE, EM DUAS ETAPAS: “AC” E “DC”... 3 CASUÍSTICA E “CAUSUÍSTICA” “Casuística” é palavra muito apreciada pelos médicos. Quando querem demonstrar sabedoria e, principalmente, exibir uma trajetória profissional marcada pela experiência, inflam o peito e logo proferem uma frase manjada: pois na minha casuística... Não nos deixemos enganar, vamos logo ao dicionário. Mestre Houaiss, por exemplo, sentencia que este é um termo que tem suas aplicações principais nos campos da ética, da religião e da teologia, o que nos faz suspeitar que talvez os doutores estejam usando a tal palavra sem as devidas licenças. Assim, se vê a seguinte definição para sua acepção principal: “exame minucioso de casos particulares e cotidianos em que se apresentam dilemas morais, nascidos da contraposição entre regras e leis universais prescritas por doutrinas filosóficas ou religiosas, e as inúmeras circunstâncias concretas que cercam a aplicação prática destes princípios. É termo comum a culturas e circunstâncias históricas heterogêneas, manifesta-se na filosofia estóica e confuciana, no talmudismo hebraico, nos comentários do Corão, na filosofia escolástica, na teologia católica”. Mas vemos também que o termo se oferece a outros significados. Por exemplo, por extensão de sentido, em Pascal e nos chamados jansenistas, refere-se a “reflexão moral oportunista e enganosa por abdicar dos princípios fundamentais da moralidade cristã em função de circunstâncias empíricas e cotidianas”, crítica esta voltada em especial contra o domínio dos Jesuítas, de influências muito secularizadas na ocasião. Pode ser também “argumentação que utiliza a simulação para justificar ou legitimar qualquer ato ou circunstância”; ou ainda “discussão e análise de problemas filosóficos, morais ou sociais por meio de sutilezas especiosas e artifícios sofísticos”. No Direito, pode ser a “aceitação passiva e acrítica de solução anteriormente dada para um caso jurídico semelhante ao que se busca atualmente analisar, em detrimento de uma análise acurada do texto legal”, o mesmo que “jurisprudência”, talvez. Finalmente, na Medicina, embora seja considerado um regionalismo brasileiro, representa o registro pormenorizado de casos clínicos das doenças. Ponto. Minha implicância com a tal “casuística” médica vem de longa data. Aprofundou-se ainda mais depois que aprendi certas noções de estatística e lógica, que me informaram que as possibilidades de generalizações a partir de dados isolados ou não controlados formalmente podem ser fonte de enganos, muito, muito mais do que de certezas. Passo a duas histórias ilustrativas. Quando fui trabalhar na Faculdade de Medicina de Uberlândia, em 1975, fiz como a maioria dos médicos, lá e em toda parte, na ocasião e ainda agora: arranjei um segundo emprego. Nada irregular nem indigno, embora na faculdade eu tivesse um contrato de “tempo integral”, mas não de dedicação exclusiva. Mas o salário... Assim eu fui trabalhar como supervisor da rede de serviços da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais, lotado no recém criado Centro (depois Diretoria) Regional de Saúde do Triangulo Mineiro (depois só de Uberlândia e região). No referido CRS, uma das minhas tarefas iniciais foi organizar a coleta de informações sobre as doenças de notificação obrigatória legal na cidade. Aliás, ninguém havia feito isso antes. De 4 posse dos primeiros dados, ainda muito precários e seguramente sub-notificados e pouco valorizados pelos “colegas”, organizei-os em gráficos e tabelas e fui mostrá-los em seletas platéias de homens de branco. Estes, de maneira geral, me cumprimentavam e elogiavam, porém sem deixarem de me olhar como se eu fosse um marciano recém ingressado na atmosfera terrestre. Na ocasião, cheguei a ouvir alguns dizerem que aqueles casos de difteria expostos em meu material não deveriam ser verdadeiros, pois “a casuística” de alguém indicava que tal doença nunca tinha grassado em Uberlândia. Tive que me calar, porque os dados eram pouco confiáveis mesmo, pelo menos naquele momento, mas a palavrinha me fazia cócegas... O mínimo que eu tinha desejo era perguntar como é que o digno doutor organizava a tal “casuística’ e que comparação ele poderia fazer com aquela dos demais colegas de profissão. Mas deixei passar. Mais adiante, houve mudanças no esquema nacional de imunizações, já não me lembro se acrescentando ou retirando vacinas tradicionais, ou alterando o número de doses. Desta vez, além de reuniões, fui procurar diretamente alguns dos principais pediatras da cidade em seus consultórios. Hoje eles se contam às centenas, mas naquele tempo, meados dos anos setenta, talvez fossem apenas pouco mais de uma dúzia. De modo geral, eu era bem recebido e ouvido atentamente, todos demonstrando real interesse na novidade que eu trazia. Até que um dia a palavra surgiu de novo... Eu falava com outro docente da Faculdade de Medicina, um sujeito formado em Ribeirão Preto. A referência a tal cidade não é preconceituosa, mas o fato é que todos sabíamos, em Uberlândia, que a “turma de Ribeirão”, formada por egressos da famosa escola de medicina da USP lá existente, era, para dizer tudo em uma única palavra, um tanto arrogante. Foi aí que o tal sujeito me sapecou esta pérola: minha casuística revela que estas mudanças no calendário de vacinas são desnecessárias... Foi assim que fiquei irremediavelmente implicante quando ouço tal palavra. Depois de estudar alguma coisa de lógica e consultar o Dicionário do Houaiss, então, nem se fala! Então, resumindo. O que vocês lerão agora – atenção! – não se trata de uma “casuística”, em qualquer das conotações que tal termo possui, mesmo aquela vulgarizada pelos médicos. Por isso – e para fazer um trocadilho que espero não seja considerado infame – é que resolvi considerar a presente série de escritos com o neologismo de “causuística”, porque o que apresento aqui são apenas vivências, reflexões, impressões ou, se quiserem, causos, que a vida me mostrou, com a dor e a beleza com que a criança, o estudante, o médico, o sanitarista, o gestor, o homem que observa, simplesmente, são obrigados a conviver e sobreviver. Vamos combinar: esta não é uma obra de ficção, embora às vezes tenha tido a tentação de que assim fosse, mas algumas das histórias que conto – todas verdadeiras, diga-se de passagem – terminam às vezes explicitamente com uma “moral da história”. Mas isso não se aplica a todas as narrativas. Em algumas delas, confesso, não sei até hoje se possuem alguma “moral” ou até mesmo algum sentido ou explicação. Mas como estou bem acompanhado por você, gentil leitor, lhe convido o refletir e tentar descobrir algo sobre tal falha, dotado que é da clarividência e da distância crítica que me escapam. Em suma não disponho de casuística, no sentido que os médicos dão ao termo, ou seja, aquele “registro pormenorizado de casos clínicos das doenças”. Mas em compensação pude colecionar muitas histórias – os tais causos – em minha vida, nos vários caminhos que percorri desde a infância, com maior foco naqueles momentos em que lidei com gente individualmente e deitada em camas de hospital ou em salas de ambulatório, em “colóquio singular” comigo, 5 ou nas salas de aula que tive que enfrentar, frente a alunos variavelmente atentos ou ausentes em espírito. E também nas várias frentes e instituições ligadas à saúde pública em que militei, onde as pessoas se contam aos milhares ou milhões e cabe, principalmente, evitar que se deitem ou se desgastem por motivo de doença. E encerro, em seção que intitulei Torre de Vigia, com reflexões que a idade e a experiência me permitiram expor, talvez com alguma falta de pudor também. Boa leitura. Abraços a todos. Obrigado pela generosidade de me lerem! 6 GENESIS 1. FAMÍLIA 2. MAIS FAMÍLIA 3. ANOS 50 4. UMA CASA 5. UM ANJO LOURO 6. CHEIRO DE TANGERINA 7. ÉRAMOS CINCO 8. MINHA CIDADE 9. O COLÉGIO DA ELITE MINEIRA (E MEU TAMBÉM) 10. DE COMO EU CONHECI BRASÍLIA 11. NÓS QUE AMÁVAMOS A REVOLUÇÃO 12. MEU CLUBE DA ESQUINA 13. UMA ESCOLA QUE ME ABRIU A CABEÇA 14. EU FUI BOY 15. ANOS DE CHUMBO 16. AMARCORD DE SABORES 7 Nasci em Itabira, e pelo menos por um ano vivi nesta cidade. Na infância e na adolescência estive por lá algumas vezes, em férias inesquecíveis, sempre tentando me fazer parte do famoso poema de Drummond. Logo vi, porém, que eu não era tão ferreamente triste ou orgulhoso, embora aquelas noites brancas e frias de minhas férias de julho combinassem bem com meus hormônios nascentes e me trouxessem boas sensações, por exemplo, que havia garotas interessantes naquele corredor de footing que vai da Praça de Batistinha e o Clube Atlético Itabirano. Com uma tosca câmera “120”, presente de minha tia Darcy, documentei alguns daqueles casarões com a paisagem escavada ao fundo e orgulhosamente coloquei a fotografia em meu quarto, com a devida menção ao poema de CDA: mas como dói... Não doía nada, era puro gênero... Belzonte, esta sim, é a minha verdadeira aldeia. E eu a palmilhei por inteiro, do Prado à Lagoinha; do Calafate ao Carlos Prates; da Barroca ao Sion; da Nova Suíça a Serra, passando pela rua Guaicurus e pelo Mercado Central. Ali cresci, brinquei, descobri, sofri, namorei, festei, conheci, além de ter praticado outros verbos com os quais se compõe a condição humana. Duas alegrias me traz hoje esta cidade: a de partir e a de ir embora. Mas o que ali vivi foi um genesis perfeito para ser quem eu sou, como todos os meus defeitos e talvez algumas qualidades. Nada mais, nada menos. 8 FAMÍLIA É um velho livro, este Horas Sephicas do Officio de N. Senhora Rainha dos Anjos Maria Santíssima, encapado em couro e com as páginas amareladas pela ação do tempo. Por si só, é uma curiosidade rara, tirado que foi em uma quarta impressão mais acrescentada, em Lisboa, na Oficina de certo Miguel Manescal da Costa, Impressor do Santo Ofício, no ano de 1764. Mais do que seu valor de relíquia, de história certamente acidentada, com as licenças necessarias do Santo Offício, como consta de seu frontispício, o que me toca mais no pequeno breviário é a humilde crônica da vida de uma família do interior de Minas, contada em sua contra-capa, a lápis e pena de ganso, com a tinta frequentemente esmaecida pela ação do tempo ou, quem sabe, de algumas lágrimas. Vejamos algumas passagens. «Cazei-me com a Sra. Theresa Maria de Jesus Paixão aos 30 de julho de 1859». «Aos 16 dias do mez de junho do anno de 1860 nasceu meu filho Florindo, que foi baptizado aos 26 do mesmo mez. Forão padrinhos Antonio Teixeira da Paixão e Theresa Maria de Jesus. O sacramento foi ministrado pelo Vigário Ignácio J. Nogueira». «Aos 13 de julho de 1861 falleceo meu sogro faltando 4 dias para completar 82 annos, sendo sepultado no dia 14». «Aos 7 de dezembro de 1861 nasceo meu filho Antonio, que foi baptizado aos 15 de janeiro de 1862 pelo Vigário Ignácio Joaquim Nogueira. «Das 2 as 3 da madrugada de 9 de abril de 1863 tremeo a terra». «A meia noite do dia 16 para 17 de fevereiro de 1864 nasceo meu filho João, foi baptizado aos 19 do mesmo pelo Vigário Ignácio. Aos 18 de abril de 1866 nasceo meu filho Galdino e foi baptizado aos 16 de junho do mesmo anno pelo Vigário Ignácio. «Aos 10 de maio de 1868 nasceo minha filha Pascoa e foi baptizada pelo Pe. Ignácio aos 9 de junho do mesmo. Na quarta feira 19 de maio falleceo minha mãe deixando 5 filhos». «Em 17 de agosto de 1878 nasceu minha filha Theresa e foi baptizada aos 6 de outubro do mesmo ano pelo Vigário Cônego João Alves Coelho. «Aos 26 de abril de 1873 falleceo meu filho João a 11 e ½ horas da manhã e como foi de bexigas enterrou-se as 2 da tarde do mesmo dia, tendo de idade 9 annos, 8 mezes e 10 dias». «Em 18 de janeiro de 1874 falleceo meu irmão João na Cidade de Ouro Preto e foi sepultado em S. Francisco de Paula a 19 do mesmo mez». «O Benjamim foi para o Collegio de Congonhas do Campo a 14 de junho de 1890». Não é pouca coisa: trinta anos de vida, morte, sustos, partidas, celebrações e tudo mais que faz da condição humana este caldo fascinante de dor, alegria e mistério. 9 MAIS FAMÍLIA O livro de orações referido na história acima me foi dado de presente pela minha avó materna, Dodora, ainda em vida. É realmente uma relíquia de família que, pelo que fiquei sabendo muitos anos depois, por minha mãe, continuava reivindicado por primas distantes dela. Mas minha avó era legítima proprietária ou, pelo menos, guardiã dele, condição que se estendeu à minha pessoa. Sendo assim, não devo nada a ninguém... Aquela Theresa, nascida em agosto de 1878, era minha bisavó, mãe de Dodora e com ela convivi, de perto, até 1965, quando ela faleceu. De repente me dou conta de que, ter convivido tão proximamente com alguém que nasceu antes da libertação dos escravos, da Proclamação da República, do advento do automóvel e da luz elétrica, isso me torna, de certa forma, também uma testemunha da história. Não tenho muitos detalhes sobre a vida de Theresa, conhecida entre as crianças da família como Vodinha, mas o que sei já faz dela uma personagem notável. Casou-se com um filho de portugueses, Marcus de Oliveira Santos, advogado que concluiu seu curso de direito em Ouro Preto, já pai de três ou quatro filhos e foi ser promotor no Sul de Minas, mais exatamente em Varginha. O nome dos pimpolhos era um primor de latinismo e cultura: Ennius, Publio e Duilio, além das duas moças, de nome mais cristão: Ligia e Maria Auxiliadora. Em Varginha, pouco tempo depois de instalado, Marcus adoeceu gravemente. Um médico foi preciso no prognóstico: senhora, seu marido viverá por no máximo seis meses. E assim aconteceu. Theresa fez a trouxa e carregou os cinco filhos para Belo Horizonte, onde viviam algumas pessoas de sua família, inclusive aquele Galdino citado nos relatos do livrinho, que lá já tinha se estabelecido como farmacêutico. Para ganhar a vida, abriu pensão e passou a fabricar petiscos para festas. Suas empadas de massa podre ficaram famosas. A vida de quituteira não lhe trouxe fortuna, mas sim algo mais essencial: boas amizades. Minha avó foi estudar interna no tradicional Colégio Santa Maria, que ainda existe no bairro da Floresta, e ali, para ficar dispensada de pagamento dos estudos, ajudava as freiras a tomar conta das demais internas, tendo que se submeter, ainda, a trabalhos pouco adequados, em termos de responsabilidade e peso, à criança que ela ainda era. Na pensão de dona Theresa apareceu um dia um jovem advogado, iniciando sua carreira na Capital. Este veio a ser meu avô, que se enamorou de Dodora, logo a pediu em casamento e, uma vez casado, rumou para sua terra, Itabira, onde certamente ganhar o pão de cada dia era mais fácil. Vieram daí onze filhos, sendo minha mãe, Favita, a quarta entre eles. Um dia escrevi sobre meu avô Altivo o seguinte. <<Do irmão se fala muito, até hoje, mais de 20 anos depois de sua morte. Ele, CDA, por sua vez falou pouco sobre Altivo, mas o bastante para reconhecê-lo como sua grande influência na carreira das letras. Eis sua apresentação na voz do próprio Poeta, conforme se vê em “A Mesa”: Este outro aqui é doutor, / o bacharel da família, / mas suas letras mais doutas, / são as escritas no sangue, / ou sobre a casca das árvores. / Sabe o nome da florzinha / e não esquece o da fruta / mais rara que se prepara / num casamento genético. / Mora nele a nostalgia, / citadino, do ar agreste, / e, camponês, do letrado. / Então vira patriarca. Nestas linhas quero trazer aos leitores algumas informações sobre tal personagem, ao mesmo tempo agreste & citadino, bacharel & camponês: Altivo Drummond de Andrade, meu avô, que 10 apesar de ser nome de rua em Itabira, continua a ser, meio século depois de sua morte, o que se costuma chamar de “ilustre desconhecido” – não só em Itabira, aliás. Altivo Drummond de Andrade nasceu em Itabira aos 19 de novembro de 1895, filho de Carlos de Paula Andrade e Julieta Augusta Teixeira Drummond, de tradicionais famílias locais. Fez seus estudos iniciais na terra natal e em Ferros, cidade cujo nome por si só indica proximidade e identidade com Itabira. O pai, pouco estudado, mas muito bem sucedido na vida e nos negócios, queria os filhos doutores. E lá se foi o jovem Altivo estudar medicina na capital. Sentiu-se mal nas primeiras aulas de anatomia e, com a devida licença do pai, mudou-se para o curso de direito, formando-se em 1918, no Rio de Janeiro. De volta a Minas, casou-se com Dodora, que foi sua companheira até a morte. Do casamento nasceram nada menos do que onze filhos. Em Itabira, sua vida se dividiu entre a advocacia, o magistério, a política e aquilo que seria sua maior paixão: o trato com as plantas, os bichos e a natureza. Herdou do pai, juntamente com o irmão Carlos, a Fazenda do Pontal, ou dos Doze Vinténs, hoje monumento em Itabira, embora fora de sua locação original. Assumiu sua administração na década de 40 e fez com que a antiga propriedade se transformasse em verdadeira fazenda-modelo, repleta de fruteiras raras, com suas terras sabiamente aproveitadas e seu notável casarão sempre muito bem conservado. Sem dúvida, Altivo deixou marcas em Itabira, fundador que foi, junto com outros ilustres conterrâneos, do antigo Ginásio Sul Americano e também da Associação Comercial. Na década de 30 havia se mudado com a família para Belo Horizonte, para possibilitar maiores oportunidades para os filhos adolescentes. Assumiu, então, o posto de redator no jornal Diário de Minas, que lhe fora oferecido pelo irmão escritor, então de mudança para o Rio. O ímã da política, da terra e das amizades, entretanto, logo o atrairia de volta a Itabira, para onde retorna em 1938. Contam que, por este tempo, ao discursar numa cerimônia de recepção ao ditador Getúlio Vargas, que fora a Itabira lançar a pedra fundamental da Vale, fez um discurso elegante, mas no qual não deixou de cobrar a redemocratização do país. Altivo, com seu perfil intelectual e militante, era amigo pessoal de Milton Campos e de outros líderes que viriam a constituir a antiga UDN, comungando com eles ideais de elitização e moralização da política, junto commodernização e progresso material para o Brasil. Com mais alguns anos na terra natal, já com a família criada, muda-se definitivamente para Belo Horizonte em 1952, onde se estabelece em um grande casarão da Rua do Ouro, no bairro da Serra, de agradáveis lembranças para seus netos mais velhos. Adquire então uma chácara em Contagem, retomando ali a obra interrompida no Pontal. Divide-se, agora, entre a função de inspetor escolar, o trato com a chácara e os netos, que passam a nascer em sequência anual. A política e a advocacia se transformariam, então, em páginas viradas. Altivo faleceu em junho de 1961, cercado pela legião de amigos e familiares, entre os quais se incluem trinta e cinco netos e incontáveis bisnetos. Foi um homem de seu tempo, acima de tudo. A literatura lhe fez tentações, que afinal cederam, mas que vigoraram o bastante para contagiar o irmão mais novo, que atribuía a ele, sete anos mais velho, sua iniciação literária, inclusive graças a livros que Altivo lhe mandava direto do Rio de Janeiro, onde fazia o curso de Direito. Pouca coisa conhecemos de sua lavra; raro exemplo é uma refinada “Baladilha” simbolista, que saiu no número 12 da Revista Vita, publicação auto-referida como “consagrada á propaganda moral e material do Estado de Minas Geraes”, no longínquo cinco de maio de 1914. O texto chegou às minhas mãos graças a Humberto Werneck – a quem agradeço – que certamente deve tê-lo encontrada em suas pesquisas sobre aquela “rapaziada desatinada” de BH nas primeiras décadas do século 20.

Description:
remete à blitzkrieg germânica, de novo. Maktub! A SENHORA VANA & E SEU MORDOMO MIGUEL. A fábula é nova, mas o sabor é antigo.
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