£ \ 1 Mapeamentoda vegetaçãoe dousodosolono Centro de Diversidade Vegetal deCabo Frio, Rio deJaneiro, Brasil Cláudio Belmonte de Athayde Bohrer6 Heloísa Guinle Ribeiro Dantas , Felipe Mendes CronembergeF Raul Sanchez Vicen , & Sandra Fernandes de Andrade5 Resumo (MapeamentodavegetaçãoedousodosolonoCentrodeDiversidadeVegetaldeCaboFrio,RiodeJaneiro, Brasil) AregiãodeCaboFrioéreconhecidacomoumimportantecentrodediversidadevegetal(CDVCF)da Região Neotropical, devido à presença de diversos taxa endêmicos e comunidades vegetais singulares, o que pode ser relacionado tanto ao clima relativamente seco quanto à heterogeneidade do ambiente físico. Emboradiversosestudosrealizadosnaregiãotenhamproduzidoinformaçõesimportantes sobre aestrutura e composição florística de algumas comunidades vegetais, existe ainda uma considerável lacuna na classificaçãoe definição dos tipos de vegetação bem como de sua distribuição espacial. Este trabalho tem como objetivo analisar e descrever os tipos de vegetação da região e sua relação com o ambiente físico, através do mapeamento da cobertura vegetal e uso do solo, baseado na análise integrada de imagens de satélite, fotografias aéreas, mapas temáticos e dados pontuais provenientes de levantamentos estruturais e florísticosetrabalhosdecampo,comapoiodoprocessamentodigitaldeimagensedesistemadeinformações geográficas. Osresultados sãoapresentadosacompanhadosdeum mapadavegetaçãoeusodo solodaárea doCDVCF,quepoderáserutilizadocomobase paranovosestudosflorísticoseecológicos,paraestudosda dinâmicadapaisagemeparaapoioaoplanejamentoambientaleaconservaçãodabiodiversidadedaregião. Palavras-chave:coberturavegetal,usodosolo,relaçãovegetação-ambientefísico. Abstract (VegetationandlandcovermappingoftheCaboFrioCentreofPlantDiversity,RiodeJaneiro,Brazil) The CaboFrioregionhasbeennominatedanimportamCentreofPlantDiversityoftheNeotropicalRegiondueto the presenceofseveralendemic taxa anduniqueplantcommunities, whicharerelatedtobothadryclimate and a heterogeneous physical environment. Although previous studies have provided important floristic and structural information on vegetation types, there is still considerable uncertainty about the spatial distribution, extern and variation in vegetation cover, as well as the classification and defmition ofthese types. This work aims to provide an analysis ofthe regiorís vegetation and its relationship to the physical environment,throughvegetationandlandcovermapping,basedonanintegratedanalysisofsatelliteimages and aerial photographs, thematic maps, point data from previous floristic and structural surveys and field work, supportedbydigitalimageprocessingandgeographicinformationsystemsoftware.Theseresultsare accompanied by a vegetation and land cover map of the entire area, thus providing a basis for further ecological studies, conservation and land use planning and monitoring and landscape dynamics analyses. Keywords: vegetation.landcover,vegetation-physicalenvironmentrelationships. Introdução materiaisdeconstruçãoeabrigo,combustível, Avegetaçãoéparteintegrantedapaisagem conservação do solo, recursos hídricos e da eservecomoum indicadordeoutrosatributos vidasilvestre. do ambiente e de suas variações no espaço. Mapasdevegetaçãomostramalocalização, Contribuitambémparaofornecimentodediversos extensãoe distribuição dos tipos de vegetação produtoseserviçosecossistêmicos,alimentos, deumadadaregião,apresentandouminventário Artigorecebidoem05/2008.Aceitoparapublicaçãoem02/2009. 1EstetrabalhocontoucomoapoiofinanceirodaFAPERJ. 'DepartamentodeGeografia,InstitutodeGeociências,UniversidadeFederalFluminense,CampusPraiaVermelha,Boa Viagem,Niterói,RJ,24210-340,Brasil 'ArquitetaPaisagistaMSc. 'ProgramadePós-GraduaçãoemCiênciaAmbiental,InstitutodeGeociências.UniversidadeFederalFluminense.Niterói,RJ. 5ProgramadePós-GraduaçãoemGeoquímica,InstitutodeQuímica,UniversidadeFederalFluminense.Niterói,RJ. '‘Autorparacorrespondência: [email protected] SciELO/JBRJ cm 13 14 .. Bohrer, C. B.A.etal. dascomunidadesvegetaisexistentes.Comisso Dryades. Gonzaga Campos propôs em 1926 gera-se uma como ferramenta para a análise umaprimeiraclassificaçãobaseada noaspecto das relações entre avegetação e o meio físicoe tisionômico da vegetação, reconhecendo três comopadrõesdereferêncianomonitoramento grandesgrupos-campos,caatingase florestas, das mudanças temporais na vegetação, definindo duas divisões da floresta atlântica: fornecendo embasamento científico ao florestas das encostas e dos pinheiros (Veloso planejamentodo usodaterra(Bohrer2000).As &Góes-Filho 1982).Azevedo(1950)estabeleceu suas características variam de acordo com a um sistemafisionómico-ecológicodividindoa escala cartográfica, os métodos e os tipos de vegetaçãobrasileiraemtrêsgrandesformações: imagensutilizados,quedeterminamadefinição florestais, com seis subdivisões; arbustivas e dos padrões passíveis de serem mapeáveis. herbáceas; e complexas, onde incluiu as A vegetação natural geralmente varia formações litorâneas. Rizzini (1997) volta a continuamente no espaço, exceto em caso de identificar dois grandes grupos de floresta, descontinuidade geológica, histórica ou amazônica e atlântica, subdivida em dois ambiental (Austin 2005). Portanto, os limites conjuntosheterogêneos,umdosquaissemtipos entre os diferentes tipos de vegetação são próprios de vegetação, onde se inclui o geralmente arbitrários e influenciados pela Complexode Restinga. escolhadascaracterísticasnasquais se baseia Beard (1946, 1955) desenvolveu um a sua classificação (Küchler 1988b). Os sistemadeclassificaçãoparaaAméricatropical sistemasdeclassificaçãodavegetaçãopodem baseado em características fisionômicas, seragrupadosemdoistiposbásicos(VVhittaker utilizando também aspectos ecológicos, 1978): fisionómico-estrutural, baseado nas relacionando a fisionomia da vegetação a formasde vidaoudecrescimentodominantes, gradientes ambientais, com as formações e florístico, baseado nas espécies ocorrentes. definidascomoestágiosreconhecíveisaolongo A fisionomia da vegetação é definida pelos de um gradiente contínuo. AUNESCO propôs tipos estruturais ou formas de crescimento umsistemafisionômicoglobaldeclassificação dominantes ou comuns nas comunidades, (Ellenberg & Mueller-Dombois 1967). definindo a aparência ou aspecto geral da posteriormenteaperfeiçoadoparautilizaçãono vegetação (Beard 1978). A estrutura está mapeamento da vegetação mundial na escala relacionada ao padrão de distribuição das 1:1.000.000 (UNESCO 1973), que emprega o espéciesnacomunidadevegetal,definidapelos conceito de formas de vida de Raunkiaer, três componentes: vertical (estratificação), modificado e expandido, além de aspectos horizontal(distribuiçãoespacialdosindivíduos) ambientaisconsideradosimportantes. e pela abundância de cada espécie (Kent & O mapeamento da vegetação do país Coker 1992; Küchler 1988a). A maioria dos efetuadopeloProjetoRadambrasilevoluiupara sistemas fisionômicos utiliza o conceito de um sistema de classificação desenvolvido a formação, considerada como um tipo de partirdestaproposta,baseadonumahierarquia comunidade definido pelas formas de deregiãoecológica,formaçãoesubformação, crescimentodominantesepelascaracterísticas de acordo com a escala e o nível de detalhe principaisdoambiente (Beard 1978). utilizado,sendoaregiãofitoecológicaentendida De acordo com Veloso & Goes-Filho comouma“áreadeflorísticatípicacdeformas (1982).aevoluçãodaclassificaçãodavegetação biológicascaracterísticas,queserepetedentro brasileira pode ser traçada desde Martius em de um mesmo clima" (Veloso & Góes-Filho 1840. que definiu cinco regiões florísticas 1982, pág 32). De acordo com este sistema, denominadascomonomededivindadesgregas, posteriormente revisado (Veloso etal. 1991). delineadas em mapa fitogeográfico anexado à a floresta ombrófila densa recobre as áreas Flora brasiliensis por Grisebach, em 1858. A costeirasúmidassemestaçãosecapronunciada, vegetação da faixa costeira foi denominada e a floresta estacionai semidecidual ocupa as Rodriguésia 60 (1): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ cm 13 14 .. 2 VegetaçãoeusodosolonoCDVCF 3 áreas interioranas com ocorrência de três ou baixosíndicespluviométricosedafisionomia, mais meses secos. As formações pioneiras, caracterizadaporaltapercentagemdeespécies incluindo restingas, manguezais e campos suculentas e lenhosas deciduais e espinhosas inundáveis,ocorremnasplaníciesquaternárias com microfolia, associada a solos eutróficos aolongodetodaazonacosteira(IBGE 1993). pouco desenvolvidos (Ururahy etal. 1987). Ule (1967) diferenciou a vegetação da Em uma análise dos padrões de região de Cabo Frio em diversos tipos de distribuição das leguminosas arbóreas do comunidades vegetais: comunidade halófita estado. Lima (2000) categoriza as formações sobredunasmaisexpostasàsalinidade;restingas arbóreas da região como florestas de planície deEricaceae(vegetaçãoarbustivapoucodensa), não-inundada,submontanaedeplaníciesobre de Myrtaceae (arbustiva densa com maior depósitomarinho. Araújo(2000)classificou a riqueza de espécies), e de Clusia (vegetação vegetação das restingas da região de acordo mais alta e densa); e as matas paludosas e de comaposiçãotopográficaemrelação aomare restinga. Rizzini (1997) dividiu a região em a fisionomia, utilizando as denominações mata litoral rochoso, limosoe arenoso, este porsua seca, mata inundada e vegetação arbustiva vez composto por dunas móveis e fixas, com fechada, aberta e herbácea. vegetaçãoherbáceo-arbustiva(thicket)distinta Um novo mapeamento do uso do solo e darestingatípica(vegetaçãoarboriformesobre cobertura vegetal do estado, com base em areia maiscompactada)eda matade restinga, imagens Landsat TM (CIDE 2000), adotou o com dossel entre 8 e 12 metros. sistema de classificação do IBGE, com a & Araújo Henriques (1984) dividem as utilização de termos de fácil entendimento e restingas do Rio de Janeiro em doze tipos de declasses decoberturaadicionais. O trabalho comunidades vegetais, de acordo com foiposteriormenteatualizado,comumamelhor características fisionômicas, ecológicas e definição da legenda e de sua relação com a florísticas, adaptando algumas das classes classificação do IBGE (Bohrer 2003a). Foi propostas por Ule (1967). Sá (1992) usou os analisada também a evolução da cobertura termos mata paludosa, para a vegetação arbóreapormunicípio,apartirdacomparação arbórea florestal sobre áreas periódica ou com cartas planialtimétricas (de 1956-69), permanentementealagadas,eflorestaseca,paia registrando um aumento de 4,8% em as áreas arenosas planas ou de relevo suave, Saquarema e diminuição de 20,8% em Cabo em Saquarema. Farág (1999) caracterizou a Frio, com uma tendência geral de redução da vegetação arbórea sobre planície areno- cobertura arbórea da região (Bohrer 2003b). argilosaemBúzioscomomatasemicaducifólia. Outros trabalhos em escala de detalhe, com O mapeamento da vegetação da região uso de fotografias aéreas e imagens orbitais peloProjetoRadambrasil(Ururahyetal. 1983) de alta resolução espacial, incluem o considerou a relação entre a fisionomia e o mapeamento da vegetação na Praia Grande, clima, a partir da relação ombrotérmica P > em Arraial doCabo (Araújoetal. 2004), e do 2T (Walter 1986), para separar as áreas com município de Armação dos Búzios (Dantas et coberturaflorestalpereneedecidual.A floresta al. 2009, neste volume). estacionai semidecidual, que alcançao litoral De modo geral, a vegetação da região na região da desembocadura do rio Paraíba refleteasuaespecificidadeclimáticaassociada doSul,recobreasplaníciesecolinasdaregião à heterogeneidade física, apresentando uma de Cabo Frio. A vegetação sobre os moiros grande diversidade fisionômica e florística e costeirosfoiconsideradacomoumadisjunção altograudeendemismos,estandoaparentemente fisionómica-ecológica da caatinga nordestina condicionadatambémpelahistóriapaleoevolutiva, e classificada como estepe arbórea, termo mantendo uma vegetação remanescente dos posteriormentesubstituídoporsavana-estépica períodos glaciais do Pleistoceno (Ab'Saber florestada(Veloso etal. 1991), em funçãodos 1992;Araujoc/al. 1998). Devidoaoconjunto Rodriguésia 60 (1): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ 13 14 15 4 Bolirer, C. B.A. etal. destes fatores, a região foi apontada como Processosintrusivos,tectônicosedeposicionais, Centrode Diversidade Vegetal de Cabo Frio- associadosàaçãodeprocessoserosivos,fluviais, CDVCF (Araújo 1997). lacustres e costeiros, respondem pela O objetivo deste trabalho consiste na diversidade litológicaedeformasderelevoda elaboraçãode mapadacobertura vegetal e do região, que, combinada com a alternância de uso do solo atual na área do Centro de condiçõesclimáticaseadiferenciaçãoespacial Diversidade Vegetal deCaboFrio, mostrando nas condições de umedecimento, resultaram a extensão atual das áreas de vegetação na diversificação dos tipos de solos e das natural remanescente e sua relação com o fisionomiasdavegetação. ambiente físico e a ação antrópica. OrioSãoJoãoconstituiolimite nortedo CDVCF, que abrange também as bacias do MaterialeMétodos rioUnaedas lagoasdeAraruama, Saquarema, Jaconé e Jacarepiá. Ocorrem ainda diversas Descrição da área de estudo lagoas menores, perenes ou temporárias, A área delimitada como Centro de importantes para a dinâmica hidrológica e a DiversidadeVegetaldeCaboFriorecobreuma vegetação das áreas mais baixas (Bidegain & extensãoaproximadade 1562km2 abrangendo , Bizerril2002; CILSJ 2002). oito municípios do estado do Rio de Janeiro: A região abrange dois domínios Maricá,Saquarema,Araruama, IguabaGrande, morfoestruturais (RADAMBRASIL 1983): a São Pedro da Aldeia, Cabo Frio, Arraial do faixa de dobramentos remobilizados e os CaboeArmaçãodosBúzios(Fig. 1). Aregião DepósitosSedimentares.Orelevomovimentado caracteriza-se pela diversidade de ambientes, é oriundo dos falhamentos e dobramentos de resultante da sua evolução físico-geográfica. uma litologia cristalina que remonta ao Figura 1-LocalizaçãodoCentrodeDiversidadeVegetaldeCaboFrio-CDVCF. Rodriguésia 60 (1): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ cm 13 14 15 16 17 18 .. > VegetaçãoeusociosolonoCDVCF 5 Arqueozóico e Proterozóico, posteriormente relacionados ao último período transgressivo submetidosamovimentostectônicosiniciados marinho. EntreCaboFrioeArraialdoCabo,a háaproximadamente 80milhõesdeanos,com maior parte dos depósitos parcialmente osoerguimentodabordadocontinenteemtodo recobertospordunasholocênicassãodeidade o sudeste brasileiro, com rompimento e pleistocênica,preservadosdaúltimatransgressão conseqüente rebaixamento dos blocos graças à presença das rochas cristalinas. Os adjacentes. Nas colinas e maciços costeiros DepósitosFluvio-Lagunaresestãogeneticamente ocorrem duas unidades geológicas com relacionadosaepisódiosdeprogradaçãofluvial diferentes idades: o Complexo Região dos sobre ambiente transicional marinho/raso, Lagos, Paleoproterozóico, constituído por estando bem representadas no curso dos rios ortognaissesbandados/dobradoscinzentos,de São João e Una, com pequenas manchas composição tonálica a granítica, corresponde situadasnapartecontinental internadaLagoa aum fragmentodaplaca Angolana, acrescida de Araruama e em Búzios (Dantas 2000). à borda leste da província Mantiqueira; Os sistemas lagunares holocênicos enquanto que o Gnaisse Búzios, bandeado e ocorrem nas zonas baixas separando terraços de foliação horizontal, data do Proterozóico arenosos pleistocênicos e holocênicos ou nos inferior(Penha 1999; Silva & Cunha 2001). cursosinferioresde valesnãopreenchidospor As intrusões e extrusões de rochas sedimentos fluviais, sendo constituídos por Cenozoicaalcalinas(IlhadoCaboFrioeoutras sedimentos sílticose/ou areno-argilosos ricos ocorrências menores), possuem idades entre em matéria orgânica, podendo conter grande ~72 e 50 Ma (Penha 2000). Ainda durante o quantidadedeconchas(Martin&Suguio 1989). período Terciário ocorreram dois grupos Osistemamaisinternoéocupadopelasgrandes alternadosdeprocessoserosivos(Ab'Saber1992): lagunas que se situam entre as formações erosãoextensivadeencostasacompanhadapor cristalinaseosdepósitospleistocênicos. Omais terraceamento lateral pela dissecamento externofoiformadoentreasbarreiraspleistocênica vertical, e intensa pedogênese, acompanhada eholocênica,constituídoporlagoaspequenas por relativa estabilidade da paisagem, com a e pouco profundas e com tendência ao formação dos tabuleiros costeiros (formação ressecamento durante períodos de estiagem. Barreiras), de ocorrência restrita na área. OsDepósitosPraiaisMarinhosholocênicossão Flutuações climáticas iniciadas no início do constituídosporareiasquartzosasesbranquiçadas, Quaternárioatéopresentetambéminfluenciaram finas a médias, apresentando estratificação a paisagem atual, com expansão/retração de paralela com suave mergulho em direção ao florestas úmidas e alterações do nível do mar mar. O pacote eólico apresenta-se na forma (Ab’Saber 1977). Foram formados diversos de depósitos próximos da linha de costa, e de ambientes de sedimentação associados a dunas transgressivas, mais interiorizadas sistemasdedeposiçãodeorigemcontinentale (Femandez2003). O transicional marinho (Turcqetal. 1999). processo de formação dos cordões Os Depósitos Colúvio-Aluvionares são litorâneoselagoasdaregiãopodeserresumido constituídospormateriaisvariados,desdeargila em quatro fases (Femandez 2003), com um até blocos de rocha (matacões) provenientes máximotransgressivoanteriora 123.000anos do embasamento, e sedimentos arenosos e A.P.formandopaleolagoas,seguidopelorecuo lamosos, eventualmente com cascalheiras, gradual do nível do até o máximo regressivo localizados em encostas baixas e ao longo de (18.000 anos A.P.), com a formação de drenagens. Nos ambientes de sedimentação tômbolos ligando o cordão pleistocênico aos transicional/marinho encontram-se os morroscosteirosededepósitoslagunaresentre Depósitos Pleistocênicos formados por o cordão e o cristalino. Ocorreu uma nova Depósitos Praiais Marinhos e/ou Lagunares, elevação do nível do mar até 5100 anos A.P., Rodriguésia 60 (1): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ 13 14 15 6 Bolirer. C. B.,4. eta!. iniciando-se posteriormente uma nova EstaçãoIguabaGrande-RJ deposição lacustre, com a formação dos cordões holocênicose iníciodasedimentação lagunar, recuodalinhadecostaeaconstrução das dunas frontais. O mapeamento bioclimático do estado (Golfari & Moosmayer 1980) aponta a peculiaridade climática e o elevado déficit hídricodaregião,comforte influênciasobrea vegetaçãoflorestal.Aumidaderelativadoarmédia situa-seemtomode83%,comprecipitaçãomédia eanunaalsváarreiaasndmoadies15b0ai0xmams,nnoasseeuscalripmaitsedaOesesrtrea Figura2-Balançohídricocombaseemdadosde 1970- 1999, da Estação Meteorológica de Iguaba Grande mm (Am/w), a800 ou menos, naporçãoentre (22°50'S, 42°10'W. 6 m alt.). localizada no centro do ArraialdoCaboeBúzios,declimasemi-árido CDVCF,evidenciandooelevadodéficithídrico(324mm), quente (Bsh) pela classificação de Kõppen com aevapotranspiraçãopotencial (ETP) (médiaanual (Barbiére 1984). Já a temperatura varia de 9o de 1244mm)superandoaprecipitação(médiaanualde a 35°C, com a média anual igual a 18°-23° C 920mm)emquasetodososmesesdoano(Fonte:Freitas etal.2005). (Bemardes 1952; Dantas et al. 2001; FIDERJ 1978). Ocorre uma estação seca curta a ecológicos ao longo do Pleistoceno resultou prolongada no inverno, amenizada em parte numa relativa diversidade de solos na região pelas frentes frias ocasionais e nas encostas, (Carvalho-Filho et al. 2000; Embrapa 1999). pela altitude, com déficit hídrico variando de OsArgissolos, de maiorocorrência na região, nuloamaisde300mm/ano(Freitasetal.2005) são constituídos por material mineral, com (Fig.2). Predominamventosdoquadrante NE, horizonte B textural com argila de atividade com a freqüência no verão superando 50%, baixa imediatamente abaixo do horizonte A, favorecidospelofortalecimentodaAltaPressão baixos teores de Fe,0,, com predomínio de do Atlântico Sul, enquanto os ventos S e SO caulinita na fração argila. São em geral são mais freqüentes no outono e inverno, profundos e bem drenados, relacionados a associados às frentes frias (Barbiére 1985). terrenoscristalinosesedimentosterciários,com Oclimapeculiardaregiãodeve-seauma teores variáveis de nutrientes. Incluem combinaçãodediversosfatores.Aprecipitação Argissolos Amarelo e Vermelho-Amarelo diminui gradualmente com o afastamento do distróficos, distribuídos na maior parte da topo da Serra do Mar em direção ao litoral e região, e eutróficos, ocupando as planícies e nosentidooeste-leste,devidoaomenorcontrole morros costeiros a leste. Os Latossolos são orográfico.Oefeitoprovocadopelaressurgência solos bem drenados de acidez elevada, com écondicionadopelabruscainflexãoquealinha baixa capacidade de troca de cátions (CTC) e de costa sofre na altura do Cabo Frio, pela uma baixa reserva mineralógica, devido à batimetria da plataforma continental e pelos intensaintemperizaçãodosmineraisprimários. constantes ventos NE, deslocando a massa Ocupam colinas e parte das encostasda Serra oceânica superficial aquecida e favorecendo do Mato Grosso, a oeste. a migração vertical de águas frias de Os Planossolos são solos minerais, subsuperfície,inibindoaformaçãodecúmulus geralmente hidromórficos, com seqüência de responsáveisporchuvasconvectivas(Barbiére horizontesA-Bt-C,caracterizadospormudança 1975;Turcqetal. 1999;Moreira-da-Silva 1973). texturalabrupta,horizonteBcomaltadensidade, A interação entre os diversos processos comaocorrênciadecoresdereduçãoevidenciando climáticos, geológicos, geomorfológicos e condiçãodedrenagem imperfeita, recobrindo Rodriguésia 60 (1): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ 13 14 15 16 17 lí VegetaçãoeusodosolonoCDVCF 7 áreas planas interiores. Gleissolos são solos Regolíticos apresentam um horizonte A minerais hidromórficos com horizonte glei assentado diretamente sobre o regolito. com superficial,poucoamedianamenteprofundos, horizonte C ou B incipiente pouco espesso, malou muitomaldrenados,periodicamenteou elevadosteoresdemineraisprimários,cascalhos permanentemente inundados,horizonteAcom ecalhausderochasemi-intemperizada,geralmente acumulação de matéria orgânica e coloração associados aos Cambissolos, ocupando escura,esequênciade horizontes AeCg,com encostas íngremes e topos de colinas. cores cinzentas, podendo ocorreracúmulo de Organossolos são solos com alto teorde sais na superfície. São solos moderado a matéria orgânica (> 0,2 kg/kg de solo), fortementeácidos,comteoresaltosou médios constituindo áreas de turfa relacionadas aos deAltrocável,distróficosoueutróficos,ocorrendo esporões internos da lagoa de Araruama e em depressões inundadas entre cordões, várzeas dorio SãoJoão, sujeitas à inundação. várzeaselagoasrasasperenesoutemporárias. Finalmente,ossolosindiscriminadosdemangue Espodossolossãosoloscomhorizonte B são pouco desenvolvidos, sem diferenciação podzolouespódicosubsuperficial,geralmente de horizontes, mal drenados, com baixa constituído de matériaorgânica, Al e Fe, com oxigenação e altos teores de sais e de profundidadevariável, imperfeitamente amal compostos de enxofre, desenvolvidos a partir drenado, textura arenosa, acumulação de de sedimentos fluviomarinhos recentes, húmus, ácido e de baixa fertilidade. O próximoàdesembocaduradorioSãoJoão,com Espodossolo Cárbico possui acúmulo de influênciadas marés. carbono orgânico e Al no horizonte Bh, enquanto que o Ferrocárbico Hidromórfico Mapeamento e classificação da Arênico possui maior acúmulo de Fe, cobertura vegetal permanecendo saturado em um ou mais Considerando o tamanho da área e a horizontes,ecomaltoteordematériaorgânica escalafinalde mapeamento,adisponibilidade (20-30%). Recobrem terrenos mais baixos de de dados espaciais temáticos e o objetivo do restingasujeitos a inundação. trabalho,foiadotadoumenfoqueholístico,com Cambissolos são pouco evoluídos, com oapoiodetecnologiasdesensoriamentoremoto horizonteBincipienteoucâmbico,rasosapouco e de sistemas de informações geográficas - profundos, moderadamente a bem drenados, SIG(Zonneveld 995).Adefiniçãodosistema 1 distróficos e eutróficos, estes situados declassificaçãofisionómico-estruturaladotado principalmentenaIlhadeCaboFrioenosmonos levou em conta os sistemas propostos para as costeiros entre Arraial do Cabo e Búzios. regiões tropicais, os mapeamentos realizados Neossolossãoconstituídospormaterial mineral no estado do Rio de Janeiro e a escala do pouco espesso, com ausência de horizonte B. mapa. O limite entre as florestas ombrófila e Neossolos Quartzarênicos são solos com estacionai foi determinado de acordo com a profundidadevariável,excessivamentearenoso, análise integrada de dadosclimáticos, relevo, ácido, álico ou distrófico, bem drenado, com soloseflonsticos,alémdeobservaçõesdecampo. alta lixiviação e baixa retenção de umidade, Estas foram separadas também conforme o constituindodunaseoutrasáreasarenosas. Os estágioderegeneração(inicial-médioeavançado). NeossolosFlúvicossãodesenvolvidosapartir A classificação do uso do solo refere-se de depósitos aluviais recentes, apresentando basicamenteàrelaçãoentreotipodecobertura estratificação de camadas e sequência de e os usos associados (IBGE 1999). horizontes do tipo A-C. eventualmente com Foram reunidos e armazenados através evidências de gleização em subsuperfície. do software ArcGIS 9.2, mapas digitais Ocorremnosmédioscursosdosrios,emgeral temáticos de geologia, geomorfologia, solos, associados aos Gleissolos. Já os Neossolos precipitação e bioclimático (Dantas et al. Rodriguésiu 60 (I): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ, 13 14 8 Bohrer, C. B.A. etal. 2000;EMBRAPA2003;Golfari&Moosmayer detalhamento da vegetação na região mais 1980). Foramsobrepostos inicialmenteostrês seca do CDV (Andrade et al. 2005). Para primeiros, resultando na compartimentação realçar a separação entre as classes de regional em unidades físicas de paisagem vegetaçãoúmidaeseca,foigeradoummodelo refletindo a interação entre estes fatores. lineardemistura,acompanhadodeumaanálise Foram armazenados ainda, além do mapa de decomponentesprincipais,quereduziuosdados vegetação do Projeto Radambrasil (1983), os espectrais para 3 bandas: respectivamente as mapasproduzidospeloProjetodeConservação “imagens-fração” solo, vegetação e sombra, e e Utilização Sustentável da Diversidade ostrêsprimeiroscomponentesprincipais. Biológica Brasileira- PROBIOeporAndrade Os três mapas de vegetação foram (2006), conforme metodologias descritas a sobrepostos a uma imagem Landsat TM de seguir. 2007, identificando-se os polígonos com O PROBIO mapeou naescala 1:250.000 eventuais discrepâncias de classificação, a cobertura e uso do solo e os remanescentes redelimitados e reclassificados através de da cobertura vegetal com base em cenas interpretação visual e sobrepostos ao mapa LandsatETMde2005,utilizandoosprogramas climáticos e de unidades de paisagem, Spring, PCI Orthoengine e eCognition. Foi verificando-se a existência de correlação realizada uma classificação supervisionada, espacialentreostiposdevegetaçãoeoambiente segundo uma abordagem top-clowiu em dois físico. O cruzamento resultou num mapa níveis de segmentação: o primeiro, restritoàs preliminardecoberturavegetaledeusodosolo, bandas do infravermelho próximo e médio, utilizado também para refinar o delineamento objetivandoaidentificaçãodeáreasdesombra dos limitesdoCDVCF(Araújo 1997). e corposd’água; eo segundo, incluindo todas A verificação de campo, com apoio de as bandas espectrais, exceto a do Azul, GPS, contribuiu para a caracterização dos embasandoodetalhamentodasdemaisclasses diferentestipos fisionômicoseoslimitesentre através de uma estrutura hierárquica, asclasses.Finalmente,foifeitaareinterpretação garantindoaherançaentreosdiferentesníveis. daimagem,comadelimitaçãofinaldospolígonos Asclassesdeummesmonívelforamdiferenciadas referentes às diferentes classes de cobertura. pormodelagemfuzzydediferentesdescritores, Resultados considerandoprincipalmentevaloresespectrais, comomédiaedesviopadrãodasbandas,brilho O mapa de vegetação potencial (Fig. 3) erazõesentrebandas.Estesmodelossepararam representa a interação entre cobertura vegetal grandes grupos, segundo a densidade da eoambientefísicodaregião,semainfluência cobertura vegetal e a resposta espectral, antrópica. Mostra a ocorrência da Floresta respondendo pela primeira divisão entre OmbrófilaDensanosterrenospré-cambrianos coberturasnaturaiseosdiferentestiposdeuso. e pleistocênicos, com Latossolos, Aigissolos, Finalmente, foram utilizados descritores Cambissolos e Neossolos flúvicos, topológicos,deformaetemáticos(geomorfologia, predominantemente distróficos, na porção solos), na identificação das diferentes centraleoestedaregião. AFlorestaEstacionai fisionomias (Cruz etal. 2007). ocorre do centro para o leste, em áreas com No mapa de Andrade (2006), realizado precipitaçãomédiainferiora 1000mmanuais, com o apoio dos programas Spring e IDRISI, sobre o mesmo tipo de terreno, além dos foram utilizadas todas as bandas (exceto a 6) tabuleiros terciários e morros alcalinos, com de imagem Landsat 7 ETM de 1999 (período Argissolos,Cambissolos,NeossolosRegolíticos seco). Foi realizada uma classificação com e Planossolos, geralmente eutróficos. As segmentaçãoporcrescimentoderegiões,com Formações Pioneiras ocupam as planícies os limiares de segmentação modificados'no arenosasdeorigemmarinha,incluindoterraços. Rodriguésia 60 (I): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ cm 13 14 15 16 17 18 .. >3 O W Vegetação 42°0‘ e uso do solo no CDVCF Figura3-MapadavegetaçãopotencialdaáreadeCDVCF. vO SciELO/JBRJ cm 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 .. 10 A Bohrer. C. B. elal. praias e campos de dunas, com Espodossolos maisplanasede menoraltitude, que facilitam e Neossolos Quartzarênicos; aluvial, com o uso agrícola e pecuário. Restam apenas depressões, várzeas e margens de lagunas fragmentos de pequeno porte de florestas cobertas por vegetação herbácea e em alguns secundárias, com predominância de espécies casosporflorestas,comGleissolos,Neossolos pioneirasesecundáriasiniciais(estágioinicial Flúvicos e Organossolos, e fluvio-marinha, a médio de regeneração). A formação constituídapormanguezais. submontana, também afetadapelaexploração Omapadevegetaçãoeusodosolo(Fig.4) madeireira,culturasdocafé, laranja, bananae mostraacoberturavegetalatualdoCDVCF,com pela pecuária, apresenta áreas de floresta aáreacobertaporcadaclassede mapeamento secundária e outras em estágio avançado de e a respectiva porcentagem em relação à área regeneração. A predominância de solos total do CDVCF apresentada na Tabela 1. A distróficos e os processos erosivos, aliados à fisionomia de cada classe, sua relação com o dificuldade de acesso e mecanização, e mais ambiente físico e as espécies dominantes ou recentemente,deummaiorrigornafiscalização, características são descritas a seguir. tornaram possível a regeneração natural, com a restauração de parte das características da Floresta Ombrófila Densa florestaoriginalnasáreasdemaiordeclividade, A floresta ombrófila densa é uma nas Serras do Mato Grosso e Palmital. vegetação com predominância de espécies Apesar da inexistência de estudos arbóreas perenes, sem proteção nas gemas florísticos e fitossociológicos locais, os foliares, geralmente formando um dossel resultados de estudos realizados em áreas espessoeestratificadodominandoporespécies relativamente próximas com ambientes macrofanerófitas, que atingem 20-35 m, semelhantes (Borém & Oliveira-Filho 2002; podendo ocorrer indivíduos emergentes, Guedes-Bruni et al. 2006; Lima et al. 2006; abundânciade pteridófitas, epífitase lianas, e Pessoa & Oliveira 2006), possibilitam uma presençade liquensnostroncos(Hueck 1972; visão aproximada da estrutura e composição Ururahy et al. 1983). O porte, a rapidez do florísticadaflorestadensa,indicandodiversidade desenvolvimentoeariquezadeespéciesestão (até 100-200 ou mais espécies arbóreas/ha) e relacionadoscom aocorrênciade um período área basal (20-50 m2/ha) relativamente altas. vegetativocontínuocomaltaumidadeecalor, Estesdados, aliados aobservações decampo, dando a origem a adaptações para aproveitar indicam a predominância de espécies das aluz,comofolhaslargas,arquiteturadascopas famílias Leguminosae (Inga, Piptadenia, e a presença de lianas e epífitas (Guariguata Parapiptadenia, Setma, Caesalpinea, & Kattan 2002). Machaerium), Rubiaceae (Psycliotria), As formações aluvial (depressões e Myrtaceae (Eugenia), Euphorbiaceae terraçoscomsolosaluviais),terrasbaixas(até CAlchornea), Moraceae (Cecropia, Ficits), 100 m) e submontana (> 100 m), recobriam a Melastomataceae Miconia Tibouchina), ( , porção central e oeste do CDVCF. Estes Meliaceae (Cedrella, Trichilia), Lauraceae limites altitudinais propostos podem ser (Ocotea), Lecythidaceae (Cariniana), referendados ou alterados através de Annonaceae (Xylopia) e Palmae (Attalea, levantamentos florísticos e estruturais locais Astrocaryum, Geonomá), entre outras. (Bohrer 1998; Moreno et al. 2003; Oliveira- Filho et al. 2005). As áreas anteriormente Floresta Estacionai Semidecidual ocupadas pelas formações aluvial e terras Vegetaçãosujeitaaduasestações,chuvosa baixas foram as mais afetadas pelo processo eseca.econdicionandoarespostadoselementos de ocupaçãodaregião, concentrado nasáreas arbóreos dominantes, com adaptações Rodriguésia 60 (1): 001-023. 2009 SciELO/JBRJ cm 13 14 ..