LUCIANE ANDREA DE OLIVEIRA ASPECTOS DA LITERATURA GÓTICA NA CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DA VAMPIRA CLÁUDIA EM ENTREVISTA COM O VAMPIRO: A SOMBRA DE MULHER EM UM CORPO DE CRIANÇA PROGRAMA DE MESTRADO EM LETRAS UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL-REI São João del-Rei 2016 Luciane Andrea de Oliveira ASPECTOS DA LITERATURA GÓTICA NA CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DA VAMPIRA CLÁUDIA EM ENTREVISTA COM O VAMPIRO: A SOMBRA DE MULHER EM UM CORPO DE CRIANÇA Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de São João del-Rei como requisitofinal para obtençãodotítulo deMestre em Letras. Área deConcentração: Teoria Literária eCríticada Cultura Linha dePesquisa: Literatura eMemóriaCultural Orientador: ProfessorDr. LuizManoel da SilvaOliveira PROGRAMADE PÓS-GRADUAÇÃOEM LETRAS: TEORIA LITERÁRIA E CRÍTICA DACULTURA SãoJoãodel-Rei 2016 Universidade Federal deSãoJoãodel-Rei –MG Programa dePós-Graduaçãoem Letras Área deConcentração:Teoria Literária eCríticada Cultura Linha de Pesquisa: Literatura eMemória Cultural ASPECTOSDALITERATURAGÓTICANACONSTRUÇÃOIDENTITÁRIADA VAMPIRACLÁUDIAEMENTREVISTACOMOVAMPIRO:ASOMBRADEMULHEREM UMCORPODECRIANÇA BANCAEXAMINADORA _______________________________________________ Prof.Dr.LuizManoeldaSilvaOliveira–UFSJ(Orientador) _______________________________________________ Prof.ª.Dra.LeilaAssumpçãoHarris–UERJ _______________________________________________ Prof.ª.Dra.MelissaGonçalvesBoëchat–UFSJ/UFVJM(Diamantina/MG) ________________________________________________ Prof.Dr.JoãoBarretodaFonseca(Suplente–UFSJ) PROGRAMADEPÓS-GRADUAÇÃOEMLETRAS TEORIALITERÁRIAECRÍTICADACULTURA 2016 Parameus pais: Josée Mercês,razões daminha vida. AGRADECIMENTOS ADeus. Ao professor Luiz Manoel, pela orientação e por ter acreditado em meu projeto de “tirar leitedepedras”.Obrigada, pelas conversas e pelaconfiança. Aos professores do Mestrado, por ajudarem na minha formação acadêmica. Em especial, àprofessora SuelyQuintana, pelaamizadee carinho. À FAPEMIG, pelo auxílio financeiro, sem o qual teria sido muito mais difícil a minha trajetória deestudo epesquisa. Ao meu pai, José Custódio (Zé Ricardo), e à minha mãe, Mercês, pela compreensão e paciência. Porsempre estarem natorcida, nosmomentos mais difíceis. ÀminhairmãMárcia e àminhasobrinhaVirgínia,pelo apoioconstante. Ao Guilherme Copati, minha alma “gêmola” literária! Obrigada, pela leitura minuciosa do meu trabalho, palpites, sugestões, conversas e incentivo constante nesse caminho acadêmico pelonosso gótico. Ao Richard Bertolin, pela amizade e cumplicidade. Por dividir o desespero e os momentos bons. Pelo bom humor e risadas. À diva Shirley Lewis, por sempre trazer alegriae transformarmomentos tensos nos mais engraçados À Camila Lelis, melhor companheira de estudos, amiga e confidente, que eu nem imaginava que seriatãoimportante em minhavida. Aos meus alunos e amigos das escolas Adílio José Borges e Cônego Osvaldo Lustosa, pelo carinho e amizade, pelas conversas inspiradoras. Ao Emerson, pelopalpitemusical (Iced Earth) epeloapoio. Ao amigo Cláudio da Costa, pela ajuda inusitada e imprescindível na elaboração dessa dissertação. RESUMO O objetivo principal desta dissertação de mestrado é oferecer uma possibilidade de leitura do romance da escritora estadunidense Anne Rice, Entrevista com o Vampiro, de 1976, comparando o romance original com a “graphic novel” Entrevista com o vampiro: a história de Cláudia (2015), também de sua autoria, priorizando um prisma de abordagem que, ao que parece, ainda não foi objeto de interesse dos estudos e pesquisas que até o momento já se desdobraram do referido romance: o processo de construção da identidade da vampira criança Cláudia. O romance focaliza a família incomum e sugestivamente homoafetiva formada por dois pais vampiros, Lestat e Louis, e a pequena Cláudia, filha deles, transformada em vampiro aos cinco anos de idade. O romance incorpora a principal característica do gótico literário tradicional, no que se refere ao poder patriarcal e ao silenciamento de vozes femininas, além de promover a sobrevivência do vampiro em um momento em que as produções literárias com esse tema estavam em franco declínio, o que fez essa obra se tornar referência e influência para escritores e escritoras do gênero. Cláudia é apresentada como uma novidade: tem uma breve vida como criança e torna-se mulher. Entretanto, é fadada a envelhecer em um corpo de criança, assumindo a natureza assassina de uma mulher vampira, ao mesmo tempo em que conserva a aparência de fragilidade infantil. Sendo assim, os paradoxo mulher/criança e anjo/monstro constituem mais que um simples estereótipo, mas um elemento importante para criar algo novo, no que se refere à identidade da vampira e ao seu empoderamento. Para a consecução da pesquisa, foram feitos estudos nas áreas do gótico, do novo gótico, dos Estudos Culturais e uma pequena incursão nos teorias feministas. Dentre os críticos e teóricos cujas ideias dão sustentação às presentes argumentações, destacam-se José Luiz Aidar e Márcia Maciel (1986), Martha Argel e Humberto Moura Neto (2008), Maria Beville (2009), Arturo Branco (2012), Thomas Bonnici (2007), Fred Botting (1996), Judith Butler (1990), Stuart Hall (2003), Linda Hutcheon (1991; 2013), Julia Kristeva (1982), J. Gordon Melton (1995), Maria da Conceição Monteiro (2004) e Catherine Spooner (2006), dentre outros. Este trabalho representa a necessidade de um aprofundamento analítico e uma nova visão sobre o gótico, englobando a inserção da figura empoderada da mulher, de forma geral, e de Cláudia, em especial, no mundo androcêntrico dos vampiros, a figura do mito do vampiro “moderno” e sua “repaginação” nos séculos XX e XXI, no que se refere à identidadee comportamentos dos indivíduos na contemporaneidade. Palavras-chave: literatura gótica; mito; criança/mulher vampira; empoderamento feminino. ABSTRACT The main aim of this Master’s thesis is to offer a new reading possibility to North- American writer Anne Rice’s novel Interview with the Vampire (1976), comparing the original novel with the graphic novel Interview with the vampire: the story of Claudia (2015), also of her authorship, focusing on a particular prism of approach, which, as it seems, has not yet been the research theme in most studies unfolding from the novel in question: the process of empowered identity construction of Claudia, the novel’s infantile female vampire. The novel focuses on an uncommon and prospectively queer family formed by two male vampires, Lestat and Louis, and their little daughter Claudia, changed into a vampire at the age of five. The novel fully embodies the main characteristics of the traditional literary gothic, as to the patriarchal power and domination, and the consequent silencing of female voices, besides promoting the survival of the vampire at a time in which the literary productions approaching such a thematic were facing an evident decline, which clearly contributed to make Rice’s novel become both a reference and a strong influence to both male and female writers of gothic and vampire stories. Claudia is presented as a promising novelty: she experiences a short life period as a human child, undergoes vampirization, and becomes a vampire woman. Nevertheless, she is doomed to enter adulthood still in a child’s body, thus assuming her killing nature, typical of a vampire woman, at the same time in which she still keeps the fragile and cute appearance of a five-year-old-girl. Consequently, the woman/child and the angel/monster binarisms assume a greater importance than that of mere stereotypes, as they seem to point to something wholly new, as far as the female vampire’s identity and empowerment process is concerned. To achieve the aims of the present research, studies on the gothic genre, the new gothic, and the Cultural Studies were necessary, as well as a short incursion into the realm of the feminist theories. Among the many critics and theorists whose ideas give the theoretical basis to the arguments here put forth, the following ones are outstanding: José Luiz Aidar and Márcia Maciel (1986), Martha Argel and Humberto Moura Neto (2008), Maria Beville (2009), Arturo Branco (2012), Thomas Bonnici (2007), Fred Botting (1996), Judith Butler (1990), Stuart Hall (2003), Linda Hutcheon (1991; 2013), Julia Kristeva (1982), J. Gordon Melton (1995), Maria da Conceição Monteiro (2004) and Catherine Spooner (2006). I do hope that the present academic work satisfies the need to go deeper into the analysis of a new view of the gothic which encompasses the following: the insertion of the empowered figure of women, as a whole, and that of Claudia, in particular, into the vampire’s androcentric world; the figure of the “modern” vampire, as well as his “repagination” in the 20th century, in what it all refers to the individuals’ identities and behaviourin contemporaneity. Key words:gothic literature; myth, child/woman vampire; feminineempowerment. LISTADE ILUSTRAÇÕES Figura 1.........................................................................................................................105 Figura 2.........................................................................................................................106 Figura 3.........................................................................................................................111 Figura 4.........................................................................................................................113 Figura 5.........................................................................................................................122 Figura 6.........................................................................................................................129 Figura 7.........................................................................................................................132 SUMÁRIO Introdução................................................................................................................... 10 Capítulo 1:O Nascimento doHorror ...................................................................... 15 1.1. Entrelendas e algumas verdades: osurgimento dovampiro ........................... 15 1.2. Vampiros reais esanguinários ......................................................................... 22 1.2.1 Elizabeth Bathory: ACondessa deSangue ...................................................... 23 1.2.2 Vlad Tepes: inspiraçãopara Drácula ............................................................... 25 1.3 Ovampiro naliteratura ................................................................................... 31 1.4 AFigura dovampiro consolidada nas mídias............................................... 40 1.4.1 OVampiro nos quadrinhos ............................................................................ 40 1.4.2 OVampiro natelevisão................................................................................. 44 1.4.3 OVampiro esua estreia nas telas de cinema ................................................. 45 Capítulo 2:O Gótico –Da Tradiçãoàs Nuances da Pós-Modernidade............. 56 2.1Construindoogótico ........................................................................................... 56 2.2OGótico contemporâneo e aspectos significativos dopós-modernismo............ 65 2.3Aescrita góticafeminina: consolidaçãoe amadorismos contemporâneos ......... 76 2.4Sobreogótico eos vampiros .............................................................................. 87 Capítulo 3: A Desestabilização Do Mundo Androcêntrico dos Vampiros com a Inserçãoda Vampira Cláudia........................................................................... 94 3.1Sobrevivências: repaginando omitodovampiro noelemento feminino ........... 94 3.2Adaptações e apropriações: os vampiros eas mídias ......................................... 100 3.3Ocorpofeminino: aprisionamento, subversãoeabjeção................................... 108 3.4Cláudia: presençaincômodaem formade sombrademulher ............................ 123 Considerações Finais.............................................................................................. 134 Referências............................................................................................................. 140 10 INTRODUÇÃO Há um mistério que envolve tanto o gótico literário quanto o mito do vampiro: como é possível que ambos tenham sobrevivido através dos séculos com tanto vigor? Tal questionamento nunca havia me perturbado no início de minha adolescência, quando comecei a ter contato com a temática mais fascinante que povoava minha imaginação e que eu mal sabia que iria se tornar um assunto sério, tanto como tema do meu trabalho de conclusão de curso na graduação em Letras, quanto o tópico principal dapresente dissertaçãode mestrado. Eu costumava reunir os amigos durante a tarde na minha casa para uma sessão de filmes B, aqueles de terror bem absurdos que muitos chamam de trash, assim como também frequentava a minúscula biblioteca municipal de Conceição da Barra de Minas, cidade também minúscula para a qual me mudei depois de viver toda a infância e parte da adolescência em São Paulo, onde timidamente havia tido contato com filmes de vampiros e raras publicações sobre esse mito. Naquela biblioteca, pude encontrar uma edição de luxo dos contos de Edgar Alan Poe, Drácula (de Bram Stoker) e vários exemplares das obras de Stephen King. Lia tudo avidamente, a ponto de quase esgotar todas as opções de terror que havia nas estantes. Isso foi aos poucos despertando meu interesse por um gênero até então desconhecido por mim. Infelizmente, durante meus estudos no Ensino Médio, nenhum professor havia me ensinado que aquilo que me fascinava tanto tinhaonomedeGótico. Tendo que lidar com o pouco incentivo cultural que uma pequena cidade interiorana como Conceição da Barra de Minas recebe, aprendi eu mesma a pesquisar fora dali por outras fontes literárias sobre o assunto. Às vezes, eu e um grande amigo costumávamos “remendar” alguns livros para que nossa leitura fosse de alguma forma mais agradável e para que outros possíveis leitores do gênero pudessem ter a felicidade de encontrar os livros em melhores condições. Um fato curioso é que, por eu ser considerada “meio estranha” na escola e na cidadezinha, pelo modo de me vestir e por meu gosto literário e musical, isso acabou me aproximando de alguns professores e de pessoas que se tornaram minhas amigas. Isso se refletia, também, na minha ficha da biblioteca. Esse grande amigo costumava garimpar livros esquecidos nas estantes mais afastadas e, em certo dia do ano de 1993, ao chegar à escola, ele me disse ter
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