INSTITUTO NACIONAL DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA Programa Nacional de Mestrado Profissional em Matemática - PROFMAT USO DE TRANSFORMAÇÕES GEOMÉTRICAS NA REVIGORAÇÃO DO ENSINO DE GEOMETRIA PLANA. por Demétrius Melo de Souza Orientador: Mestre Eduardo Wagner RIO DE JANEIRO 2014 INSTITUTO NACIONAL DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA Programa Nacional de Mestrado Profissional em Matemática - PROFMAT USO DE TRANSFORMAÇÕES GEOMÉTRICAS NA REVIGORAÇÃO DO ENSINO DE GEOMETRIA PLANA. por Demétrius Melo de Souza Orientador: Mestre Eduardo Wagner Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada, para obtenção do título de Mestre pelo Programa nacional de Mestrado profissional em Matemática - PROFMAT. RIO DE JANEIRO 2014 "Quem não souber geometria, não entre." Inscrição na entrada da Academia de Platão 387 AC.(possivelmente só uma lenda). 3 Agradecimentos A Isaak Moiseevitch Yaglom. À Profª Arilene (1ª à 3ª séries primárias) e à Profª Celene, de Língua Portuguesa, ginásio, ambas da Escola Municipal Leônidas Sobrinho Pôrto, em Bangu. Ao Prof. Paulo Nobre (turma de oficiais-alunos - Tamandaré, 1988). Ao saudoso Prof. Augusto César Morgado e ao Prof. Eduardo Wagner, com cujos livros me iniciei e me apaixonei pela Geometria. Ao Prof. Flávio Dickstein, ao Prof. Felipe Acker e ao Prof. Rolci Cipolatti. Todos do Instituto de Matemática da UFRJ. A maior parte dos citados sequer tem ideia da importância que tiveram em minha vida e em minhas escolhas. Ao meu pai e à minha mãe. 4 Resumo SOUZA, Demétrius Melo de. Uso de Transformações Geométricas na Revigoração do Ensino de Geometria Plana. Trabalho de fim de curso para obtenção do título de Mestre; orientador: Mestre Eduardo Wagner. PROFMAT, IMPA, 2004. Este trabalho faz uma reflexão sobre o que de fato estudamos - ou deveríamos estudar - em geometria plana nas escolas primária e secundária (níveis Fundamental e Médio), no Brasil. Incentiva o uso de isometrias como ferramentas para auxiliar os alunos na tarefa de atingir os níveis mais elevados de abstração matemática. A abordagem é guiada por Isaak Moiseevitch Yaglom, nos seus volumes de Transformações Geométricas I e II ([1] e [2]) para o ensino e aprendizado de Geometria Euclideana Plana. São resolvidos uma série de problemas com diferentes graus de complexidade - alguns inéditos, outros amplamente conhecidos - fazendo uso das ferramentas abordadas, quais sejam: a Translação, a Rotação e a Reflexão. As resoluções foram desenhadas com o software Geogebra e animadas, em seguida, resultando em vídeos que poderão ser utilizados para difundir o conhecimento entre professores e, por estes, para ensinar seus alunos. Propõe a utilização de materiais e metodologias alternativas, assim como uma possível resposta para a pergunta: "Por que ensinar - ou aprender - Geometria?". 5 Abstract This work is a reflection on what we actually study - or should do - in plane geometry in primary and secondary schools in Brazil. Encourages the use of iso- metries as tools to assist students in the task of achieving the highest levels of mathematical abstraction. The approach is guided by Isaak Moiseevitch Yaglom in his volumes of Geometric Transformations I and II ([1] and [2]) for the teaching and learning of Plane Euclidean Geometry. Namely, a series of problems varying degrees of complexity are solved - some unpublished, some widely known - mak- ing use of the tools discussed such as : Translation, Rotation and Reflection. Solu- tions were drawn with Geogebra (software) and animated, then, resulting in video files that can be used to raise awareness among teachers and, through these, to teach their students. The use of alternative materials and methodologies are pro- posed, as well as a possible answer to the question: "Why teach - or learn - Geo- metry?". 6 Sumário 1 Introdução ..................................................................................................................................8 1.1 Quais são os objetivos deste trabalho? ............................................................................... 12 1.2 Quais não são os objetivos deste trabalho? ........................................................................ 14 1.3 Metodologia e apresentação .............................................................................................. 15 2 Apresentando o Método ........................................................................................................... 18 2.1 Começando pelo problema resolvido ................................................................................. 18 2.2 Movimentos Rígidos no Plano (e fora dele) ......................................................................... 18 2.2.1 Translação ................................................................................................................... 19 2.2.2 Rotação ....................................................................................................................... 24 2.2.3 Reflexão (ou simetria) com relação a uma reta ............................................................ 34 3 Questões Resolvidas ................................................................................................................. 44 3.1 Demonstrações (quase) visuais ........................................................................................... 44 3.2 Questões que envolvem (muitas) contas ............................................................................ 61 4 Formalização de Conceitos ........................................................................................................ 79 4.0 Transformações e Classes de Equivalência .......................................................................... 79 4.1 Translação .......................................................................................................................... 83 4.2 Rotação .............................................................................................................................. 85 4.3 Composição de transformações.......................................................................................... 94 5 Abordando o assunto ................................................................................................................ 99 5.1 O que é? O que não é? ..................................................................................................... 100 5.2 Sugestões de materiais e metodologia para uso em sala de aula. ..................................... 101 6 Afinal, por que ensinar Geometria? ......................................................................................... 105 O que é Geometria? (Segundo Isaak Moiseevitch Yaglom) ......................................................... 110 Tradução ................................................................................................................................ 110 Notações e Convenções Utilizadas ............................................................................................. 117 Recursos Utilizados .................................................................................................................... 118 Bibliografia ................................................................................................................................ 123 7 1 Introdução A educação (em especial, a educação matemática) passou por grandes mudanças na últimas décadas. Um dos pontos altos de toda esta revolução certamente foi a era do “prova não prova nada” (que, na verdade, deveria ter sido entendido com “prova não prova tudo”) e que culminou com a panaceia da aprovação automática na maior parte das escolas da rede pública de níveis Fundamental e Médio do Brasil1. Os efeitos negativos destas novidades didáticas foram sentidos sobremaneira pela população mais carente, mantendo analfabetizada2 toda uma geração, com implicações econômicas, sociais e culturais ainda difíceis de mensurar. A matemática, por ser uma das disciplinas do núcleo comum, não passou ilesa por todas estas transformações. Uma das grandes mudanças certamente foi a aparentemente permanente execração do "Calcule x". A escola deixou de focar o ensino no tecnicismo algébrico e passou a valorizar mais a contextualização, ou melhor, a aplicação da matemática no cotidiano e nas ciências que se relacionam de alguma forma com o dia a dia do aluno e da sociedade em que ele se encontra inserido. Este movimento provocou uma reformulação quase radical na forma - e até no teor - como os conteúdos passaram a ser ministrados. Dentre os efeitos promissores, destaca-se a busca por respostas - antes solenemente ignoradas - para perguntas como "por que estamos aprendendo isso?". Já como efeitos retrógrados, convém citar a quase extinção – salvo em escolas mais tradicionais ou de excelência - de disciplinas como a álgebra básica 1 Uma rápida, porém muito lúcida discussão sobre o tema da aprovação (ou progressão) automática pode ser encontrada em DEMO [5] e [8]. 2 O que afirmei, eu o fiz baseado em minha experiência de décadas de magistério e, ainda, enquanto cidadão politizado. O fato da sociedade hoje repudiar a aprovação automática já é uma evidência bastante forte de que os efeitos deste "projeto político-pedagógico" foram desastrosos. Há, entretanto, uma vasta gama de materiais acadêmicos sobre o assunto, entre os quais posso citar FERREIRA [12] e VIÉGAS [13]. 8 e a geometria plana, ensinadas no curso Fundamental. Como o foco passou a ser a contextualização com o cotidiano, não foi nada fácil de se encontrar aplicação simples e imediata no dia a dia comum para coisas como fatoração de polinômios e a maior parte dos problemas resolvidos num curso convencional de Geometria Plana. Apenas como digressão, talvez não tenha havido tempo ainda para que a sociedade entenda que algumas - na verdade, muitas - ferramentas matemáticas possuem seu escopo de aplicação quase que exclusivamente na própria matemática. Tolher os alunos do domínio destas ferramentas fará com que o domínio de outras, com aplicabilidade mais óbvia mas que tenham como pré- requisito aquelas ferramentas, seja quase que impossibilitado. A rigor, o ensino de Geometria já estava bastante deficiente, mesmo antes da década de 90, sobretudo nas escolas públicas brasileiras, por conta de outros fatores que se sobrepunham uns aos outros por décadas, sendo o principal deles, talvez, a incapacidade de alunos e professores de lidarem com o conteúdo na forma proposta. No que tange aos alunos, ressaltam-se a carência de pré- requisitos técnicos para manipulação das equações e expressões algébricas utilizadas e o fato de normalmente o material didático, assim como a metodologia utilizada pelo professor, não estarem em sintonia com o grau de abstração acessível aos alunos em classe. Segundo o modelo de Van Hiele, a comunicação fica muito prejudicada se as partes se encontram em níveis distintos de abstração (propriedade da separação, em USISKIN [9] p. 5). Com relação aos professores, uma parcela considerável ainda não domina - ou não se sente à vontade em lecionar - o conteúdo presente nos livros didáticos (PAVANELLO [6] pag. 8 a 10), o que pode ser visto como resultado da falha na condução do conteúdo enquanto estes mestres eram alunos, gerando um mecanismo de feedback negativo. Em outras palavras, este ciclo vicioso começa quando o aluno não aprende e, portanto, conclui que não gosta da matéria. O curso de licenciatura, por sua vez, em geral, não consegue mudar a sua forma de encarar a realidade e ele acaba entrando em sala de aula ainda com a forma de enxergar a Geometria consolidada na adolescência, o que faz com que ele se esquive de ensinar (e aprender) a disciplina fabricando, assim, mais alunos refratários à matéria. 9 Não é de todo absurdo inferir que, mais do que simplesmente não saber "para que serve a Geometria", o método utilizado pela escola limitando-se - não raro - ao emprego imediato de fórmulas e à algebrização de problemas3 é uma das razões, se não a principal delas, para declínio do ensino da Geometria. E com relação a este declínio, há boas razões para acreditar que este efeito de aniquilação da Geometria não é uma particularidade do Brasil. WHITELEY [11] exibe estatísticas que indicam clara queda da produção científica na área, da quantidade de professores dedicados à disciplina e do porcentual da carga horária dedicado à Geometria tanto nos cursos de Graduação quanto no Nível Médio na América do Norte ao longo do século XX. O texto também sugere, como já foi feito aqui, que estes fatores não ocorrem isoladamente, mas se interferem e se acentuam - em ressonância - para, ao longo de gerações, chegarmos ao quadro que se apresenta hoje para a sociedade. Um ponto importante a se questionar é: isso é importante? Ou seja, será que este abandono do ensino da Geometria - como milenarmente tem sido ministrado - não é bom para a Escola do nosso mundo globalizado? Na verdade, perguntar isso é quase o mesmo que perguntar "por que estudamos Geometria?". Este caminho continuará a ser seguido ao longo dos próximos parágrafos até o fim deste trabalho. Mas, de antemão, é possível ressaltar que há algumas razões - que não serão tratadas com profundidade neste texto - que denunciam de forma bastante contundente a importância do ensino de Geometria, pelo menos no nível Fundamental. Entre elas, o aprimoramento de habilidades ligadas a: representação e medição do espaço (físico ou não), visualização espacial (noções de profundidade e perspectiva), compreensão e elaboração de esquemas e diagramas (pensamento visual), investigação, experimentação, ordenação, classificação, criatividade4. 3 O foco do problema é resolver uma equação. Problemas assim são encontrados facilmente em coleções de matemática no Brasil. Por exemplo, duas retas se intersectam em um ponto e são mostrados dois ângulos (opostos pelo vértice), um deles vale 2x+60, o outro vale 3x+30. Pede-se os valores dos ângulos. 4 Muito já foi escrito sobre as habilidades desenvolvidas pela Geometria com crianças. Convém citar SOARES ([7] p. 49 a 52), WHITELEY ([11] p. 7 e 8). Muitas destas habilidades - sobretudo as que lidam com aspecto concreto e descritivo da disciplina - podem ser desenvolvidas também através de outras atividades, como a dança, a pintura etc. Por conta disso, e pelo fato deste trabalho 10
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