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Imigrantes altamente qualificados em Portugal PDF

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MARQUES, José Carlos e GÓIS, Pedro (2008), “Imigrantes altamente qualificados em Portugal: uma tipologia”, in PEIXOTO, João (org.), Revista Migrações - Número Temático Imigração e Mercado de Trabalho, Abril 2008, n.º 2, Lisboa: ACIDI, pp. 73-94 Imigrantes altamente qualificados em Portugal: uma tipologia Highly-skilled immigrants in Portugal: a typology José Carlos Marques* e Pedro Góis** Resumo A imigração altamente qualificada em Portugal é uma realida- de antiga e multidimensional que tem vindo a tornar-se mais complexa nos últimos anos e que apresenta uma elevada di- versidade interna. Neste artigo apresenta-se uma análise desta componente específica da imigração portuguesa e explicitam- se as suas modalidades de inserção num mercado de traba- lho português que se caracteriza como segmentado. Através da construção de uma tipologia propõe-se uma explicitação conceptual para a análise da imigração que apresenta eleva- dos níveis de qualificação escolar, esteja ou não enquadrada em empregos compatíveis com essas habilitações. Identifica- se a existência de três grupos bem definidos de imigrantes al- tamente qualificados em Portugal: 1) grupo de indivíduos que migraram para Portugal sem constrangimentos e que exercem funções correspondentes às suas qualificações (normalmente ligados a empresas transnacionais); 2) grupo de indivíduos que migraram para Portugal de forma independente e se encontram a trabalhar no segmento secundário; 3) grupo de indivíduos que adquiriram parte da sua formação em Portugal e trabalham no mercado de trabalho português. Através de uma análise des- critiva de cada um dos tipos apresentados caracterizam-se as suas diferentes dinâmicas e especificidades. Palavras-chave imigração, altamente qualificados, mercado de trabalho, tipo- logia. Abstract Highly-skilled immigration in Portugal is a long-standing and multi-dimensional reality that has become more complex du- ring recent years, and has shown a greater internal diversity. In this paper, an analysis of this specific component of Portu- guese immigration is presented, setting out modes of insertion into a Portuguese labour market that is characterised as seg- * Sociólogo, Universidade Católica Portuguesa (Viseu) e Centro de Estudos Sociais da Univer- sidade de Coimbra / Sociologist, Portuguese Catholic University (Viseu) and Centre of Social Studies at the University of Coimbra. ** Sociólogo, Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra / Sociologist, Faculty of Fine Arts at the University of Oporto and Centre of Social Studies at the University of Coimbra. Migrações _ #2 _ Abril 2008 73 mented. Through the construction of a typology, a conceptual explanation is proposed for the analysis of an immigration flow that presents increased levels of schooling, whether or not the immigrants find themselves in employment commensurate with these qualifications. The existence of three well-defined groups of highly-skilled immigrants in Portugal is identified: 1) the group of individuals who migrated to Portugal without restrictions and who exercise functions corresponding to their qualifications (normally linked to transnational companies); 2) the group of individuals who migrated to Portugal indepen- dently and find themselves working in the secondary sector; 3) the group of individuals who received part of their education in Portugal and work in the Portuguese labour market. By means of a descriptive analysis of each of these types, their various dynamics and specificities are characterised. Keywords immigration, highly-skilled, labour market, typology. 74 Imigração e Mercado de Trabalho Imigrantes altamente qualificados em Portugal: uma tipologia1 José Carlos Marques e Pedro Góis Introdução A imigração em Portugal só a partir de meados dos anos 80 do século passado é que conheceu, à semelhança do registado noutros países do Sul da Europa, um aumento significativo e subsequente transformação em objecto de análise. Os estudos e os debates produzidos desde esse momento em torno da população imigrante têm prestado especial atenção aos imigrantes portadores de poucas ou nenhumas qualificações que se têm inserido no mercado de trabalho secun- dário. O estudo da inserção laboral e da mobilidade profissional de imigrantes altamente qualificados tem constituído, por seu turno, uma dimensão frequen- temente negligenciada nesta análise. Trata-se, contudo, de uma realidade antiga e multidimensional que tem vindo a tornar-se mais complexa em anos recentes, seguindo a evolução da realidade das migrações internacionais à semelhança do que tem acontecido em outros países de imigração. A imigração de profissionais altamente qualificados tem evoluído paralelamente à evolução da economia portuguesa, acompanhando o processo de internaciona- lização das empresas nacionais e a crescente abertura das empresas ao capital estrangeiro, mas, ao mesmo tempo, tem seguido outras direcções, alargando-se quer no que diz respeito ao volume, quer ao tipo de imigrantes altamente qualifi- cados que se dirigem ao mercado de trabalho português. Em termos históricos, os imigrantes altamente qualificados são, desde há muitas décadas (ou mesmo séculos), uma constante na história portuguesa. São várias as personagens de origem estrangeira que exerceram no país profissões alta- mente qualificadas, da joalharia às artes plásticas, da arquitectura ao comércio, da gestão empresarial à docência no ensino superior. Em anos recentes, e de forma cada vez mais pronunciada a partir dos anos 80 do século XX, coincidindo em grande parte com a adesão do país à então Comunidade Económica Europeia (CEE), Portugal começa a atrair profissionais altamente qualificados para um mercado de trabalho com necessidades específicas. Os exemplos dos dentistas brasileiros nos anos 80/90, ou dos profissionais de marketing e profissionais de saúde desde os anos 90, são elucidativos e estão bem documentados (Machado, 2000; Peixoto, 2001 e 2004; Santos, 2002). De igual modo, são conhecidas migra- ções de altos quadros de empresas, em especial de empresas multinacionais, que por esta época investem em Portugal. Estes quadros de topo de indústrias exportadoras, do sector automóvel ou de componentes, da banca ou de empresas de consultadoria, instalam-se em Portugal de forma (quase) imperceptível para Migrações _ #2 _ Abril 2008 75 a generalidade da população portuguesa e têm sido pouco estudados. Muitos destes imigrantes são tipicamente transmigrantes, ou o que poderíamos chamar de quadros empresariais globais, percorrendo sucessivamente vários países ao longo da sua carreira profissional. Os trabalhos de João Peixoto permitiram desvendar um pouco esta realidade so- bretudo no que diz respeito aos quadros de empresa europeus (Peixoto, 1998). Este autor oferece um retrato de uma imigração ainda numericamente incipiente mas em que já se adivinhavam os seus principais traços: uma migração depen- dente dos laços históricos ou culturais do país, ou das estratégias internas das empresas multinacionais que se vão instalando no país, e assente em processos não unidireccionais em que a circulação entre diversos países de acolhimento constitui um elemento determinante de progressão na carreira profissional. De alguma forma os trabalhos de João Peixoto permitem assinalar a entrada de Por- tugal no sistema migratório global no que aos quadros de empresa diz respeito. A posição que Portugal vai ocupar neste sistema é, como seria de esperar, es- truturalmente consistente com a sua posição semi-periférica na economia glo- bal. Esta posição de Portugal na Europa e no Mundo é acompanhada, a um nível mais regional, por uma progressiva e sucessiva integração ibérica, marcada pela circulação de quadros num mesmo mercado peninsular empresarialmente in- ternalizado. A entrada de profissionais altamente qualificados nos anos 80/90 corresponde, simultaneamente, a duas lógicas complementares: primeiro, a crescente imigra- ção de quadros espanhóis para Portugal é consentânea com um processo de ibe- rização dos mercados. Segundo, a migração de quadros de empresas e de outros imigrantes altamente qualificados resulta da posição semi-periférica do país e da capacidade daí resultante de atrair imigrantes qualificados quer dos países cen- trais (frequentemente de forma temporária e em que Portugal representa ape- nas uma fase intermédia nas suas carreiras globais), quer dos países periféricos. João Peixoto (1994, 1996a, 1996b, 1998) nos seus trabalhos “foca, entre outros as- pectos, as formas de entrada, motivações e experiência migratória em Portugal, nomeadamente das empresas multi/transnacionais, pelo que nos permite um número significativo de comparações entre este subconjunto privilegiado da po- pulação imigrante e os restantes imigrantes” (Baganha e Góis, 1998/1999: 262). A nosso ver, a imigração de indivíduos altamente qualificados era nos anos 90 ainda um fenómeno emergente que, grosso modo, reproduzia as características gerais da imigração portuguesa, designadamente quanto às regiões de origem, isto é, Portugal recebia imigrantes altamente qualificados com origem ou na Europa ou nos países de língua portuguesa, com preponderância do Brasil. No início dos anos 90, verificou-se em Portugal um fluxo migratório de tipo di- verso do acabado de referir, uma imigração de indivíduos altamente qualifica- 76 Imigração e Mercado de Trabalho dos, cientistas ou académicos da Europa do Leste que, após a queda do muro de Berlim, integraram as universidades e centros de investigação avançada, em regime de complementaridade com os especialistas nacionais. As mais jovens Universidades portuguesas (e.g. Universidade da Beira Interior, Universidade do Algarve, etc.) souberam aproveitar estes docentes altamente qualificados para estruturarem novas áreas de saber, deficitárias no país, designadamente nas áreas das Ciências Físicas ou das Ciências Naturais. Embora o seu número não fosse muito significativo, este tipo de imigrantes altamente qualificados fez mais do que acrescentar diversidade às migrações em Portugal. Muitos destes imigrantes formaram o grupo dos pioneiros que permitiram colocar Portugal no mapa dos destinos migratórios com origem na Europa de Leste. Também este tipo de imigrantes foi pouco estudado e, portanto, dele temos um conhecimento apenas superficial. No seu conjunto, estes tipos específicos de fluxo migratório, numericamente pou- co significativos, em contraponto com uma imigração semi-qualificada ou des- qualificada, permitiram a alguns autores conceptualizar a imigração laboral para Portugal nos finais dos anos 90 como sendo polarizada, isto é, capaz de atrair imigrantes para os segmentos de topo do mercado de trabalho e, em simultâneo, atrair um número considerável de trabalhadores pouco ou nada qualificados para os segmentos profissionais de base (Baganha e Peixoto, 1997). Tratava-se de uma polarização desequilibrada com uma preponderância esmagadora de imigrantes pouco ou nada qualificados e alguns, escassos, imigrantes altamente qualificados que laboravam em sectores e empregos correspondentes às suas qualificações. Desde o final dos anos 90 a realidade portuguesa da imigração altamente qua- lificada alterou-se significativamente, complexificando as possíveis análises. Por um lado, com a internacionalização da economia portuguesa, o acesso a um mercado externo de recrutamento cada vez mais global acentuou-se. Através de uma colocação ou destacamento no âmbito de estratégias internas às empre- sas, ou através do recurso a empresas de executive search ou head hunting, a internacionalização das empresas portuguesas (ou a sua aquisição por parte de grandes grupos internacionais) implicou a vinda para Portugal de um número indefinido mas significativo de quadros altamente qualificados. O recrutamen- to externo passou a fazer parte das estratégias de algumas das empresas mais internacionalizadas. Por outro lado, o alargamento do mercado interno de recru- tamento, por via do aumento da qualificação dos recursos humanos disponíveis em Portugal, ou da chegada espontânea de profissionais altamente qualificados, implicou que a base de recrutamento potencial se tenha, também ela, alargado exponencialmente. Deste modo, a procura e a oferta de recursos qualificados convergem para o de- senvolvimento de uma complexa dinâmica migratória que se faz sentir de forma Migrações _ #2 _ Abril 2008 77 diferenciada nos vários segmentos da população imigrante ao longo da última década. Se é certo que as dinâmicas de polarização da imigração em Portugal se mantêm, recrutam-se igualmente profissionais altamente qualificados – que estão disponíveis no mercado interno de recrutamento ou que a ele acedem – para profissões que não aproveitam essas qualificações. Este novo fenómeno de saturação de oferta de altamente qualificados em alguns sectores ou profissões vai gerar mudanças ao nível da própria estrutura do mercado de trabalho em Por- tugal. Muitos imigrantes altamente qualificados (e também muitos autóctones) vêem-se obrigados a aceitar trabalhos onde as suas qualificações não são utiliza- das, dando lugar a um processo de desqualificação profissional (deskilling). Esta nova realidade atinge transversal e de forma geralmente não discriminatória tan- to imigrantes como autóctones e mais não é do que o resultado de uma desade- quação entre a oferta e a procura de recursos humanos altamente qualificados. Mais especificamente corresponderá não a uma desadequação quantitativa, mas a uma desadequação qualitativa, isto é, o tipo e especialidades de qualificações oferecidas não correspondem, na maioria dos casos, às necessidades específicas do mercado de trabalho nacional. Este processo conduz, em última análise, ao subaproveitamento por parte das empresas ou do Estado das qualificações dos imigrantes, representando, assim, um exemplo claro de desperdício de capital humano ou de brain waste. Aos fluxos migratórios referidos, há a acrescentar um tipo de movimento que, apesar de frequentemente não ser inicialmente de carácter laboral, assume, com o prolongamento da estadia do indivíduo em território nacional, alguma relevân- cia para segmentos específicos do mercado de trabalho nacional. Referimo-nos aos estudantes que chegam a Portugal com o intuito de obter uma formação de nível superior e que após terminada essa formação não regressam aos seus paí- ses de origem. Esta realidade, que pode ser definida a partir dos países de origem como uma componente de brain drain (cf. OECD, 2006), assenta na formação pro- fissional e académica dos imigrantes e na sua posterior incorporação no merca- do de trabalho português, muitas vezes, porém, nos seus segmentos inferiores. Estes imigrantes acabam por contribuir para colmatar algumas lacunas do mer- cado de trabalho nacional, quer no decurso da sua formação através da inserção em empregos do tipo MacJobs, quer, após a conclusão da sua formação, pela inserção no mercado secundário de trabalho. A prossecução e o prolongamento destas estratégias de inclusão no mercado de trabalho nacional contribuem para o não aproveitamento das qualificações obtidas, nem pelo mercado de trabalho português, nem pelo mercado de trabalho do país de origem. Este último caso tem como consequência a manutenção das necessidades de profissionais quali- ficados nos países de origem. 78 Imigração e Mercado de Trabalho Imigrantes qualificados em Portugal: uma proposta de tipologia Do descrito atrás resulta que a imigração qualificada em Portugal se encontra, assim, marcada por uma situação paradoxal: ao mesmo tempo que existe um recrutamento de indivíduos altamente qualificados para o exercício de profissões para as quais estão habilitados, existe o recrutamento de indivíduos altamente qualificados para o exercício de profissões em que essas qualificações não são aproveitadas. Trata-se de uma situação que, apesar de não ser exclusiva de Por- tugal, merece um tratamento aturado se atendermos ao debate actual em torno dos movimentos migratórios, em que o recrutamento de profissionais altamente qualificados ressurge como parte do discurso sobre políticas migratórias, e em que estes profissionais são vistos como um recurso importante no desenvolvi- mento das economias dos países da União Europeia.2 Da breve descrição realizada pode concluir-se que, em Portugal, estamos pe- rante um grupo heterogéneo de imigrantes qualificados com diferentes motiva- ções migratórias, padrões de mobilidade específicos e variações relevantes no processo de inclusão no mercado de trabalho nacional. Trata-se de imigrantes que, apesar de apresentarem níveis de qualificação semelhantes, são objecto de tratamento diferencial por parte da sociedade de acolhimento em resultado dos seus processos migratórios específicos e da procura de realização de oportuni- dades de inclusão em distintos sistemas funcionais e nas suas organizações.3 A centralidade da (re)acção da sociedade nacional na constituição de segmentos distintos de imigrantes qualificados torna adequado apresentar a situação na- cional a partir de uma distinção tipológica cujo principal critério de classificação assenta na forma como os diferentes sistemas funcionais do país avaliam e valo- rizam as qualificações académicas apresentadas pelos vários grupos de imigran- tes, originando, deste modo, diferenças importantes no processo de inclusão dos imigrantes no mercado de trabalho nacional. À semelhança de outras tipologias de migrações qualificadas (e das tipologias em geral), a tipologia proposta neste artigo constitui um procedimento de redução da complexidade da migração qualificada. Ao proceder através do estabelecimento de uma distinção, ou conjunto de distinções, entre as diversas características dos imigrantes qualificados, a tipologia proposta representa uma descrição das dife- renças e similitudes entre este grupo de imigrantes.4 Ao optar por construir a presente tipologia a partir da forma como a sociedade de acolhimento (e, em especial, o mercado de trabalho) valida de forma nacional- mente diferenciada as competências e formações académicas e profissionais dos imigrantes qualificados, não se ignora a influência de outros processos sobre a posição dos diferentes grupos de imigrantes no mercado de trabalho português.5 Mas acentua-se um aspecto que tem estado relativamente ausente dos estudos Migrações _ #2 _ Abril 2008 79 sobre os imigrantes altamente qualificados e sobre a sua inserção nos mercados de trabalho e nas sociedades de acolhimento, a saber: a forma como um mesmo Estado cauciona ou admite, através de um mecanismo directo ou indirecto (e, por vezes, de forma não pretendida, ou contrária ao inicialmente intentado), as possibilidades de inserção dos imigrantes nos diferentes sistemas funcionais da sociedade portuguesa. Ou seja, é realçado o facto de o Estado e as ordens profis- sionais representativas dos diferentes grupos profissionais utilizarem o seu po- der de definir o que são consideradas formações e competências legítimas para o exercício de determinada função para incluir ou excluir imigrantes altamente qualificados de acordo com a origem geográfica da sua procedência.6 A relevância do contexto e da atitude do país de acolhimento para a análise dos processos de inclusão/exclusão dos imigrantes nos mercados de trabalho dos pa- íses de acolhimento foi já sugerida por Portes e Böröcz (1989), ao proporem uma “tipologia dos modos de incorporação dos migrantes contemporâneos nos países avançados” (1989: 620).7 Trata-se de uma proposta de tipificação que, apesar das suas vantagens para avaliar a forma como o Estado (e o mercado) acolhe dife- rentes grupos de imigrantes, parece estar concebida de forma demasiado rígida, não tomando devidamente em consideração a possibilidade de migrantes com qualificações semelhantes serem objecto de distintos contextos de recepção, que originam discrepâncias importantes nos modos de participação dos imigrantes nos vários sistemas funcionais da sociedade de acolhimento. De modo a obviar a esta limitação julgamos necessário recorrer a uma defini- ção ampla de imigrantes qualificados que inclua quer os que são explicitamente recrutados por empresas portuguesas ou multinacionais, ou que se dirigem de forma independente para Portugal, para suprirem carências em determinadas profissões ou funções adequadas à sua formação/experiência, quer os que apre- sentam tipos semelhantes de formação/experiência mas se encontram a tra- balhar em actividades dissociadas da sua qualificação. Em termos operacionais tal significa a conjugação de informações relativas à profissão exercida pelos imigrantes e, em categorias específicas de imigrantes, às suas habilitações académicas. Acre- ditamos que este procedimento, apesar de não se encontrar isento de dificuldades,8 permite responder ao problema de somente uma proporção reduzida dos imigran- tes portadores de elevado nível de habilitações se encontrar activa em profissões do designado mercado de trabalho primário e uma parte substancial dos imigrantes qualificados se encontrar a laborar no mercado de trabalho secundário. De forma sintética, os imigrantes qualificados em Portugal podem ser diferencia- dos nos seguintes tipos (cf., também, Tabela 1): a) imigrantes altamente qualificados que migram para Portugal (de forma independente ou institucionalmente enquadrados) para aí exercerem pro- 80 Imigração e Mercado de Trabalho fissões no segmento primário do mercado de trabalho. Denominaremos estes “migrantes altamente qualificados funcionalmente legitimados”; b) imigrantes altamente qualificados que migram para Portugal de forma independente (ou enquadrados por entidades no seio de uma indústria das migrações) e que vão laborar no segmento secundário do mercado de trabalho. Denominaremos estes “migrantes altamente qualificados fun- cionalmente ilegitimados”; c) imigrantes que adquirem uma formação superior em Portugal e que aqui laboram após a obtenção dessa formação (e tanto o podem fazer no seg- mento primário como no segmento secundário do mercado de trabalho). Denominaremos estes “migrantes internamente qualificados”. Tabela 1 - Tipologia dos imigrantes qualificados em Portugal Oportunidade de Posição no mer- Principais Tipo de Imigrante Conceitos impli- inclusão que pro- cado de trabalho nacionalidades qualificado cados curou realizar nacional representadas Mercado de europeus / Brain gain Funcionalmente trabalho primário/ Mercado primário brasileiros (vagas Brain circulation legitimados carreira profis- mais antigas) Brain exchange sional Leste da Europa / Funcionalmente Mercado de tra- Mercado secun- Brain waste brasileiros (novas ilegitimados balho secundário dário Deskilling vagas) Brain gain Brain circulation Mercado secun- Brain exchange Internamente Sistema de ensi- PALOP / dário (+)/ Merca- Brain waste qualificados no/formação brasileiros do primário (-) Deskilling Beneficial brain drain Como se irá demonstrar de seguida, esta proposta de classificação dos imigrantes altamente qualificados presentes em território nacional não ignora o significado de outros critérios de classificação (como, por exemplo, critérios geográficos, temporais, ou critérios referentes ao mecanismo ou canal promotor da migra- ção), nem a possibilidade de mobilidade dos imigrantes entre os diferentes tipos identificados. Ela pretende somente funcionar como um instrumento de análise da posição actual dos imigrantes qualificados em Portugal através da identifica- ção de características consideradas relevantes para essa análise. Temos consci- ência que uma tipologia é sempre uma simplificação da realidade e desta resulta uma relativa menorização de características que, apesar de parte integrante e importante para essa posição, são consideradas como estando a jusante da sua conjuntura contemporânea.9 Migrações _ #2 _ Abril 2008 81 Numa perspectiva histórica é possível afirmar que os três tipos de imigrantes altamente qualificados atravessam diferentes fases que reflectem muito do que foi a própria história da imigração em Portugal, não sendo de estranhar que à medida que avançamos no tempo estas migrações se diversifiquem e se tornem mais complexas. Portugal era há pouco mais de 30 anos: uma economia relativa- mente fechada sobre si própria, interagindo sobretudo com as suas possessões ultramarinas; um país envolvido numa guerra colonial de longa duração; um país com uma emigração volumosa e uma ditadura que parecia perpétua. Entretanto, o fim da ditadura; a descolonização; o retorno ao país de emigrantes, colonos e um grupo de portugueses ultramarinos; a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia; a abertura da economia nacional ao mercado global e as transformações politicas e sócio-económicas registadas nos países da Europa de Leste, para só citar alguns marcos fundamentais, encarregaram-se de mu- dar radicalmente a situação política, social, cultural e económica em Portugal e transformaram-no (também) em país de imigração. Através de uma explicitação da tipologia apresentada demonstra-se como as diferentes fases da imigração qualificada para Portugal acompanharam toda esta mudança. Migrantes altamente qualificados funcionalmente legitimados A abertura e crescente internacionalização da economia portuguesa a partir de meados da década de 80 foi acompanhada por uma evolução positiva dos fluxos de entrada de migrantes altamente qualificados direccionados para segmentos específicos do mercado de trabalho nacional. Entre 1986 e 199810 os imigrantes activos em profissões científicas, técnicas e liberais, e directores e quadros su- periores administrativos, mais do que duplicaram, passando de 12.609, em 1986, para 26.819, em 1998. Dado que durante este período também se registou um au- mento significativo dos imigrantes activos nos restantes grupos profissionais, a proporção de activos altamente qualificados no conjunto da população activa es- trangeira manteve-se praticamente constante (de 29,3% em 1986, para 30,2% em 1999). A análise dos dados relativos às solicitações de autorizações de residência permite obter informação mais actualizada sobre as características profissionais dos imigrantes que anualmente entram em Portugal. De acordo com esses dados a proporção de imigrantes detentores de profissões qualificadas (grupos profis- sionais 1 e 2 da CNP-94) que anualmente solicitaram uma autorização de resi- dência regista uma diminuição progressiva desde 2002, passando de 30,6% para 19,8%, em 2005. Estes fluxos de imigrantes dirigiram-se, de forma independente ou inseridos num processo organizacional de mobilidade externa, para os segmentos quali- ficados do mercado de trabalho. Apesar de se manterem como uma realidade ainda pouco conhecida, este tipo de imigrantes tem merecido alguma atenção no conjunto dos estudos dedicados à imigração qualificada em Portugal. Em termos 82 Imigração e Mercado de Trabalho

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A imigração de profissionais altamente qualificados tem evoluído .. mente qualificados que, ao contrário dos migrantes anteriores, se vão inserir no.
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