UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP Faculdade de Filosofia e Ciências – FFC Campus de Marília Simone Maria Magalhães Poder e Violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda Marília 2008 1 Simone Maria Magalhães Poder e violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós- graduação em Ciência Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – UNESP “Júlio de Mesquita Filho” – Campus de Marília, como parte integrante dos requisitos para obtenção do título de mestre. Linha de pesquisa: Trabalho, política e sociabilidade. Orientadora: Dra. Fátima Cabral Marília 2008 2 Simone Maria Magalhães Poder e violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda Comissão Examinadora: ____________________________ Dra. Fátima Cabral - orientadora (Departamento de Sociologia e Antropologia da FFC - UNESP) _______________________________ Profº Dr. Marcos Tadeu Del Roio (Departamento de Ciência Política da FFC – UNESP) ___________________________ Drª Maria Ribeiro do Valle (Departamento de Sociologia da FCL – UNESP) Marília 2008 3 MAGALH ÃES, Simone Maria. Poder e violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda / Simone Maria Magalhães – Marília, 2008. 128 f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, 2008. Bibliografia: f. 124-129 Orientador: Fátima Cabral 1. Hanna h Arendt. 2. Poder. 3. Nova Esquerda. I. Autor. II. Título. 4 Dedico este trabalho a minha mãe Ana Maria que fez a opção de me educar e, sozinha, trabalhou arduamente para garantir os meus estudos. 5 Agradecimentos À Fátima Cabral que, desde o primeiro ano da graduação até aqui, orientou minha pesquisa acadêmica com rigor intelectual e sabedoria. Agradeço imensamente pela solidariedade, paciência e sensibilidade que me concedeu nos momentos de agruras existenciais e materiais, e, ainda, por acreditar no meu trabalho e incentivar sempre a reflexão. À Fátima, minha gratidão e amizade. Ao José Luiz, meu companheiro, que com serenidade e grande ternura, suavizou os momentos de angústia e desânimo com conversas, bons filmes, literatura (seu vício) e música. Sua atenção e paciência me ensinaram muito. Este trabalho não poderia ter sido concluído sem o apoio moral, emocional e material das pessoas amigas que me acompanharam ao longo dos anos da graduação e do mestrado. As dificuldades encontradas para a realização do mesmo foram muitas, mas sempre pude contar com o incentivo, os préstimos e a solidariedade dos amigos. O nosso convívio intenso nos espaços da FFC, na Moradia, nas ocupações, nos atos políticos e passeatas, na promoção dos almoços coletivos, na criação do coletivo “Mulheres Livres” e, posteriormente, do coletivo “Sopros”, são experiências que imprimem grande significado à minha prática política e se constituem em ensinamentos que sustentam a tentativa de me tornar um ser humano melhor. Quero agradecer, ainda, àqueles trabalhadores da FFC que, de forma silenciosa mas decisiva, contribuíram positivamente na nossa peleja para superar as dificuldades encontradas nesta Faculdade, sobretudo nos momentos em que as barreiras burocráticas e econômicas se apresentavam imperiosas. A solidariedade de classe e a sensibilidade destes trabalhadores para com os alunos oriundos das camadas populares, fizeram deles nossos importantes aliados dentro da Universidade. Meus sinceros agradecimentos aos professores Sueli Mendonça e Marcos Tadeu Del Roio, mestres e companheiros de luta, cujas práticas pedagógicas eram baseadas no rigor intelectual, mas repletas de sensibilidade, afeto e paciência revolucionária. 6 Sumário Resumo Abstrat Introdução Capitulo 1 1.1 A Guerra Fria e a construção do “consenso” em torno da situação econômica e política do capitalismo 09 1.2 Os Anos dourados do capitalismo e o pretenso “fim da ideologia 22 1.3 A Eclosão da Rebelião Estudantil e os limites do consenso 29 Capítulo 2 2.1 A leitura arendtiana do Movimento Estudantil e seus conceitos de Poder e violência 39 2.2 O conceito arendtiano de poder 56 2.3 A noção de História em Arendt 69 Capítulo 3 Hannah Arendt e a pretensa separação entre o econômico e o político 77 3.1 A Revolução Francesa e a “questão social”: elementos para a crítica da teoria arendtiana da separação entre econômico e político 86 3.2 Hannah Arendt e a separação entre econômico e político: a revitalização da teoria liberal-burguesa 94 Considerações finais 102 Bibliografia 110 7 RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo analisar a reflexão empreendida por Hannah Arendt (1906-1975) acerca dos fenômenos do poder e da violência, bem como sua crítica à Nova Esquerda , crítica essa que se apresenta de forma sistematizada em seu ensaio Sobre a violência, de 1969. A distinção entre poder e violência constitui-se, pois, em tema central do pensamento político da autora, que teve como motivação para sua reflexão a Rebelião Estudantil de 1968, a guerra do Vietnã e o papel da violência no âmbito da Nova Esquerda. Com efeito, o poder, para Arendt, é inerente a toda comunidade política e resulta da capacidade de agir conjuntamente. Por outro lado, a violência, que é instrumental, se funda na categoria meio-fim, e quando recobrada no âmbito do político é responsável por fazer desaparecer o poder. Portanto, poder e violência são assuntos opostos: quando um se afirma absoluto, o outro desaparece. Do contato com o pensamento de Arendt, percebemos que seu conceito de poder foi forjado tendo como referência a tradição da polis grega, a qual, no entendimento de Arendt, lança luzes sobre a derrocada dos valores da política moderna, bem como sobre a necessidade de resgatar a diferença entre as esferas pública e privada para fazer emergir o fenômeno originariamente político. Confrontando suas idéias com as de outros autores, consideramos que a análise de Arendt sobre o poder transcende completamente as relações conflituosas constitutivas da vida política e suas instituições tradicionais. Além disso, a rejeição da ação radical da Nova Esquerda, por esta autora, em grande medida parece engrossar o coro que recusa e rechaça a utopia, que significa, no contexto do “fim da ideologia”, a negação da perspectiva socialista em favor, mais uma vez, da “democracia” e do “pluralismo” norte-americanos. Palavras-chave: Hannah Arendt, poder, violência e Nova Esquerda. 8 Abstract The aim of this paper is to analyze the reflexion undertaken by Hannah Arendt (1906-1975) on the phenomena of power and violence as well as her critique of the New Left, which is presented systematically in her essay On Violence (1969). The distinction between power and violence thus comprises a central theme in her political thought, which has had as a motivation for her reflexion the Student Rebellion of 1968, the Vietnam war and the role of violence within the New Left. Indeed, the power, on Arendt's account, is inherent to every political community and it is a result of the ability to act jointly. Furthermore, the violence, that is instrumental, is based upon the means-end category and whenever stablished within the political sphere becomes responsible for causing the power to vanish. Therefore, power and violence are opposite subjects: as one becomes absolute, the other vanishes. By being in touch with Arendt's thinking we come to realize that her innovative concept of power has been forged having as reference the tradition of Greek polis, which, from Arendt's understanding, casts light on the defeat of the values of the modern Politics, as well as on the need of restoring the difference between public and private spheres to cause the originally political phenomenom to emerge. By putting her thoughts with those of other authors, we consider that Arednt's analysis of power goes completely beyond the conflicting constituents of political life and its traditional institutions. Moreover, the rejection of the extreme action of the New Left, by the author, largely seems to reinforce the chorus that refuses and rejects the utopia, which means, in the "end of ideology" context, the negation of the socialist perspective in behalf, once again, of the American "democracy" and "pluralism". Keywords: Hannah Arendt, power, violence and New Left 9 INTRODUÇÃO A relativa estabilidade alcançada pelo capitalismo durante a década de 50 nos países industrializados centrais fazia-se sentir pela expansão do sistema econômico, pela produção de bens em larga escala, consumo acentuado, altas taxas de lucros, e através do amplo desenvolvimento tecnológico. O período entre 1950-1970 caracterizou-se pela prosperidade do sistema capitalista que, através do modelo taylorista/fordista, atingiu altas taxas de crescimento econômico por habitante nos países industrializados centrais. Com base na reestruturação da economia capitalista do pós-guerra, implicando no progresso econômico, criou-se a ilusão de que o compromisso entre capital e trabalho, mediado pelo Estado, pudesse ser duradouro. Dessa ilusão decorreu o fortalecimento e a institucionalização, em alguns países da Europa, do Estado do Bem-Estar Social, assegurando, por exemplo, a previdência social e o consumo desenfreado de mercadorias. Concluiu-se adiante que a função do Estado em assegurar a política de pleno emprego e gerir o Estado de Bem-estar Social se constituía em procedimentos necessários à ampliação da acumulação do capital e à legitimidade política A “sociedade afluente” que desfrutava perspectivas de progresso material chegou mesmo a convencer muitos intelectuais, tanto da direita quanto da esquerda, de que o capitalismo e o progresso do Iluminismo tinham se tornado uma realidade e uma vez que as sociedades incorporassem suas estruturas, valores e instituições, acabariam seus problemas. Ou seja, uma vez que as sociedades se modernizassem passariam a desfrutar do desenvolvimento econômico, político e social. A revitalização do otimismo iluminista nesse período foi o resultado imediato do progresso que se seguiu ao pós-guerra, revitalização essa vista em termos de desenvolvimento econômico e do avanço da democracia, nos termos do modelo norte- americano (BRESSER-PEREIRA, 2006, p. 12). 10
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