UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ O Real e o Imaginário: A Experiência da Maçoriaria na Loja União III Porto União da Vitória - 1936 a1950 CURITIBA 2003 JEFFERSON WILLIAM GÖHL O REAL E O IMAGINÁRIO: A EXPERIÊNCIA DA MAÇONARIA NA LOJA UNIÃO III EM PORTO UNIÃO DA VITÓRIA « 1936 a 1950 Dissertação apresentada como requisito à obtenção o grau de Mestre em História, Curso Pós - Graduação em História, setor de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná. Orientador : Prof. Dr. Euclides Marchi Banca Examinadora Prof. Dr. Euclides Marchi Prof. Dr. Judite Maria Barboza Trindade Prof. Dr. Sylvio Fausto Gil Filho CURITIBA 2003 11 ¡iïlHli'w'Miïlli'1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO l'ÀRANÀ (ÖmM? s e t or de c i ê n c i as h u m a n a s, l e t r as e a r t es UI " PR l'(X>RDl:'NA(,'/\iJ DOS CURSOS Uli l'ÒS GRAUUAQ'ÄÜ EM HISTÓRIA ~ General Carneiro, 460 6° andar lone 360-5086 FAX 264-2791 Ru;i Ala da sessão pública de argiiição tie Dissertjação para obtenção do grau de Mestre em História. Aos vinte e nove dias do mês de agosto de dois mil e três, às quatorze horas, no Anfiteatro 1111, 11° andar do Edificio ü. Pedio 1, da Universidade Federal do Paraná, foram instalados os trabalhos de argüido do candidato JelTerson Willian Göhl em relação a sua Dissertação intitulada "O Real e o Imaginário: a experiência da maçonaria na Loja União III cm Torto União da Vitória: 1936-1950. A Banca Examinadora, designada pelo Colegiado dos Cursos de Pós-Graduação em História, foi constituída pelos seguintes professores: Euclides Marchi, orientador, Sylvio Fausto Gil Filho (UFPR), Judith Maria Barbosa Trindade (DEMIS), sob a presidência do primeiro. A sessão teve início com a exposição oral do candidato sobre o estudo desenvolvido. Logo após o senhor presidente concedeu a palavra a cada um dos Examinadores para suas respectivas argüições. Em seguida, o candidato apresentou sua defesa. Na seqüência, o senhor presidente retomou a palavra para as considerações finais. A seguir a banca examinadora reuniu-se sigilosamente, decidindo-se candidato. Finalmente,-^-s^nlfár presidente declaroutí^.'1:!?.1:?.^^. o candidato que recebeu o título de História. Nada mais havendo a tratar o senhor presidente deu por encerrada a sessão, da qual eu, Luci Moreira 13aena, lavrei a presente Ata que vai assinada por mim e pelos membros da Comissão Examinadora. vi Agradecimentos Este projeto foi sonhado ainda no curso de graduação. Embora o sonho seja individual, raramente tais feitos são de uma pessoa só. Assim devo render meus agradecimentos às pessoas que ainda nesta fase possibilitaram a existência deste trabalho final. Nomeio-as e a seguir consigno a contribuição que acredito estarem também impressas junto com estas linhas quase como um intertexto. Leia -se com atenção e encontrar-se-á a todos. Leni Trentim Gaspari , crença na educação e nas pessoas que passaram pelas suas aulas; Maria do Carmo Pires, orientação e incentivo; Michel Kobelinski, formação efetiva. Aos colegas de turma especialmente Ilton Cesar Martins, garra acadêmica e Siclinde Werle de Oliveira, clareza e sinceridade na vida e no texto. Não se pode deixar de fora aqueles que efetivamente contribuíram para a base material de toda boa pesquisa. Assim todo meu crédito à Felipe Abraão, acesso aos arquivos; Herbert Oberdiek, abertura de espírito; João Marcelino Maia e Ghassoub Domit, entrevistas. Créditos a Lili e Gessy Matzembacher bem como a Therezinha Leony Wolff que concederam entrevista sobre um assunto que aparentemente não compete às mulheres, mas que possui ligações profundas com elas. Gratidão pela clareza e honestidade de minha orientação, durante todo o curso, conduzida pelo professor doutor Euclides Marchi. Aos colegas de curso Viviane, Artur, Soleni, Lilian, Marco, Ederson, Andréia e Isabelle pela colaboração e companheirismo tão raro na atualidade (saudades hein !). Finalmente, agradeço àqueles que durante toda uma vida estão presentes, compartilham de nossos projetos e visões, desilusões e conquistas: minha esposa Marinea M. Fediuk, pela força e sua fé inquebrantável; à minha mãe Rosicler Guérios Göhl e avó Eglé Schmall Guérios que sempre, com suas preocupações e incertezas, deram-me, com seus conselhos, a noção da inserção social do homem e de seus sonhos e medos, — habilidade essencial para o oficio de historiador. m SUMÁRIO Introdução Q! 1.0- A Maçonaria Vista de Dentro 1.1. A Autocompreensão dos Maçons_ 19 1.2. A Realidade da Loja (Poder Local: Poder do Maçon) 30 2.0 - O Imaginário Externo da Maçonaria 2.1. Uma Memória da Maçonaria 44 2.2. O Discurso Ultramontano antimaçônico 51 2.3. A Maçonaria na Obra de Gustavo Barroso 58 3.0- Um Discurso Maçônico 3.1 .No imaginário: As Ligações Obscuras 71 3.2 - Fragmentos Mentais do Pós-guerra. 92 4.0 - Experência Local 4.1. A Cidade e a Loja 106 4.2. A Loja União III e Seus Posicionamentos ; 113 4.3. Ideologias Contrárias ao Regime 128 4.4. O Consultório Maçônico do Doutor Hely 139 Considerações finais 147 Referência Bibliográfica 157 Bibliografia GÖHL, Jefferson William. O Real e o Imaginário: A Experiência da Maçonaria na Loja União III ein Porto União da Vitória ~ 1936 a 1950. União da Vitória, 2003. Dissertação ( Mestrado em História ) - Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba. RESUMO Esta pesquisa procura captar um objeto mental na história, que é o imaginário do complô maçônico, através de uma Loja Maçônica do sul paranaense - União III . A década de 1940 se revelou um momento de extremas tensões mundiais, com a Segunda Grande Guerra e a ascensão de ditaduras por todo o mundo. Neste quadro de crises onde as paixões políticas afloravam de formas diversas, como o fascismo, integralismo ou os vários nacionalismos, procuramos entender como o imaginário do complô que pretende conquistar o mundo se manifesta nas áreas que estavam ainda na primeira etapa de implantação do capitalismo industrial. A Loja União III é a catalizadora das tensões que giravam em torno da discussão judaica no país, por grupos extremistas e pelo Estado que, levado pelo clima conspiratório, determina o fechamento das sociedades secretas no Brasil em 1937. O segredo sugerido pela iniciação a maçonaria afeta a produção da literatura maçônica, na resposta aos ataques advindos da Igreja e de grupos sociais políticos como o integralismo. Dos discursos apregoados de ambos os lados nasce o tema da conspiração. Tão antigo quanto a própria maçonaria este imaginário acaba por determinar, condutas reais de comportamento junto aos maçons e interpretações fantasiosas na sociedade circundante. A tomada de posturas da Loja frente ao decreto de fechamento, a exclusão de membros, e muitas das condutas mais cotidianas é determinada no período pelo âmbito do segredo e pela concepção de poder que o imaginário acerca deste segredo gera. Palavras Chaves : Imaginário, complô, maçonaria, crise, Loja União III V GÖHL, Jefferson William. O Real e o Imaginario: A Experiência da Maçonaria na Loja União III em Porto União da Vitória ~ 1936 a 1950. União da Vitória, 2003. Dissertação ( Mestrado em História ) - Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba. ABSTRACT This reserch helps us capture mental picture in history, which is the imagined Masonic conspiracy, through Masonic lodge in south of Paraná - União III .The 40's , were years of extreme tension in the world, with the Second World War and the rise of dictatorships all over the wolrd. In this backdrop of crisis in which political passions emerge in separate ways like fascism, integralism or various forms nationalism, we want to understand how the imagined Masonic conspiracy that intends to conquer the world manifested itself in areas that were still in the first stages of industrial capitalism . The lodge União III, was the catalyst involving tensions surrounding radical groups concerned with the Jewish discussion. Motivated by the climate of conspiracy, in 1937 the state decided to close secret societs in Brazil. The suggest secret of the Masons initiation rites affected the production of Masonic literature, in responding to the attacks that came from the Church and social political groups like the integralism. From what was preached from both sides of the issue, the theme of conspiracy arose. Being as old as masonry itself, this imagined conspiracy effected the actual conduct of the masons, and the shadowy interpretation sunrrounding the society. The position taken by the lodge, as well as many of their more common daily activities were directly affected by de decree of closure and the exclusion of members within the context of the imagined conception of a secret political force during this period. Key Words : Imaginary, conspiracy, masonry, crisis, Lodge União III VI Introdução O tema proposto nesta pesquisa se desenvolve em tomo da Loja Maçônica União III. Esta Loja, fundada ao final do século XIX na região sul do Paraná, teve em seus quadros a participação dos prefeitos das cidades de União da Vitória e Porto União. Não somente os prefeitos, mas também uma significativa parcela dos vereadores locais e cidadãos com reconhecido status social junto a comunidade. A participação dos homens públicos na Loja sugere que este espaço seria um lugar privilegiado para a formação de grupos diferenciados com vistas a obtenção de poder ou influência social. Esta sugestão, que aparece no primeiro trabalho histórico sobre a Loja,1 aponta para a formação de um complô, ou para a imagem da reunião secreta. A imagem do complô, como demostrou Benimelli, gerou durante a década de 1940 inúmeras * • 2 expressões de antimaçonisino por parte dos estados totalitários. A pergunta que motivou esta pesquisa, inicialmente, era muito simples. Como reagiu a Loja União III, quando, em 1937, o governo Vargas decretou o encerramento das atividades maçônicas ? A motivação para responder a ela ocorreu quando da leitura de um artigo do historiador maçom Kurt Prober, publicado na revista Amizade, no Paraná. Neste artigo, Prober fez um levantamento das Lojas que existiam no Estado, traçou um pequeno histórico de cada uma, e questionou alguns posicionamentos em relação às dissidências ocorridas em nível federal e estadual, e em relação ao que ele chamava de "Questão Getülio", ou seja, o fechamento das Lojas. Na medida em que a busca pelas respostas acontecia, na bibliografia disponível, na gravação das entrevistas coin os membros mais antigos, na pesquisa da documentação preservada da Loja, foi se delineando um quadro mais extenso e complexo do que se 1 CLARO NETO, Manoel Alves. Subsídios para o estudo histórico da Maçonaria em Porto União e União da Vitória. Fundação Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras; Depto. Ciências Sociais: União da Vitória, 1980 (Mimeo) 2 BENIMELLI, José A .F. Maçonaria X Satanismo. Londrina : Ed Maçônica A Trolha, 1995 V-2 3 CH'AN, Isa. Aclicgas para a História da Maçonaria Paranaense. Curitiba: Revista Amizade, 1966 1 supunha inicialmente. A resposta a esta simples pergunta esbarrou em uma grande quantidade de dados que, aparentemente, não tinham absolutamente nada a ver com os documentos que tratavam única e exclusivamente do decreto do Secretário de Segurança do governo varguista, bem como das carta individuais dos membros da Loja União III, anexadas na forma de abaixo-assinado e enviadas ao Poder Central maçônico no Rio de Janeiro como uma declaração de obediência das Lojas para com o governo. O objeto pequisado compõe-se desta idéia múltipla do poder maçônico, advinda do senso comum e de uma literatura maçônica reservada, proveniente também das ligações e atitudes reais dos maçons e de uma literatura detratora e publicista que, no período, atacou fortemente a instituição da maçonaria. Este objeto, composto por vários, troncos, é um imaginário social da maçonaria, forjado em tomo das Lojas, a partir destes elementos. Assim, captar este imaginário social e a idéia do complô que lhe é subjacente, especialmente neste período, — é o objetivo desta pesquisa. O recorte temporal que se adotou, de 1936 a 1950, obedece a uma dupla justificativa : 110 primeiro plano, há o quadro da conjuntura nacional, 11a qual acontece a publicação do texto de Gustavo Barroso, Os Protocolos dos Sábios de Sião, em 1936. Logo depois o Grande Oriente do Brasil sofre com essa crise, iniciada em 37 e com outra, institucional, que vinha desde 1927. Durante a década de 1940, a Maçonaria perde seu grão-mestre, o General Moreira Guimarães, e finalmente, terá separados a Maçonaria Simbólica dos Altos Graus, em 1951, pelo então grão-mestre Joaquim Rodrigues Neves.4 A idéia do complô, durante as décadas de 1930 e 40, contém uma significação ideológica inequívoca por todo o mundo. Conforme apontado por Tucci Carneiro, o judeu era o alvo de um preconceito no Brasil, que remontava ao período colonial.5 É interessante observar que os ideólogos no período potencializaram este preconceito, aliando este sentimento ao corpo de uma teoria conspiratória maior, que inclui a Maçonaria, como um elemento judaizante no mundo social. 1 CASTELLANI. José. O Supremo Conselho do Brasil: Síntese de sua História. Londrina: Ed Maçônica A TROLHA, 2000 5 TUCCI CARNEIRO. Maria Luiza. O Anti Semitismo na Era Vargas (1930-1945).São Paulo: Brasiliense, 1995 2 No plano regional, tivemos em União da Vitória dois homens que escreveram a História da cidade, seja a história das origens no caso de Alvir Riesemberg coin as obras: A Instalação Humana no Vale do Iguaçu, A Nau São Sebastião, A Navegação a Vapor no Rio Iguaçu, todos publicados pela década de 1970 pelo IHGEP*, seja pelas letras, no caso de José Julio Cleto da Silva, que, com uma preocupação mais regionalista e política, escreve: Campos e Selvas, O Contestado Diante das Carabinas e Apontamentos Históricos de União da Vitória. Neste último livro, também publicado pelo IHGEP, Cleto realiza um minucioso levantamento de dados que ele considera relevantes, desde a fundação do Entreposto Nossa Senhora das Vitórias até 1933. Este é também o trabalho mais consultado para se conhecer a história da cidade. Cleto da Silva viria a falecer em 1953, e Riesemberg ern 1975, contemporâneos e ambos maçons, personagens celebres que animaram a Loja União III e lhe emprestam respeitabilidade e seus dons da oratória entre colunas, ou seja dentro da loja. Com a morte de ambos um capítulo da história regional findou, considerando que suas contribuições para a historiografia local privilegiaram desde as primeiras entradas bandeirantes no território até 1933. O capítulo em que eles foram personagens históricos ficou por ser escrito. A seu tempo, os dois intelectuais também foram prefeitos e alimentaram, com suas participações na Loja, uma idéia do poder e das ligações inaçônicas. Partindo do pressuposto que a imagem social do complô toma um sentido imperioso, chegando a ameaçar até mesmo a própria existência da maçonaria após 1936, ela permanece até 1950 como uma das visões dominantes, com rastros até hoje. A pequisa verificou como estes efeitos se deram e ao mesmo tempo resgatou um hiato da história local ein meados da década de 1930 em União da Vitória, ainda que seja através da vida maçônica destes historiadores e de seus irmãos em Loja. O que se buscou nesta pesquisa foi a captação do imaginário do complô e como este imaginário modulou condutas reais junto aos membros nele envolvidos. Observando 3
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