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Fora do Ar PDF

133 Pages·2007·1.4 MB·Portuguese
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Orelha Acompanhei a chegada de Heródoto Barbeiro à Rádio Caramelo de Taiaçupeba, no interior de São Paulo. Vinha ele da Rádio Perereca de Monte Alumínio, e sua contratação constituía um investimento corajoso que os acionistas da rádio fariam no jornalismo Investigativo. A estréia de Heródoto foi gloriosa. Primeiro, sua formação universitária, diplomado que era em história e direito, cresceu com as outras três qualificações: tinha sido um excelente professor de cursinho, onde granjeara fama de comunicador; trabalhara ainda em grandes rádios da capital com notáveis radialistas e onde conseguira seu Mtb de jornalista; e, por último, era budista e corintiano. Mas, para uma ala da redação, o trunfo mais instigante da vinda de Heródoto era o fato de ele escrever na Revista Imprensa uma crônica mensal intitulada Rádio Escuta. Além do estilo solerte e atrevido, o pessoal apreciava no futuro colega uma vocação a ombudsman da mídia rádio, tal era a violência com que espinafrava radialistas e empresários do setor no Brasil. Dava-se ao luxo ainda de uns toques didáticos, já que, dominando o inglês das canções de Bob Dylan e Janis Joplin. Ousava traduzir livremente termos técnicos de rádio como: off-radio, off-tube, establishment, ghost writer e footing. Pesava, contudo, contra o Heródoto, uma queixa apaixonadamente debatida nos corredores da empresa. Teria o âncora poderes para sempre imiscuir no noticiário comentários jubilosos ou amarelados quando o Corinthians jogava? O pior era nas derrotas. O esforço do âncora era o de desconstruir a gozação que os anticorintianos e os desafetos dele infalivelmente fariam. Um grupo da redação, inclusive, já tinha apresentado um mandado de segurança jornalístico contra tal pusilanimidade. Agora, em livro, as crônicas de Heródoto, publicadas na Revista Imprensa entre 2001 e 2006, poderão ser ou não uma contribuição à crítica da mídia rádio. Mas mostrarão certamente aos novos leitores que existem vida e humor no rádio brasileiro. Sinval de Itacarambi Leão Diretor e editor da Revista Imprensa Heródoto Barbeiro é jornalista da CBN/TV Cultura, gerente de jornalismo do Sistema Globo de Rádio SP e articulista em jornais, em revistas e na internet. Formado em direito, história e jornalismo, publicou diversos livros nas áreas de história, religião, jornalismo e de treinamento para empresas. Apresentação Estas são algumas das histórias dos bastidores do jornalismo que não foram ao ar. Muitas delas retratam personagens que nunca apareceram na telinha, tampouco tiveram os seus 15 minutos de fama e, no entanto, carregam o piano para que tudo ocorra na mais perfeita ordem. Jornalismo só se faz em equipe, dizem os manuais, mas os louros, os melhores salários, não são divididos em equipe. Há um ditado popular em Taiaçupeba que diz assim: justiça, jornalismo e salsicha é bom não ver como se faz. Entretanto, é apenas um adágio, nada mais, talvez urdido por alguma viúva dos tempos em que não havia liberdade de imprensa no Brasil. As histórias e personagens são fictícios. Apenas colaboram para que determinadas situações nos bastidores de uma redação possam ser mostradas de forma descontraída ao respeitável público. Originalmente, essas crônicas foram publicadas na Revista imprensa, e agradeço ao Sinval, ao Carlos Nascimento e ao Boris Casoy pelo apoio. Afinal, Taiaçupeba existe? As histórias se passam no pequeno distrito de Taiaçupeba, município de Mogi das Cruzes, região do alto Tietê, na grande São Paulo. A ambientação tem a intenção de divulgar uma região de manancial e de Mala Atlântica, onde um grupo de abnegados se debate contra a destruição, o loteamento clandestino, o desmatamento, a especulação imobiliária e outras patifarias. O impacto mais visível causado pelo desmatamento nessa área tão próxima a São Paulo é o desaparecimento das fontes, e a empresa que fornece água é obrigada a captá-la a mais de cem quilômetros de distância. Cheguei lá há 35 anos e logo me apaixonei pela região e pela mala, senti meus pós criarem raízes e entrarem pela terra. Há muito tempo me pergunto: o que eu posso fazer para preservar a natureza, além de participar da SAT Sociedade Amigos de Taiaçupeba? Ocorreu-me a idéia de ambientar as histórias na pequena vila e tirar os personagens de suas ruas e colocá-los nas crônicas. Toda a região, seus bairros e personagens mais conhecidos são homenageados nas crônicas; e se você for lá, poderá encontrar o bar do Padilha, o Zé Ferro, o Raimundinho, o restaurante da Lenilza, o supermercado da Odete, enfim, os atores reais do dia-a-dia do distrito. As Organizações Caramelo nasceram e cresceram em Taiaçupeba. Lá, estão a rádio e a TV Caramelo, o jornal, os concorrentes, enfim, todo o cenário apropriado para se acompanhar como funciona uma redação de notícias. Prefácio Carlos Nascimento As redações e suas histórias Mal sabe o Heródoto que ele próprio era conhecido por um pseudônimo carinhoso entre um grupo de admiradores na redação da TV Globo. O autor da brincadeira foi o Antonio Carlos Ferreira, jornalista esportivo, que adorava trocar os nomes dos colegas. Foi assim que ele passou a se chamar Heráclito Bombeiro. O apelido pegou, e era comum ouvir comentários sobre o que o “Heráclito” havia dito na CBN. Jamais imaginei que caberia a mim prefaciar este livro escrito com criatividade e bom humor por um dos mais respeitados jornalistas do rádio brasileiro. Outra história inesquecível foi no dia em que o nosso herói comentou a notícia de um revés sofrido pelo senador José Sarney no Congresso. Heródoto disse: - Pois é, fizeram barba e cabelo do Sarney. Ao que o locutor respondeu: - E disso você entende bem. Afinal, é o Heródoto Barbeiro. Lendo as muitas histórias da redação e dos bastidores da TV Caramelo, lembrei-me de quantas situações parecidas vivi ou acompanhei. Uma delas foi na via Anhangüera, quando o motorista de um carro de microondas da TV Globo corria para trazer uma fita com imagens do presidente da Venezuela, Carlos Andrés Pérez, que havia desembarcado em Viracopos. Ao passar pelo posto da Polícia Rodoviária, um guarda informou: - Moço, o senhor não percebeu, mas um pedaço do carro ficou lá atrás. Era o enorme “panelão” do microondas que havia se desprendido e virara lata velha debaixo de um caminhão. Muito tempo antes, quando ainda trabalhava na Rádio Cultura de Dois Córregos, minha cidade, tomos transmitir um jogo em Bariri. A companhia telefônica exigiu que levássemos um magneto (telefone de manivela). O único que consegui foi um daqueles aparelhos de madeira no qual se falava num microfone e se ouvia num fone parecido com um copo. O locutor da rádio local, que dividia a cabine conosco, fez o seguinte comentário: - Vocês vieram transmitir o jogo ou abrir um museu? No capítulo das situações embaraçosas, tive algumas experiências. Uma delas foi com o empresário José Mindlin. Ele me deu uma entrevista no Bom Dia São Paulo e usávamos um cabo Y, isto é, os dois microfones saíam da mesma fonte. Quando a entrevista acabou, ele se despediu, levantou-se e foi embora. Eu tinha de chamar o intervalo e não tive alternativa. Levantei-me também e o acompanhei na direção da porta, enquanto dizia: - Voltamos daqui a pouquinho, depois dos comerciais! Em 1978, na visita do presidente americano Jimmy Carter ao Brasil, fiz a reportagem no aeroporto de Brasília. Na hora de embarcar, ele passou pela imprensa centrou num lugar em que já não podíamos vê-lo. Resolvi sair correndo para ir ao banheiro e vivi uma situação que, imagino, nenhum outro jornalista viveu: fiz xixi ao lado do presidente dos Estados Unidos. Em Tânger, no Marrocos, preparava-me para embarcar rumo à Espanha, vindo de Gibraltar, durante a Guerra das Malvinas. Na hora de entrar no navio, aparece uma brasileira, muito nervosa, e me pede para passar conosco pela alfândega, como se fosse da equipe da TV Globo. Eu a conhecia, e concordei. Durante a travessia, ela me agradeceu e explicou o motivo da aflição: - É que eu trouxe haxixe escondido na vagina e, se eles me pegassem, não sairia nunca mais da cadeia! “E nem eu”, imaginei. Para terminar, a resposta de um colega também dos tempos do rádio, em Dois Córregos, quando o diretor o advertiu sobre uma infinidade de erros de português no texto: - Não se preocupe. Isso aí é só o script. Na hora de falar, eu leio tudo certo! Divirtam-se com as histórias do Heródoto e exercitem a memória para tentar descobrir de quem ele está falando. Não será difícil constatar que estão mais perto de nós e de nossas vidas do que imaginamos. Escala maldita A consultoria MacNamara foi contratada para fazer um downsizing nas Organizações Caramelo. Os gestores não se conformavam com o percentual do faturamento que era gasto com os colaboradores, o eufemismo da moda para os empregados. Mais de 60% eram destinados a pagar salários e contratos artísticos, e isso era impensável, uma vez que o método de gestão adotado era o de gerar os melhores resultados possíveis, logo a notícia se espalhou e chegou na redação da TV Caramelo de Taiaçupeba, a emissora líder do grupo. Na redação, alguém rapidamente explicou aos mais novos que downsizing era o popular “passaralho”. O corre-corre para salvar o emprego foi intenso, com o registro de lances de puxa-saquismo explícitos. O corte foi de 20% na redação e zero na programação, ou melhor, os programas seriam os mesmos e a equipe restante teria de responder por tudo. Cada sobrevivente teria de exercer mais de uma função e a qualidade não poderia cair, sob a ameaça de mais demissões. Os cortes proporcionaram a redução nos gastos, mas não foram suficientes. Era preciso economizar mais. Novos métodos foram adotados um deles foi o banco de horas. Por mais que os sindicatos dos jornalistas e radialistas bombardeassem as categorias com campanhas contra o banco de horas, a maioria se dobrou à pressão. Daquele dia em diante, ninguém mais ganharia hora extra. Elas iriam para o banco de horas e

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