CIP-Brasil Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ Fantasmas no Cérebro - Uma Investigação dos Mistérios da Mente Humana - V. S. Ramachandran, Sandra Blakeslee Criação/formatação ePub: Relíquia Tradução: Antônio Machado Prefácio: Oliver Sacks 2ª ed - Rio de Janeiro: Record, 2004 Tradução de Phantoms in the Brain. Inclui bibliografia. ISBN 85-01-05556-5 l Neurologia - Obras populares 2 Cérebro - Obras populares 3. Neurociência- Obras populares I Blakeslee, Sandra. II. Titulo. 01-1760 CDD-612-8 CDU-612-8 Título original em inglês: Phantoms in the Brain: Probing the Mysteries of the Human Mind Copyright © 1998 by V. S. Ramachandran and Sandra Blakeslee Copyright do prefácio © 1998 by Oliver Sacks Direitos exclusivos de publicação em língua portuguesa para o Brasil adquiridos pela DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVIÇOS DE IMPRENSA S.A Rua Argentina 171 Rio de Janeiro, RJ 20921-380 - Tel.: 2585-2000 que se reserva a propriedade literária desta tradução. Impresso no Brasil ISBN 85-01-05556-5 PEDIDOS PELO REEMBOLSO POSTAL Caixa Postal 23.052 Rio de Janeiro, RJ - 20922-970 A minha mãe, Meenakshi. A meu pai, Subramanian. A meu irmão, Ravi. A Diane, Mani e Jayakrishna. A todos os meus antigos professores na índia e na Inglaterra. A Sarasvati, a deusa da erudição, da música e da sabedoria. Pelos déficits, podemos conhecer os talentos, pelas exceções, podemos discernir as regras, pelo estudo da patologia podemos construir um modelo de saúde, E — o mais importante — a partir deste modelo podemos desenvolver os insights e instrumentos de que necessitamos para afetar nossas próprias vidas, moldar nossos destinos, transformar a nós mesmos e à sociedade por meios que, até agora, podemos apenas imaginar. LAURENCE MILLER O mundo perecerá não por falta de maravilhas, mas por falta de imaginação. J. B. S. HALDANE Sumário Apresentação Prefácio Capítulo 1 - O Fantasma Interior Capítulo 2 - Sei Onde Coçar Capítulo 3 - A Caça ao Fantasma Capítulo 4 - O Zumbi no Cérebro Capítulo 5 - A Vida Secreta de James Thurber Capítulo 6 - Através do Espelho Capítulo 7 - O Som de Uma Só Mão Batendo Palmas Capítulo 8 - A Insustentável Aparência do Ser Capítulo 9 - Deus e o Sistema Límbico Capítulo 10 - A Mulher que Morreu de Rir Capítulo 11 - O Senhor se Esqueceu de Tirar o Gêmeo Capítulo 12 - Os Marcianos Vêem Vermelho? Agradecimentos Bibliografia e Leituras Sugeridas Notas Apresentação Os grandes neurologistas e psiquiatras do século XIX e início do XX eram mestres na arte de descrever, e alguns de seus históricos de casos continham uma riqueza quase romanesca de detalhes. Silas Weir Mitchell — que era romancista e neurologista — proporcionou descrições inesquecíveis de membros fantasmas (ou fantasmas sensoriais, como os chamou a princípio) em soldados que tinham sido feridos nos campos de batalha da Guerra Civil. Joseph Babinski, o grande neurologista francês, descreveu uma síndrome ainda mais extraordinária — anosognosia, a incapacidade de alguém perceber que um lado do seu corpo está paralisado e a frequentemente estranha atribuição do lado paralisado a outra pessoa. (Esse tipo de paciente poderia dizer sobre seu próprio lado esquerdo: É do meu irmão, ou é seu.) O Dr. V. S. Ramachandran, um dos mais interessantes neurocientistas do nosso tempo, tem feito um trabalho seminal sobre a natureza e o tratamento de membros fantasmas — aqueles obstinados e às vezes atormentadores fantasmas de braços e pernas perdidos há anos ou décadas, mas não esquecidos pelo cérebro. Um fantasma pode a princípio ter as sensações de um membro normal, uma parte da imagem normal do corpo; mas, isolado da sensação ou ação normal, pode assumir um caráter patológico, tornando-se intruso, “paralisado”, deformado ou torturantemente doloroso — dedos fantasmas podem-se cravar numa palma de mão fantasma com intensidade indizível, irreprimível. O fato de a dor e o fantasma serem “irreais” não ajuda em nada, e talvez na verdade os torne mais difíceis de tratar, pois a pessoa pode ser incapaz de relaxar o fantasma aparentemente paralisado. Numa tentativa de aliviar tais fantasmas, médicos e pacientes têm sido levados a medidas extremas e desesperadas: tornar o coto da amputação cada vez mais curto, eliminar a dor ou o trato sensorial na medula espinhal, destruir centros de dor no próprio cérebro. Mas, com muita frequência, nada disso funciona; quase invariavelmente, o fantasma e a dor fantasma retornam. Para esses problemas aparentemente intratáveis, Ramachandran oferece uma abordagem nova e diferente, resultante de suas pesquisas sobre o que são fantasmas, e como e onde são gerados no sistema nervoso. Classicamente se considera que as representações no cérebro, inclusive as da imagem corporal e fantasmas, são fixas. Mas Ramachandran (e agora outros) tem mostrado que ocorrem com muita rapidez reorganizações na imagem corporal — em 48 horas e possivelmente muito menos — depois da amputação de um membro. Em sua opinião, os fantasmas são gerados por essas reorganizações da imagem corporal no córtex sensorial e depois podem ser mantidos pelo que ele classifica como paralisia “aprendida”. Mas se há essas rápidas mudanças subjacentes na gênese de um fantasma, se existe tal plasticidade no córtex, o processo pode ser revertido? O cérebro pode ser induzido astuciosamente a desaprender um fantasma? Usando um engenhoso dispositivo de “realidade virtual”, uma simples caixa com um espelho, Ramachandran descobriu que um paciente pode ser ajudado simplesmente dando-lhe a visão de um membro normal — o próprio braço direito normal do paciente, por exemplo, agora visto do lado esquerdo do corpo, em lugar do fantasma. O resultado disso pode ser instantâneo e mágico: o aspecto normal do braço compete com a sensação do fantasma. O primeiro efeito disso é que um fantasma deformado pode ficar reto, um fantasma paralisado pode se mover; posteriormente, o fantasma pode desaparecer completamente. Aqui, Ramachandran fala, com humor característico, “da primeira amputação bem-sucedida de um membro fantasma”, e de como, se o fantasma for extinto, a dor também pode desaparecer — pois, se não há nada para materializá-la, então ela também não pode sobreviver. (A sra. Gradgrind, em Hard Times [Tempos difíceis], quando indagada se sentia alguma dor, respondeu: “Há uma dor em algum lugar no quarto, mas não posso ter certeza se a sinto.” Mas isto era confusão dela, ou uma brincadeira de Dickens, pois ninguém pode ter uma dor a não ser em si mesmo.) Será que “truques” igualmente simples podem ajudar pacientes com anosognosia, pacientes que não podem reconhecer um dos seus lados como seu próprio? Aqui, também, Ramachandran acreditava que os espelhos podem ser de grande utilidade para capacitar esses pacientes a recuperar como seu o lado previamente negado; contudo, em outros pacientes, a perda da “esquerda”, da bissecção do corpo e do mundo de alguém é tão profunda que os espelhos podem induzir uma confusão ainda maior, uma tendência a ver se não existe alguém se escondendo “atrás” ou “no” espelho. (Ramachandran é o primeiro a descrever esta “agnosia de espelho”.) Graças não só à tenacidade mental de Ramachandran, mas a seu relacionamento delicado e encorajador com os pacientes, ele conseguiu seguir estas síndromes até suas profundezas. O caso profundamente estranho da agnosia de espelho e o de atribuir equivocadamente os próprios membros a terceiros são frequentemente desprezados pelos médicos como irracionais. Mas esses problemas também são examinados cuidadosamente por Ramachandran, que não os vê como infundados ou loucos, mas como medidas emergenciais de defesa construídas pelo inconsciente para enfrentar as repentinas e esmagadoras confusões sobre o corpo de alguém e sobre o espaço à sua volta. São, segundo ele, mecanismos de defesa perfeitamente normais (negação, repressão, projeção, confabulação etc.) como os que Freud delineou como estratégias universais do inconsciente, quando forçado a se adaptar ao intolerável ou ininteligível. Tal entendimento afasta esses pacientes do reino da loucura ou extravagância e os recoloca no reino do discurso e da razão — embora o discurso e a razão do inconsciente. Outra síndrome de identificação errada que Ramachandran examina é a síndrome de Capgras, em que o paciente vê figuras conhecidas e amadas como impostores. Aqui, também, ele consegue delinear uma clara base neurológica para a síndrome — a remoção dos elementos afetivos habituais e cruciais ao reconhecimento, aliada a uma interpretação que não é anormal das percepções que agora são desprovidas de afeto (“Ele não pode ser meu pai, porque não sinto nada — deve ser uma espécie de simulacro”). Ramachandran também tem inúmeros outros interesses: na natureza da experiência religiosa e nas extraordinárias síndromes “místicas” associadas a uma disfunção nos lobos temporais, na neurologia do riso e das cócegas, e — um vasto domínio — na neurologia da sugestão e dos placebos. Como o psicólogo Richard Gregory (com quem ele publicou fascinante trabalho sobre vários assuntos, desde o preenchimento do ponto cego a ilusões visuais e colorações protetoras), Ramachandran tem um faro para ver o que é fundamentalmente importante e está preparado para voltar sua mão, seu vigor, e sua inventividade para quase todas as coisas. Todos esses assuntos, em suas mãos, tornam-se janelas para o modo como nossos sistemas nervosos, nossos mundos e nossos próprios eus são constituídos, de forma que seu trabalho se torna, como gosta de dizer, uma forma de “epistemologia experimental”. Assim, ele é um filósofo natural no sentido do século XVIII, embora tenha atrás de si todo o conhecimento e know-how do final do século XX. Em seu prefácio, Ramachandran fala-nos dos livros de ciência do século XIX que apreciava especialmente quando garoto: Chemical History of a Candle, de Michael Faraday, obras de Charles Darwin, Humphry Davy e Thomas Huxley. Nessa época, não havia distinção entre obras acadêmicas e populares, mas preferia-se a ideia de que alguém podia ser ao mesmo tempo profundo, sério e completamente acessível. Mais tarde, conta-nos Ramachandran, gostou dos livros de George Gamow, Lewis Thomas, Peter Medawar, e depois Carl Sagan e Stephen Jay Gould. Agora Ramachandran se juntou a estes grandes escritores de ciência com seu livro detalhadamente examinado e profundamente sério, mas de leitura deliciosamente agradável, Fantasmas no cérebro. Este é um dos livros de neurologia mais originais e acessíveis da nossa geração. Oliver Sacks
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