UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS CENTRO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS – MESTRADO Dissertação Divergência, insurgência e convergência: uma análise da trilogia Divergente sob a luz das distopias modernas e contemporâneas Ânderson Martins Pereira Pelotas, 201(cid:26) Ânderson Martins Pereira Divergência, insurgência e convergência: uma análise da trilogia Divergente sob a luz das distopias modernas e contemporâneas Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação de Letras – Mestrado da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Letras. Área de concentração: Literatura Comparada. Orientador: Eduardo Marks de Marques Pelotas, 201(cid:26) 2 Universidade Federal de Pelotas / Sistema de Bibliotecas Catalogação na Publicação P436d Pereira, Ânderson Martins PerDivergência, insurgência e convergência : uma análise da trilogia Divergente sob a luz das distopias modernas e contemporâneas / Ânderson Martins Pereira ; Eduardo Marks de Marques, orientador. — Pelotas, 2017. 14 f Per7 PerDissertação (Mestrado) — Programa de Pós-Graduação em Letras, Centro de Letras e Comunicação, Universidade Federal de Pelotas, 2017. Per1. Distopias contemporâneas. 2. Divergente. 3. Transumanismo. I. Marques, Eduardo Marks de, orient. II. Título. CDD : 809 Elaborada por Aline Herbstrith Batista CRB: 10/1737 Agradecimentos Ao início acreditei que fazer os agradecimentos para a dissertação seria parecido com a experiência pregressa que tive, ao fazê-los na monografia de conclusão de curso. Contudo, parece que o tempo envolvido, as pessoas e a fase da vida fazem com que a experiência de sentar e escrevem um texto para agradecer seja totalmente distinta. Os dois anos que envolvem a dissertação demandam que as relações que perpassaram e possibilitaram este trabalho tenham amadurecido e mudado com o tempo. É aqui que busco ingenuamente contemplar os felizes encontros que se refletem na minha escrita. Neste sentido, creio que a primeira pessoa a ser lembrada nesta nota é o Dr. Eduardo Marks de Marques, pois sua orientação, sua presença e seus concelhos se fizeram sentir neste texto, mesmo quando este se encontrava ainda no campo das ideias. Foi através das conversas e das leituras propostas por ele, que a proposta de trabalho foi se solidificando e se tornando palpável. Ter sua orientação foi com certeza um presente, pois tive a sorte de encontrar um orientador a nível de mestrado que trabalhasse exatamente com o que eu me predispunha a analisar. Agradeço-lhe não apenas pelos valiosos concelhos teóricos, mas também pela paciência e pelas orientações embebidas de sua experiência pessoal e relacionadas ao ato da escrita. Posso dizer que tive um guia durante todo o processo, que soube me incitar a motivação de galgar novos espaços e ir mais além. Gratulo à banca de qualificação, composta Dra. Andrea Czarnobay Perrot e Dra. Rubelise da Cunha, por lerem atentamente meu texto inicial e pelas sugestões dadas que enriqueceram o trabalho e auxiliariam na composição e na apresentação da análise que se seguirá. Sou grato às peculiaridades da vida, que as vezes fazem com que a distância seja um fator não de separação, mas sim de encontro. Neste sentido, agradeço a distância entre Bagé e Pelotas, a qual fez com que eu me aproximasse muito de uma Bajeense que se tornou minha amiga, confidente e cuja presença tornou a experiência do mestrado singular e inesquecível. Ariane Neto foi minha companheira nesta jornada de aulas, de viagens, de escrita e espero que continue sendo para a vida. Agradeço também a uma soledadense que foi morar em Pelotas e que só na distância descobrimos o quanto presentes estávamos nos tornando na vida um do outro. Greice Ortiz espero que nossas constantes dúvidas sobre formatos e publicações se esvaneçam com os anos, mas não nossos vários sonhos compartilhados. Agradeço imensamente em especial ao colega Ivens Mattoso, que sempre me auxiliou a estabelecer um norte a ser seguido. Ao amigo Vando Moreira Castro que me ofereceu apoio sobremaneira e que cuidou para que eu pudesse me dedicar as leituras e a escrita necessárias a este fazer. 6 Por fim, agradeço a pessoas que ainda que não façam parte da vida acadêmica sempre estão direta ou indiretamente ligadas às escolhas e à motivação de nosso trabalho. Agradeço em especial a minha mãe Leonete de Fátima Martins (já falecida) e a minhas duas irmãs Ana Paula Martins Pereira e Camila Martins Caldas. Obrigado por sempre confiarem em minha capacidade de superação e por compartilhar de meus anseios. Sou grato também a Maurício Gonçalves da Silveira, cuja companhia e amizade fez com que a finalização deste processo se tornasse algo mais leve e tranquilo. Finalmente, presto especial homenagem a Everton Miranda que foi o primeiro leitor destes escritos e cuja amizade e carinho para com todo o processo, foram impagáveis. 7 Resumo: Na contemporaneidade, o corpo tem sido largamente discutido e industrializado. As distopias contemporâneas têm tornado mais agudas as problemáticas do corpo em suas narrativas, uma vez que o gênero distopia é extremamente arraigado à sociedade que o concebe, transpondo para a história os temores dessa coletividade de forma pungente e em narrativas que em geral se projetam para o futuro da humanidade. Estabelecida a relação direta entre distopia e sociedade, este trabalho baseia-se na concepção de Eduardo Marks de Marques, na qual existem três vertentes na constituição do gênero. A fase atual ou terceira fase distópica tem sido vigente nos últimos trinta anos e tem por característica elementar a discussão de corpos erigidos a partir de um ideal capitalista de perfeição. Sob esta perspectiva, os romances Divergente (2012), Insurgente (2013) e Convergente (2014), escritos por Veronica Roth, se apropriam de elementos distópicos de obras clássicas. Entre estes elementos pode-se listar o apagamento da história, soros para contenção e identificação social e criação de uma nova sociedade dentro de outra já estabelecida. Neste viés, pretende-se estabelecer uma comparação entre os romances da trilogia Divergente, que se enfocam na transfiguração do corpo, e alguns romances distópicos clássicos que são centradas em uma crítica às políticas sociais. A partir das conexões com estes dois momentos do gênero e também a partir de algumas utopias, este trabalho pretende verificar como elementos sociais são traduzidos na narrativa de Veronica Roth, tendo em vista a troca da problemática política para a do corpo transfigurado. Palavras-chave: Distopias contemporâneas; Divergente; Transumanismo. 8 Abstract: In the contemporaneity, the body has been widely discussed and industrialized. The contemporary dystopias have made more acute the issues of body in their narratives, since the genre dystopia is extremely ingrained to the society that conceives it by transposing into a story the fears of this collectivity in a pungent way and in narratives that generally project themselves to the future of humankind. Having established the direct relationship between dystopia and society, this work is based on the conception of Eduardo Marks de Marques, in which there are three strands in the constitution of the genre. The present phase or third dystopian turn has been in force for the last thirty years and has, as an elementary characteristic, the discussion of bodies erected from a capitalist ideal of perfection. In this perspective, the novels Divergent (2012), Insurgent (2013) and Convergent (2014), by Veronica Roth, update dystopian elements from classic works. Among the elements there can be enlisted the history erasing, the sera for containment and social identification and the creation of a new society within another already established. In this bias, we seek to establish a comparison between the novels of the Divergent Trilogy, which focuses on the transfiguration of the body, and some classic novels that are centered on a critique of social policies. From the connections with these two moments of the genre and also from another classic utopias, this work aims to verify how social elements are translated in the narrative of Veronica Roth, in view of the exchange of the political problematic for a transfigured body. Keywords: Contemporary dystopia; Divergent; transhumanism. 9 Sumário Introdução .................................................................................................................................................. 11 1 – A problemática teórica. ........................................................................................................................ 21 1.1 -Introduzindo espaços imaginários: Distopias e utopias ................................................................ 21 1.2 - O dilema do futuro: Ficção Científica e distopia ........................................................................... 27 1.3- O corpo contemporâneo: Intensificando ou transgredindo o humanismo? ................................ 32 1.4- A problemática Young Adult Fiction ............................................................................................... 37 2 – Narrativas outópicas clássicas: a construção do não-lugar no texto .................................................. 43 2.1- Utopia- a obra que cunha o conceito ............................................................................................. 43 2.1.1- A ilha e o espaço ...................................................................................................................... 45 2.1.2- Sociedade e trabalho ............................................................................................................... 49 2.1.3-Tecnologia/ estrutura ............................................................................................................... 53 2.1.4- Controle social para a manutenção da sociedade .................................................................. 55 2.2- Distopias da segunda virada ........................................................................................................... 58 2.2.1- Insularidade das distopias ....................................................................................................... 60 2.2.2- Controle do conhecimento ..................................................................................................... 62 2.2.3- Controle da memória ............................................................................................................... 64 2.2.4- Condicionamento ..................................................................................................................... 68 2.2.5- Vigia constante ......................................................................................................................... 70 2.3- Bordas do gênero: A ficção cientifica e a fantasia ......................................................................... 71 3 – A desestabilização do humano e os movimentos de terceira virada distópica ................................. 74 3.1- Capitalismo: onde tudo é comercializável é possível falar em ética? ........................................... 75 3.2- Achávamos que éramos humanos ................................................................................................. 80 3.3- A evolução do corpo como mecanismo de exclusão. ................................................................... 82 3.4- Subtexto utópico: Entre o pós e o transumano. ............................................................................ 86 4 – Divergente: A (re)construção genética da distopia ............................................................................. 93 4.1 - Sociedade transumana................................................................................................................... 97 4.2 - Política de “normalidade” ............................................................................................................ 110 4.3 - Humano versus transumano ........................................................................................................ 121 4.4 - Controle e distinção ..................................................................................................................... 127 Considerações finais ................................................................................................................................. 134 REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................ 141 10 Introdução A atualidade é marcada por grandes mudanças tecnológicas que ressignificaram muito a sociedade. A revolução na comunicação apregoada por McLuhan (1971), em livro homônimo, começa a partir da popularização e disseminação de aparelhos audiovisuais. Esse processo tem sua origem a partir da invenção de Orticon - a primeira televisão que poderia ser produzida em escala industrial - em 1923 e desencadeia um processo que, segundo o autor, viria a intensificar-se. McLuhan, ainda que tenha morrido no ano de 1980, chega a prever tecnologias que nos conectariam globalmente, como aconteceu postumamente com o advento da internet. Esse processo não dá sinais de desaceleração e com a criação de novas mídias e tecnologias, se torna cada vez mais rápido e a adequação da sociedade a ele se faz fundamental. A tecnologia tem atualizado e também tornado obsoletos vários mecanismos de comunicação entre a espécie humana, mas não é apenas isso: a ciência, ao se utilizar destes novos recursos, vem descobrindo melhor o mundo em que vivemos e começa, então, a criar e reformular o que já está disposto nele. A disposição e consumo de produtos no mercado de alimentos transgênicos é comum atualmente e não gera tantas discussões acerca das questões éticas envolvidas como acontecia no passado. A interferência humana na natureza tem se tornado assunto cada vez mais corriqueiro e pontos de interferência, antes inimagináveis perante a moral, começam a ser revistos. Um dos pontos considerados até então tabu é a interferência tecnológica para modificar a espécie humana. Correntes filosóficas atuais, refletindo este entorno social cambiante, começam a questionar o humano em sua essência e colocam a tecnologia como elemento importante para tais reflexões, de forma direta ou indireta. Ainda assim, esses ideais se embatem com prerrogativas criacionistas largamente disseminadas em nossa sociedade. Imaginar o ser humano enquanto protagonista de seu futuro e senhor de sua própria forma e natureza é difícil para uma grande parte da sociedade, a qual se não acredita no criacionismo, ao menos foi criada a partir de tais preceitos. Além do princípio da fé, existe a noção de que o ser humano é falho como seria sua própria tecnologia e que este não possuiria 11
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