Departamento de História CONSERVAÇÃO PREVENTIVA: CONSTRUÇÃO DE UMA “CHECKLIST” APLICADA ÀS ÁREAS DE EXPOSIÇÃO E RESERVAS ANA ANDREIA ALBERTO LOPES Dissertação apresentada para obtenção do grau de Mestre em Museologia Orientadora: Professora Doutora Raquel Henriques da Silva Lisboa 2011 A GRADECIMENTOS Este espaço é dedicado a todos aqueles que deram o seu contributo para que esta dissertação fosse concretizada. Desde logo um reconhecimento e agradecimento especial à Dra. Conceição Borges de Sousa, que sempre se disponibilizou para me receber, orientar, esclarecer quaisquer dúvidas e ajudar para que a tese de mestrado alcançasse um término. À Professora Raquel Henriques da Silva que se prontificou para a orientação da mesma. A todos os colegas e professores do Mestrado em Museologia, pela partilha de experiências. Aos amigos, eles sabem quem são, pela paciência, companheirismo, amizade, compreensão e constante força e motivação para a concretização dos objectivos a que me propus. À Sónia pelo mútuo apoio, pela luta e pela esperança, a qual tentamos com determinação manter viva. A toda a família, que sempre esteve presente, em especial aos Pais, pelo estímulo e exemplo que são, me incentivaram a prosseguir na vida académica, sem nunca desanimar, e que com todo o amor contribuíram para a conclusão de mais uma etapa na minha vida. 2 Mas porque “…os problemas da conservação não se podem resolver, atirando- lhes com dinheiro e tecnologia‖, e porque “…muitas soluções que hoje se propõem estão legitimadas por práticas milenárias, como sejam as que resultam da necessidade de proteger os móveis e as tapeçarias dos efeitos da luz ou dos riscos da humidade e do pó, práticas que foram sendo abandonadas por força da evolução dos costumes, do gosto, da arquitectura e das técnicas de construção […]. Importa recuperar algumas destas práticas para as integrar na nossa realidade actual, nomeadamente as que tinham como objectivos evitar o calor e o frio e de que são exemplo os rolos nas frinchas das janelas e das portas, as cortinas pesadas e as persianas nas janelas que estavam viradas a sul e poente…” In, CASANOVAS, Luís Efrem Elias, Conservação Preventiva e Preservação das Obras de Arte. Condições- ambiente e espaços museológicos em Portugal, Tese de Doutoramento em História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2006, pág. 81 3 R ESUMO O tema seleccionado para a elaboração da presente dissertação de Mestrado – ―Conservação Preventiva: Construção de uma Checklist aplicada às áreas de Exposição e Reservas‖ - surge através de um diálogo estabelecido com a Dra. Conceição Borges de Sousa, Conservadora do Museu Nacional de Arte Antiga, que outrora me orientou num estágio extra-curricular nesse mesmo museu e que eu desejaria que fosse co- orientadora desta dissertação, o que não foi possível concretizar-se. Pretendia-se criar uma ferramenta, apoiada em princípios e prioridades da conservação preventiva, que fizesse parte integrante das rotinas de trabalho dos Museus, com o intuito de facilitar, metodizar e orientar de uma forma prática e concisa o trabalho pelos funcionários responsáveis por esta área nos mesmos, assegurando assim a estabilidade do acervo museológico e as próprias funções do Museu descritas na Lei-Quadro dos Museus Portugueses: conservar, estudar, divulgar, e expor. Para este fim, optou-se por utilizar o formato de ―checklist‖ pois a sua estrutura ia de encontro aos objectivos que se pretendiam alcançar. Refira-se que no âmbito do tema escolhido para a presente dissertação, apesar de terem sido encontradas algumas ―checklists‖ na área da conservação preventiva de bens museológicos, não foi encontrada nenhuma relativamente ao tema seleccionado, aumentando o interesse para a realização da mesma. Pretende-se criar uma ferramenta útil e ao mesmo tempo inovadora. Note-se que a finalidade deste trabalho não se prenderá com a análise e diagnóstico de uma determinada colecção de um Museu relativamente à identificação dos riscos específicos a que a colecção está sujeita, mas antes a criação de um guia para o/os responsável/eis pelo acervo museológico, reunindo na mesma lista todas as tarefas essenciais e indispensáveis a realizar nas áreas de exposição e reservas, aquando das inspecções de rotina e monitorização praticadas pelos mesmos. Para a construção da ―checklist‖ não foi usada nenhuma outra anteriormente realizada. Esta foi construída através da análise e estudo da bibliografia referente aos principais factores de deterioração que afectam as colecções dos Museus, a própria colecção e o edifício que a alberga. Mais, tendo em conta que a bibliografia em língua portuguesa sobre conservação preventiva é escassa e poucos são os museus e outras instituições que dispõem de publicações especializadas em língua estrangeira, pretende-se que a 4 ―checklist‖ proposta na presente dissertação seja encarada como um manual de fácil acesso e compreensão, através de uma linguagem objectiva, servindo de apoio a estudantes e àqueles que tenham de tomar decisões nesta área, evidenciando e explanando os aspectos de maior relevância na área da conservação preventiva. Sucintamente, definiu-se como objectivos: - Contextualizar a problemática da conservação preventiva no panorama museológico; - Identificar os principais organismos nacionais e internacionais que contribuem para o desenvolvimento da conservação preventiva; - Identificar os fundamentos legais relacionados com a problemática da conservação preventiva; - Identificar e mostrar a importância dos aspectos que envolvem o edifício que constitui o Museu, a caracterização do mesmo e do acervo que este alberga; - Identificar e caracterizar os factores de degradação principais dos bens culturais em Museus. - Criação de uma ―checklist‖ respeitante à prática da conservação preventiva nas áreas de exposição e reserva dos Museus. 5 Í NDICE GERAL Agradecimentos…………………………………………………………………... 2 Resumo……………………………………………………………………………. 4 Índice Geral……………………………………………………………………….. 6 Índice de Abreviaturas……………………………………………………………. 7 Índice de Tabelas e Figuras……………………………………………………….. 8 Introdução………………………………………………………………………… 9 Da Conservação Preventiva à Construção da ―Checklist‖……………………….. 18 1. Edifício…………………………………………………………….. 18 1.1. Situação geográfica…………………………………….. 18 1.2. Clima…………………………………………………… 19 1.3. Edifício e estado de conservação………………………. 21 1.4. Acervo………………………………………………….. 21 2. Espaço Expositivo e Reservas……………………………………... 22 2.1. Factores/agentes de deterioração………………………. 22 2.1.1. Luz………………………………………….. 22 2.1.2. Humidade e temperatura……………………. 30 2.1.3. Poluentes atmosféricos……………………... 40 2.1.4. Pestes……………………………………….. 48 2.1.5. Segurança…………………………………… 58 Checklist…………………………………………………………………………... 60 1. Edifício…………………………………………………………….. 61 2. Espaço Expositivo…………………………………………………. 69 3. Reservas…………………………………………………………… 79 Conclusão…………………………………………………………………………. 88 Bibliografia……………………………………………………………………….. 93 Anexos……………………………………………………………………..……… 101 6 Í NDICE DE ABREVIATURAS Organismos: - ASHRAE- American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers. - CCI – Canadian Conservation Institute. - GCI – Getty Conservation Institute. - ICOM – International Council of Museums. - ICCROM - International Centre for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property. - IMC – Instituto dos Museus e da Conservação. - RPM - Rede Portuguesa de Museus. - V&A – Victoria and Albert Museum. Designações Técnicas: - Radiação UV - Radiação ultra-violeta. - Hr - Humidade relativa. - CPI - Controlo Integrado de Pestes. 7 Í F NDICE DE IGURAS E TABELAS FIGURAS: Figura 1 – Valores de precipitação para Portugal Continental nos meses de Maio, Junho e Julho ……………………………………………………………………………….…20 Figura 2 – Espectro electromagnético…………………….…………………………..23 Figura 3 - Colónia de um fungo no verso da moldura de uma pintura. ………...…49 Figura 4- Ciclo de vida de um insecto e fotografia de um insecto xilófago na fase adulta………………………………………………...……………...………………….50 QUADROS: Quadro I - Recomendações de exposição à luz e radiação ultra-violeta, numa exposição diária de sete horas, consoante a sensibilidade à mesma de alguns materiais……….28 Quadro II-Principais poluentes atmosféricos encontrados no ambiente museológico..43 Quadro III – Principais poluentes atmosféricos vs. Efeitos nos bens culturais……….45 Quadro IV – Armadilhas de insectos e roedores…………………………………….53 Quadro V – Pragas e os seus efeitos nas peças………………………………………55 Quadro VI – Anóxia…………………………………………………………..……….57 8 1 I NTRODUÇÃO O que se entende como conservação preventiva em Museus? Em que consiste e qual é o objectivo da aplicação da mesma no ambiente de trabalho dos mesmos? Estas são questões primordiais e às quais deve ser dada resposta no âmbito do tema da presente dissertação e previamente ao desenvolvimento da mesma. Pretende-se também reiterar a importância da conservação preventiva no actual panorama português museológico, cuja menção é já parte integrante na Legislação Portuguesa e referenciar alguns organismos internacionais e nacionais que operam nesta área. Irá ainda fazer-se referência à existência de algumas ―checklists‖ construídas na área da conservação preventiva, apesar de não terem servido de base para a construção da que aqui é proposta. O ser humano, desde sempre e de forma intuitiva, cuidou e manteve as coisas que, de algum modo, lhe eram importantes. Esta necessidade de preservação faz parte integrante de um instinto de sobrevivência que impele o Homem a rever-se nos seus antepassados, e a atribuir valor à herança patrimonial que recebeu, tentando salvaguardá-la para as gerações vindouras (Pedroso, G., 1999). É uma actividade de longa data, e a sua estruturação inicia-se no século XX, num conjunto de actividades, práticas e conceitos mais especializados no domínio patrimonial, sendo o mais recente a ―conservação preventiva‖. Um dos grandes impulsionadores foi Garry Thomson1, nos 1 Garry Thomson (Malásia, 1925 – 2007) começou a sua carreira como investigador em Química, na National Gallery em Londres, de 1955 a 1960, ano em que foi promovido a conselheiro científico para a Administração e Chefe do Departamento Científico da mesma Instituição, cargo que ocupou até 1985. Em 1968, organizou a primeira conferência sobre a climatologia em Museus para o International Institute for Conservation (IIC), em Londres. Foi ainda presidente do mesmo Instituto de 1983 a 1986. Durante muitos anos foi colaborador do ICCROM, sendo encarregado de vários missões (incluindo na Algéria, Índia e Líbano), e concebendo o curso ―Princípios científicos da Conservação‖, lançado em Roma em 1974, o qual também ministrou. Em 1976 contribuiu para o novo curso do ICCROM ―Conservação Preventiva‖, sendo um professor regular no mesmo até 1989, e em 1986 recebe um prémio do mesmo Organismo. Foi o autor do livro The Museum Environment, publicado primeiro em 1978, e revisto em 1986, o qual se tornou numa fonte de informação fundamental na conservação de todos os tipos de colecções no mundo (http://www.iccrom.org/eng/news_en/2007_en/various_en/06_06obitThomson_en.shtml, em 11 de 9 anos de 1970, quando se apercebeu dos problemas provocados pela instalação sistemática de climatização nas galerias de exposição, demonstrando a importância de controlar o meio ambiente que rodeia as colecções, bem como a sua iluminação. Outro impulsionador foi Gäel de Guichen2, quando utilizou a expressão ―conservação preventiva‖: ―Where yesterday one saw objects, today one should see collections. Where one saw rooms, one should see buildings. Where one saw a person, one should see teams. Where one saw short-term expenditure, one should see long-term investment. Where one saw day-to-day actions, one should see programme and priorities. Preventive conservation means taking out a life insurance for museum collections‖ (http://oldweb.ct.infn.it/~rivel/museologia/1_ICOM-CC.pdf, em 14 de Janeiro de 2010). De acordo com Gäel de Guichen a conservação preventiva é entendida como um conjunto de acções destinadas a assegurar a preservação de uma colecção, ou de um objecto, aumentando a sua esperança de vida, com vista à sua transmissão às gerações futuras. A sua aplicação prática envolve as qualidades que o ser humano possui – senso comum, memória, intuição, imaginação, razão e ética - conjugadas e inter-relacionadas com o conhecimento cientifico e experiência profissional do mesmo. As acções neste sentido pretendem-se indirectas, actuando apenas sobre aquilo que rodeia o objecto. Novembro de 2010). Garry Thomson é portanto um dos mais importante autores da ciência da Conservação e da Conservação Preventiva. 2 Gäel de Guichen (França), Engenheiro Químico e investigador, é considerado por muitos teóricos e profissionais como uma referência internacional no que diz respeito à Conservação Preventiva dos bens culturais, pelo seu trabalho pioneiro neste campo e por ter contribuído de maneira decisiva para a sua afirmação como matéria disciplinar. Em 1969 incorpora no ICCROM –― International Centre for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property‖- em Roma, no qual se desenrolou a sua carreira profissional. Ocupou, entre outros cargos, o de Director do Departamento de Colecções, coordenando mais de 500 projectos dos países membros deste Organismo. Destacam-se os cursos de Conservação Preventiva no ICCROM, dirigidos a Conservadores de Museus, Conservadores- restauradores e cientistas, por ele desenhados. Na década de 1990, preocupado com a pouca atenção dada pela imprensa às questões ligadas à conservação do património cultural, participou em dois programas, no ―PREMA – Prevenção nos Museus Africanos‖ e no ―Salvar Media Art‖, cujo objectivo era a integração do público na conservação preventiva. Esta campanha consistiu em cinco competições internacionais que originaram 250 artigos publicados em grandes jornais americanos e europeus, revistas, documentários televisivos, noticiários e programas, fotografias, etc. Actualmente ocupa o cargo de Director Geral do ICCROM (http://museudainconfidencia.wordpress.com/2009/10/; http://ge- iic.com/files/Cursos/CV_conferenciantes.pdf, em 11 de Novembro de 2010). 10
Description: