SENADO FEDERAL UNIVERSIDADE DO LEGISLATIVO BRASILEIRO UNILEGIS PATRICIA SILVA BERNARDI PERES EDUCAÇÃO: INSTRUMENTO PARA A CIDADANIA, ÉTICA E DIGNIDADE HUMANA BRASÍLIA – DF 2008 2 PATRÍCIA SILVA BERNARDI PERES EDUCAÇÃO: INSTRUMENTO PARA A CIDADANIA, ÉTICA E DIGNIDADE HUMANA Trabalho final apresentado para aprovação no curso de pós-graduação lato sensu em 2008 realizado pela UNILEGIS - Universidade do Legislativo Brasileiro e pela UFMS – Universidade Federal do Mato Grosso do Sul como requisito para obtenção do título de especialista em Direito Legislativo Orientadora: Tatiana Feitosa de Britto BRASILIA – DF 2008 3 EDUCAÇÃO: INSTRUMENTO PARA A CIDADANIA, ÉTICA E DIGNIDADE HUMANA Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Direito Legislativo, realizado pela Universidade do Legislativo Brasileiro no 2º semestre de 2008. Aluno: Patrícia Silva Bernardi Peres Banca Examinadora: ________________________________________ Tatiana Feitosa de Britto ________________________________________ Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho Brasília, 24 de Novembro de 2008. 4 AGRADECIMENTOS A Deus, que sempre foi o meu grande refúgio. Ao meu esposo, amigo e companheiro, Adriano, que em mais esta conquista esteve presente, me apoiando e muitas vezes assumindo as minhas obrigações para que eu tivesse mais tranqüilidade e tempo para me dedicar aos estudos. Aos meus filhos, Bruna, Victor e Alexandre, que abdicaram dos meus cuidados e da minha presença em diversos momentos para eu conseguir alcançar mais esta etapa em minha vida. À minha orientadora, Tatiana F. de Britto, que desde o primeiro contato sempre se mostrou prestativa, auxiliando-me e incentivando-me durante a realização de todo esse trabalho. Aos meus professores e amigos da Unilegis, por todo ensinamento, compartilhamento e principalmente pelo agradável ambiente de aprendizado. 5 RESUMO A presente monografia discute a educação como um instrumento para a construção da cidadania, dos valores éticos e da dignidade humana. Para tanto, apresenta um quadro conceitual do direito à educação como um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988, por meio do art. 6º e, em especial, do art. 205, dispositivo exclusivamente dedicado ao tema, que firmou o entendimento de que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família. Com base nos princípios constitucionais, o trabalho investigou como está sendo implementada, no âmbito da educação básica, a formação para o exercício da cidadania, de modo a minimizar os preconceitos e a imensa desigualdade social de nosso país. Assim, foi realizado um levantamento dos principais instrumentos normativos e projetos governamentais voltados para garantir que os fundamentos constitucionais da cidadania, da dignidade humana e dos valores éticos sejam, de fato, tornados realidade na rede de ensino do país. Essa pesquisa foi complementada por um trabalho de campo realizado em três escolas do Distrito Federal , com o objetivo de verificar, na prática, a aplicabilidade das normas e dos programas oficiais, bem como analisar de que modo eles estão sendo trabalhados nos próprios estabelecimentos de ensino. Concluiu-se que, nesses vinte anos de " educação cidadã " , desde a promulgação da Constituição, iniciou-se uma mudança no enfoque da educação escolar, antes voltada para um ensino conteudista, em direção a uma educação propulsora do pleno desenvolvimento do ser humano, da preparação para o trabalho e como condição para o exercício da cidadania. Porém, muitas são as dificuldades encontradas pelas instituições de ensino e pelos professores para alcançar os resultados pretendidos e o disposto na lei, abrangendo desde a falta de preparação do corpo docente até fatores externos à escola, como a desestrutura familiar, a violência da sociedade e o preconceito arraigado. Palavras-chave: Cidadania; Constituição Federal; dignidade humana; educação e ética 6 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 07 DESENVOLVIMENTO 11 1. QUADRO CONCEITUAL 1.1 O ÍNICIO DA EDUCAÇÃO COM VISÃO CIDADÃ 11 1.2 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMO CENTRO DO DIREITO 12 1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO 14 1.4 DIREITO À EDUCAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL 19 1.5 CIDADANIA 21 1.6 A DIGNIDADE HUMANA 24 1.7 ÉTICA NA EDUCAÇÃO 28 2. CIDANIA, ÉTICA E DIGNIDADE HUMANA NA ESCOLA: LEIS, PROGRAMAS E PROJETOS 31 2.1 LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL – LDB 31 2.2 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS – PNEDH 36 2.3 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS – PCN 38 2.4 PROGRAMA DE ÉTICA E CIDADANIA – MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO 40 2.5 CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA DAS ESCOLAS PÚBLICAS DO DISTRITO FEDERAL 41 3. CIDADANIA, ÉTICA E DIGNIDADE HUMANA NAS ESCOLAS DO DF: ESTUDOS DE CASO 42 3.1 RELATÓRIO DE VISITA À ESCOLA CLASSE 415 NORTE 43 3.2 RELATÓRIO DE VISITA À ESCOLA CLASSE 104 NORTE 44 3.3 RELATÓRIO DE VISITA AO COLÉGIO JK 46 3.4 RELATO DA REPORTAGEM – VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS 48 4. CONCLUSÃO 49 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS 55 7 INTRODUÇÃO O conhecimento propicia qualidade na vida individual e integra o homem na sociedade. Leva o homem ao desenvolvimento constante, à prosperidade, à liberdade de escolha, consciência de decisão, com capacidade de lutar pelos seus objetivos e ideais, não sendo influenciado por pensamentos incompatíveis com os seus próprios. Não há dignidade humana, nem cidadania na ignorância. Não educar é não dar liberdade. Conforme Fabiana Cássia Dupim Souza, É preciso educar o povo (crianças, adultos e idosos aí incluídos), para que ele possa compreender seu papel na sociedade em que vive e exercer os direitos que decorrem da situação da peça ativa da realidade que o circunda. (...) A escola deve servir como instrumento de preparação para uma participação ativa no mundo. Não há como reivindicar, propor ou participar sem que se saiba de quê. É imprescindível que o povo saiba ler, que tenha noções, ainda que básicas, dos direitos de que é titular. (...) não há cidadania plena onde não há educação. Povo sem educação, sem participação nos rumos de seu Estado, inconsciente de seu papel no mundo, alheio às discussões que o impulsionam, perde a condição de cidadão e passa a ser simplesmente mera massa disforme (apud ROCHA, 2004, p.232). O cidadão desinformado torna-se “escravo” das decisões dos demais, pois não tem condições de decidir, acaba sendo uma pessoa de fácil manipulação, alvo de oportunistas e enganadores. Essa pessoa é livre em seu ir e vir, mas preso ao desconhecimento. Somente com conhecimento, homens e mulheres são livres e têm pelo menos alguma chance de exercer sua liberdade (SILVA, 2006). O duplo desafio da educação é ensinar o aluno a participar – sinônimo de cidadania e a produzir – sinônimo de trabalho. Quando se ensina o aluno a “aprender a aprender” (DEMO, 1995), se lhe estão fornecendo as ferramentas para que o mesmo desenvolva papel estratégico de aprendizado e crescimento contínuo nos desafios que o futuro lhe apresentar. Segundo Pedro Demo “a base educativa comum precisa datar-se de qualidade formal e política adequadas, em termos quantitativos e qualitativos, passando a funcionar como motor substancial do processo de modernização da sociedade e da 8 economia” (1995, p.29). O autor ainda considera analfabeto o “desinformado”, e não o iletrado. O conhecimento político, social e econômico é pré-requisito para realizar, debater, questionar, intervir, lutar, defender, transformar, decidir, socializar-se. Quando a educação plenamente proporcionar esses conhecimentos, o ser humano terá a possibilidade de fazer as suas próprias escolhas. A informação torna-se o primeiro item a ser cumprido para que o cidadão esteja apto para o exercício da cidadania e, por fim, esteja qualificado profissionalmente para ser incluído no mercado de trabalho. “O homem não pode tornar-se um verdadeiro homem senão pela educação. Ele é aquilo que a educação dele faz” (KANT, 1996, p.15). Limites de vagas, altos índices de repetência, evasão escolar, falta de professores, baixos salários, falta de verbas para infra-estrutura operacional, escolas distantes da residência do aluno, diferença nos valores investidos por aluno/ano entre os Estados da Nação. Apesar de todas essas situações reais, a formação de alunos sem consciência crítica não pode ser justificada. Cabe ao educador incluir em processos didáticos os problemas atuais do país, o conhecimento legal, as relações existentes entre o povo e o governo. A democracia se inicia com os princípios éticos e morais passados na escola e na família. Com o aprendizado objetivando a cidadania de fato e de direito pode se chegar ao alvo constitucional de dar uma vida digna a toda à população brasileira. Por todas essas razões, a Constituição da Republica Federativa do Brasil, intitulada “cidadã”, legisla sobre diversos direitos sociais, ao longo do art. 6º, e inclui a educação como um dos direitos fundamentais para se conquistar uma vida digna, com cidadãos capazes para o exercício da cidadania, segundo o art. 205. O art. 6º declara que são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e infância, a assistência aos desamparados, na forma preconizada pela Constituição. O sentido do direito à educação na ordem constitucional de 1988 está intimamente ligado ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil, bem como com os seus objetivos, especificamente: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; o desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza e da marginalização; a redução 9 das desigualdades sociais e regionais; e a promoção do bem comum (art. 3º, CF 1988). O art. 205 da CF define: “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Os valores sociais do trabalho e da iniciativa estão definidos no art. 1º, IV, CF como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. O indivíduo que for instruído a participar da vida como cidadão e capacitado para o exercício do trabalho estará apto para contribuir para o seu crescimento pessoal e o do país. No contexto do arcabouço constitucional, não cabe mais à escola apenas alfabetizar, ensinar os princípios da ciência, os fundamentos da matemática e da gramática. Mais do que isso, é preciso ensinar a pesquisar, buscar novos conhecimentos, interpretar a humanidade e as leis nas quais se está inserido. Após a nova Constituição, as escolas receberam uma grandiosa função: formar cidadãos conscientes de seu papel na sociedade, indivíduos capazes de conhecer seus direitos e deveres e assumir as suas responsabilidades para exercer uma cidadania plena. A melhor expressão que resume educação cidadã seria ensinar a criticar. O cidadão crítico é capaz de distinguir e reconhecer as ações humanas como corretas ou não. A palavra crítica vem do grego kritein, e significa julgar, distinguir, analisar, separar. O homem preparado para criticar é aquele que conhece o contexto em que está inserido, ou seja, a sociedade, e principalmente conhece a sua função de agente da sociedade com capacidade e autoridade na busca do melhor e da verdade. A “prática do levar vantagem” não lhe seria mais aceitável e tão comum. “Formar uma consciência crítica significa preparar o indivíduo para – de posse do conhecimento da sociedade em si e do conhecimento sobre as condições sociais de suas próprias funções – distinguir o que os outros estão fazendo e o que ele deve fazer” (RODRIGUES, 1996, p. 70). Aprender a criticar é aprender a ser ético, fundamentar-se, buscar os fatos reais, conhecer o que se está criticando. Quando criticamos, na verdade estamos buscando algo que entendemos como de direito, mas também devemos nos preparar para reconhecer que nossa crítica pode não estar correta. A crítica feita com ética e respeito leva ao debate, ao crescimento e amadurecimento. Não é ético criticar o que 10 não se conhece. Paulo Freire descreveu que “o direito incontestável de criticar exige de quem o exerce o dever de não mentir” (2001, p. 64). Este trabalho enfocará o cidadão como o indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado democrático e que para o exercício da cidadania estará condicionado ao uso dos direitos e ao cumprimento dos deveres de cidadão. A Constituição Cidadã enfatizou em vários artigos “a dignidade humana”, a “cidadania” e a “educação”, além de ser uma Constituição embasada em princípios éticos. Este estudo pretende demonstrar que não há possibilidade de se atingir um fator sem os demais estarem caminhando juntos. Somente com a interação de todos estes elementos terá a Constituição atingido seu alvo. Constituir um Estado Democrático de Direito, e de fato. Um povo não atinge a cidadania se não lhe é assegurada uma educação que o qualifique para este exercício. Um povo com educação de qualidade, exercendo a sua cidadania, é um povo no qual a dignidade humana foi colocada em primeiro plano. O trabalho se organiza da seguinte forma. Após esta breve introdução, será realizada uma exposição sobre a educação como valor fundamental para se atingir a cidadania, a ética e a dignidade humana. Em seguida, será realizada uma pesquisa do que tem sido executado ou almejado para a educação cidadã, através de leis, planos educacionais e governamentais que estejam direcionados para este foco. Finalmente, apresentarei os resultados de um trabalho de pesquisa de campo em algumas escolas do Distrito Federal, com o objetivo de averiguar o que se tem concretizado para a construção deste novo perfil educacional. Nesse sentido, procurarei elencar as dificuldades encontradas para a implementação dessas novas propostas e discutir como está o caminhar destes princípios no âmbito do sistema educacional. Portanto, não pretendo encontrar soluções para resolver as mazelas do sistema educacional, mas fazer uma análise de como está sendo abordada a questão da cidadania, da ética e da dignidade humana na educação básica após estes 20 anos de Constituição Cidadã, quando a educação tomou um rumo diferente na sua história, deixando de ser uma educação conteudista para ser uma educação voltada para o desenvolvimento pessoal dos alunos, objetivando a atuação com desenvoltura nos campos político, social, cultural, econômico e financeiro de cada indivíduo. Embora essa preocupação não seja nova, o fato de a CF ter adotado essa perspectiva já configura uma inovação.
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