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as fontes da nova lex mercatoria PDF

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Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca 125 AS FONTES DA NOVA LEX MERCATORIA: O INÍCIO DE UMA NOVA ALQUIMIA REFLEXIVA - MÉTODOS E REFLEXOS; FLUXOS E IMPULSOS Ricardo Alexandre Cardoso Rodrigues ISSUE DOI: 10.21207/1983.4225.307 RESUMO Temos assistido, nos últimos anos, a diversas manifestações da Nova Ordem Mundial, seja no plano político, social, econômico e financeiro. A nova lex mercatoria representa a melhor expressão destas mutações no comércio transnacional, pela sua natureza transnacional, dinâmica, reve- la-se intensamente multifacetada, pelo que constitui uma realidade jurídi- ca open-ended ou in progress. Neste estudo, procuramos desenvolver, cientificamente, aquilo a que chamamos, no plano das fontes, o núcleo duro da nova lex mercatoria, os seus diversos afloramentos e desenvolvimentos no curso da história. O objetivo fundamental desta investigação é através de um processo de sistematização permitir aos juristas e interessados nestes assuntos um acesso simplificado para uma profunda compreensão da sua natureza e amplitude. 126 ISSN 1983-4225 – v.10, n.2, dez. 2015. Palavras chave: Nova lex mercatória. Comércio transnacional. Fontes do Direito. INTRODUÇÃO A globalização e a mundialização transmutaram, definitivamen- te, a sociedade e o globo. A realidade econômica hodierna já não se com- padece com a rigidez, obscuridade, entre outras limitações próprias dos direitos Estaduais. A dinâmica das operações mercantis num espaço tão fluído co- mo o transnacional, a par dos riscos inerentes aos grandes investimentos, pressupõe, necessariamente, uma elevada segurança jurídica. As expetativas dos operadores do mercado não poderão ser frus- tradas, razões de ordem econômica, social, política e até cultural, moti- vam uma tutela eficiente aos interesses e necessidades do comércio trans- nacional. A nova lex mercatoria enquanto verdadeira ordem jurídica dis- põe dos instrumentos fundamentais à otimização das transações, com reflexo econômico e financeiro imediato. Constitui o instrumento mais eficiente para a contratação inter- nacional, seja enquanto corpo disciplinador por via direta, como estrutura normativa a que se chegue pela via indireta, ou como ordenamento jurídi- co coadjuvante. A nova lex mercatoria constitui o marco ideal da nova ordem econômica transnacional. Foi através da lex mercatoria – nos seus diferentes estádios evo- lutivos – que os operadores de mercado viram singrar as respetivas ativi- dades comerciais no seio do seu setor de mercado. Na antiguidade, passando pela Idade Média, pelo fim da Idade Moderna, pela Idade Contemporânea, a lex mercatoria provou a adaptabi- lidade e flexibilidade funcionais – à realidade espacial e temporal – que tanto a carateriza. A lex mercatoria remonta à Antiguidade, revelando-se, como estrutura autossuficiente em meados do século X-XI. Emergindo como ius mercatorum – essencialmente pelas fragilidades do Direito do Império Romano desagregado e das insuficiências dos Direitos feudais –, o Direi- to dos mercadores e o Direito das suas corporações, com uma natureza Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca 127 jurídica espontânea, tendo por base os usos e costumes do comércio local e internacional, regras de conduta (etc.), atingira a sua fase adulta no final da Idade Média. Com o surgimento do Estado soberano, aparecem as primeiras codificações que absorveram para os seus dispositivos legais os normati- vos do direito dos mercadores, passando a aplicar-se como Direito Esta- dual. A partir dos séculos XVII e XVIII, uma nova fase daquele Direito toma lugar. Veem-se renascidas as suas formas e o seu conteúdo exponenci- almente mais vasto, mas também, mais coeso, mais sistemático. Os contornos dessa realidade ganham uma dimensão verdadei- ramente internacional ou transnacional por efeito da globalização e mun- dialização hodiernas. Para essa unicidade muito contribuíram os dois instrumentos de soft law mais marcantes no panorama do Direito comercial internacional: os princípios UNIDROIT e os princípios LANDO201 202. Com uma natureza não vinculativa, o Direito comercial interna- cional recorreu a um jogo de influência, utilizando modelos de regulação, mas também, modelos interpretativos e integrativos, servindo como fonte de inspiração para legisladores, julgadores e intérpretes. A nova lex mercatoria ou new law merchant corresponde a um novo corpo normativo bastante amplo no que tange ao seu conteúdo, compreendendo: usos e costumes, modelos jurídicos: contratos tipo e formulários standard, contratos auto-normativos, contratos atípicos (so- bretudo os tipos sociais), jurisprudência, princípios gerais do direito e, em especial, os princípios gerais em matéria contratual; por último, di- reito harmonizado, unificado e uniforme da contratação internacional. Apresenta-se como uma realidade dinâmica, multidimensional, uma ordem jurídica suis generis.203,204. Opinião fervorosamente combati- da e apaixonadamente acolhida por diversos setores de opinião205. 201 De notar, as potencialidades destes últimos princípios, seja como base para um futuro código europeu dos contratos seja para a edificação de uma verdadeira “infraestrutura” para a legislação, em matéria contratual, da União Europeia. Aliás, o reflexo dessa evolu- ção está na criação de um Quadro Europeu Comum de Referência em matéria de contratos (QFR). 202 Marcos aos quais dedicaremos especial atenção. 203 Partindo duma perspetiva sociológica do direito nos seus axiomas estruturais definimos – in Regulação apositiva da contratação internacional – New law merchant, in pas- 128 ISSN 1983-4225 – v.10, n.2, dez. 2015. Constitui uma realidade ampla, desenvolta, fluida, deveras efi- ciente, adequada às exigências do comércio transnacional. Um direito à margem dos sistemas jurídicos nacionais. A mais preciosa manifestação da Nova Ordem Jurídica Mundial. A composição hodierna da new law merchant é tão rica quão complexa e interessante. Fruto da evolução dos tempos, revela-se a partir do processo de sedimentação ou cristalização na vida mercantil. Passa- mos, ora, a expor os seus mais marcantes elementos206. 1 USOS E COSTUMES DO COMÉRCIO INTERNACIONAL Não poderemos deixar de relevar a importância daquilo que de- signamos como os primeiros passos da lex mercatoria.207 No fundo, os elementos constitutivos da sua base ou gênese normativa. Falamos dos usos e costumes do comércio internacional208,209,210. sim. E as correspondentes referências – nova lex mercatoria como o direito apositivo [um direito sempre novíssimo, um direito vivo] da contratação internacional [com as devidas ressalvas ao seu âmbito de aplicação – bem mais amplo – visto estarmos no domínio da contratação internacional], um direito universal-setorial, eminentemente, espontâneo, criado segundo processos jurígenos específicos, constituído por um conjunto de esquemas normativos – autónomos e quási-autónomos – e paranormativos dotados de eficácia na e para a business community. Em síntese, a regulação apositiva da contratação internacio- nal. Um Direito que vive e revive a par do direito dos Estados e de outras revelações de direito que existem em constante interceção. 204 Para mais desenvolvimento Vide CARDOSO RODRIGUES, Ricardo Alexandre – Regulação apositiva da contratação internacional – New law merchant, in passim. E as correspondentes referências. 205 In ibidem.. In passim. E as correspondentes referências. 206 Em termos técnicos fontes. De onde brotam todas as formas de disciplina apositi- va mercantil transnacional. Ou, no fundo, critérios jurídicos da nova lei dos merca- dores. 207Uma parte, muito reduzida, da nova lex mercatoria foi positivada pela via consuetudi- nária ou pela atividade normativa de alguns centros autónomos. Todavia, consideramos que nem por isso na sua prática mercantil transnacional deixara de ser recorrentemente utilizada, pelo que iremos, também, considera-la no nosso estudo. 208 Como sabemos existe uma distinção, mais ou menos, precisa da ideia de uso e de costume, entre nós, PIRES DE LIMA, F. A. / ANTUNES VARELA J. M., – Noções fundamentais de direito civil, Vol. I, Coimbra, Coimbra Editora, 4.ª ed., 1957, págs., 109-110; GALVÃO TELLES, – Introdução ao Estudo do Direito, Vol. I, Coimbra, Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca 129 Implicam, como é sabido, uma prática reiterada e constante (elemento material), a que se acrescerá a correspondente aceitação, certe- za ou convicção (da rotina, prática ou rito) subjetiva e socialmente assu- mida pelos elementos da comunidade mercantil, cuja dimensão da sua obrigatoriedade varia de acordo com o grau, nível ou dimensão da gene- ralização ou projeção funcional (elemento psicológico: opinio iuris vel necessitatis) 211 212 213. Certamente, a fonte mais pura e genuína, mas tam- Coimbra Editora, 2010, págs. 81 e 96; DIAS MARQUES, J. – Introdução ao Estudo do Direito, 4.ª ed., Lisboa, 1972, pág. 206; CASTRO MENDES, J. – Introdução ao Estudo do Direito, 3.ª ed., Lisboa, 2010, pág. 109-111, Vide, também, nota de rodapé n.º 63; OLIVEIRA ASCENSÃO – O direito. Introdução e teoria geral, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1978. págs. 218-219, 230-232; BAPTISTA MACHADO, J. – In- trodução ao direito e ao discurso legitimador, Coimbra, Almedina, 1990, págs. 158- 159, 161, Vide in fine. MENEZES CORDEIRO, A. – Costume TUME, Enc. Polis, Vol. I, Lisboa, Verbo, 1983, pág. 1349. Vide, também, SANTOS JUSTO, A. – Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra, Coimbra Editora, 6.ª Ed., 2012, págs. 211-223; e BARBO- SA RODRIGUES, LUÍS, – Manual de Introdução ao Direito: Interno e Internacional, FORMALPRESS, 2011 págs. 165-169, sobre o costume internacional, in ibidem, págs 163-165. 209 Diversos autores, defensores da lex mercatoria, qualificam estas regras de direito consuetudinário. Todavia, há autores que consideram que melhor será optar pela expres- são usos quando pretendem referir-se à disciplina de origem costumeira, por duas ordens de razão: a primeira porque a destrinça entre uso e costume é difícil devido aos obstáculos tidos pela busca de uma fronteira absoluta; a segunda, pelo facto de a expressão usos, ter sido, recorrentemente utilizada na sua aceção ampla, abarcando, assim, o fenómeno cos- tumeiro. Neste sentido e tendo em consideração, somente, a prática arbitral e o enquadra- mento real da jurisprudência francesa. Vide. FOUCHARD, Ph. – Les usages, l’arbitre et le juge, in Le droit des relations économiques internationales – Études offertes à Berthold Goldman. Paris, Librairies Techniques, 1983, pág. 68. 210Preferimos recorrer à expressão “usos e costumes”. Esta englobará as duas ex- pressões, a prática mercantil mais vincada no comércio transnacional. A diferença estará no grau e na amplitude da aceitação dessas práticas, que será tanto maior, no caso do costume, e tanto menor, no caso do mero uso. Atentamos, todavia, as carac- terísticas fundamentais destas práticas. 211 Quando a lei de um Estado não se adapta às exigências do tráfico mercantil, os comer- ciantes não aguardam por forma passiva pela disciplina legal adequada, antes recorrem aos usos (lato sensu) extra legen, mais adequados àquelas exigências. O direito mercantil nasce por força do uso, não por força do impulso legislativo. Vide. MARTINEZ CA- ÑELLAS. A. – Temas de Derecho Vivo, Madrid, Civitas, 1978. 212 Os usos mercantis que se traduzem em práticas reiteradas no mundo dos negócios, que revelam a observância por forma uniforme e generalizada de regras de conduta, ou modus de agir. ANTUNES, J. Engrácia, A. – Direito dos Contratos Comerciais, Coimbra, Almedina, 2009, pág. 58 130 ISSN 1983-4225 – v.10, n.2, dez. 2015. bém mais fluida e mutável, acompanhando o pulsar do comércio no espa- ço transnacional. Não obstante, a sua volatilidade e seu dinamismo que acabam, de certa forma, por obstaculizar a sua captação plena, motivando a energia de fações da doutrina mais céticas em torno da questão da prova efetiva da sua existência, os usos e costumes do comércio internacional têm sido, no decurso dos tempos, objeto de compilação levada a cabo por diversas agências e organizações internacionais214, não menosprezando a colaboração fundamental das associações profissionais e corporativas nacionais215, procurando superar a sua diversidade, bem como estabelecer correspondências, ligações, critérios equivalentes, estabelecendo um tron- co comum, visando um cânone, um padrão216 217. Desse trabalho intensivo resulta todo um processo de unificação do corpo normativo, que passará, também, pela supressão de ineficiências lógicas e teleológicas, recriando- se, em certos casos, a harmonia jurídico-econômica dos preceitos, poten- ciando-se, deste modo, a continuidade das relações jurídicas comerciais. Os INCOTERMS218 (ou termos do comércio internacional)219 são um bom testemunho do que se vem afirmando. Constituem regras 213 Determinados ordenamentos jurídicos reconhecem a relevância dos “usos de comér- cio” no âmbito da contratação mercantil, como exemplo: o § 346 do “Handelsgesetzbuch” germânico. Para maiores desenvolvimentos, Vide ANTUNES, J. Engrácia, A. “Consueto Mercatorum” como Fonte do Direito Comercial, in: 146 RDMIEF (2007), 7-22. In nota 52 ANTUNES, J. Engrácia, A. – Direito dos Contratos Comerciais, Coimbra, Almedina, 2009, pág. 58. 214 Vide DRAETTA, Ugo, – Gli Usi del Commercio Internazionale nella Formazione di Contratti Internazionali, in: DRAETTA, Ugo/ VACCÀ, Cesare (dir.), “Fonti e Tipi del Contratto Internazionale”, Milão, EGEA, 1991, págs. 49-72. 215 Vide FOUCHARD, Ph, – L’arbitrage comercial international, Paris, Dalloz, 1965, pág. 410. P. ex. London Corn Trade Association, Substituída pela Grain and Feed Trade Association Limited of London –MUSTILL, Lord Justice – The New Lex Mercatoria: The First Twenty- Five Years, em Liber Amicorum for the Rt. Hon. Lord Wilberforce, Pc, CMG, OBE, QC, Oxford, Clarendon Press, 1987, pág. 159, n.º 37; Outras associações nacionais. KAHN, Ph, – La vente commerciale internationale, Paris, Sirey, 1961, pág. 21; SIEHR, K, – Sachrecht im IPR, transnationales Recht und lex mercatoria, in W. Holl– U. Klinke, Internationales Privatrecht – Internationales Wirtschaftsrecht, Co- lónia/Berlim/Bona/Mogúncia, Carl Heymanns Verlag, 1985, pág. 314 e n.º 63. 216 Vide estudo sobre os usos e costumes do comércio internacional. KASSIS, A. – Thèorie genèrale des usages de commerce, LGDJ, Paris, 1984, págs. 159-220. Atente- se, no entanto, que se trata de um dos autores que nega o carácter substantivo da lex mer- catoria. 217 Constituindo aquilo a que podemos chamar usos codificados. 218 Foi elaborada e publicada pela CCI em 1936 e sofreu sete revisões: 1953, 1967, 1976, 1980, 1990, 2000 e a versão 2010. Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca 131 oficiais da Câmara do Comércio Internacional de Paris (CCI)220 para a interpretação de termos comerciais usados nos contratos relativos a tran- sações transnacionais221 222 223 224.Um outro grande exemplo é o regime jurídico do crédito documentário225 que se encontra, essencialmente, pre- visto nas Regras e Usos Uniformes sobre Créditos Documentários (CCI)226 227 228 229 230. Constituem, hoje, disciplina jurídica uniforme de 219 Regras internacionais de interpretação uniforme da terminologia contratual comercial. 220 Fundada em 1919. 221 Especialmente para analisar das responsabilidades dos operadores envolvidos. 222 Para TETLEY, no âmbito do Direito privado a avaria geral, o salvamento, afretamento e seguro marítimo, constituem dos princípios mais antigos, elaborados como resposta às dificuldades do comércio marítimo. Terão sido difundidas pelos países de tradição anglo- saxónica ou romano-germânica. A necessidade de unificação provocou na Europa Medie- val o surgimento da Lex mercatoria transnacional, e como parte dela a Lex marítima. Sobre a história do Direito Marítimo e do “Almirantado”. TETLEY, William. – Interna- tional Maritime and Admiralty Law. Québec, Éditions Yvon Blais, 2002, pág. 4.: pág. 3-30. 223 Vide site International Chamber of Commerce (ICC), disponível em: http://www.iccwbo.org. 224 Vide site Portugal International Chamber of Commerce (Delegação Nacional Portuguesa da Câmara de Comércio Internacional), disponível em: http://www.icc- portugal.com/. 225 Contrato atípico e inominado. Sobre a natureza jurídica Vide. PINA, C. COSTA – Conceito, Estrutura e Natureza dos Créditos Documentários, págs. 111 e ss. In: “Es- tudos Jurídicose Económicos em Homenagem ao Professor Doutor João Lumbrales”, págs. 95-117, Coimbra, Coimbra Editora, 2000. Vide também, UREBA, A. Alonso – Naturaleza y Régimen der Crédito Documentário, in: AAVV, “ Contratos Bancários”, págs 437-490, Madrid, Civitas, 1992. 226 CCI – Uniform Customs and Practice for Documentary Credits/ /2007 Revision. 2007, p. 66. 227 Adotadas em 1933, revistas em 1951, depois em 1962, mais tarde, em 1975, logo depois em 1983, seguidamente em 1993, em 1 e em 2007 (UCP600) sua última versão. InRevista > Ano 2007 > Ano 67 – Vol. I – Jan. 2007> Doutrina, MENEZES CORDEIRO A. – Créditos Documentários. Disponível em: http://www.oa.pt/Conteudos/Artigo s/detalhe_artigo.aspx?idc=30777&idsc=59032&ida=59051. Consultado em : 19-02-2015. 228 A respeito das duas últimas versões Vide. BYRNE, J. – The Comparison Between UCP500 and UCP600, Institute of Banking Law and Practice, Montgomery, 2007. DU- RÁ, R. Marimón – La Nueva Editión de las Reglas de la CCI para los Créditos Do- cumentários, in: 263 RDM, 2007, págs. 7-68. 229 I – As Regras e Usos Uniformes sobre Crédito Documentário (RUU) constituem direi- to dispositivo para o qual as empresas remetem a regulação das suas relações contratuais plurilocalizadas, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, enquanto expressão da denominada «lex mercatoria». II – A natureza jurídica dos créditos documentários, face à ausência da sua previsão legal, 132 ISSN 1983-4225 – v.10, n.2, dez. 2015. vocação universal231 232. Existem, ainda, as regras uniformes relativas às cobranças (CCI) e as regras e usos uniformes para as garantias contratuais (CCI)233 . Atente-se, que os usos e costumes do comércio internacional cristalizam-se, o mais das vezes, setorialmente: Esse processo passa pela especialização em diferentes setores do Direito Comercial Transnacional. Assim, e designadamente, no âmbito das construções, a lex constructionis234; no âmbito do comércio eletrôni- co, a lex eletrônica, informática ou numérica; no setor dos derivados do petróleo, gás e carvão, a lex petrólia235; no setor bancário, a lex argenta- rium; no que tange aos assuntos relacionados com o mar, a lex marítima. no ordenamento jurídico português, só pode ser encontrada, através do regime jurídico definido pelas RUU. Negrito nosso. In Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 1ª SEC- ÇÃO, processo n.º 406/09.0YFLSB, em 22-09-2009. 230 Sob a sua égide a CCI reconhece, já, todo um conjunto de documentos desenvolvidos pelos associados, com expressão significativa na prática mercantil internacional. Entre os quais: os Forwarders Certificate of Receipt (FCR); Forwarders Certificate of Transport (FTC); Negotiable Fiata Combined Transport Bill of Lading (FBL). Neste sentido Vide. GOODE, Roy – Commercial Law, Penguin, Middlesex / New York, 1982, págs. 566 e ss, Para mais desenvolvimentos a respeito. PINA, C. Costa – Créditos Documentários – As regras e Usos Uniformes da Câmara de Comércio Internacional e a Prática Ban- cária, Coimbra, Coimbra Editora, 2000. 231 Neste sentido. EBERTH, Rolf – Zur Rechtnatur der Einheitlichen Richtlinien un Gebräuche für Dokumentenakkreditive, in : “Festschrift für Karl-H. Neumayer”, No- mos, Baden-Baden, 1986, págs. 199-216; PINA, C. Costa – Créditos Documentários – As regras e Usos Uniformes da CCI e a prática Bancária, Coimbra, Coimbra Editora, 2000. 232 No mesmo sentido destacamos a seguinte jurisprudência. Acórdão STJ de 16-07-1970, in: 198 BMJ, 1970, págs. 163 – 172. 233Sobre as regras as uniformes relativas às cobranças e as regras uniformes para as garan- tias contratuais. Vide SACARRERA, Guardiola, E. – La Compraventa Internacional: Importaciones y exportaciones. Barcelona, Bosch, Casa Editorial, S.A., 1994, págs. 23- 24. 234 Vide MOLINEAUX, CH. – Moving toward a Construction Lex Mercatoria: A Lex Constructionis, Journal of International Arbitration, 1997, pág. 56. 235 Vide BERGER, K., P. – The Relationship between the UNIDROIT Principles of International Commercial Contracts and the New Lex Mercatoria, Uniform Law Review, 2000-1, págs. 153-170. Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca 133 2 OS MODELOS JURÍDICOS: CONTRATOS-TIPO E FORMULÁRIOS STANDARD Os modelos jurídicos têm, também, especial importância no la- bor do comércio internacional236. Falamos dos contratos-tipo e dos formu- lários standard237, que na prática da contratação transnacional se materia- lizam operando como condições contratuais gerais, correspondendo a parte ou mesmo à totalidade do contrato. Constituem, enquanto fonte, em termos globais, um mecanismo unificador, de fato, do conteúdo da nova lex mercatoria238. Para alguns, representam formas de expressão da prática mer- cantil239 240. Consideramos, todavia, que certos modelos jurídicos são 236 Vide BAPTISTA, Luiz Olavo, – Les Joint ventures dans les relations internationales, Doutoramento, Paris, 1981, in passim. 237 O contrato constitui, de facto e de direito, um elemento fundamental da Lex mercato- ria. A sua centralidade tem como motivo o facto de corresponder a um instrumento ade- quado à configuração do mercado (físico e virtual), bem como, por ir de encontro às exi- gências jurídicas da globalização, atente-se o caráter apolítico. Vide FERRARESE, Mª. R. – La lex mercatoria tra storia e attualità: da diritto dei mercanti a lex per tutti? , Sociologia del Diritto, Milan, 2005, pág. 161. Vide, também, na mesma linha de entendimento. E. LOQUIN ; L.RAVILLON – “La creation d’un espace juridique mondial. La volonte des operateus vecteurs d’un droit mondialise”, La Mondialisation du Droit. E. LOQUIN e C. KESSEDJIAN (dirs), Dijon Litec, – CREDIMI, 2000, págs. 91 e ss. 238 A harmonização tende a desenvolver-se através dos contratos elaborados por associa- ções de operadores internacionais em determinados sectores ou produtos. MARTINEZ CAÑELLAS. A. – La interpretación y la integración de la Convención de Viena sobre la compraventa internacional de mercaderías de 11 de abril de 1980, Granada, Ed. Comares, 2004, pág. 28. Natural será, que esses contratos tendam, de alguma forma, a favorecer os membros da associação que os elaborou. 239Ampliando o sentido de “usos do comércio internacional.” Os Contratos-tipo, elabora- dos por organizações socioprofissionais, constituiriam um instrumento uniformizador das condutas dos seus membros, no âmbito do respetivo setor mercantil. Neste sentido, cf. GOLDMAN, B. – Frontières du droit et «lex mercatoria», in Archives de philosophie du droit, n.º 9 – Le droit subjectif en question, Paris , Sirey, 1964, pág. 180; FOUCHARD, Ph, – L’Etat face aux usages du commerce international, in TCFDIP 1973/1975, Paris, Dalloz, 1977, pág. 74; MARMOL, Ch. Del, – Les clauses contractuelles types, facteur d’unification du droit commercial, in Liber Amicorum Baron Louis Frédéricq, Vol. 1, Gand, Faculteit der Rechtsgeleerdheid te Gent, 1965, pág. 310 ; LOQUIN E. – L’amiable composition en droit comparé et international – Contribution à l’étude du non-droit dans l’arbitrage commercial, Paris , Librairies Techniques, 1980, pág. 310. Infere-se do escrito por alguns autores que os contratos elaborados por organizações socioprofissionais identificam-se com os usos escritos, trata- se de documentos que consagram e ajustam as práticas adotadas no setor mercantil onde 134 ISSN 1983-4225 – v.10, n.2, dez. 2015. fruto das práticas mercantis comumente aceitas entre os operadores do comércio internacional, nos diversos setores mercantis em que os mesmos se situam, como forma de disciplinar, eficientemente, os seus contratos. Não recorrem, por isso, aos critérios jurídicos dos direitos nacionais, ali- ás, pouco flexíveis, o mais das vezes, obsoletos, desajustados à dinâmica deste comércio. Atente-se o pragmatismo dos critérios e a natureza observacio- nal do método edificador dos modelos. As diversas instituições incumbidas de compilar estas práticas, e no intuito de prever todos os eventuais circunstancialismos contratuais, modelam-nas intensivamente a ponto de elencarem pormenores, muito além dos seus carateres constitutivos241. atuam aqueles membros. Vide. LOUSSOUARN, Yvon ; BREDIN, Jean-Denis, – Droit du commerce international. Paris, Sirey,1969, pág. 46; SCHMITTHOFF, C. – The Law of International Trade, Ist Growth, Formulation and Operation, in The Sources of the Law of International Trade (With Special Reference to East-West Trade), Londres, Ste- vens & Sons, 1964, pág 16; DAVID, R. – L’arbitrage dans le commerce international, Paris, Económica. 1982, pág. 485. Outros autores incluem os contratos tipo na lex merca- toria, mas não como fonte. Ela seria constituída por usos do comércio e aqueles contratos seriam “custom and usages. “ Vide LANDO, O. – The lex mercatoria in International Commercial Arbitration, in International Comparative Law Quarterly ICLQ, 1985, pág. 751. GOLDSTAJN, A. – Usages of trade and other autonomous rules of international trade according to the UN (1980) sales convention. In International sale of goods; Dubrovnik lectures. Sarcevic, P. and P. Volken, eds. New York, Oceana, 1986, pág. 72. 240Também no sentido de ampliar o conteúdo da expressão “usos dos comércio internaci- onal. “A utilização generalizada das cláusulas standard para certos tipos contratuais, manifestaria uma atitude comum assumida pelos operadores do comércio transnacional no que concerne à necessidade de adotar soluções diversas daquelas que os direitos nacionais preconizam para os aspetos elencados nessas cláusulas. Aquelas cláusulas constituiriam fontes da lex mercatoria (em muitos casos contêm cláusulas de “força maior” e de hardship para contratos de longa duração). Vide, entre outros autores, GOLDMAN B., – La lex mercatoria dans les contrats et l’arbitrage international: realité et perspectives, Clunet Vol. 106 : 475-505, 1979, págs. 487 – 489; KAHN Ph., –‘Lex mercatoria’ et pratique des contrats internationaux : l’expérience française, in Le contrat économique international – stabilité et évolution, Travaux des VII es Journées d’études juridiques Jean Dabin, Bruxelas/Paris, Bruylant/Pedone, 1975, pág. 185 e ss , KAHN Ph., – Force majeure et contrats internationaux de longue durée, in Jus et Societas – Essays in Tribute to Wolfgang Friedmann, Haia/Boston/Londres, Martinus Nijhoff, 1979. pág. 200; ROBERT, J. – L’arbitrage – droit interne – droit international privé. 5.ª edição, Paris , Dalloz, 1983, pág. 286; SCHMITTHOFF, C. – The Law, ob. cit. pág. 16; GOLDSTAJN, A.- Usages of Trade, ob. cit. pág. 72; LANDO, O. – The lex mercatoria, ob. cit. pág. 751. 241 Vide nota n.º 16, 17, 19

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O INÍCIO DE UMA NOVA ALQUIMIA . para a business community. http://www.unidroit.org/english/principles/contracts/principles2010/translations
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