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Arte e psicanálise PDF

75 Pages·2002·0.405 MB·Portuguese
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Coleção PASSO-A-PASSO CIÊNCIAS SOCIAIS PASSO-A-PASSO Direção: Celso Castro FILOSOFIA PASSO-A-PASSO Direção: Denis L. Rosenfield PSICANÁLISE PASSO-A-PASSO Direção: Marco Antonio Coutinho Jorge Ver lista de títulos no final do volume Tania Rivera Arte e psicanálise 2a edição Rio de Janeiro Copyright © 2002, Tania Rivera Copyright desta edição © 2005: Jorge Zahar Editor Ltda. rua México 31 sobreloja 20031-144 Rio de Janeiro, RJ tel.: (21) 2108-0808 / fax: (21) 2108-0800 e-mail: [email protected] site: www.zahar.com.br Todos os direitos reservados. A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação de direitos autorais. (Lei 9.610/98) Edição anterior: 2002 Capa: Sérgio Campante Composição eletrônica: TopTextos Edições Gráficas Ltda. Impressão: Cromosete Gráfica e Editora CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. Rivera, Tania R522a Arte e psicanálise / Tania Rivera. — 2.ed. — Rio de 2.ed. Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005 (Passo-a-passo; 13) Inclui bibliografia ISBN 85-7110-676-2 1. Psicanálise e arte. 2. Sexo e arte. I. Título. II. Série. CDD 701.05 05-1 7 25 CDU 7.01 Sumário Espelhos em pedaços 7 A arte e o sexual, ou A interpretação e seus limites 26 O olhar e sua estranheza 47 Corpo, arte e psicanálise: inconclusões 64 Referências e fontes 69 Leituras recomendadas 73 Sobre a autora 75 Espelhos em pedaços Encontros e desencontros. A psicanálise e a arte do século XX nasceram na mesma época e não pararam de se atrair, se distanciar e se esbarrar, às vezes desastradamente, até hoje. Nós pertencemos à revolução cezanniana e freudiana, como lembra o filósofo francês Jean-François Lyotard. Na virada do século XX, a primeira rompe, na pintura, com a organi- zação espacial tradicional, vigente desde o Renascimento. A obra do pintor francês Paul Cézanne mostra que não há ordenação natural do espaço visual. O quadro não mais se compõe a partir da posição inquestionável e bem centrada de um olho ordenador, segundo as leis da perspectiva, e assim o espaço da obra se desestabiliza. Com Freud, de maneira complementar, é o sujeito representado por este olho que perde sua estabilidade, sua posição central. Após a descoberta freudiana do conceito de inconsciente, nunca mais o eu será totalmente senhor em sua própria casa. Ele estará irremediavelmente dividido; o espelho que a psicaná- lise e a arte lhe oferecem está em pedaços, e nele o eu se vê irremediavelmente fragmentado. Essa aproximação entre a arte moderna e a psicanálise vem do fato de serem ambas produtos culturais que com- 7 1047.02-3 8 Tania Rivera partilham um mesmo “espírito da época”, ainda que suas ligações nem sempre sejam visíveis, mas permaneçam fre- qüentemente latentes, à espera de que se venha atualizá-las. E apesar de o próprio fundador da psicanálise, em vez de convocar os artistas de seu tempo, preferir fazer referência, em sua obra, a obras clássicas de Michelângelo ou Leonardo da Vinci. Freud não escondia, inclusive, sua antipatia em relação à arte moderna. A respeito de uma obra que perten- cia a seu discípulo Karl Abraham, escreveu-lhe certa vez, com ironia, que o gosto de Abraham em relação ao moder- nismo devia ser cruelmente punido, e utilizou aspas para qualificar a “arte” dita moderna. Ao pastor e psicanalista Oskar Pfister ele demonstra uma franca intolerância em relação aos expressionistas e afirma que estas pessoas não têm o direito de ser designadas como artistas. Principalmente a partir da Primeira Guerra Mundial, contudo, movimentos de vanguarda literária e artística fa- rão referências explícitas à psicanálise. Em nome de um novo cânone estético, que se afirma por uma negação viru- lenta de todos os parâmetros vigentes e pela busca de uma expressão revolucionária que irromperia do inconsciente, alguns artistas se aproximarão das idéias de Freud. Um deles, o poeta francês André Breton, antigo aluno de psi- quiatria que lançará em 1924 o primeiro Manifesto do sur- realismo, terá um papel decisivo para a influência freudiana no meio artístico. Apenas em 1922 ele poderia ler algum livro do pai da psicanálise, visto que enfim eram publicadas as traduções para o francês da Psicopatologia da vida coti- diana e das Conferências introdutórias à psicanálise, mas Arte e psicanálise 9 vários anos antes ele já afirmava que as idéias de Freud lhe causavam “emoções intensas”. Em 1921, o jovem Breton faz uma visita ao mestre em Viena. Freud o recebe entre suas sessões de análise vesper- tinas e parece ao poeta um senhor pequeno-burguês sem ares de importância. Não demonstrando nenhum interesse pelo movimento dadaísta ao qual Breton está então ligado, Freud afirma laconicamente que é bom poder contar com os jovens. Colecionador de antiguidades, era um homem de grande erudição e gosto austero, que apreciava enorme- mente obras clássicas e nunca se aproximou das vanguardas artísticas e literárias da Viena de sua época. Ele não percebe o papel que Breton e seus companheiros terão na divulgação da psicanálise na França, onde as resistências do meio mé- dico e uma germanofobia disseminada levantavam barrei- ras à entrada do freudismo. É na revista La Révolution Surréaliste, por exemplo, que seu texto “A questão da análise leiga” será pela primeira vez publicado em francês, em uma tradução de Marie Bonaparte. Ainda nos anos 1910, em plena Primeira Guerra, nas- cera na Suíça o movimento dadaísta, em torno de Tristan Tzara e Hugo Ball. Dada é uma palavra de autoria e sentido controvertidos, que em francês designa o cavalo de pau ou outro brinquedinho de criança e em alemão, segundo Ball, é um sinal de ingenuidade tola e disparatada. Ou ainda, conforme o Manifesto Dadá de 1918, “Dada não significa nada”. Paralelamente a uma atitude antiguerra, uma vigo- rosa rejeição das convenções artísticas vigentes faz do da- daísmo uma espécie de anárquica e radical recusa da arte, 10 Tania Rivera visando a uma explosiva liberação das potências criativas, fora de qualquer padrão estético preestabelecido. Rompen- do o domínio da racionalidade, o acaso toma importante papel na criação de artistas como Hans Arp, que chega a afirmar que somente se pode vivenciar o princípio do acaso ao se entregar “inteiramente ao inconsciente”. Se o poeta romeno Tzara negará qualquer interesse pela psicanálise, o pintor alemão Max Ernst considerará a leitura de textos freudianos que realizou no início dos anos 1910 fundamen- tal para o seu trabalho. A arte em busca de suas origens. A procura de novos parâme- tros formais que marca essas vanguardas é correlativa a uma valorização do “irracional”, do espontâneo, de uma expres- são mais livre. É neste contexto que os artistas do início do século XX se apaixonam pela arte africana, os pintores auto- didatas, naïfs, as obras de loucos internados em hospícios. Em 1922, um crítico de arte e psiquiatra alemão, Hans Prinzhorn, publicará diversos trabalhos pictóricos recolhi- dos durante anos em instituições alemãs em seu Bildnerei der Geisteskranken (algo como Atividade plástica de doentes mentais). O livro causará furor nos meios artísticos e, diante de suas páginas, o grande pintor Paul Klee exclamará: “Eis o melhor Klee!” A descoberta do inconsciente por Freud é contemporânea dessa preocupação e vem reforçar essa ten- dência. Num mundo balançado pela máxima de Paul Cé- zanne de que “a natureza está no interior” e pela ênfase expressionista na subjetividade, não é de espantar que o inconsciente freudiano seja alçado à condição de fonte te- mática e formal para a criação artística.

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