S W H E R M A N I L COX PH Y L L I S PE R R I N W I L COX SHERMAN WILCOX PHYLLIS PERRIN WILCOX Tradutor TARCÍSIO DE ARANTES LEITE Para os muitos estudantes maravilhosos de Língua de Sinais Americana da Universidade do Novo México que têm enriquecido nossas vidas como professores de língua. S UMÁRIO Prefácio para a Edição Brasileira 6 Prefácio 16 1 Mais do que um Gesto 18 2 A Língua de Sinais Americana em Perspectiva 34 3 A Cultura Surda Norte-Americana 92 4 O Ensino de ASL 120 5 Considerações Especiais 167 Apêndices 180 Referências Bibliográficas 191 P REFÁCIO PARA A EDIÇÃO BRASILEIRA Três de abril de 2005. Essa é a data limite estabe- lecida para a sociedade civil opinar sobre o projeto de decreto que visa a regulamentar a Lei Federal no 10.436, de 24 de abril de 2002 - a “Lei de Li- bras”.1 A perspectiva é encorajadora: pelo proje- to, cursos de Libras vão se tornar parte obrigató- ria do currículo para cursos preparatórios para o magistério e para cursos de fonoaudiologia, e po- dem integrar outros cursos conforme a demanda. A regulamentação deve garantir o acesso de sur- dos à educação em todos os níveis, a capacitação em Libras para os professores e aulas de Libras para os alunos surdos. Ela prevê a formação de intér- pretes de Libras-Língua Portuguesa, por meio de cursos superiores ou de pós-graduação. Para tal, as instituições de ensino superior poderão solici- tar ao MEC autorização para ministrar cursos de licenciatura em Libras e especialização em Inter- pretação de Libras-Língua Portuguesa, e deverão “incluir Libras como objeto de ensino, pesquisa e extensão”. A regulamentação não se limita a ques- 7 tões de educação, embora sejam elas o seu alvo principal: en- globa também a área da saúde e todos os “estabelecimentos prestadores de serviços públicos, as instituições financeiras e os órgãos da administração pública direta e indireta”. Além disso estabelece “o uso e difusão” de Libras e a interpretação Libras- Língua Portuguesa como os meios legais de viabilizar o trata- mento diferenciado aos surdos, necessário à sua “inclusão ple- na” na vida social do país. Sem dúvida, essas claras intenções do poder público, ao adquirir a força da lei, vão mudar o ambiente em que se pensa sobre a língua de sinais no Brasil. No mínimo, vão alimentar e canalizar uma demanda por instrução em Libras que já vem aumentando sensivelmente nos últimos anos. Esse crescimen- to de demanda vai exacerbar as carências de formação, de certificação, de currículo, de material didático e de avaliação, que até agora vêm sendo tratadas em pequena escala ou de maneira informal. Isso vai ter que mudar. Não poderia existir um momento mais propício para o lançamento de um livro como Aprender a Ver: o ensino da lín- gua de sinais americana com segunda língua, de Sherman e Phyllis Wilcox, dois lingüistas da Universidade de Novo México, EUA, que participaram diretamente da recente expansão da deman- da para cursos de língua de sinais nos Estados Unidos. O livro serve, para nós, como um diário de viagem para o futuro pró- ximo, escrito por quem já esteve lá. A monografia dos Wilcox, publicada pela Gallaudet University Press em 1997, já circulava desde 1991, em edi- ção do Center of Applied Linguistics (Wilcox & Wilcox 1991a, 1991b). Ou seja, o livro foi escrito na crista da onda da expansão da demanda pelo ensino da língua de sinais ame- ricana (ASL) ocorrida durante os anos 80, em uma espécie de 8 prévia do que poderá acontecer na próxima década no Brasil, se acreditarmos nas mudanças que a regulamentação da Lei de Libras promete. O que o livro nos traz é uma sintética discussão sobre a natureza das línguas sinalizadas, uma instigante introdução a diferenças culturais e à cultura surda e uma série de reflexões sobre o desenvolvimento de programas de ensino de línguas de sinais, baseadas na experiência norte-americana. O brasileiro que conhece um pouco a história da língua de sinais brasileira vai poder compará-la com a história da lín- gua de sinais americana: as duas foram influenciadas direta- mente pela língua de sinais francesa (nos Estados Unidos pela ida do professor Laurent Clerc em 1816, e no Brasil pela vinda do professor Eduard Huet em 1855)2, e portanto as duas lín- guas são primas-irmãs (diferentes, por exemplo, da língua de sinais britânica, que tem origem independente, não sendo in- teligível pelos surdos norte-americanos; e diferentes da língua gestual portuguesa, originária da língua de sinais sueca).3 Uma das coisas que mais se destaca na discussão dos Wilcox sobre as línguas sinalizadas é o cuidadoso tratamento dado aos “códigos manuais” para o inglês (os vários sistemas de inglês sinalizado) e sua relação com a ASL, dentro de um complexo quadro de bilingüismo e de variação lingüística na comunida- de surda. Essa discussão coloca em relevo não só as diferenças e as interações entre as línguas orais e sinalizadas, como tam- bém as relações entre essas duas modalidades e uma terceira: a modalidade escrita. O capítulo sobre cultura, além de apontar características da cultura surda, principalmente em relação a padrões de co- municação, traz uma discussão da arte performática, do folclo- re, da literatura surda em língua inglesa, e de história oral de 9 surdos. Talvez mais importante para os professores (surdos) e alunos (ouvintes) de língua de sinais, é a orientação que os autores dão em relação ao “olhar do outro”, uma lição sobre a conscientização para as diferenças culturais. A parte mais “futurística”, dado o nosso ponto histórico no Brasil, talvez seja o capítulo sobre o desenvolvimento dos currículos e métodos de ensino de língua de sinais. Durante a leitura dessa parte, seria bom o leitor brasileiro ficar atento a uma diferença estrutural apresentada pelo sistema educacional norte-americano que influenciou esse desenvolvimento: trata- se dos requerimentos curriculares de língua estrangeira, nos níveis do ensino médio e superior, em todas as áreas de conhe- cimento (tanto nas Exatas e Biológicas quanto nas Sociais e Humanas).4 Um dos focos de luta nos Estados Unidos foi pela classificação da ASL, para fins curriculares, como língua estrangeira, para que os cursos de ASL pudessem satisfazer os requisitos escolares oficiais, substituindo outras línguas mo- dernas, como o espanhol ou o francês. Sherman Wilcox foi um dos acadêmicos mais ativos nesse processo de reconheci- mento (Wilcox 1989, 1992, 2004; Wilcox & Peyton 1999). Como não poderia deixar de acontecer, muita coisa mu- dou nesses últimos quinze anos da existência do livro do casal Wilcox. Hoje existe maior quantidade e variedade de materiais didáticos disponíveis no mercado, como existe também infini- tamente maior acesso à informação por meio da World Wide Web. Na adaptação do livro, não houve tanto a preocupação em atualizar as relações de recursos, quanto a de fornecer algu- mas dicas para quem fosse pesquisar os recursos na Internet. A Web hoje, com suas novas possibilidades de busca, é o melhor meio de se manter atualizado. Algumas tecnologias que hoje são comuns, há poucos anos nem existiam. Por exemplo, o livro fala das tentativas frustra- 10 das de usar a informática para o treino da datilologia. Hoje existem páginas na Web que apresentam exercícios ou exem- plos da datilologia com animação gráfica ou com videostreaming.5 Também no livro fala-se das possibilidades da tecnologia do videodisco interativo; entretanto, essa tecno- logia não sobreviveu aos anos 90, tendo sido substituída pelas tecnologias de multimídia baseada em CD-ROM, DVD e videostreaming. * * * Voltando à questão da regulamentação da Lei de Libras e o impulso que isso promete dar à difusão da língua de sinais brasileira no setor público, principalmente educacional, devo fazer algumas ressalvas. O decreto, como está sendo proposto, apesar de ressaltar a importância de Libras na educação, e de dar destaque específico para a educação bilíngüe em Libras e Língua Portuguesa, está claramente motivado também pela perspectiva da inclusão. Evidentemente, sou inteiramente fa- vorável a aulas de Libras para todos os futuros professores. Quanto mais pessoas tiverem contato direto com a língua de sinais e a cultura surda, mais compreensão haverá, na socieda- de, sobre as necessidades especiais dessa minoria lingüística. Talvez haja, também, mais compreensão sobre os perigos ine- rentes à classificação da surdez como deficiência, pura e sim- plesmente. Por outro lado, não é qualquer curso de Libras, de qualquer qualidade e de qualquer extensão, que vai preparar um professor ou uma professora para lidar com uma classe de alunos surdos. Não são cursos de trinta horas que vão satisfa- zer a necessidade. Para a educação de alunos surdos, precisa- mos de professores fluentes em Libras, precisamos urgentemente
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