ANA CRISTINA GUARINELLO O PAPEL DO OUTRO NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE PRODUÇÕES ESCRITAS POR SUJEITOS SURDOS Tese apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor, do Programa de Pós-Graduação em Letras, área de concentração em Estudos Lingüísticos, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná. Orientadora: Prof.3 Dr.a Reny Maria Gregolin Co-orientadora: Prof.3 Dr.3 Maria Cristina da Cunha Pereira CURITIBA 2004 |¡gg¡gg UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ MFPP CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES S E T OR DE U rr r\ COORDENAÇÃO DO CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM LETRAS P A R E C ER Defesa de tese da doutoranda ANA CRISTINA G0ARINELLO BARUSSO para obtenção do título de Doutora em Letras. As abaixo assinadas RENY MARIA GREGOLIN, ANA PAULA BERBERIAN VIEIRA DA SILVA, MARIA CRISTINA DA CUNHA PEREIRA YOSHIOKA, BEATRIZ CARMEM WARTH RAYMANN e IARA BEMQUERER COSTA argüiram, nesta data, a candidata, a qual apresentou a tese: "A PRODUÇÃO ESCRITA DE SUJEITOS SURDOS" Procedida a argüição segundo o protocolo aprovado pelo Colegiado do Curso, a Banca é de parecer que a candidata está apta ao título de Doutora em Letras, tendo merecido os conceitos abaixo: Banca Assinatura Aprovado Não aprovado /O RENY MARIA GREGOLIN / w L - cA — ANA PAULA B. V. DA SILVA í /tyfik&U. tfnktÀ^ MARIA C. CUNHA P. YOSHIOKA ((LAA ÛjAmMr /^VC-iRZ^OC; BEATRIZ C. W. RAYMANN Oufirvot/cuzL* IARA BEMQUERER COSTA / Curitiba, 31 de março de 2004. «AcJk^ JuJuvJfc Prof. Marilene Weinhardt a Coordenadora A todos os surdos que me ensinaram a escutara voz do silêncio. AGRADECIMENTOS À minha orientadora Prof.3 Dr.a Reny Gregolin, pelas suas orientações e ensinamentos durante esta caminhada. À minha co-orientadora Prof.3 Dr.3 Maria Cristina da Cunha Pereira, pela inestimável orientação no percurso da surdez, pela paciência e principalmente por ter acreditado em mim, minha admiração e respeito pelo seu trabalho na área da surdez. À Prof.3 Dr.3 Iara Bemquerer Costa, pelas contribuições e sugestões na qualificação e durante meu percurso na Lingüística Textual. À Prof.3 Dr.a Odete Pereira Menon, pelas sugestões na qualificação. Aos sujeitos dessa pesquisa e suas famílias, por fazerem parte deste trabalho e me tomarem uma pessoa meihor. Às queridas amigas Karin Strobel e Rita Maestri, por me ensinarem a amar os surdos e pelas valiosas discussões. Às queridas amigas Ana Paula Berberian e Giselle de Athayde Massi, por terem me ajudado a conhecer melhor o mundo da escrita, com quem pude dividir minhas angústias e alegrias durante este caminho. A todos os colegas da Universidade Tuiuti do Paraná, pelo apoio, carinho e respeito. Aos amigos do Movimento Familiar A Voz do Silêncio, principalmente a Erica Maestri, por todos os ensinamentos, oportunidades e pela amizade, minha gratidão. À Antonia Schwinders, pela revisão, pelas conversas e ensinamentos. A todos os meus amigos e familiares que acreditaram em mim e contribuíram de alguma forma para a construção deste trabalho. Aos meus pais, por sempre acreditarem em mim e participarem de tudo que faço. E, finalmente, ao Alexandre, meu marido, pelas horas de ausência, pelas horas sem paciência, por todas as horas e principalmente por ter SEMPRE acreditado que juntos poderíamos construir um mundo melhor. SUMÁRIO LISTA DE QUADROS v LISTA DE FIGURAS v LISTA DE ABREVIATURAS vi RESUMO vii ABSTRACT viii INTRODUÇÃO 1 CAPÍTULO 1 - ESTUDOS SOBRE A SURDEZ: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS 4 1.1 UM BREVE OLHAR HISTÓRICO SOBRE A EDUCAÇÃO DE SURDOS 4 1.2 PRÁTICAS FONOAUDIOLÓGICAS E O TRABALHO COM SUJEITOS SURDOS 17 CAPÍTULO 2 - A PROPOSTA BILÍNGÜE: SINAIS E ESCRITA 25 2.1 EDUCAÇÃO BILÍNGÜE 25 2.2 BREVE DESCRIÇÃO DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS 28 2.3 AS VISÕES SOBRE A LÍNGUA ESCRITA NA SURDEZ 46 CAPÍTULO 3 - A TEORIA E A METODOLOGIA 63 3.1 METODOLOGIA 63 3.2 REFERENCIAL TEÓRICO PARA A ANÁLISE DOS DADOS 70 3.2.1 A Coesão como Fator de Textualidade 73 3.2.2 A Coerência como Fator de Textualidade 88 CAPÍTULO 4 - A ESCRITA DOS SURDOS: ESTUDO DE CASOS 98 4.1 ANÁLISE LONGITUDINAL DO CASO 1 - RAFAEL 98 4.2 ANÁLISE LONGITUDINAL DO CASO 2 - GABRIEL 122 4.3 ANÁLISE LONGITUDINAL DO CASO 3 - MIGUEL 160 4.4 ANÁLISE LONGITUDINAL DO CASO 4 - URIEL 174 CONCLUSÃO 194 REFERÊNCIAS 201 ANEXO 208 iv LISTA DE QUADROS 1 SUJEITOS DA PESQUISA 63 2 RECURSOS E ESTRATÉGIAS QUE PODEM SER USADOS NA REFERENCIAÇÃO 79 3 RECURSOS E ESTRATÉGIAS QUE PODEM SER USADOS NA REFERENCIAÇÃO 84 4 MODELO DIAGRAMÁTICO PARA ANÁLISE DOS PROCESSOS DE RETEXTUALIZAÇÃO 96 LISTA DE FIGURAS 1 AS 46 CONFIGURAÇÕES DE MÃO DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS 32 2 PARÂMETROS PRINCIPAIS DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS 33 3 UNIDADE MÍNIMA DISTINTIVA PELO PARÂMETRO PONTO DE ARTICULAÇÃO 34 4 FORMAÇÃO DE PALAVRAS POR DERIVAÇÃO 36 5 DERIVANDO NOMES DE VERBOS 37 6 CLASSIFICADOR EM ANDAR 38 7 VERBOS SIMPLES 40 8 VERBOS COM CONCORDÂNCIA 41 9 VERBOS ESPACIAIS 41 V LISTA DE ABREVIATURAS ASL Língua de Sinais Americana CT Comunicação Total FENEIS Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos L1 Primeira língua L2 Segunda língua LIBRAS Língua Brasileira de Sinais LO Leitura orofacial LSF Língua de Sinais Francesa LT Lingüística textual vi RESUMO A elaboração do presente trabalho originou-se da minha inquietação com relação à aquisição da língua portuguesa em sua modalidade escrita por sujeitos surdos. Como fonoaudióloga, nos últimos dez anos de prática clínica, venho repensando questões sobre a surdez e as diferentes concepções de linguagem que caracterizam o trabalho com sujeitos surdos. Assim, partindo do fato de que há poucos trabalhos da lingüística que analisam as produções escritas de sujeitos surdos, o objetivo desta investigação é evidenciar o papel do outro na construção das produções escritas de sujeitos surdos, demonstrando que é fundamental que esse outro tenha o domínio da língua de sinais, para que sua experiência com a linguagem escrita possa ser compartilhada de forma mais efetiva. Além disso, pretendo também analisar produções escritas de quatro sujeitos surdos entre 11 e 15 anos, com base na lingüística textual, principalmente à luz dos estudos de Koch e Marcuschi (2002), ao tratarem do processo de referencíaçâo, e Marcuschi (2001), ao tratar do processo de retextualização e, por fim, tenho como objetivo demonstrar o processo singular de construção de cada sujeito e enfatizar o papel da retextualização no processo de aquisição e produção escrita. Para isso, os dados escritos foram coletados em terapias fonoaudiológicas individuais, nas quais atuei como co-autora. As análises demonstram que o surdo é capaz de escrever e aproximar seu texto do português padrão, desde que lhe sejam dadas oportunidades de interagir com a escrita por meio de atividades significativas e que haja um trabalho de parceria e atribuição de sentidos pelo leitor. Demonstram ainda que o processo de aquisição da linguagem escrita baseia-se na interação com o outro, e nessa parceria reconstroem-se os sentidos dos textos. Com os resultados deste estudo, espero contribuir para que os surdos alcancem melhores resultados no uso do português escrito. Palavras-chave: surdez, linguagem escrita. vi i ABSTRACT The elaboration of this work originates from my inquietude in relation of deaf people acquiring the Portuguese Writing Language. As a speech language therapist, in the last ten years of clinical practice, I've been thinking about deafness and the different language conceptions that characterize the work with deaf people. As we know, there are only few researches on linguistics that analyses the writing productions of deaf people, so this study aims to make clear the position of the other in the construction of writing production by deaf people, demonstrating that is important that this other person dominate sign language, in order to his experience with writing language can be shared effectively. Besides, I intend to analyse writing productions of four deaf people between the ages of 11 and 15, based on textual linguistics, specially in the studies of Koch and Marcuschi (2002), when they refer to the referential processes, and Marcuschi (2001), when he postulates the retextualization process. I also pretend to demonstrate the singular process that each person uses to construct writing language and emphasize the retextualization role in this acquisition process of writing production. For that, all the writing productions were collect particularly during the speech language therapies, in which I acted as a co-author. The analyses show that deaf people are capable to write and to approximate their writing of the formal Portuguese, as long as we give them the chance to interact with writing through significant activities and as long as we have a partnership work of attribution of senses by the reader. Besides that, the acquisition of writing language is based in the interaction with other people, that together reconstruct the texts meaning. With the results of this study, I hope to contribute for deaf people achieve better results using writing language. Keywords: deafness, writing language. viii INTRODUÇÃO A elaboração do presente trabalho originou-se da minha inquietação com relação à aquisição da língua portuguesa em sua modalidade escrita por sujeitos surdos. Como fonoaudióloga, nos últimos dez anos de prática clínica, venho repensando questões sobre a surdez e as diferentes concepções de linguagem que caracterizam o trabalho com sujeitos surdos. Durante minha prática clínica fonoaudiológica, trabalhei com vários sujeitos surdos que tinham muita dificuldade para utilizar a língua portuguesa, porém, geralmente dominavam a língua de sinais, o que fazia com que se comunicassem basicamente por meio desta língua. Intrigava-me o fato de as construções escritas dos surdos serem bastante diferentes da escrita dos ouvintes. Parecia-me que este fato se relacionava com as metodologias educacionais empregadas com esses sujeitos, que se baseavam, muitas vezes, em estratégias descontextualizadas e repetitivas. Além disso, foi possível observar que muitos estudos destacavam as dificuldades e as diferentes construções escritas dos surdos; alguns se detinham na sua escrita considerada "atípica"; outros na interferência da língua de sinais nas construções escritas; outros na condição da surdez, e havia, ainda, os que relacionavam a escrita a técnicas pedagógicas inadequadas. Porém, poucas eram as propostas para o desenvolvimento da escrita. Deste modo, muitos surdos continuam com muitas dificuldades para aprender a 1er e a escrever, e um grande número deles não tem acesso a práticas discursivas significativas que propiciem o domínio da linguagem escrita. Os trabalhos de leitura e escrita com os surdos ainda hoje são colocados em segundo plano em muitas escolas especiais, que priorizam a aprendizagem da linguagem oral, como se esta fosse um pré-requisito para a aprendizagem da escrita. Além disso, muitos surdos ainda não têm acesso a atividades significativas com a linguagem escrita, que os auxiliem a perceber o valor e a função da mesma. Durante o Doutorado em Estudos Lingüísticos da Universidade Federal do Paraná, tive a oportunidade de aprofundar os meus conhecimentos sobre os
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