o que resta da ditadura Diag OK.indd 1 27/6/2007 19:48:51 NOTA DA EDIÇÃO ELETRÔNICA Para aprimorar a experiência da leitura digital, optamos por extrair desta ver- são eletrônica as páginas em branco que intercalavam os capítulos, índices etc. na versão impressa do livro. Por este motivo, é possível que o leitor perce- ba saltos na numeração das páginas. O conteúdo original do livro se mantém integralmente reproduzido. o que resta da ditadura a e x c e ç ã o b r a s i l e i r a edson teles e vladimir safatle (orgs.) Sobre O QUE RESTA DA DITADURA A ditadura militar brasileira encontrou uma maneira insidiosa de se manter, de per- manecer em nossa estrutura jurídica, nas práticas políticas, na violência cotidiana, em nossos traumas sociais. Daí a pergunta – “o que resta da ditadura?” – que deu origem ao seminário realizado na Universidade de São Paulo, em 2008, cujos resul- tados aparecem agora neste O que resta da ditadura: a exceção brasileira. Sob a leitura das novas relações políticas e sociais da democracia, o livro trata do passado de violência e da sua incrível capacidade de não passar, procurando refletir sobre como certos hábitos e práticas autoritárias foram assimilados através de uma reconciliação extorquida. Ao mesmo tempo que se nega seu alcance e se minimiza seu legado autoritário, a exceção brasileira indica as circunstâncias que permitiram certa continuidade da ditadura brasileira. O fato é que a ditadura não está somente lá onde o imaginário da memória coletiva parece tê-la colocado. Mais ainda: sua permanência não é mais simples presentificação daquilo que já foi, do passado de repressão, mas reaparece hoje nas práticas institucionais. Compõem o volume artigos sobre os múltiplos aspectos do legado ditatorial no Brasil. Analisa-se a perenidade institucional e jurídica dos aparatos econômicos e securitários; a aberração brasileira em relação ao direito internacional sobre crimes contra a humanidade; o trauma social resultante da anulação do direito à memória; a herança política e as tentativas de deslegitimar o direito à violência contra um Estado ditatorial ilegal. Completam o quadro avaliações históricas sobre a maneira como as Forças Armadas relacionaram-se com a anistia e reflexões sobre a literatura diante do dever de memória. “A tradição dos oprimidos nos ensina que o estado de exceção em que vivemos é na verdade regra geral. Precisamos construir um conceito de história que corresponda a essa verdade. Nesse momento, perceberemos que nossa tarefa é criar um verdadeiro estado de emergência.” Walter Benjamin Copyright © Boitempo Editorial, 2010 Coordenação editorial Ivana Jinkings Editor‑assistente Jorge Pereira Filho Assistência editorial Ana Lotufo, Elisa Andrade Buzzo, Frederico Ventura e Gustavo Assano Preparação Flamarion Maués Revisão Alessandro de Paula Capa e diagramação Silvana de Barros Panzoldo Sobre foto de repressão ao Dia Naciona de Luta, protesto realizado em 23 de agosto de 1977 – Arquivo/ Agência Estado. Produção Marcel Iha e Paula Pires CIP‑BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Q35 O que resta da ditadura : a exceção brasileira / Edson Teles e Vladimir Safatle (Orgs.). ‑ São Paulo : Boitempo, 2010. ‑ (Estado de Sítio) Inclui bibliografia ISBN 978‑85‑7559‑155‑0 1. Brasil ‑ História ‑ 1964‑1985. 2. Brasil ‑ Política e governo, 1964‑1985. 3. Ditadura ‑ Brasil ‑ História ‑ Século XX. 3. Direitos humanos ‑ Brasil ‑ História ‑ Século XX. 4. Justiça ‑ Brasil ‑ História. 5. Ciências sociais e história. 6. Violência ‑ Brasil ‑ História. I. Teles, Edson, 1968‑. II. Safatle, Vladimir, 1973‑. III. Série. 09‑5696. CDD: 981.064 CDU: 94(81)”1964/1985” 03.11.09 11.11.09 016126 É vedada, nos termos da lei, a reprodução de qualquer parte deste livro sem a expressa autorização da editora. Este livro atende às normas do acordo ortográfico em vigor desde janeiro de 2009. 1a edição: março de 2010 1a reimpressão: junho de 2010 BOITEMPO EDITORIAL Jinkings Editores Associados Ltda. Rua Pereira Leite, 373 05442‑000 São Paulo SP Tel./fax: (11) 3875‑7250 / 3872‑6869 [email protected] www.boitempoeditorial.com.br Quem controla o passado, controla o futuro. George Orwell, 1984 É vedada, nos termos da lei, a reprodução de qualquer parte deste livro sem a expressa autorização da editora. Este livro atende às normas do acordo ortográfico em vigor desde janeiro de 2009. 1a edição: março de 2010 1a reimpressão: junho de 2010 BOITEMPO EDITORIAL Jinkings Editores Associados Ltda. Rua Pereira Leite, 373 05442‑000 São Paulo SP Tel./fax: (11) 3875‑7250 / 3872‑6869 [email protected] www.boitempoeditorial.com.br sumário Apresentação ................................................................................................9 1 A EXCEÇÃO JURíDICA Militares e anistia no Brasil: um dueto desarmônico ............................15 Paulo Ribeiro da Cunha Relações civil‑militares: o legado autoritário da Constituição brasileira de 1988 ...........................................................41 Jorge Zaverucha “O direito constitucional passa, o direito administrativo permanece”: a persistência da estrutura administrativa de 1967 ...........77 Gilberto Bercovici Direito internacional dos direitos humanos e lei de anistia: o caso brasileiro ..................................................................................91 Flávia Piovesan O processo de acerto de contas e a lógica do arbítrio ..........................109 Glenda Mezarobba 2 O PREÇO DE UMA RECONCILIAÇÃO EXTORQUIDA Tortura e sintoma social .....................................................................123 Maria Rita Kehl Escritas da tortura ..............................................................................133 Jaime Ginzburg As ciladas do trauma: considerações sobre história e poesia nos anos 1970 ..........................................................................................151 Beatriz de Moraes Vieira O preço de uma reconciliação extorquida ..........................................177 Jeanne Marie Gagnebin Brasil, a ausência significante política (uma comunicação) .................187 Tales Ab’Sáber 3 A POLíTICA DO BLOQUEIO, O BLOQUEIO DA POLíTICA 1964, o ano que não terminou ..........................................................205 Paulo Eduardo Arantes Do uso da violência contra o Estado ilegal .........................................237 Vladimir Safatle Os familiares de mortos e desaparecidos políticos e a luta por “verdade e justiça” no Brasil ..................................................253 Janaína de Almeida Teles Entre justiça e violência: estado de exceção nas democracias do Brasil e da África do Sul ................................................................299 Edson Teles Dez fragmentos sobre a literatura contemporânea no Brasil e na Argentina ou de como os patetas sempre adoram o discurso do poder ...............................................................................319 Ricardo Lísias Bibliografia..............................................................................................329 Sobre os autores .......................................................................................347 apresentação Vivemos atualmente dias de inquietude e incerteza. [...] Tenho a convicção de que o nosso Exército saberá, como sempre, contornar tão graves inquietações e continuará, a despeito de qualquer decisão, protegendo a nação do estrangeiro e de si mesma. Gal. Luiz Cesário da Silveira Filho, 11/3/2009 “Quem controla o passado, controla o futuro.” A frase de 1984, que serve de epígrafe a este livro, indica claramente o tamanho do que está em jogo quando a questão é elaborar o passado. Todos conhecemos a temática clássica das sociedades destinadas a repetir o que são incapazes de elaborar; sociedades que já definem de antemão seu futuro a partir do momento que fazem de tudo para agir como se nada soubessem a respeito do que se acu‑ mulou às suas costas. A história é implacável na quantidade de exemplos de estruturas sociais que se desagregam exatamente por lutar compulsivamente para esquecer as raízes dos fracassos que atormentam o presente. No caso da realidade nacional, esse esquecimento mostra‑se particularmente astuto em suas múltiplas estratégias. Ele pode ir desde o simples silêncio até um pecu‑ liar dispositivo que mereceria o nome de “hiper‑historicismo”. Maneira de remeter as raízes dos impasses do presente a um passado longínquo (a reali‑ dade escravocrata, o clientelismo português etc.), isto para, sistematicamen‑ te, não ver o que o passado recente produziu. Como se fôssemos vítimas de um certo “astigmatismo histórico”. O que propomos neste livro é, pois, falar do passado recente e da sua incrível capacidade de não passar. Mas, para tanto, faz‑se necessário mos‑ trar, àqueles que preferem não ver, a maneira insidiosa que a ditadura mi‑ litar brasileira encontrou de não passar, de permanecer em nossa estrutura jurídica, em nossas práticas políticas, em nossa violência cotidiana, em nossos traumas sociais que se fazem sentir mesmo depois de reconcilia‑ ções extorquidas. Daí a pergunta que deu origem ao seminário realizado na Universidade de São Paulo em 2008, cujos resultados aparecem agora em livro: “O que resta da ditadura?” Pergunta ainda mais urgente se lem‑ brarmos a incrível capacidade que a ditadura brasileira tem de desapare‑