ANATOMDIEA UMAE PIDEMIA PíluMláagsi cDarso,g Passi quiáeto r icas AumenAtsos ombdraoD sooe nMçean tal FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ Presidente Nísia Trindade Lima ViceP- residente de Educação, Informação e Comunicação Manoel Barrai Netto Editora Fiocruz (Gestáo 2017-2020) Diretor Manoel Barrai Netto Editor Executivo João Carlos Canossa Mendes Editores Científicos Carlos Machado de Freitas Gilberto Hochman Conselho Editorial Denise Valle José Roberto Lapa e Silva Kenneth Rachel de CamargoJr. Ligia Maria Vieira da Silva Marcos Cueto Maria Cecília de Souza Minayo Marilia Santini de Oliveira Moisés Goldbaum Rafael Linden Ricardo Ventura Santos ANATOMDIEA UMAE PIDEMIA PíluMláagsi cDarso,g Passi quiáeto r icas AumenAtsos ombdraoD sooe nMçean tal RobeWrhti taker Tradução VerRai beiro (psicanalista) Revisão técnica Paulo Amarante Fernando Freitas 1ª r eimpressão EDITC>RA FIOC::::RUZ Copyright© 2017 do autor Originalmente publicado em inglês sob o título Anatomy ofa n Epidemie: magic bullets, psychiatric drugs, and the astonishing rise efmental illness inAmerica (Broadway Paperbacks, 2010) Direitos para a língua portuguesa reservados com exclusividade para o Brasil à FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ/ EDITORA l ª edição: 2017 1 ª reimpressão: 20 I 7 Revisão Irene Ernest Dias Índice Clarissa Bravo Capa A partir da capa da edição original, criada por Laura D,gjy sobre ilustração de © Dietrich Madsen/Getty Images Projeto gráfico e editoração Daniel Pose Produção gráfico-editorial Phelipe Gasiglia Catalogação na fonte Fundação Oswaldo Cruz Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde Biblioteca de Saúde Pública W5 78a Whitaker, Robert Anatomia de uma epidemia: pílulas mágicas, drogas psiquiátricas e o aumento assombroso da doença mental./ Robert Whitaker; tradução de Vera Ribeiro. -Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2017. 421 p.: il.; tab. ISBN, 978-85-7541-492-7 1. Transtornos Mentais -terapia. 2. Psiquiatria. 3. Reforma dos Serviços de Saúde. 4. Epidemias. 5. Surtos de Doenças. 6. Saúde Mental. 7. Esquizofrenia. 8. Doença Crônica.!. Título. CDD -22.ed. - 362.2 2017 EDITORA FIOCRUZ Ed■itora filiada ■ Av. Brasil, 4.036, térreo, sala 112 -Manguinhos l I 21040-361 -Rio de Janeiro, RJ Tek (21) 3882-9039 e 3882-9041 1 Telefax, (21) 3882-9006 ASSOCIAÇÃO EIRASIJ.SRA DASED ITORAS UNIVERSITÃIUAS E-mail: [email protected] I www.fiocruz.br/editora Sumário Prefácio à edição brasileira ...................................................................................... 9 Apresentação........................................................................................................... 15 pA RTE I -A EPIDEMIA 1. Uma Praga Moderna .......................................................................................... 21 2. Reflexões Experienciais .. , .................................................................................. 31 II-A PARTE CIÊNCIA DAS DROGAS PSIQUIÁTRICAS 3. As Raízes de uma Epidemia .............................................................................. 55 4. As Pílulas Mágicas da Psiquiatria ..................................................................... 63 5. A Caçada aos Desequilíbrios Químicos ............................................................ 81 III - PARTE REsULTADOS 6. Revelação de um Paradoxo ............................................................................... 1 O 1 7. A Armadilha das Benzodiazepinas ................................................................... 137 8. Uma Doença Episódica Torna-se Crônica ....................................................... 159 9. O Crescimento Explosivo do Transtorno Bipolar ........................................... 183 10. Explicação de uma Epidemia. ......................................................................... 215 11. A Epidemia Disseminada entre as Crianças ................................................. 225 12. Quando osJ ovens Sofrem ............................................................................... 255 L pAR TE IV -EXPLlCAÇÃO DE UMA ILUSÃO !3. A Ascensão de uma Ideologia ..................................................................... 27! !4. A História que Foi... e Não Foi Contada .................................................... 29! 15. Contabilizando os Lucros. ........................................................................... 321 PARTE V -SOLUÇÕES !6. Projetos de Reforma .................................................................................... 339 Epílogo ................................................................................................................. 367 Notas .................................................................................................................... 369 Agradecimentos .................................................................................................. 40 l Índice ................................................................................................................... 403 Prefácio à edição brasileira É com enorme satisfação e honra que prefaciamos este livro do jornalista estadunidense Robert Whitaker que, já traduzido em mais de uma dezena de idiomas, finalmente chega às mãos do leitor de língua portuguesa. Desde 201 O, quando foi publicado nos Estados Unidos,Anatomia de uma Epidemia tem tido uma repercussão gigantesca nos diversos cantos do mundo, seja no meio acadêmico, entre profissionais da saúde em geral, entre pacientes psiquiátricos autodenominados vítimas ou sobreviventes da psiquiatria, ou mesmo entre os psiquiatras, embora não nos surpreenda que a maioria ainda reaja ao seu conteúdo. Nosso interesse pelo pensamento de Whitaker foi despertado pela leitura de um artigo de Mareia Angell publicado no número 59 da revista Piauí, em agosto de 2011. O artigo, com o sugestivo título "A epidemia da doença mental", é norteado por uma questão, por si própria, bastante intrigante: por que cresce assombrosamente o número de pessoas com transtornos mentais e de pacientes tratados com antidepressivos e outros medicamentos psicoativos? Após haver lido os dois livros de Whitaker sobre psiquiatria até então publicados -Mad in America e Anatonry ofa n Epidemie-, como membros da diretoria da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme) não poupamos esforços para trazê-lo ao Brasil para dois eventos de grande porte organizados pela entidade: o 3° Congresso Brasileiro de Saúde Mental, realizado em Manaus em 2014, e o 2° Fórum Brasileiro de Direitos Humanos e Saúde Mental, emJoão Pessoa, em 2015. As contribuições trazidas por Whitaker foram impactantes. Como jornalista investigativo, Whitaker ganhou vários prêmios importantes nos Estados Unidos e tem larga experiência em editorias de periódicos científicos em medicina. Em Anatomia de uma Epidemia ele assume o desafio de decifrar um 9 enigma: está havendo um crescimento vertiginoso de pessoas diagnosticadas com algum transtorno mental, com parte considerável da população entrando em tratamento psiquiátrico e não se curando com as abordagens psicofarmacológicas; muito pelo contrário, ficam mais doentes e dependentes da psiquiatria. Ora, essa realidade contraria o pensamento dominante segundo o qual a psiquiatria tem tido enorme progresso científico nos últimos cinquenta anos. Essa problemática não pode deixar de nos inquietar. Particularmente a nós, brasileiros, que temos um processo de reforma psiquiátrica reconhecido internacionalmente. Ao deslocar a assistência para o território e oferecer aos usuários dos serviços públicos cuidados baseados em abordagens psicossociais, temos tido êxito em diminuir significativamente o número de pessoas tratadas em hospitais psiquiátricos. Não obstante, verificamos que aqui no Brasil vem se produzindo um fenômeno em muito assemelhado ao que se passa na maioria das sociedades que não contam com uma reforma da assistência tão radical como a que temos obtido com muitas lutas. Trata-se do crescimento vertiginoso do número de pessoas que são diagnosticadas com algum transtorno mental e não conseguem deixar de ser pacientes (usuários) da assistência psiquiátrica. Por que isso ocorre? Por que os ''transtornos mentais", como as psicoses, os transtornos depressivos, os transtornos de ansiedade, e assim por diante, são doenças crônicas em sua maioria? Será que é porque os serviços são carentes de recursos humanos, físicos, técnicos ou financeiros? Se assim for, a dimensão da "epidemia" é muito maior ainda, porque não faltam relatos de pesquisas a afirmarem que há subnotificação diagnóstica, que haveria muito mais pessoas que deveriam estar em tratamento se os profissionais estivessem mais bem formados academicamente. Será que vivemos uma "epidemia" de transtornos mentais de fato? O senso comum diz que sim! O impactante na leitura de Anatomia é que vários dos fundamentos que sustentam esse senso comum são ilusórios! São mitos criados com nenhuma ou pouca fundamentação científica. Whitaker nos motiva a refletir profundamente e com coragem sobre o que está errado e não sabemos dizer o que é. Guiados pelo senso comum, fazemos esforços para escapar dessa "epidemia", mas não podemos. Nosso sofrimento e o do outro -depressão, psicoses, dificuldades de relacionamento, insônia, ou medo - precisa ser compreendido. Tentamos de todas as maneiras negar o sofrimento! E quando buscamos um médico, uma orientação, um suporte afetivo-emocional, 10 é-nos apresentado um determinado diagnóstico, quase sempre acompanhado por uma droga psiquiátrica. O enigma é: por que continuamos a sofrer, física, fisiológica e/ou psicologicamente? Por que o sofrimento parece ficar ainda mais acentuado com as formas de tratamento hegemônicas? O primeiro mito abordado por Whitaker é o de que, graças aos avanços científicos das últimas décadas, a sociedade conta, cada vez mais, com diagnósticos psiquiátricos precisos, com protocolos de intervenção objetivos e confiáveis, capazes de identificar problemas que até então ou não eram percebidos ou eram abordados de forma não científica, os quais devem orientar o tratamento adequado. Por conseguinte, não é surpresa que o número de pessoas com algum "transtorno mental" esteja sempre aumentando. Sendo isso quase s_enso comum entre nós, o desafio maior seria dotar o sistema de saúde de capacidades para dar conta·das demandas (das quais uma parte significativa ainda estaria reprimida!). Whitaker desconstrói esse mito recapitulando a história das maneiras como a psiquiatria tem tornado problemas normais, usuais - comuns ao cotidiano da maioria das pessoas -em "transtornos mentais". Em sua desconstrução, adota a própria lógica que supostamente sustenta o discurso psiquiátrico: a das evidências científicas. Com a leitura do livro, a cada página somos surpreendidos com a constatação de que faltam justamente evidências científicas para a construção das categorias de diagnóstico. As sucessivas revisões doDiagnostic and Statistical Manual of MentDails or(DdSeMr)s,d i zem os seus formuladores, apenas tornam oficial o que é observado na prática. Dizem ainda que a causa dos transtornos mentais é essencialmente biológica, e por isso mesmo a medicação psiquiátrica é essencial. Quer dizer, historicamente o que a psiquiatria temfe ito é primeiro nomear transtornos para depois buscar causas biológicas. A lógica que fundamenta a construção desses manuais é que se um número importante de clínicos sente que determinada categoria de diagnóstico é importante emse u trabalho, então essa categoria merece estar no manual (muito em particular noDSM, objeto de análise de Whitaker). As sucessivas versões doDSM têm como questão saber o quanto de consenso há para se reconhecer e incluir um transtorno mental qualquer. Porém, para a ciência acordo não necessariamente significa verdade. O segundo mito é ode que as drogas psiquiátricas íniciaraffi um extraordinário avanço científico. Para a visão oficial, a introdução da clorpromazina na medicina asilar em 1955 foi o ponto de partida para uma revolução na psiquiatria, comparável à introdução da penicilina na medicina. E em 1989, com a introdução dos medicamentos da segunda geração, argumenta-se que ocorre uma nova li etapa revolucionária. Com "transtornos mentais" bem definidos e medicamentos adequados para atingir o "alvo", eis que nós, contemporâneos, podemos, cada vez mais, nos ver livres do "sofrimento psíquico" - é o que nos fazem pensar! Ora, quando se faz um tratamento para determinada doença, o que se espera é que esta desapareça ou pelo menos seja submetida a controle. No entanto, cada vez mais há mais pessoas "doentes mentais" e em tratamento por médio e longo prazos. Como o medicamento psiquiátrico age no cérebro? Segundo a teoria, há um desequilíbrio químico subjacente a cada ''transtorno mental". Por exemplo, a teoria da dopamina para a esquizofrenia e da serotonina para a depressão. Não obstante essa crença, há muito poucas evidências científicas a confirmar tal teoria. Ao contrário, o que aparece são-evidências que a desmentem. O que cada vez mais tem ficado evidente é que as drogas psiquiátricas criam perturbações nas funções dos neurônios; temporárias, mas desgraçadamente muitas vezes definitivas. O que explicaria a razão pela qual as pessoas que começam a tomar antipsicóticos, antidepressivos, ansiolíticos não possam mais interromper o tratamento medicamentoso, sob o risco de terem recaídas que as deixam em condição muito mais grave do que o estado em que se encontravam inicialmente! Tudo parece indicar que após poucas semanas de uso de drogas psiquiátricas, o cérebro da pessoa passa a funcionar de modo qualitativa e quantitativamente diferente daquele como funcionava nos estados normais. E o que não faltam são evidências científicas para se entender esse fenômeno, tradicionalmente conhecido como iatrogenia. São evidências interculturais investigadas pela própria Organização Mundial da Saúde, com clássicos estudos de follow-up, nos quais "países em desenvolvimento", cuja população está menos psiquiatrizada, apresentam muito melhores resultados de cura dos seus cidadãos do que aqueles países onde a presença da psiquiatria é muito forte. São experimentos em animais nos quais as patologias "psiquiátricas" são encontradas após o uso de drogas psiquiátricas. São estudos prospectivos longitudinais que acompanham pessoas, entre pacientes diagnosticados com esquizofrenia, que foram ou não tratadas com medicamentos psiquiátricos ao longo de dois, cinco, dez, quinze, vinte e 25 anos. São pesquisas com imagens de ressonância magnética que demonstram a redução da massa encefálica ao longo do tempo de tratamento com medicamentos psiquiátricos. Muito provavelmente, o leitor de Anatomia de uma Epidemia ficará surpreso como a maioria dos seus leitores nos diversos países têm ficado. Os desafios para nós, brasileiros, são enormes, sobretudo porque o uso de medicamentos 12